Primeiras Impressões
O primeiro e mais famoso exemplo é a Carta, de Pero Vaz de Caminha, em que o escrivão da frota de Pedro Álvares Cabral descreve ao rei D. Manuel I as características geográficas e humanas da terra recém-descoberta.
Os principais viajantes do período foram portugueses e religiosos enviados ao Brasil para catequizar os índios. Alguns deles, como os jesuítas Manuel da Nóbrega e José de Anchieta, produziram obras de fundamental importância para o desenvolvimento da vida colonial.
Houve também viajantes alemães, como Hans Staden, e franceses, como Jean de Léry e André Thevet, que deixaram testemunho da experiência nas novas terras.
Os poucos escritos produzidos no século XVI serviriam de referência para a literatura brasileira que foi sendo elaborada ao longo dos tempos. A natureza exuberante e os costumes dos indígenas serviram como embrião do Nativismo, decisivo para as manifestações poético-literárias do Barroco e do Arcadismo. A imagem do índio como símbolo nacional, empregada por autores do Romantismo como foi o caso de José de Alencar, também remonta às produções desse período.
Concebidos em grande parte para o leitor europeu, os textos desse período têm caráter eminentemente informativo, documental ou religioso e aparecem em formas variadas: cartas e informes em torno de condições da colônia, roteiros náuticos, relatos de naufrágios, descrições geográficas e sociais, descrições da natureza e dos povos nativos, autos para a catequese dos indígenas e até sob a forma de epopéias com assunto local. A curiosidade geográfica e humana, o desejo de conquista e o deslumbramento diante da paisagem exótica e exuberante do país são a tônica dos textos produzidos ao longo do século XVI.
No campo da poesia, a tradição medieval continuava presente. Confrontada com a realidade da colônia, ela deu origem a resultados singulares, como pode ser percebido nos poemas de José de Anchieta. Segundo Alfredo Bosi, a particularidade de sua produção poética está justamente na conformação do idioma tupi, empregado em vários de seus versos, a formas medievais. Assim, palavras tupis aparecem em versos que seguem a métrica trovadoresca, composta em versos de cinco ou sete sílabas – as redondilhas menores e maiores das formas populares portuguesas – e esquemas rítmicos inspirados na tradição medieval. Muitas vezes, os versos aparecem na forma de diálogos, o que imprime forte carga dramática e contribui para o poder de comunicação dos poemas, cuja função primordial era aculturar o indígena e aproximá-lo da doutrina cristã.
I. Carta de Achamento a El´Rey (1500)
De Pero Vaz de Caminha
Detalhado relato feito pelo escrivão da frota de Pedro Alvares Cabral ao rei D.Manuel da descoberta de uma nova terra no qual inarra as primeiras impressões sobre a costa descoberta bem como dos seus nativos, além de uma série de outras observações sobre o clima, a paisagem e as potencialidades gerais do que fora encontrado.O documento é tido como o Certificado de Nascimento do Brasil.
O texto integral somente veio à publico no Brasil por obra de Aires de Casal, em 1817.
“Neste mesmo dia, a horas de véspera, houvemos vista de terra! A saber, primeiramente de um grande monte, muito alto e redondo; e de outras serras mais baixas ao sul dele; e de terra chã, com grandes arvoredos; ao qual monte alto o capitão pôs o nome de O Monte Pascoal e à terra A Terra de Vera Cruz!
Mandou lançar o prumo. Acharam vinte e cinco braças. E ao sol-posto umas seis léguas da terra, lançamos ancoras, em dezenove braças -- ancoragem limpa. Ali ficamo-nos toda aquela noite. E quinta-feira, pela manhã, fizemos vela e seguimos em direitura à terra, indo os navios pequenos diante -- por dezessete, dezesseis, quinze, catorze, doze, nove braças -- até meia légua da terra, onde todos lançamos ancoras, em frente da boca de um rio. E chegaríamos a esta ancoragem às dez horas, pouco mais ou menos.
E dali avistamos homens que andavam pela praia, uns sete ou oito, segundo disseram os navios pequenos que chegaram primeiro.
