31.8.09
HIROSHIMA E NAGASAKI
HIROSHIMA E NAGASAKI
As 8:15 da manhã de 6 de agosto de 1945, quando os moradores de Hiroshima estavam começando o dia, um avião americano B-29, chamado Enola Gay, soltou uma bomba atômica chamada "Little Boy", com 12,500 toneladas de TNT, que detonou 580 metros acima do Hospital Shima próximo ao centro da cidade.
Como resultado do ataque, calor e incêndios, a cidade de Hiroshima foi destruída e 90 mil pessoas morreram naquele dia. Três dias após destruir Hiroshima, outro avião B-29 atacou a cidade de Nagasaki com a terceira arma atômica mundial. O ataque resultou em mortes imediatas de 40 mil pessoas.
Até o final de 1945, 145 mil pessoas tinham morrido em Hiroshima e 75 mil em Nagasaki. Mais dezenas de milhares de pessoas sofreram ferimentos sérios. Mortes entre os sobreviventes continuaram nos próximos anos devido aos efeitos da radiação que também causou o nascimento de bebês com má formação.
Na concepção de muitos, se não da maioria dos cidadãos americanos, as bombas atômicas salvaram a vida de talvez 1 milhão de soldados americanos e a destruição de Hiroshima e Nagasaki é vista como um pequeno preço a ser pago por salvar tantas vidas e levar a guerra terrível ao final. Esta visão dá a impressão que o ataque nestas cidades com armas atômicas foi útil, rendeu frutos e é uma ocasião a ser celebrada.
Más a necessidade de se jogar as bombas para terminar a guerra tem sido amplamente discutido pelos historiadores. Muitos intelectuais, incluindo Lifton e Michell, mostram que o Japão estava com intenções de se render quando as bombas foram jogadas, que a estratégia militar americana havia calculado muito menos baixas de uma invasão do Japão e finalmente que havia outras maneiras de se terminar a guerra sem utilizar bombas atômicas nas duas cidades japonesas.
Entre os críticos do uso das armas nucleares em Hiroshima e Nagasaki estão líderes militares americanos. Em uma entrevista após guerra o General Dwight Eisenhower, que mais tarde viria a ser presidente dos EUA, disse a um jornalista: " ... os japoneses estavam prontos para se renderem e não era necessário atacá-los com aquela coisa terrível."
O Almirante William D. Leahy, chefe do grupo de trabalho de Truman, escreveu:
" Na minha opinião o uso desta arma bárbara em Hiroshima e Nagasaki não ajudou em nada na nossa guerra contra o Japão. Os japoneses já estavam vencidos prontos a se renderem ... Sinto que sendo os primeiros a usá-la, nós adotamos o mesmo código de ética dos bárbaros na Idade Média (...) Guerras não podem ser ganhas destruindo mulheres e crianças ..."
Não há reconhecimento suficiente no mundo e nem nos EUA de que as vítimas das bombas eram na maioria civis, que aqueles mais próximos do epicentro das explosões foram incenerados enquanto os mais distantes receberam a radiação, que muitos tiveram mortes dolorosas e que mesmo hoje, mais de cinco décadas após o ataque com bombas nucleares, os sobreviventes ainda sofrem os efeitos da radiação.
As bombas de Hiroshima e Nagasaki fazem parte do passado. Mas elas ensinem umas das lições mais importantes da humanidade: existe a possibilidade de sermos exterminados como espécie, não simplesmente mortes individuais, mas o fim dos seres humanos.
Cada dia em que as armas nucleares continuem a existir na Terra é um dia que se festeja uma catástrofe como aquelas de Hiroshima e Nagasaki em 6 e 9 de agosto de 1945.
Mais de 30 mil armas nucleares existem no mundo hoje. Tudo isto apesar de que os maiores e mais antigos portadores de armas nucleares, EUA, Russia, China, França e Reino Unido, terem prometido, há mais de 30 anos, eliminar suas armas nucleares. A proliferação de armas nucleares para Israel , India , Paquistão e Korea do Norte e a possível aquisição e produção de armas nucleares por organizações não estatais, tem aumentado o perigo de uma guerra nuclear intencional ou por acidente mais cedo ou mais tarde.
