As fontes primeiras
Uma das suas primeiras fontes foi a escola psicológica inaugurada por Wilhelm Wund (1832-1920) que procurou determinar a estrutura da mente na tentativa de compreender os fenômenos mentais pela decomposição dos estados de consciência produzidos pelos estímulos ambientais. Para tanto, o psicólogo defendeu como linha de atuação o introspeccionismo (o “olhar para dentro”) na tentativa de fazer com que o pesquisador observasse e descrevesse minuciosamente suas sensações em função das características dos estímulos a que ele era submetidas, afastadas do relato tudo aquilo que fosse previamente conhecido. No campo da lingüistica, o trabalho do francês Ferdinand de Saussure (Cours de linguistique général, 1916, publicado pós-morte), empreendido apenas antes da Iª Guerra Mundial, serviu por muito tempo como o modelo e inspiração da corrente estruturalista de formação francesa.
A lingüística de Sausurre
A característica do estruturalismo, baseado no inquérito lingüístico de Saussure, centrou-se não no discurso próprio, mas nas regras e nas convenções subjacentes que permitiam a língua operar: qual a lógica que subjaze oculta por detrás da fala das gentes. Ao analisar a dimensão social ou coletiva da língua, ele abriu caminho e promoveu o estudo da gramática. Para melhor entendimento do estudo da linguagem separou-a em langue (língua, o sistema formal da linguagem que governa os eventos da fala) e a parole (palavra propriamente dita, o discurso, ou os eventos da fala). Saussure estava interessado na infra-estrutura da língua, aquilo que é comum a todos os falantes e que funciona em um nível inconsciente. Seu inquérito concentrou-se nas estruturas mais profundas da língua, mais do nos fenômenos de superfície, não fazendo nenhuma referência à evolução histórica dos idiomas.
Sincronia e diacronia
Esta atitude cientifica, a de analisar o objeto do estudo em si, relacionado apenas com o que lhe era pertinente, quase que imóvel no tempo, ele chamou de sincrônico, contrapondo-o ao estudo histórico do mesmo, ao que ele chamou de diacrônico, onde a mudança está sempre presente. Fiel ao ideário positivista, ele opôs-se ao evolucionismo, ao hegelianismo e ao marxismo que entendiam qualquer objeto ou fenômeno como resultante da história. Para ele o que interessava eram quais eram os resultados extraídos da observação direta e o que podia apreender-se delas.
Lévi-Strauss e a Antropologia Estrutural
Lévi-Strauss (1908-2009) |
A valorização das narrativas mitológicas
Enquanto a ciência racionalista e positivista do século XIX desprezava a mitologia, a magia, o animismo e os rituais fetichistas em geral, Lévi-Strauss entendeu-as como recursos de uma narrativa da história tribal, como expressões legitimas de manifestações de desejos e projeções ocultas, todas elas merecedoras de serem admitidas no papel de matéria-prima antropológica. Como é o caso dos seus estudos sobre o mito (Mythologiques), cuja narrativa oral corria da esquerda para a direita num eixo diacrônico, num tempo não-reversível, enquanto que a estrutura do mito (por exemplo, o que trata do nascimento ou da morte de um herói), sobe e desce num eixo sincrônico, num tempo que é reversível. Se bem que eles, os mitos, nada revelavam sobre a ordem do mundo, serviam muito para entender-se o funcionamento da cultura que o gerou e perpetuou. A mesma coisa aplica-se com o totemismo, poderoso instrumento simbólico do clã para reger o sistema de parentesco, regulando os matrimônios com a intenção de preservar o tabu do incesto (cada totem está associado a um grupo social determinado, a uma tribo ou clã, e todo o sistema de casamentos é estabelecido pelo entrecruzar dos que se filiam a totens diferentes). O objetivo dele era provar que a estrutura dos mitos era idêntica em qualquer canto da Terra, confirmando assim que a estrutura mental da humanidade é a mesma, independentemente da raça, clima ou religião adotada ou praticada. Contrapondo o mito à história ele separou as sociedades humanas em “frias” e “quentes”, formando então o seguinte quadro delas:
Sociedades “frias” (primitivas): Encontram-se “fora da história”, orientando-se pelo modo mítico de pensar, sendo que o mito é definido como “ máquinas de supressão do tempo”.
