A cachaça, aguardente de cana ou pinga é uma bebida alcoólica tipicamente brasileira. Seu nome pode ter sido originado da velha língua ibérica – cachaza – significando vinho de borra, um vinho inferior bebido em Portugal e Espanha, ou ainda, de "cachaço", o porco, e seu feminino "cachaça", a porca. Isso porque a carne dos porcos selvagens, encontrados nas matas do Nordeste – os chamados catitus – era muito dura e a cachaça usada para amolecê-la. Carvalho (1988).
Obtida da fermentação da cana-de-açúcar e sua posterior destilação, usada como coquetel da mundialmente conhecida Caipirinha.
A diferença básica entre a aguardente de cana e a cachaça está na origem da matéria-prima. Enquanto a aguardente de cana é feita diretamente a partir do destilado da cana, a cachaça é feita a partir do melaço resultante da produção do açúcar de cana.
A cana-de-açúcar, elemento básico para a obtenção, através da fermentação, de vários tipos de álcool, entre eles o etílico. É uma planta pertencente à família das gramíneas (Saccharum officinarum) originária da Ásia, onde teve registrado seu cultivo desde os tempos mais remotos da história.
Os primeiros relatos sobre a fermentação vem dos egípcios antigos. Curam várias moléstias, inalando vapor de líquidos aromatizados e fermentados, absorvido diretamente do bico de uma chaleira, num ambiente fechado. Os gregos registram o processo de obtenção da ácqua ardens. A água que pega fogo - água ardente (al kuhu). Alquimistas tomam conhecimento da água ardente, atribuindo-lhe propriedades místico-medicinais. Transforma-se em água da vida, e a eau de vie é receitada como elixir da longevidade.
A aguardente então vai da Europa para o Oriente Médio, pela força da expansão do Império Romano. São os árabes que descobrem os equipamentos para a destilação, semelhantes aos que conhecemos hoje. Eles não usam a palavra al kuhu e sim al raga, originando o nome da mais popular aguardente da península arábica: arak. Uma aguardente misturada com licores de anis e degustada com água. A tecnologia de produção espalha-se pelo velho e novo mundo. Na Itália, o destilado de uva fica conhecido como grappa. Em terras Germânicas, se destila a partir da cereja, o Kirsch. Na Escócia fica popular o whisky, destilado da cevada sacarificada. No Extremo Oriente, a aguardente serve para esquentar o frio das populações que não fabricam vinho. Na Rússia a vodka, de centeio. Na China e Japão, o sake, produzido a partir da fermentação do arroz é frequentemente confundido com uma aguardente devido ao seu elevado teor alcoólico, mas é na verdade um vinho. Portugal também absorve a tecnologia dos árabes e destila a partir do bagaço de uva, a bagaceira.
Já em 1530 os primeiros donatários portugueses decidem começar empreendimentos nas terras orientais do Novo Mundo, implementando o engenho de açúcar com conhecimento e tecnologia adquiridos nas Índias Orientais, vindas do sul da Ásia. Assim surgem na nova colônia portuguesa os primeiros núcleos de povoamento e agricultura.
A geração inicial de colonizadores apreciava a bagaceira portuguesa e o vinho do porto. Assim como a alimentação, toda bebida era importada da metrópole. Num engenho da capitania de São Vicente, entre 1532 e 1548, descobrem o vinho de cana-de-açúcar - garapa azeda, que fica ao relento em cochos de madeiras para os animais, vinda dos tachos de rapadura. É uma bebida limpa, em comparação com o cauim - vinho produzido pelos índios, no qual todos cospem num enorme caldeirão de barro para ajudar na fermentação do milho. Os senhores de engenho passam a servir o tal caldo, denominado cagaça, para os escravos. Daí é um pulo para destilar a cagaça, nascendo assim a cachaça.
Dos meados do século XVI até metade do século XVII as "casas de cozer méis", como está registrado, se multiplicam nos engenhos. A cachaça torna-se moeda corrente para compra de escravos na África. Alguns engenhos passam a dividir a atenção entre o açúcar e a cachaça. A descoberta de ouro nas Minas Gerais, traz uma grande população, vinda de todos os cantos do país, que constrói cidades sobre as montanhas frias da Serra do Espinhaço. A cachaça ameniza a temperatura.
Incomodada com a queda do comércio da bagaceira e do vinho portugueses na colônia e alegando que a bebida brasileira prejudica a retirada do ouro das minas, a Corte proíbe várias vezes a produção, comercialização e até o consumo da cachaça. Sem resultados, a Metrópole portuguesa resolve taxar o destilado. Em 1756 a aguardente de cana-de-açúcar foi um dos gêneros que mais contribuíram com impostos voltados para a reconstrução de Lisboa, abatida por um grande terremoto em 1755. Para a cachaça são criados vários impostos conhecidos como subsídios, como o literário, para manter as faculdades da Corte.
Como símbolo dos ideais de liberdade, a cachaça percorre as bocas dos Inconfidentes e da população que apoia a Conjuração Mineira (ou Inconfidência Mineira). A aguardente da terra se transforma no símbolo de resistência à dominação portuguesa. Com o passar dos tempos melhoram-se as técnicas de produção. A cachaça é apreciada por todos. É consumida em banquetes palacianos e misturada ao gengibre e outros ingredientes, nas festas religiosas portuguesas - o famoso quentão.
Devido ao seu baixo valor e associação às classes mais baixas (primeiro os escravos e depois os pobres e miseráveis), a cachaça sempre deteve uma áurea marginal. Contudo, nas últimas décadas, seu reconhecimento internacional tem contribuído para diluir o índice de rejeição dos próprios brasileiros, alçando um status de bebida chique e requintada, merecedora dos mais exigentes paladares. Atualmente várias marcas de boa qualidade figuram no comércio nacional e internacional e estão presentes nos melhores restaurantes e adegas residenciais pelo Brasil e pelo mundo.
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