Milhões de pessoas no mundo todo não aceitam que armas nucleares possam nos defender, nossos países, os valores que acreditamos, nosso mundo, nem o mundo que queremos passar para nossas crianças e netos. Existem muitos grupos e campanhas trabalhando para a eliminação sistemática das armas nucleares através de controle internacional e criar maneiras para que isto aconteça. Uma destas maneiras é se juntar aos Prefeitos que estão chamando os líderes do Governo para a conferência do NPT - Tratado de Não Proliferação Nuclear em 2005.
O mundo precisa de símbolos em comum para se unir. Um símbolo em comum é a foto da Terra tirada do espaço. Esta foto é um símbolo que nos faz entender imediatamente que compartilhamos o mesmo planeta e um futuro em comum. E este futuro em comum está em nossas mãos. É nossa responsibilidade ajudar o mundo a se livrar dos mecanismos que geram violência e sofrimento e investir em uma geração de construtores da paz. É tempo de se começar a educar para a paz e ajudar a passar às crianças e jovens a visão, o conhecimento, habilidades e atitudes que eles precisarão para serem líderes e co-criadores de um mundo de paz, harmonia e justiça para todos.
Fonte: www.wagingpeace.org
HIROSHIMA E NAGASAKI
O Projeto Manhattan
O Projeto Manhattan foi o esforço dos EUA durante a Segunda Guerra Mundial para desenvolver a primeira bomba atômica. A empreitada sem precedentes reuniu dezenas de cientistas em torno do programa ultra-secreto. A corrida começou no último mandato do presidente Franklin Delano Roosevelt. Em 1939, havia rumores de que a Alemanha nazista de Adolf Hitler estaria desenvolvendo a bomba atômica. As suspeitas haviam sido reforçadas depois que cientistas alemães descobriram, um ano antes, o processo de fissão nuclear, dando a Berlim a dianteira nas pesquisas nucleares. Cientistas alemães exilados nos EUA temiam que Berlim conseguisse manipular o urânio de tal modo a torná-lo próprio para construção de uma bomba atômica e persuadiram o físico Albert Einstein a alertar Roosevelt para o perigo de uma ameaça nuclear nazista. Em carta datada de 2 de agosto de 1939, Einstein destacava que o urânio seria uma nova e importante fonte de energia no futuro próximo e advertia que os EUA não tinham vastas reservas do minério. O alerta funcionou, e Einstein lamentaria suas conseqüências. Com o objetivo de construir uma arma atômica antes da Alemanha e do Japão, os EUA iniciaram seu programa nuclear no fim de 1941, sob a direção do general Leslie Groves. O projeto foi desenvolvido conjuntamente em diversos locais do país, mas a descoberta mais significativa aconteceria na Universidade de Chicago, em Stagg Field, onde Enrico Fermi realizou uma reação de fissão em cadeia controlada.
O primeiro grande desafio do Projeto Manhattan foi justamente produzir urânio enriquecido em grande quantidade para sustentar uma reação em cadeia, numa época em que o urânio-235 (U-235) era muito difícil de extrair. Suas pesquisas amparavam-se em avanços em série, conquistados nos anos anteriores, nos estudos do núcleo do átomo e do poder de sua fissão. Neil Bohr descobrira que o isótopo U-235 era um bom combustível nuclear devido a sua característica instável e poderia sustentar uma reação em cadeia. Já Glenn Seaborg descobrira que o isótopo plutônio-239 (P-239) também poderia ser usado em um armamento nuclear.O segundo grande obstáculo era sustentar uma reação em cadeia, que dá à bomba atômica sua força.
Ao longo de seis anos, de 1939 a 1945, cerca de US$ 2 bilhões foram gastos e quase 150 pessoas participaram do programa, criando meios de enriquecer o urânio. O Projeto Manhattam resultou em três bombas atômicas: Gadget, uma bomba de teste feita de plutônio; "Little Boy", a bomba de urânio que devastou Hiroshima; e "Fat Man", a bomba de plutônio que destruiu Nagasaki.
