24.7.09

Talibã é fruto de vácuo de poder após anos de conflito no Afeganistão

Grupo islâmico radical surgiu em 1994 e tomou Cabul em 1996.
Durante seu governo, direitos foram suprimidos, e o país se fechou.


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Imagem de 1998 mostra soldados talibãs aguardando para lutar contra milícias opositoras em Bagram (Foto: AFP)

Até os atentados de 11 de Setembro de 2001, quase ninguém tinha ouvido falar nos militantes islâmicos radicais do Talibã, em Osama bin Laden e no papel que eles ocupavam no Afeganistão. A tragédia americana voltou os olhos do mundo para a árida região montanhosa da Ásia central e seus protagonistas, que lutam há séculos pelo controle do país islâmico.

Mas, afinal, quem está por trás do Talibã? Como o grupo surgiu e por onde anda agora, depois da tomada do país pelas tropas americanas em 2001?

Em março deste ano, o presidente Barack Obama afirmou que o combate ao Talibã e à al-Qaeda no Afeganistão e no Paquistão passaria a ser prioridade dos EUA, tirando o foco da luta antiterrorismo do Iraque. Em julho, as tropas lideradas pelos EUA iniciaram uma grande ofensiva contra o movimento na província de Helmand.

Saiba mais sobre os radicais islâmicos que governaram o Afeganistão por cinco anos e que, segundo os norte-americanos, ainda são uma ameaça à segurança do Ocidente.

Histórico

O Talibã surgiu em um momento de lutas internas dentro do país. Voltando um pouco no tempo: o Afeganistão foi unificado em 1747 e foi motivo de briga entre os impérios britânico e russo até sua completa independência, em 1919. Após experimentar a democracia, um golpe em 1973 inaugurou um período de conflitos que dura até hoje no país. Em 1978, um contragolpe comunista estabeleceu a República Democrática do Afeganistão.

De olho no país, a ex-União Soviética invadiu o território no ano seguinte, com 30 mil homens e ajudou os comunistas numa luta ferrenha contra os rebeldes tribais muçulmanos. O número de soviéticos no país chegou a 115 mil, e, nessa época, muitos refugiados foram para o Paquistão e para o Irã.

As guerrilhas rebeldes, conhecidas como Mujahideen (‘santos guerreiros’), não estavam unidas, e de nada adiantava a ajuda em armas e dinheiro enviada pelos EUA aos guerreiros, que estavam concentrados em sua maioria no Paquistão.

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Foto de 1997 mostra afegãs cobertas pela burca - que já era um costume na região em épocas anteriores ao Talibã (Foto: Stefan Smith/AFP)

A saída dos soviéticos ocorreu em 1989, mas as diferenças entre os grupos fizeram com que a guerra civil continuasse. Em 1992, os Mujahideen tomaram o poder, e um acordo permitiu a governança até 1994, quando a crise entre as diferentes facções guerreiras explodiu novamente.

Ao mesmo tempo, no sul do Afeganistão, surgiu um outro grupo militante, liderado por Mullah Mohammed Omar e que envolvia aprendizes do Islã sunita que pegavam em armas: o Talibã.

Ele logo conquistou as cidades de Kandahar e Charasiab.

“Após ter conquistado Kandahar, eles entenderam as misturas sociais e étnicas da região e tentaram manipular essas diferenças étnicas para seus ganhos políticos e militares. Eles davam recompensas a quem cooperava e puniam quem ia contra eles. [...] Usavam armas roubadas e ajuda externa militar na formação de seu exército”, escreveu Neamatollah Nojumi no livro "The rise of the Taliban in Afghanistan" (A ascensão do Talibã no Afeganistão, Inédito em português).

Com financiamento paquistanês, eles foram derrotados na primeira tentativa de conquistar Cabul, mas continuaram os bombardeios à cidade, tomando-a por completo em setembro de 1996 e impondo um governo islâmico radical no país.

Apogeu e convivência com a al-Qaeda

Num país assolado por anos seguidos de guerras, a rigidez do Talibã trouxe uma certa calmaria à região. A maioria dos líderes tribais havia sido derrotada, e seus líderes foram enforcados. A população foi desarmada, e as ruas foram desbloqueadas, facilitando o comércio.

O grupo aplicou no país uma interpretação rígida da Sharia, a lei islâmica. Logo as escolas de meninas foram fechadas, e as mulheres foram proibidas de deixar suas casas até para fazer compras. Fontes de entretenimento como música, TV e esportes também foram banidas.

Foto: Jean Claude-Chapon e Shah Marai/AFP

Na esquerda, foto de 1997 mostra uma das estátuas de Buda datadas dos séculos II e V, na província de Bamiyan. Eram os maiores monumentos do tipo, com cerca de 53 metros. Na foto da direita, de 2008, o local aparece sem o Buda, destruído em 2001 por ordem de Mullah Omar (Foto: Jean Claude-Chapon e Shah Marai/AFP)

A aproximação com o líder da rede terrorista da al-Qaeda, Osama bin Laden, não tardou. A princípio um opositor do Talibã, Bin Laden mudou de lado após um encontro com Mullah Mohammed Omar em 1996. Com o apoio de Omar, sua al-Qaeda estava segura para agir no Afeganistão.

“O Talibã teve inigualável sucesso, pois implementou uma teocracia austera e puritana às quais desejavam a al-Qaeda e outro grupos jihadistas. Apesar de só ser reconhecido por três países (Paquistão, Emirados Árabes Unidos e Arábia Saudita), o minicalifado sob ordens de Mullah Omar reinou a vontade para realizar seus experimentos entre 1996 e 2001”, escreveu Abdel Bari Atwan no livro "Historia secreta da al-Qaeda".

Queda e dispersão

E o controle do território foi aumentando até que, pouco antes da invasão americana, em 2001, o Talibã controlava 90% do Afeganistão - embora nunca tenha sido reconhecido pela ONU. Aliás, os únicos países que reconheciam o governo eram a Arábia Saudita, os Emirados Árabes Unidos e o Paquistão.

New York Times: Afeganistão é desafio para a Otan

O fim da administração do Talibã no Afeganistão está vinculado aos atentados de 11 de Setembro de 2001 nos EUA. O presidente americano à época, George W. Bush, revidou com uma invasão ao país que dava abrigo à rede al-Qaeda, responsável pelos ataques. Paquistão e Arábia Saudita se tornaram aliados na luta ao terror, e os talibãs continuaram a sua luta armada, agora na clandestinidade.

A guerra destituiu os radicais e impôs um novo governo ao país. Até hoje, as tropas americanas lutam contra a insurgência que se divide em diferentes grupos opositores - entre eles, o Talibã.

Em outubro de 2007, uma reportagem do jornal "The New York Times" estimou que o grupo tinha 10 mil combatentes, embora apenas 3 mil fossem soldados exclusivos.

O Talibã que hoje luta no Paquistão foi organizado de maneira distinta que o grupo que atuou no Afeganistão, emergindo em 2002 após ataques do Exército a regiões tribais. Hoje, o Paquistão empenha sua máxima força na luta contra os talibãs no vale do Swat.

Fonte: G1