Então lançamos fora os batéis e esquifes. E logo vieram todos os capitães das naus a esta nau do Capitão-mor. E ali falaram. E o Capitão mandou em terra a Nicolau Coelho para ver aquele rio. “E tanto que ele começou a ir-se para lá, acudiram pela praia homens aos dois e aos três, de maneira que, quando o batel chegou à boca do rio, já lá estavam dezoito ou vinte”.
II. Cartas do Brasil (1549-1560)
De Pe. Manuel da Nóbrega
São cartas enviadas pelo padre Manoel da Nóbrega aos padres-mestres da Companhia de Jesus, ao Provincial, que ficaram na Europa e que servem como testemunho vivo do processo de ocupação do novo território, bem como das dificuldades da catequese aqui encontradas pelos jesuítas na conversão dos Gentios, assim como uma exposição detalhada dos ‘pecados da terra’, isto é, os costumes dos indígenas reprovados pelos padres. Por igual acompanha as medidas iniciais da implantação do governo colonial As cartas cobrem os primeiros onze anos ( de 1549 a 1560)da sua chegada ao Brasil
“Depois que partimos de Portugal, o que foi em 1º de fevereiro de 1549, toda a Armada trouxe-a Deus a salvamento; sempre com ventos prósperos e de tal arte que chegamos à Bahia de Todos os Santos dentro de 56 dias sem que sobreviesse nenhum contratempo e antes com muitos outros favores e graças de Deus, que bem mostrava ser sua a obra que agora se precipitou. Desde logo se fez a paz com o Gentio da terra e se tomou conselho sobre onde se fundaria a nova cidade, chamada de Salvador.”
III. Cartas (1554-587)
De Pe José de Anchieta
Vindo ao Brasil com D. Duarte Costa, o segundo governador-geral que desembarcou na Bahia em 1553, e com mais outros colegas jesuítas, suas cartas dirigidas a pessoas as mais diversas, que se estendem de 1554 até o ano de 1587, oferecem um amplo panorama da vida do Brasil daqueles tempos, relatando o cotidiano dos nativos bem como dos portugueses que se assentavam na nova terra. São documentos preciosos que flagram os passos dados pelos recém-chegados, padres e renóis, para afirmarem-se num mundo que lhes era totalmente estranho e muitas vezes hostil.
“De maneira que os índios me tinham muito crédito, máxime porque eu lhes ocorria a suas enfermidades, e como algum enfermava logo me chamavam, aos quais eu curava a uns como levantar a espinhela, a outros com sangrias e outras curas, segundo requeria a doença, e com o favor de Cristo Nosso Senhor achavam-se bem.”
IV. Duas viagens feitas ao Brasil (1557)
De Hans Staden
Narrativa de um aventureiro alemão que na sua segunda vinda ao Brasil caiu
nas mãos de uma tribo de antropófagos. Aprisionado no litoral de São Paulo,
descreve em prosa vivaz os costumes indígenas bem como as várias tentativas de fuga até seu retorno final à Europa. É um relato emocionante.
“Formaram um círculo ao redor de mim, ficando eu no centro com duas mulheres, amarraram-me numa perna um chocalho e na nuca penas de pássaros. Depois começaram as mulheres a cantar e, conforme um som dado, tinha eu de bater no chão o pé onde estavam atados os chocalhos.
As mulheres fazem bebidas. Tomam as raízes de mandioca, que deixam ferver em grandes potes. Quando bem fervidas tiram-nas (...) e deixam esfriar (...) Então as moças assentam-se ao pé, e mastigam as raízes, e o que fica mastigado é posto numa vasilha à parte.
Acreditam na imortalidade da alma(...)."
"Voltando da guerra, trouxeram prisioneiros. Levaram-nos para sua cabana: mas a muitos feridos desembarcaram e os mataram logo, cortarm-nos em pedaços e assaram a carne (...) Um era português (...) O outro chamava-se Hyeronimus; este foi assado de noite."
V. Singularidades da França Antártica (1558)
De André Thevet
Primeiro registro da fundação da França Antártica, em 1555, obra de Villegagnon que construiu o Forte Coligny na baia da Guanabara para servir de base de apoio ao seu projeto de colonização de toda a região.