A partir daí, a História da Humanidade mudaria para sempre.
A terrível herança das bombas sobre Hiroshima e Nagasaki perdura até hoje. Feridas físicas e psicológicas ainda abertas não permitem que o passado seja esquecido com facilidade pelos sobreviventes. Para os japoneses, trata-se da legião de "hibakusha", aqueles que sofreram na carne e na mente o impacto da bomba.
Do clarão atômico e da chuva negra à fuga do pesadelo para bem longe, personagens reais de um dos capítulos mais tristes da História revelam o que muitas vezes guardavam a sete chaves.
O americano J. Robert Oppenheimer é considerado o "pai" da bomba atômica. Oppenheimer formou-se com louvor em química pela Universidade de Harvard e em, 1927, terminou o doutorado em física na Universidade de Gottigen, na Alemanha. Ao retornar para os Estados Unidos, soube das pesquisas em andamento sobre fissão nuclear e começou a pensar em como usar a energia liberada durante essa reação.
Em meados de 1942, Oppenheimer organizou uma conferência na Universidade da Califórnia em Berkeley, durante a qual físicos renomados discutiram a possibilidade de fabricação de uma bomba atômica. No ano seguinte, ele assumiu a direção do laboratório nuclear de Los Alamos, no Novo México, onde um time de cientistas sob seu comando trabalhou no desenvolvimento de uma bomba nuclear. Oppenheimer participou de todas as etapas do Projeto Manhattan.
Com o fim da Segunda Guerra Mundial, depois que o mundo testemunhou os efeitos devastadores das bombas lançadas sobre Hiroshima e Nagasaki, Oppenheimer tornou-se um defensor do controle de armas atômicas. Ele chegou a sofrer censura do governo americano, que o acusou de ser uma ameaça à segurança. Robert Oppenheimer morreu de câncer na garganta aos 62 anos, em 1967.
Sobre o Holocausto
Há 60 anos, um simples ato, uma ordem dada a um piloto da Força Aérea Americana, foi o causador de uma das maiores catástrofes não naturais já registradas na história mundial e que traz conseqüências até os dias de hoje. As cidades japonesas, Hiroshima e Nagasaki foram pulverizadas por bombas atômicas americanas, fato este que definiu o término da II Guerra Mundial (1939-1945). A primeira explodiu em Hiroshima em seis de agosto de 1945. Três dias depois, a operação se repetiu em Nagasaki, que embora tenha sofrido estragos materiais menores do que Hiroshima, o número de vítimas superou a primeira.
Nagasaki, em 9 de agosto de 1945
A história da descoberta de como liberar a energia nuclear, e sua aplicação para fazer bombas capazes de destruir, irradiar e queimar cidades inteiras, é a grande epopéia trágica do século XX. Para construir as primeiras armas, os Estados Unidos investiram mais de US$ 2 bilhões e construíram um complexo industrial, espalhado do Tennessee ao Novo México e ao Estado de Washington, que em 1945 era tão grande quanto a indústria de automóveis americana.
Sessenta anos depois, o Projeto Manhattan esmaece em mito. Os reatores para produção em massa e equipamentos para a extração de plutônio em Hanford, Washington; as instalações para separação de urânio de quase um quilômetro de extensão em Oak Ridge, no Tennessee; os 200 mil trabalhadores que construíram e operaram o vasto maquinário enquanto se esforçavam para manter seu propósito em segredo, tudo desaparece de vista deixando para trás um núcleo vazio de lenda: um laboratório secreto em uma típica colina do Novo México, onde as bombas de verdade eram projetadas e construídas; o carismático diretor do laboratório, J. Robert Oppenheimer, que conquistou reputação internacional até que seus inimigos o derrubaram; um solitário B-29, incongruentemente batizado em homenagem à mãe do piloto, Enola Gay; uma cidade arruinada, Hiroshima, e a pobre Nagasaki, quase esquecida.
