Introdução sobre Maria Antonieta
Maria Antonieta | |||
© iStockphoto.com /ConstanceMcGuire Gravura em livro de 1862 retrata Maria Antonieta e o rei Luis 16, ambos à direita, conversando com o Marquês de La Fayette |
Essas biografias ajudam a entender melhor o que foi a vida dessa polêmica rainha, cujo casamento com o rei da França, o gorducho Luis 16, levou sete anos para se "consumar", possivelmente em função do desconforto que o monarca sentia com o próprio corpo obeso e da opção pela abstinência sexual feita por ambos. Além disso, o excesso de tempo livre e os exageros da vida na corte em Paris e Versalhes contribuíram para hábitos que ajudaram a construir a péssima imagem que Maria Antonieta carregou por séculos. A sua má fama deve-se também à eficaz propaganda dos revolucionários que derrubaram a monarquia durante a Revolução Francesa e viram na rainha o símbolo perfeito para mostrar a degradação que o antigo regime representava.
A fama que carregou de ninfomaníaca também tampouco corresponde ao que foi sua vida amorosa. A incompatibilidade entre ela e o rei não resultou numa coleção de amantes e traições, como foi popularizado em muitas versões sobre sua vida. Um relato feito pelo Príncipe de Ligne mostra que Maria Antonieta tinha “a qualidade encantadora da obtusidade que mantinha à distância todos os amantes”. Além disso, ela se encantava pelos galanteios e flertes com homens bem mais velhos, que normalmente sabiam dançar e cantar - dotes que faltavam a Luis 16 - e que geralmente animavam suas festas e eram companhias divertidas para ela.
No entanto, a admiração e a proximidade que tinha com esses nobres foi mal interpretada e os encorajou a cortejá-la crentes de que a rainha nutria por eles algo mais do que amizade. Quando se declaravam, Maria Antonieta os rejeitava prontamente. Mas isso não impediu que surgissem várias narrativas que a difamassem e criassem uma imagem de promiscuidade sexual que não corresponde aos fatos históricos. Na próxima página, conheça como foi a vida dessa jovem rainha que escandalizou a França e a Europa do século 18.
Maria Antonieta: uma rainha jovem e alienada
Marie-Antoinette-Josèphe-Jeanne d’Autriche-Lorraine nasceu em 2 de novembro de 1755, em Viena, na Áustria. Ela foi a décima primeira filha de Maria Teresa de Habsburgo e de Francisco Estêvão de Lorena, imperatriz e imperador do Sacro Império Romano-Germânico e fundadores da dinastia dos Habsburgo-Lorena.
Reprodução Cartaz de "Maria Antonieta", filme de Sofia Coppola, baseado em biografia escrita por Antonia Fraser |
Maria Antonieta e Luis casaram-se em 1770 e quatro anos depois ascenderam ao trono francês. Apesar de casados, a falta de interesse sexual de ambos durou até 1777, quando ela engravidou do primeiro dos quatro filhos (dois meninos e duas meninas) que o casal teria. Essa demora de sete anos para a "consumação" do casamento, que é atribuída a questões como a vergonha que Luis 16 tinha do próprio corpo ou a uma preguiça sexual de ambos, foi determinante para os boatos que criaram uma imagem perversa de Maria Antonieta. Rumores de casos extraconjugais, de festas orgiásticas, de lesbianismo e outros tornaram-se populares, muitos deles criados e alimentados por rivais políticos. Alguns panfletos de teor pornográfico que circularam na época retratavam a jovem rainha como uma ninfomaníaca.
Para a historiadora francesa Evelyne Lever, Maria Antonieta era imatura, impetuosa e não estava preparada para o papel de uma rainha. Além disso, as festas e recepções encenadas deram-lhe a falsa impressão de aprovação popular, quando na verdade ela estava se distanciando dos reais problemas econômicos e sociais franceses e isolando-se num mundo fantasioso, cercada por um grupo de cortesãos extravagantes, e no qual buscava apenas se divertir. As pressões e chantagens emocionais que sua mãe, a imperatriz austríaca Maria Tereza, fazia sobre ela, mesmo à distância, também contribuíram para prejudicar seus atos numa corte cheia de intrigas e distante do mundo novo criado pela ideias iluministas.
O mais evidente sinal da vida fantasiosa que Maria Antonieta levou em boa parte do tempo como rainha foram suas encenações de peças teatrais em que assumia personagens que a levavam a viver uma outra vida. Ainda assim, nos momentos mais críticos do reinado de seu marido, foi ela quem mostrou-se corajosa, de personalidade forte e leal, como veremos na próxima página.
Uma das facetas mais impressionantes de Maria Antonieta foi sua atitude inquietante em relação à moda de sua época. Ela alterava frequentemente seu visual, que podia incluir desde vestidos luxuosos e penteados com cerca de um metro de altura até peças que compunham uma silhueta andrógina, usadas por ela em seus passeios a cavalo. Isso a tornava popular na mesma medida em que gerava antipatias das damas da corte francesa. Elas temiam que a aproximação que Maria Antonieta fazia muitas vezes de seus trajes com o dos camponeses e a população em geral derrubasse a moda como um dos símbolos da separação entre as classes sociais. Além de inovar nas roupas e penteados, Maria Antonieta também agia como uma estrela pop dos dias atuais, com aparições estratégicas e plantando informações que provocavam calorosos debates públicos. Essas atitudes "midiáticas" muitas vezes colocaram em discussão o papel da mulher na sociedade e da sexualidade feminina. Provocativa, Maria Antonieta foi uma espécie de Madonna ou Lady Gaga do século 18.