“Se advém, paralelamente, entre eles, algum tipo de indignação ou querela contrao próximo, eles têm o costume de recorrer ao Pagé, para que faça morrer por veneno aquele ou aqueles a quem querem mal.”
VI. História da Província de Santa Cruz que chamamos Brasil (1576)
De Pero de Magalhães Gândavo
Descrição primeira da Terra de Santa Cruz descoberta pelos portugueses
e até então pouco conhecida em Lisboa. Após a nomeação das capitanias em que o território se encontrava dividido, o autor demora-se na nomeação das suas exuberâncias com destaque aos perigos que aqui se encontravam em vista da ferocidade dois animais e da peçonha das serpentes..Exalta a piscosidade do litoral e encanta-se com a variedade e abundância das aves da terra, assim como apresenta a vida cotidiana dos nativos bem como as guerras que travavam entre si.
“A causa principal que me obrigou a lançar mão da presente historia,e sair com Ella a luz, foi por não haver até gora pessoa que emprendesse, havendo já setenta e tantos annos que esta Provincia he descoberta. A qual historia creio que mais esteve sepultada em tanto silencio, pelo pouco caso que os portuguezes fizerão sempre da mesma provincia, que por faltarem na terra pessoas de engenho, e curiosas que per melhor estillo, e mais copiosamente que eu a escrevessem.”
VII. Viagem à Terra do Brasil (1578)
De Jean de Léry
Indicado por Calvino para vir ao Brasil, Léry aqui chegou na companhia de 13 outros pastores huguenotes que vieram irmanar-se na colônia fundada por Villegagnon na baia da Guanabara. Sua aproximação com os tupinambás terminou por render o melhor ensaio etnográfico sobre os indígenas do Brasil.
O livro de Léry, segundo Claude Lévy-Strauss, foi seminal da antropologia moderna e obra magna, perene, sobre o Brasil do século XVI.
“Depois de discorrer acerca do que vimos no mar, tanto na ida para o Brasil, como no regresso à França, depois de narrar o que se passou na ilha e forte de Coligny, onde residiu Villegaignon, enquanto aí estivemos, e igualmente após divagar sobre o rio Guanabara, quando também me referi demoradamente aos fatos ocorridos anteriormente a meu embarque, cabe-me dizer o que observei com referência ao modo de vida dos selvagens e a outras coisas singulares e desconhecidas aquém-mar, que vi nesse país.”
VIII. Tratado Descritivo do Brasil (1587)
De Gabriel Soares de Souza
Naturalista e explorador do sertão que viveu na Bahia por 17 anos, é um vibrante relato das riquezas da terra escrito por um reinól desejoso de impressionar a Corte de Madri na época da União Ibérica, que não se dera conta da vastidão do território que administrava.
Ainda que eivado de fantasias sobre monstros e animais descomunais, é uma obra referencial sobre o Brasil ainda no berço da colonização.
"Estará bem empregado todo o cuidado que Sua Majestade mandar
Ter d'este novo reino; pois está para edificar nele um grande império,
o qual com pouca despesa destes reinos se fará tão
soberano que seja um dos Estados do mundo”.
IX. Prosopopéia (1601)
De Bento Teixeira
Obra daquele que é tido, ainda que nascido no Porto, como o primeiro poeta brasileiro. Celebra em versos barrocos os feitos dos irmãos Jorge e Duarte de Albuquerque Coelho, donatários da Capitania de Pernambuco Fidalgos valentes que tiveram participação em batalhas na África, mas que depois vieram para o Nordeste do Brasil.
Olhai o grande gozo e doce glória/Que tereis quando, postos em descanso, Contardes esta larga e triste história /Junto do pátrio lar, seguro e manso. Que vai da batalha a ter victória,/O que do Mar inchado a um remanso,Isso então haverá de vosso estado/Aos males que tiverdes já passado..”