Em 6 de agosto de 1945, às 8h15 da manhã, a primeira bomba nuclear usada contra civis foi lançada pelos EUA sobre a cidade de Hiroshima, no Japão. Três dias depois, uma segunda bomba arrasou a cidade de Nagasaki. Mais de 140 mil pessoas morreram nas duas cidades devido aos ataques. Em Hiroshima, apenas 10% das construções ficaram intactas, 62,9% dos edifícios foram totalmente queimados ou destruídos. Uma bolha de fumaça, o famoso "cogumelo", atingiu 12 km de altura em minutos após a explosão.
O que torna essas armas diferentes é a enorme concentração de energia que poderia ser engendrada em um pequeno espaço, capaz de ser liberada de repente, com resultados devastadores. E também porque carrega um subproduto letal, que se estenderia por muitos anos: a radiatividade.
Para relembrar esse triste aniversário de 60 anos, o único bom motivo é que essas foram as duas únicas vezes que uma arma desse tipo foi usada contra alvos civis, desde sua invenção. Um dos criadores da bomba, o físico Philip Morrison (que morreu em abril deste ano) viajou ao Japão logo após a explosão, em 1945, e confessou ter ficado chocado com o que viu. "Não havia restado nada, apenas uma 'cicatriz' sobre o solo".
Hoje, o mundo ainda se pergunta: teria sido possível alcançar a paz sem a bomba atômica? Naquele momento, a consideração dos que decidiam era de ordem numérica. A guerra já ceifara seis milhões de pessoas e consumira uma cifra inimaginável (Só o Projeto Manhattan, da fabricação da bomba atômica, custou US$ 2 bilhões). Os argumentos a favor da bomba colocavam-se como consistentes do ponto de vista militar e irrelevantes do ponto de vista humano. Foi com base na lógica de uma operação puramente militar que decidiu o Comitê Consultivo formado pelo presidente Truman, sob o comando do secretário de Defesa Henry Stimson. A escolha, selada a 9 de maio de 1945, recaiu sobre o Japão também por uma razão que a eles pareceu óbvia: os valentes japoneses jamais aceitariam a rendição, mesmo com a Alemanha e a Itália esfaceladas. O ultimato dos aliados foi oficialmente ignorado pelo imperador Hirohito, após ouvir os líderes militares, três dias antes da tragédia.
A primeira sugestão foi de que a bomba fosse despejada sobre o monte Fuji, principal cartão postal japonês. Kyoto chegou a ser lembrada, pela condição de importante centro religioso, mas descartada por ser pouco populosa. Quanto maior o alvo, maior também o poder de persuasão, resolveu o conselho consultivo. No dia 6 de agosto, o coronel Tibbets deixou a ilha Tinian em direção a Hiroshima, a 2.240 quilômetros. Às 8h11min, a cidade apareceu clara e iluminada bem à frente de seu Enola Gay. Quatro minutos depois, ele ordenou ao major Tom Ferebee que liberasse as 4,5 toneladas da Little Boy. A bomba A carregava em seu interior uma carga de urânio. Quando explodiu, 45 segundos após, a 565 metros de altura, o B-29 já estava a 19 km do ponto zero, a ponte Aioi. Do alto, e com óculos especiais, a tripulação viu um clarão estupendo. Embaixo, os moradores nem sentiram barulho. Um silêncio mortal logo encobriu Hiroshima e enegreceu para sempre a história da humanidade.