Maria Antonieta: provocações e a morte na guilhotina
Com o passar dos anos, as extravagâncias de Maria Antonieta e os boatos criados pelos inimigos políticos de Luis 16 e do regime criaram uma imagem antipática da rainha junto à população. Ela passou a ser denominada pejorativamente como "a austríaca" ou "Madame Déficit" - este último em alusão a sua gastança que teria contribuído para a ruína econômica do país, o que não é verdade, já que o principal motivo da crise econômica francesa no fim do século 18 era a inaptidão do rei e seus ministros em conduzir a economia nacional. A vilanificação de Maria Antonieta, no entanto, era de interesse dos inimigos do regime e até mesmo um suposto caso dela com um cardeal foi inventado para aumentar a antipatia popular pela monarca.© iStockphoto.com /Alice_yeo Vila próxima a Versalhes construída para a rainha Maria Antonieta, que ali levava uma vida fictícia como camponesa |
Os seguidos escândalos desacreditaram o já frágil governo de Luis 16 e até mesmo a nobreza e a burguesia começaram a opor-se a ele vigorosamente, exigindo reformas financeiras. Foi durante essas crises que Maria Antonieta mostrou ser bem mais corajosa e decidida do que o rei. Nos meses que se seguiram ao início da Revolução Francesa, foi ela quem resistiu à restrição das prerrogativas reais exigidas pelos revolucionários. Ela também negociou secretamente com os membros mais proeminentes da Assembléia Nacional a restauração dos poderes da monarquia. No entanto, seus apelos para que o irmão, o imperador austríaco Leopoldo 2.°, do Sacro Império Romano-Germânico, conduzisse um movimento contrarrevolucionário e a guerra entre a França e a Áustria a partir de 1792 minaram suas pretensões e aumentaram a fúria popular contra ela, que foi considerada uma traidora.
Essas intervenções políticas de Maria Antonieta foram, no entanto, esporádicas já que suas preocupações principais voltavam-se para seus divertimentos. A reclusão da vida na corte e uma mistura de alienação, ingenuidade e teimosia, tanto dela como do rei, contribuíram decisivamente para eles não perceberem que a vontade dos súditos, influenciados pelas ideias do Iluminismo, era a de não aceitar mais o argumento do poder e direito divino dos reis. Os episódios em que Maria Antonieta envolveu-se politicamente defendendo a todo custo a monarquia serviram para aumentar o ódio popular contra ela, que passou a ser o melhor símbolo que os revolucionários puderam usar para mostrar a degradação que o regime monárquico representava.
Em 10 de agosto de 1792, pouco mais de um ano após uma fracassada tentativa de fuga de Maria Antonieta e Luis 16 para fora da França, uma insurreição popular derrubou a monarquia francesa. Luis 16 foi executado na guilhotina por ordem da Convenção Nacional em janeiro de 1793. Quando foi levada a julgamento, após passar mais de um ano na prisão, em 14 de outubro de 1793, Maria Antonieta não lembrava em nada a rainha exuberante e provocativa que havia sido. Ela estava extremamente magra, pálida e com a aparência de uma sexagenária, apesar de ter somente 38 anos de idade. Seu julgamento durou dois dias e as testemunhas narraram orgias comandadas pela rainha, uma suposta relação incestuosa com o filho e um caso homossexual dela com a condessa de Polignac, entre outras histórias. Considerada culpada em todas as acusações, ela foi levada a Praça da Concórdia, em Paris, em 16 de outubro de 1793, onde um público exultante a viu ser executada na guilhotina. Para este evento final, ela vestiu-se intencionalmente de branco para simbolizar sua lealdade à monarquia.
As pesquisas feitas pelas historiadoras Antonia Fraser e Evelyne Lever mostraram que muitos dos escândalos e absurdos atribuídos a Maria Antonieta não passaram de propaganda revolucionária e distorções de fatos bem menos escandalosos. Um deles é a atribuição a ela da famosa e debochada frase "Que comam brioches", que a rainha teria dito ao ser acossada por uma multidão faminta que protestava contra a falta de alimentos e a má qualidade do pão. No entanto, essa mesma frase já havia sido atribuída a outras monarcas e nobres europeias antes mesmo de Maria Antonieta ter nascido. Seus casos extraconjugais e as acusações de lesbianismo e incesto também mostraram-se mais folclóricos do que reais. A única situação que pode ter se aproximado de um "caso" foi o relacionamento que ela teria mantido com o conde sueco Fersen. Ainda assim, ele foi tão discreto para os padrões da corte francesa da época que é difícil afirmar se ele culminou em um envolvimento sexual. Assim, as cenas de amor entre a rainha e o conde sueco, que são mostradas no filme "Maria Antonieta" (2006), de Sofia Coppola, não teriam chegado a acontecer de fato, segundo a historiadora francesa Simone Bertière, autora do livro "Maria Antonieta, a insubmissa".
Fontes:
BRITANNICA ENCYCLOPEDIA ONLINE
FRASER, Antonia. Maria Antonieta. Rio de Janeiro: Editora Record, 2006.
LEVER, Evelyne. Maria Antonieta - A última rainha da França. Rio de Janeiro: Editora Objetiva, 2004.
BRITANNICA ENCYCLOPEDIA ONLINE
FRASER, Antonia. Maria Antonieta. Rio de Janeiro: Editora Record, 2006.
LEVER, Evelyne. Maria Antonieta - A última rainha da França. Rio de Janeiro: Editora Objetiva, 2004.