X. História da missão dos padres capuchinhos na ilha do Maranhão e terras circunvizinhas (1615)
De Claude D´Abeville
“Cresceu ainda mais a devoção quando se edificou o Forte e a Capela de São Luís à imitação das igrejas dos nossos conventos, com madeira, cercada e coberta de galhos fortes, cortados das árvores chamadas Acauikantin. Ai celebramos missas, cantei vésperas, preguei e batizei os catecúmenos. À noitinha tocava o sino, e todos se reunia antes de ir dormir, na capela se cantava a saudação Angélica, implorava-se a agraça divina, e depois cada um se retirava e ia para onde queria.”
Yves d´Évreux – Continuação da história das coisas mais memoráveis acontecidas no Maranhão moa anos 1613-1614.
XII. Diálogo das Grandezas do Brasil (1618)
De Ambrósio Fernandes Brandão
(autor presumido)
Os diálogos entre dois personagens Alviano e Brandônio são em número de seis. Seu autor nunca passou do cabo de Santo Agostinho para o Sul; devem, pois, ter sido escritos em uma das capitanias ao Norte do cabo. Destas apenas duas diz ele explicitamente ter visitado, e pelas abundantes informações mostra conhecer diretamente: Pernambuco e Paraíba, – Tamaracá ficava a meio caminho e devia ser-lhe familiar.
“Certamente, diz Brandonio:, que estimara muito não me meter em semelhante trabalho (tratar das madeiras) pelo muito que há que dizer desta matéria. Porque por tôda parte que ponho os olhos, vejo frondosas árvores, entrabastecidas matas e intrincadas selvas, amenos campos, composto tudo de uma doce e suave primavera; porquanto em todo o decurso do ano gozam as árvores de uma fresca verdura, e tão verdes se mostram no verão como no inverno, sem nunca se despirem de todo de suas folhas, como costumam de fazer em nossa Espanha; antes, tanto que lhe cái uma, lhe nasce imediatamente outra, campeando a vista com formosas paisagens, de modo que as alamedas de alemos e outras semelhantes plantas que em Madrid, Valhadolid e em outras vilas e lugares de Castela se plantam e grangeam com tanta indústria e curiosidade para formosura e recreação dos povos, lhe ficam muito atrás - quase sem comparação uma coisa de outra.
XII. História do Brasil (1627)
De Frei Vicente do Salvador
O autor da primeira obra denominada História do Brasil nasceu na Bahia por volta de 1564, tendo sido batizado Vicente Rodrigues Palha. Graduado em teologia em Coimbra, retornou à sua terra natal em fins dos anos oitenta do século inicial da colonização. Tendo tomado ordens sagradas, serviu de cônego, de vigário-geral, de governador de bispado, sendo que em 1597 tomou o hábito de São Francisco.
"Confesso que é trabalho labutar com este gentio com a sua inconstância, porque no princípio era gosto ver o fervor e devoção com que acudiam à igreja e quando lhes tangiam o sino, à doutrina ou à missa, corriam com um ímpeto e estrépido que pareciam cavalos, mas em breve tempo começaram a esfriar de modo que era necessário levá-los à força, e se iam morar nas suas roças e lavouras, fora da aldeia, por não os obrigarem a isto. Só acodem todos com muita vontade nas festas em que há alguma cerimônia, porque são muito amigos de novidades; como dia de São João Batista por causa das fogueiras e capelas, dia da comemoração geral dos defuntos, para ofertarem por eles, dia de Cinza e de Ramos e principalmente das endoenças para se disciplinarem, porque o tem por valentia”
XIV. O Brasil Holandês (1647)
De Gaspar Barléus
Narrativa da estada e das realizações do Conde Maurício de Nassau no nordeste do Brasil, escrita por um dos que o acompanharam na empreitada dirigida pela Companhia Holandesa das Índias Ocidentais no seu projeto de controle sobre a produção açucareira da colônia Brasil.
“O Conde aprovou-lhes e agradeceu-lhes a resposta generosa e cordata, distribuindo presentes para cada um deles
Foram recenseados em todas as províncias todos os cidadãos que habitavam os campos, holandeses, alemães, franceses e ingleses. Deram-se-lhes comandantes de várias patentes — coronéis, tenentes-coronéis, sargentos-mores e comandantes de cavalaria, permitindo-se aos mesmos a escolha dos oficiais inferiores. Os conscritos do Recife ficaram à ordens do coronel Carpentier, a fim de se ter, em casos imprevistos, uma força armada ao alcance. Nos campos comandava os recrutas; no posto de coronel, Gaspar van Nyhoven. Se bem não recebessem soldo, era fácil convocá-los apenas mediante ordem escrita”.