A morte veio em ondas consecutivas. Milhares se desintegraram na hora. Seus corpos tornaram-se sombras. Outros foram alcançados pelo vento de 1.200 km que varreu prédios e homens. Nuvens de fuligem radioativa obstruíram o sol. A chuva negra da morte que se seguiu durou seis horas. Um ciclone de fogo acabou de destruir o que restava de vida num raio de 1.500 metros em torno do ponto zero. Os que sobreviveram, tinham estranhas manchas na pele e hemorragias. Morreriam contaminados pela radiação. Dias, meses, anos, décadas se seguiram e os japoneses de Hiroshima e Nagasaki ainda morreriam vítimas da estranha doença contraída em agosto de 1945. Do outro lado do mundo, o Ocidente festejou a tragédia final. No dia 9 daquele mês, uma nova bomba, carregada de plutônio, repetia a operação. A bordo do B-29 Great Artiste, a Fat Man deveria ser despejada sobre a cidade de Kokura, mas uma formação de nuvens fez o avião desviar-se para Nagasaki. Mais de 75 mil mortos por uma estranha contingência do destino. Para os vencedores, a mudança não fez diferença: o imperador assinou a rendição. Nos dias subseqüentes, milhares de japoneses se suicidaram, inconformados com a desonra final da derrota. A história da humanidade encerrava ai o seu capítulo mais negro. A rosa de Hiroshima jamais será esquecida.
OS HOMENS DA BOMBA
Presidente Harry Truman - Coube a ele, como presidente dos Estados Unidos, a decisão sobre o lançamento das duas bombas sobre o Japão. Era um defensor da solução nuclear. Assumiu a presidência em 1945, com a morte do presidente Roosevelt.
Julius Oppenheimer - Com apenas 38 anos, este físico, considerado um dos mais brilhantes de seu tempo, comandou o Projeto Manhattan, que reuniu uma centena de cientistas.
Coronel Paul Warfield Tibbets - Comandou a tripulação de 12 oficiais do B-29 Enola Gay, o bombardeiro de onde foi despejada a Little Boy, a primeira bomba atômica em área povoada. Era um veterano de bombardeios na Europa. O nome Enola Gay foi uma homenagem à mãe dele.
Hirohito - Imperador japonês, responsável pela entrada do Japão na Segunda Guerra Mundial. Só aceitou a rendição após as duas explosões. Permaneceu no poder mesmo depois da derrota de seu país.
General Douglas MacArthur - Comandante das forças militares no Pacífico. Só foi informado da decisão do presidente Truman de lançar a bomba atômica um dia antes, quando já preparava a invasão do Japão pelos aliados.
Ney Matogrosso - Rosa de Hiroshima
Pensem nas crianças
Mudas telepáticas
Pensem nas meninas
Cegas inexatas
Pensem nas mulheres
Rotas alteradas
Pensem nas feridas
Como rosas cálidas
Mas, oh, não se esqueçam
Da rosa da rosa
Da rosa de Hiroshima
A rosa hereditária
A rosa radioativa
Estúpida e inválida
A rosa com cirrose
A anti-rosa atômica
Sem cor sem perfume
Sem rosa, sem nada.
Fonte: www.colegioantares.com.br
HIROSHIMA E NAGASAKI
Os Fanáticos do Imperador
O samurai vingador
O livro Corações sujos, de Fernando de Morais, restaura as ações da Shindo Renmei, a até então esquecida seita nipo-fascista que, entre 1945-46, por não aceitar a derrota do Japão na guerra, aterrorizou boa parte da comunidade japonesa em São Paulo. Além do livro ser um grande achado jornalístico, descreve, com a agilidade e presteza de sempre do autor, como o véu ideológico que cobre os militantes pode, contra todas as evidências, repudiar a realidade mais evidente.
Memória e Ideologia
A explosão nuclear foi minimizada pela Shindo Renmei
Os estudiosos da mente humana sempre se impressionaram com a capacidade que homens e mulheres têm para selecionar e guardar aquilo que os impressiona, que os convêm ou os interessa, manifestando indiferença pelo restante. O cérebro funciona pois como um enorme filtro seletivo, descartando o que lhe parece inconveniente e desinteressante, ressalvando e guardando na memória aquilo que lhe agrada. O mesmo pode-se dizer dos adeptos das ideologias. O século XX foi pródigo em produzir grandes movimentos de idéias e ideais, os mais extremados, os mais arrebatadores, que mobilizaram milhões de adeptos em todo os cantos do mundo, gerando comportamentos muito próprios em seus militantes. As ideologias políticas, porém, não se limitaram a dar aos homens uma visão de mundo (o que Hitler chamava de Weltanchauung), mas também, desde que os acontecimentos lhes fosse politicamente adversos, cegaram-nos para eles. Rejeitar a realidade, mesmo a mais evidente, foi um dos traços mais espantosos e inexplicáveis do comportamento ideológico do século que passou. O caso da seita japonesa Shindo Renmei, que atuou em São Paulo nos anos 40, encaixa-se perfeitamente neste caso de negação absoluta do real.