Sociedades “quentes” (civilizadas): Movem-se dentro da história, com ênfase no progresso, estando em constante transformação tecnológica
Partindo-se das idéias de Saussure e do lingüista Roman Jakobson, e do antropólogo Lévi-Strauss, especificaram-se quatro procedimentos básicos ao estruturalismo:
- Primeiro, a análise estrutural examina as infra-estruturas inconscientes dos fenômenos culturais;
- em segundo, considera os elementos da infra-estrutura como "relacionados," não como entidades independentes;
- em terceiro lugar, procura entender a coerência do sistema;
- e quarta, propõe a contabilidade geral das leis para os testes padrões subjacentes no sentido da organização dos fenômenos.
A Importância da Narrativa
Nos estudos humanísticos e literários em geral, o estruturalismo foi aplicado o mais eficazmente no campo do "narradologia." Esta disciplina, ainda nascente, estuda todas as narrativas, se elas ou não usam a língua, os mitos, as lendas, as novelas, a circulação das notícias, historias, esculturas de relevo e janelas, as pantominas e os estudos de caso psicológicos. Usando métodos e princípios do estruturalismo, os narradologistas analisam as características e as funções sistemáticas das narrativas tentando estabelecer e isolar um jogo de regras finito para esclarecer o jogo infinito de narrativas reais e possíveis.
Começando nos 1960s, o crítico francês Roland Bartes e diversos outros narradologistas franceses, popularizaram o método, que tem desde então transformado um método de análise importante também nos Estados Unidos também.
Estruturalismo, marxismo e freudismo
Ao avaliar as estruturas profundas, subjacentes, que se ocultam por detrás dos fenômenos, escapando do primeiro olhar humano, o estruturalismo aproxima-se das visões de Marx (a infra-estrutura econômica) e Freud (o poder do inconsciente). Ambos, como se sabe, entendiam os fenômenos sociais ou comportamentais como obrigatoriamente condicionados por forças impessoais (o Capitalismo, o Superego), deslocando, desde então, o problema do estudo da consciência ou das escolhas individuais para um quadro bem mais amplo, dos macro-sistemas.
Ao contrário da ciência de inclinação liberal, para as correntes citadas acima, o indivíduo pouco contava. Tal como o marxismo e o freudismo, o estruturalismo diminui a importância do que é singular, subjetivo, individual, retratando o ser, a pessoa humana, como resultante de uma construção, a conseqüência de sistemas impessoais (no marxismo o indivíduo é marionete do sistema capitalista, na psicanálise, se bem que amparado no ego, ele é regido pelos impulsos do inconsciente, e na antropologia estrutural pelas relações de parentesco determinadas pelo totemismo).
Os indivíduos, por conseguinte, nem produzem nem controlam os códigos e as convenções que regem e envolvem a existência social deles, sua vida mental ou experiência lingüística (É o que Marx quis dizer quando afirmou que “os homens fazem a história, mas não estão conscientes disso”). Em conseqüência desse descaso do estruturalismo pela importância da pessoa, ou do assunto, por ter feito o homem desaparecer na complexa teia da organização social em que nasce e a que pertence, foi considerado pelos seus críticos como um "anti-humanismo."
A semiologia e a semiótica
F. Saussure (1857-1913) |
Os derradeiros
O termo semiótica substituiu gradualmente o de estruturalismo, e o surgimento da Associação Internacional para Estudos Semióticos, nos 1960s, solidificou ainda mais esta tendência. No momento em que a metodologia do estruturalismo estava se dissolvendo na disciplina da semiótica, uma reação crítica ocorreu particularmente na França. Surgiram projetos de antítese da parte de cismáticos, tais como Gilles Deleuze ' com sua “esquisoanálise”, o "desconstrucionismo” de Jacques Derrida ' e a “genealogia” de Michel Foucault, Estas escolas críticas foram , porém, consideradas como marginais e, depois, etiquetadas dentro do conceito muito amplo do pós-estruturalismo.