XV. Historia Natural do Brasil (Historia Naturalis Brasiliae) 1848
De Piso e Marcgrave
Resultou o livro da decisão do Conde Mauricio de Nassau em trazer para o Brasil alguns cientistas e artistas para que fizessem um levantamento das potencialidades e das riquezas existente no território ocupado pela Companhia Holandesa das Índias Ocidentais.
O doutor William Piso foi o chefe da primeira expedição puramente científica enviada pelo mundo europeu a investigar as coisas do sertão brasílico. O seu colega, o dr Georg Marcgrave só chegou mais tarde, para acompanhar o jovem Piso.
“O Brasil, por certo a prestantíssima parte de toda a América, considerado de perto, excele principalmente pelo seu agradável e saudável temperamento, a ponto de contender, em justa competição, com a Europa e a Ásia, na clemência dos ares e das águas (...).
:...os habitantes atingem cedo a puberdade e envelhecem tarde; por isso ultrapassam os cem anos, gozando de verde e longeva velhice, não só os brasis como também os próprios europeus...
São mui dados à dança e à bebida e ignoram tempos
determinados para comer ...”
XVI. O Valeroso Lucideno (1648)
De Frei Manuel Calado
Com o subtítulo de Triunfo da Liberdade na Restauração de Pernambuco, a crônica de frei Calado narra em prosa barrôca a resitência portuguesa à ocuapção holandesa do Nordeste brasilerio.
“Andava o Príncipe Conde de Nassau tão ocupado em fabricar a sua cidade, que para afervorar os moradores a fazerem casa, ele mesmo, com muita curiosidade lhe andava deitando medidas, e endireitando as ruas, para ficar a povoação mais vistosa, e lhe trouxe a entrar por meio dela, por um dique, ou levada, a água do rio Capibaribe a entrar na barra, por o qual dique entravam canoas, batéis e barcas para o serviço dos moradores por debaixo das pontes de madeira, com que atravessou em alguma parte este modo de Holanda, de sorte que aquela ilha ficava toda rodeada de água: também ali se fez casa de prazer que lhe custou muitos cruzados, e no meio daquele areal estéril, e infrutuoso plantou um jardim, e em todas as castas de árvores de fruto que se dão no Brasil, e ainda muitos que lhe vinham de diferentes partes, e a força de muitas outras terra frutífera, trazida de fora em barcas rasteiras, e muita soma de esterco, fez o sítio tão bem acondicionado como a melhor terra frutífera; pôs neste jardim dois mil coqueiros, trazendo-os ali de outros lugares, porque os pedia aos moradores, e eles lhos mandavam trazer em carros, e deles fez umas carreiras compridas, e vistosa, a modo de alameda de Armazéns, e por outra parte muitos parreirais, e tabuleiros de hortaliça, e de flores, com algumas casas de jogos, e entretenimentos, aonde iam as damas, e seus afeiçoados a passar as festas no verão, e a ter seus regalos, e fazer suas merendas, e beberetes, como se usam em Holanda, com seus acordes instrumentais; e o gosto do Príncipe era que todos fossem ver suas curiosidades, e ele mesmo por regalo as andava mostrando, e para viver com mais alegria deixou as casas onde morava, e se mudou para seu jardim com a maior parte dos seus criados”.
XVII. A Arte de Furtar (1652)
De Pe Manuel da Costa
Aconselhamento ao príncipe português, na época do Portugal Restaurado, para que se previna contra as ‘unhas larapias’ que desejam furtar o tesouro real.
“Todos falam na política, muitos compõem livros dela, e no cabo nenhum a viu, nem sabe de que cor é. E atrevo-me a afirmar isto assim, porque, com eu ter poucos conhecimento dela, sei que é uma má peça, e que a estimam e aplaudem, como se fora boa; o que não fariam bons entendimentos, se a conheceram de pais e avós, tais, que quem lhos souber, mal poderá ter por bom o fruto que nasceu de tão más plantas”.