A Dor da Derrota
O general MacArthur, em posição informal, ao lado do imperador Hiroito
Nos dias seis e nove de agosto de 1945, aviões norte-americanos lançaram duas bombas atômicas sobre o Japão, contra quem os Estados Unidos estavam em guerra desde dezembro de 1941. O efeito foi devastador. As cidades de Hiroxima e Nagasaki, num par de minutos, deixaram de existir. Estimaram-se as baixas em 150-200 mil pessoas, incineradas pelo calor desprendido da explosão nuclear e pelos efeitos da radiação. Simultaneamente a este desastre de dimensões humanas sem precedentes, a União Soviética destruía as forças japonesas remanescentes que ocupavam a região da Manchúria chinesa. Atacado por terra, mar e pelo ar, tendo seu território e a sua população submetida ao cerco e aos aterrorizantes bombardeios, só restou ao outrora todo-poderoso Império do Sol Nascente aceitar render-se. Não foi uma decisão fácil. Em seus 2.600 de história, o Japão jamais sofrera uma derrota sequer, mantendo seu arquipélago a salvo de todas as invasões. Assim, foi um espanto geral quando os súditos japoneses ouviram pelo rádio, no dia 15 de agosto de 1945, a voz do imperador Hiroito, tido como um deus-vivo, o descendente da divina deusa do Sol, Amaterasu Omikami, explicando-lhes a necessidade, sem mencioná-la explicitamente, de uma capitulação incondicional
Japoneses no Brasil
Campos Sales e R. Alves estimularam a imigração japonesa
A chegada da primeira leva de imigrantes japoneses ao Brasil em 1908 fazia parte do um vasto programa adotado pelas autoridades brasileiras desde o Segundo Império, quando a escravidão deu para declinar. A falta de braços para a lavoura cafeeira em expansão permanente obrigou a que o país adotasse um agressiva política em busca de colonos e de braceiros que para cá viessem em substituição ao sistema escravista que entrara em colapso a partir de 1888. Como, em geral, eram paulistas ou mineiros os presidentes da República daquela época (Prudente de Morais, Campos Salles, Rodrigues Alves e Afonso Penna), expressando justamente os interesses do dois estados voltados para dar sustentação à lavoura do café, a preciosa imigração japonesa foi canalizada basicamente para o Oeste paulista. Diligentes, devotados ao trabalho e à ordem, os recém-chegados espalharam-se pelo triângulo formado pelas cidades de Bauru, Araçatuba e Presidente Prudente, onde estabeleceram as suas principais colônias.
Medidas Repressivas
A imigração dos filhos do Sol Nascente não foi acolhida por unanimidade entre os políticos brasileiros. Havia entre eles os chamados "eugenistas" que, influenciados pelas idéias raciais, consideravam os japoneses inassimiláveis, uma raça estranha ao corpo nacional. Com a eclosão da guerra do Império nipônico contra os Estados Unidos em 1941, o governo de Getúlio Vargas, apesar de não declarar guerra ao Japão, procurou mantê-los sob uma vigilância cada vez mais crescente. Os imigrantes japoneses passaram a viver sob a situação de estado de sítio permanente, pois viram-nos como potenciais traidores, capazes de auxiliar os nazistas a afundarem os navios brasileiros (o Brasil havia entrado na guerra em agosto de 1942, perdendo até o final dela 32 navios mercantes e três de guerra, com mais de 1.400 mortos). Durante quatro anos, até o conflito se encerrar em agosto de 1945, a colônia japonesa amargou o pão que o diabo amassou, vendo serem fechadas as escolas onde suas crianças aprendiam o Yamatodamashii (a maneira nipônica de ser) e até sendo proibida de falar a sua língua em público.