Conclusão
A obra antropológica de Lévi-Strauss pode ser considerada como um enorme esforço intelectual e ideológico para superar as concepções teóricas que dominavam o cenário do estudo dos povos, nações e tribos não-europeus, até a Segunda Guerra Mundial. Procurando afastar-se do eurocentrismo e das concepções de superioridade do homem branco, resultantes da Era Colonialista, ele executou uma erudita operação de ‘descolonização’ da antropologia ocidental, procurando abolir com conceitos como ‘ primitivo’, ‘selvagem’, arcaico’ ou ‘atrasado’, comumente aplicados às sociedades indígenas do Terceiro Mundo. De certo modo, sua posição frente aos indígenas foi ‘conservacionista’, insistindo no direito que aquelas organizações tinham de viver ao seu modo, sem ter que aderir às políticas ‘civilizatórias’ dos governos influenciados pelas idéias do progresso e do desenvolvimento. A multiplicidade das formas sociais e culturais que se encontrava pelo planeta inteiro fazia parte do enorme caleidoscópio humano, no qual devíamos abandonar conceitos regidos pelos princípios de superioridade ou inferioridade em favor do respeito à diversidade racial e cultural e à relatividade de tudo. Enfim, todos são filhos de Deus!
Citações
Totem, símbolo clânico |
De fato, na história da humanidade aconteceu um fenômeno importante, capital, que é o nascimento do pensamento científico e seu desenvolvimento. Esse fato é um valor intrínseco, em si mesmo, que eu realmente coloco fora do relativismo cultural. Agora, se você olha as coisas um pouco mais do alto, dirá que esse pensamento científico que respeitamos e que nos apaixona em seus progressos passo a passo, que se efetua no decorrer dos séculos, anos ou dias, é na realidade profundamente vão. Já que o que nos ensina é, ao mesmo tempo, a melhor compreender as coisas em seus detalhes e que não podemos jamais compreender na totalidade, no conjunto.
O pensamento científico, ao mesmo tempo em que alimenta nossa reflexão e aumenta nossos conhecimentos, mostra a insignificância última desse conhecimento. Depende do seu ponto de vista e do nível, que é o nosso, o do homem do século XX, do mundo ocidental, o pensamento científico é algo essencial, fundamental, e devemos utilizá–lo. “Porém, se nos tornamos metafísicos, diremos que de fato ele é essencial, mas ao mesmo tempo é preciso saber que não serve para nada”
(LÉVI–STRAUSS, C. Entrevista a Bernardo Carvalho, in FOLHA DE S. PAULO, 22 de outubro de 1989).
Em favor da diversidade cultural
“A verdadeira contribuição das culturas não consiste numa lista das suas invenções particulares, mas na maneira diferenciada com que elas se apresentam. O sentimento de gratidão e de humildade de cada membro de uma cultura dada deve ter em relação a todas as demais não deve basear-se senão numa só convicção: a de que as outras culturas são diferentes, de uma maneira a mais variada e se a natureza última das suas diferenças nos escapa... deve-se a que foram imperfeitamente penetradas.
Se a nossa demonstração é válida não há nem pode haver uma civilização mundial no seu sentido absoluto, porque civilização implica na coexistência de culturas que oferecem o máximo de diversidade entre elas, consistindo mesmo nesta coexistência. “A civilização mundial não será outra coisa que a coalizão de culturas em escala mundial, preservando cada uma delas a sua originalidade.”
Lévi-Strauss - Antropologia estrutural
Bibliografia
Enciclopédia de Grolier. ( de onde foi tirado o arcabouço deste texto)
Groethuysen, Bernard – Antropologia Filosófica (Lisboa, Presença, 1982)
Lévi-Strauss, Claude - Antropologia Estrutural (RJ, Tempo Brasileiro, 1970)
- “- O Pensamento Selvagem (SP, Nacional, 1976)
- “- As estruturas elementares do parentesco (Petrópolis, RJ, Vozes, 1982)
- Tristes Trópicos (Lisboa, Edições 70, 1979)
Fonte:
- Malinowski, R. – Uma teoria científica da cultura (RJ, Zahar, 1962)