XVIII. Castrioto Lusitano (1670)
De Frei Raphael de Jesus
Historia da Guerra entre o Brazil e a Hollanda, durante os annos de 1624 a 1654, terminada pela gloriosa restauração de Pernambuco e das capitanias confinantes : obra em que se descrevem os heroicos feitos do illustre João Fernandes vieira, e dos valorosos capitães que com elle conquistarão a independencia nacional.
“Marchava Mathias de Albuquerque na forma referida, seguindo os passos do Conde Banholo, e duas jornadas antes de chegar ao Porto do Calvo recebeu a Nova da perda do lugar, e da torpe fuga dos italianos. Como capitão prudente Experimentado, certificou-se do poder e alojamento do inimigo, despediu a carruagem por veredas desusadas, e com os soldados determinou buscar o holandês em seus alojamentos. Por ordem sua adiantaram os capitães Francisco Rebello e Assenso da Silva a esperar o inimigo de emboscada, entre a povoação e o outeiro de Amador Alves.”
XIX. Theatri Rerum Naturalium Brasiliae
De Albert Eckhout (autor das gravuras)
Magnífica reprodução da flora e da fauna do Nordeste brasileiro à época de Nassau feita pelo pintor holandês Eckhout. A obra foi dada como pesente pelo Conde Maurício a Frederico Guilherme príncipe-eleitor de Brandenburg.
Exalta a exuberância da região ocupada bem como a variedade frutífera do trópico e a beleza física dos seus nativos.
Poemas (1696) - De Gregório de Matos Guerra
heranças nas letras brasileiras.
Ofendi-vos, meu Deus, é bem verdade,
É verdade, Senhor, que hei delinqüido,
Delinqüido vos tenho e ofendido,
Ofendido vos tem minha maldade.
Maldade que encaminha à vaidade,
Vaidade que todo me há vencido.
Vencido quero ver-me e arrependido,
Arrependido a tanta enormidade.
Arrependido estou de coração,
De coração vos busco, dai-me os braços,
Abraços que me rendem vossa luz.
Luz que claro me mostra a salvação,
A salvação pertendo em tais abraços,
Misericórdia, amor, Jesus, Jesus.
XXI. Música no Parnaso (1705)
De Manuel Botelho de Oliveira
Primeira obra impressa por um brasileiro em Lisboa,
composta em versos barrocos;
Jaz oblíqua forma e prolongada
a terra de Maré toda cercada
de Netuno, que tendo o amor constante,
lhe dá muitos abraços por amante,
e botando-lhe os braços dentro dela
a pretende gozar, por ser mui bela.
Nesta assistência tanto a senhoreia,
e tanto a galanteia,
que, do mar, de Maré tem o apelido,
como quem preza o amor de seu querido:
e por gosto das prendas amorosas
fica maré de rosas,
e vivendo nas ânsias sucessivas,
são do amor marés vivas;
e se nas mortas menos a conhece,
maré de saudades lhe parece.
Vista por fora é pouco apetecida,
porque aos olhos por feia é parecida;
porém dentro habitada
é muito bela, muito desejada,
(À ILHA DE MARÉ TERMO DESTA CIDADE DA BAHIA
SILVA)
XXII. Cultura e Opulência do Brasil por
suas Drogas e Minas (1710)
De Pe André João Antonil
Registro das riquezas existentes no Brasil feito pelo jesuíta italiano Andreoni. Obra que foi confiscada pelo Conselho Ultramarino para que não atiçasse a cobiça dos interesses estrangeiros sobre os mananciais da colônia Brasil na época da descoberta do ouro.
“Toda a escravaria (que nos maiores engenhos passa o número de cento e cinqüenta e duzentas peças, contando as dos partidos) quer mantimentos e farda, medicamentos, enfermaria e enfermeiro; e, para isso, são necessárias roças de muitas mil covas de mandioca. Querem os barcos velame, cabos, cordas e breu. Querem as fornalhas, que por sete e oito meses ardem de dia e de noite, muita lenha; e, para isso, há mister dous barcos velejados para se buscar nos portos, indo um atrás do outro sem parar, e muito dinheiro para a comprar; ou grandes matos com muitos carros e muitas juntas de bois para se trazer.”