Confisco e Isolamento
Esta política de sufoco culminou no decreto de 11 de março de 1942 que confiscou um percentual dos depósitos dos súditos do Eixo existentes nos bancos brasileiros, a título de compensação pelas perdas sofridas pelo Brasil na guerra, e na liquidação extrajudicialmente de todas as empresas de certo porte que fossem de propriedade de italianos, alemães ou japoneses. O que contribuiu para que as colônias japonesas, cercadas pela hostilidade da vizinhança, proibidas ainda de possuírem receptores de rádio, mergulhassem num isolamento quase que completo. Foi em meio a isso, a uma guerra em andamento e a perseguição tentacular que lhe movida o governo que surgiu a seita patriótica Shindo Renmei.
Estranhas Núpcias
Amaterasu, a deusa-mãe da família imperial
O pretexto do encontro era a celebração de uma núpcias. O local escolhido foi o Hotel Sawaya na cidade de Marília, interior de São Paulo. A intenção dos que compareceram, uma pequena multidão de japoneses atraídos para o banquete, era fundar as bases de uma sociedade patriótica que desse apoio moral à guerra movida pelo imperador e ao mesmo tempo lutasse pela preservação dos valores mais altos da maneira japonesa de ser. A data escolhida revelou-se desastrosa, porque exatamente naquele agosto de 1942 inúmeros navios brasileiros haviam sido afundados e aquela aglomeração de gente da colônia para oficiar ainda que um casamento foi interpretada pelos marilienses como uma odiosa provocação. Não demorou para que o salão do hotel, decorado com bandeiras do sol nascente e imagens de Hiroito, se visse invadido por uma turba furiosa disposta a dissolver o encontro à pauladas e porretadas. Esse incidente em Marília foi um dos primeiros, de tantos outros, bem mais graves, em que se opôs a comunidade japonesa com a população paulista, onde até linchamentos ocorreram.
A Liga do Caminho dos Súditos
Não muito longe de Marília, escapados do linchamento do hotel assaltado, acolhidos numa galpão de um a chácara de um patrício, o ex-coronel do exército imperial Jungi Kikawa, e um pequeno grupo de escolhidos, fundava a Liga do Caminho dos Súditos (Shindo Renmei), uma entre tantas outras seitas patrióticas (eram umas trinta) que emergiram naquela época de guerra. A Shindo porém, apoiada em 64 municípios e com 100 mil sócios-contribuintes, deixaria sua marca de sangue na história da imigração japonesa. A sua função original foi abastecer clandestinamente, por meio de mascates da Casa Paulista (a fachada legal da Shindo Renmei), a comunidade japonesa com boletins informando o andamento da guerra, sem a contaminação da "propaganda americana". Além disso procurava manter o moral alto, enaltecendo os valores pátrios e a cultura ancestral japonesa.
O Drama da Rendição
A cultura ancestral a ser preservada
O diabo deu-se ao término da guerra, quando o representante do imperador rendeu-se no dia dois de setembro de 1945, numa cerimônia a bordo do encouraçado Missouri, ancorado na baía de Tóquio, perante o general Douglas MacArthur. A comunidade japonesa imediatamente cindiu-se em dois grupos conflitantes. De um lado encontravam-se a minoria dos makegumi (os "derrotistas" ou "esclarecidos") que aceitavam a derrota como uma fatalidade inquestionável (em geral gente próspera, os "burgueses" da comunidade nipônica, melhor informados e mais adaptados à vida brasileira) . Do outro os auto-intitulados kachikumi, "os vitoriosos", o imenso exército de lavradores, chacareiros, feirantes, tintureiros, a raia miúda da imigração, cujo sonho era juntar dinheiro e algum dia voltar para o Japão.