XXIII. O Uraguai (1769)
De Basílio da Gama
Poema épico da época pombalina que descreve a luta travada contra a resistência guarani na região dos Sete Povos das Missões, capitaneados pelos jesuítas insurgidos contra as autoridades luso-espanholas por ocasião das Guerras Guaraníticas (1754-1756).
As maiores dificuldades ocorreram na região dos aldeamentos jesuíticos de São Borja, São João Batista, São Luiz Gonzaga, São Lourenço, São Miguel e São Nicolau. Incentivados pelos padres, os indígenas aldeados recusaram-se a abandonar as terras onde viviam uma experiência colonizadora diferente, pegando em armas contra as forças colonialistas.
Fumam ainda nas desertas praias
Lagos de sangue tépidos e impuros
Em que ondeiam cadáveres despidos,
Pasto de corvos. Dura inda nos vales
O rouco som da irada artilheria.
MUSA, honremos o Herói que o povo rude
Subjugou do Uraguai, e no seu sangue
Dos decretos reais lavou a afronta.
Ai tanto custas, ambição de império!
E Vós, por quem o Maranhão pendura
XXIV. Vila Rica (1773)
De Cláudio Manuel da Costa
Poema épico que narra a fundação e o desenvolvimento de Vila Rica do Ouro Preto, o maior Centro aurífero das Minas Gerais no Século XVIII.
E se estas Minas, pelas riquezas que têm derramado por toda a Europa, e pelo muito que socorrem com a fadiga dos seus habitantes ao comércio de todas as nações polidas, eram dignas de alguma lembrança na posteridade, desculpa o amor da Pátria, que me obrigou a tomar este empenho, conhecendo tanto a desigualdade das minhas forças. Estimarei ver elogiada por melhor pena uma terra que constitui hoje a mais importante Capitania dos domínios de Portugal.
XXV. Cartas Chilenas (1789)
De Tomás Antonio Gonzaga(autor presumido)
Reprodução da correspondencia imaginária de um reinól chamadao Critilo, que vivia no Chile (na verdade nas Minas Gerais), com um confrade seu da Europa, de nome Doroteu, na qual as autoridades são expostas à crítica e ao ridículo, especialmente o gobernante local Fanfarrão Minésio. Como nos poemas satíricos, o tom é mordaz, agressivo, debocado, ironizando sistemáticamente a mediocridade burocrática da administração colonial.
“Na cabeça vazia se atravessa
Um chapéu desmarcado, nem sei como
Sustenta o pobre só do laço o peso.
Ah ! tu, Catão severo, tu que estranhas
O rir-se um cônsul moço, que fizeras
95 - Se em Chile agora entrasses e se visses
Ser o rei dos peraltas quem governa ?
Já lá vai, Doroteu, aquela idade
Em que os próprios mancebos, que subiam
À honra do governo, aos outros davam
100 - Exemplos de modéstia, até nos trajes.
Deviam, Doroteu, morrer os povos
Apenas os maiores imitaram
Os rostos e os costumes das mulheres
Seguindo as modas e raspando as barbas.”
XXVI. Marília de Dirceu (1792-1799)
De Tomás Antônio Gonzaga
Um dos mais expressivos monólogos da lira da língua portuguesa, no qual Dirceu Encarcerado lamenta a separação da sua musa amada Marília. Um dos maiores poemas da cultura luso-brasileira de todos os tempos.
“Eu, Marília, não sou algum vaqueiro,
Que viva de guardar alheio gado;
De tosco trato, d’expressões grosseiro,
Dos frios gelos, e dos sóis queimado.
Tenho próprio casal, e nele assisto;
Dá-me vinho, legume, fruta, azeite;
Das brancas ovelhinhas tiro o leite,
E mais as finas lãs, de que me visto.
Graças, Marília bela,
Graças à minha Estrela!”
XXVII. Princípios de economia politica (1804) - De José da Silva Lisboa, visconde de Cairu
“Era, portanto, um espetáculo triste verem-se ali as cidades e vilas cheias de
gente sem obra útil, por impossibilitadas de exercerem alguma indústria
que contribuísse para o vestuário do país e para outros suprimentos...”
(critica de Cairu a lei que impedia a existência de manufaturas no Brasil)
XXVIII. História do Brasil (1810 e 1819)
De Robert Southey
Poeta do romantismo inglês e historiador, Southey se interessou pelo Brasil pretendendo ser o Heródoto dessa nova terra. A narrativa começa no Descobrimento estendendo-se até a chegada da família real portuguesa ao Rio de Janeiro, em 1808.
“A presente obra compreende algo mais do que o título promete. Ele relata a fundação e o progresso das províncias Espanholas e a relação delas com o Brasil. A intençãoÉ abarcar a maioria dos territórios contidos entre os rios da Prata, Paraguia, Orinoco e Amazonas, estendendo—se para o oeste em direção ao Peru, tão longe quanto os portugueses puderam
alcançar com seus assentamentos e suas descobertas.”
XXIX. Ensaio Econômico sobre o Comércio de Portugal e suas colônias (1816)
De Azeredo Coutinho
Obra oferecida a D. João VI para que se intimasse das relações materiais que a metrópole portuguesa tinha com suas colônias de além-mar, particularmente com o Brasil, apresentado por alguém da terra (Coutinho nascera em Campos de Goitacás, no atual Estado do Rio de Janeiro). A exposição feita em capítulos curtos procura dar um panorama das riquezas excepcionais do país, bem como é obra de um conselheiro econômico que orienta o Príncipe no sentido dos melhores investimentos a serem feitos para aumentar a prosperidade do reino.
“A América é um terreno abundantíssimo: o Brasil é o mais abundante de baixo de um clima quente, mas doce, ameno e temperado pelas chuvas e pelos ventos, está sempre produzindo, em continuo giro. A terra está em todo ano coberta de uma alegre verde e uma primavera continuada. As árvores estão sempre floridas , e em cada uma delas se vê ao mesmo tempo a flor, o fruto verde e o sazoanado.”
XXX. Corografia brasílica ou Relação historico-geográfica do reino do Brasil
De Padre Aires de Casal (1817)
Apresentação do Brasil a D.João VI, para que o soberano tomasse Conhecimento não somente da história das províncias que então constituíam o vice-reino como da situação geral
em que cada uma delas se encontrava.
Ao mesmo tempo, oferece ao soberano detalhada
informação sobre as condições mineralógicas, botânicas, zoológicas e agriculturáveis delas. É obra de um notário, um testamenteiro expondo a riqueza da herança recebida pelo seu Senhor, o monarca do Reino Unido. De Portugal e Algarves.
XXXI. Viagens (1820)
De Auguste Saint-Hilaire
Relato precioso feito pelo Naturalista francês do levantamento feito sobre o interior do Brasil joanino às vésperas da independência do Brasil.Foram milhares de quilômetros percorridos, desde as províncias centrais até o Uruguai.
“... Para se ter uma idéia de como é fascinante a paisagem ali, o leitor deve imaginar em conjunto tudo o que a natureza tem de mais encantador: um céu de um azul puríssimo, montanhas coroadas de rochas, uma cachoeira majestosa, águas de uma limpidez sem par, o verde cintilante das folhagens e, finalmente, as matas virgens, que exibem todos
os tipos de vegetação tropical."
XXXII. Viagem pelo Brasil (1817-1819)
De Spix e Martius
Dois naturalistas vindos da Europa (um austríaco outro bávaro) que desembarcaram no Brasil por ocasião da vinda da princesa Dona Leopoldina, dispondo-se então a percorrer todo o interior do país realizando notável levantamento botânico
A dança dos Puris. Ao luar perto da fazenda Guidoval. Os homens formam a primeira fila e as mulheres, a segunda. As crianças, agarradas às coxas dos mais velhos, dão os passos furtados da dança para a frente.
Um dançador dá, como saudação, uma umbigada a cada um de nós observadores