A cerimônia de rendição do Japão (02/09/1945)
Foi a eles que a Shindo Renmei se dirigiu, apontando o seu dedo vingativo contra "os corações sujos", os makegumi que diziam que era verdade sim, o Império não mais existia, o Japão fora derrotado. Em frente às casas desses renegados do imperador foram então fixados cartazes ou dizeres infamantes, alertando-os para que "limpassem a garganta de traidores para não sujar a espada que os degolaria".
Os comandos entram em ação
O coronel Kikawa em trajes cerimoniais
O coronel Kikawa, um sexagenário de 1,51 metro de altura, com expressão comuníssima, e que havia se tornado dono de uma tinturaria em São Paulo, detido por fazer ameaças aos seus concidadãos, nem quando foi solto pelas autoridades brasileiras desistiu das coações e intimações. Ninguém o convenceu, enquanto estava preso, de que a rendição do Japão, seguida do Rescrito Imperial, haviam de fato ocorrido. Para ele nada mais era do que um embuste da propaganda americana, uma cortina de fumaça para enganar os japoneses emigrados. Como conseqüência disto não só dedicou-se a forjar incontáveis boletins diários e orientar na falsificação de fotografias para provar justamente o contrário - que eram os Estados Unidos que havia se rendido ao Japão - como considerou todo o japonês que divulgasse a verdade como um traidor da pátria. Para esses ele reservou um destino especial: seriam eliminados pelos tokkotai, as unidades especiais de ataques, chamadas Batalhões do Vento Divino, que lembravam os fascio di combattimento da época de Mussolini, mas com um toque de cangaço.
As Listras Negras
E. Sakani, um tokkotai errático
A Shindo Renmei preparou listas dos makegumi a serem mortos e distribuiu as tarefas de liquidá-los por vários grupos de tokkotai espalhados pelo interior de São Paulo e pela capital. Sucederam-se então uma série impressionante de atentados nos quais os "derrotistas" foram, por vezes, executados em frente aos seus familiares. As baixas provocadas pelos fanáticos do imperador superaram a 170 vítimas (23 mortos e 147 feridos). A comunidade japonesa entrou em polvorosa e as autoridades brasileiras correram a tomar as providência devidas: 31.380 japoneses tidos como simpatizantes da Shindo Renmei foram detidos e identificados.
Uma Situação Nonsense
Bandeira de guerra do Japão
Ao saber que a razão daqueles crimes era a negativa de boa parte da comunidade japonesa a aceitar a derrota de 1945, o interventor do estado de São Paulo José Carlos Macedo Soares marcou para o dia 19 de junho de 1946 (quase dez meses depois da capitulação do Japão) um encontro com as lideranças da mais representativas da comunidade. Queria usar o princípio da autoridade do governo brasileiro para neutralizar o princípio da fidelidade ao imperador, um contraveneno às intrigas e absurdos difundidos pela Shindo Renmei. Pensou que se ouvissem dele uma declaração oficial de que a "Esfera da Co-Prosperidade da Grande Ásia Oriental", o projeto imperialista do Japão, tinha sucumbido e que o Hiroito de fato se rendera, eles acatariam sua palavra.
Exigências Absurdas
Que nada. Entre os mais de 500 japoneses presentes nenhum aceitou a verdade. Não só isso, exigiram do governo paulista que de alguma forma impedissem que o noticiário fizesse qualquer menção à derrota japonesa. O que causou uma natural indignação nacional com tal petulância. Seja como for, as imensas redes policiais, apoiadas em verdadeiras operações militares do exército brasileiro, realizadas nas cidades de Osvaldo Cruz, de Tupi, de Bical e Marília, conseguiram paralisar os terroristas tokkotai que, juntos com as lideranças, foram presos e identificados. Em pouco tempo a Shindo Renmei deixou de existir recolhendo-se então para um longo esquecimento de quase meio século, do qual somente saiu pelo exemplar livro-reportagem de Fernando de Morais.
Fonte: educaterra.terra.com.br