A História da Ásia Contemporânea dificilmente seria reduzida satisfatoriamente em pequeno espaço, sem um prévio esclarecimento das condições históricas que conformam sua “evolução” interna fora do âmbito europeu, seus desenvolvimentos, dinâmicas e processos históricos. Desbastando-a do cipoal de particularidades e incidentes secundários que a caracterizam, entretanto, tentar-se-á mostrar somente linhas gerais e já bastante conhecidas num estudo panorâmico do assunto. Ainda mais por tratar-se de um recorte espacial tão amplo, heterogeneamente constituído de populações não pouco díspares entre si (longe de constar um único e simplificado bloco “oriental”), não será possível destacar muito mais do que “salta aos olhos” num levantamento de suas principais linhas de força no período referido.
O principal eixo temático pelo qual os estudos ocidentais abordaram a história da Ásia, nos séculos XIX e XX, gira em torno da dominação européia e da expansão da ideologia imperial neocolonialista sobre os países orientais. Este estudo não se afastará dessa questão visceral, mas tentará tão somente apontar caminhos alternativos. Essa engenhosidade dominadora, ao engendrar um tipo de discurso “viciado” pelos interesses geopolíticos da Europa, contribuiu para construir uma história apologética do desenvolvimento europeu fundada na expansão “civilizacional” de seus centros difusores que, desde épocas remotas (ao menos desde a Renascença), já esbanjavam ilustremente ares de superioridade e acelerado crescimento econômico e militar. Sem intentar, como se disse, desviar-se visceralmente dessa narrativa tradicional, cuja contraposição crítica já se faz supor nas obras incipientes de historiadores revisionistas, é sensato logo ressaltar suas limitações estruturais. Ela não só é tendente a detratar o passado histórico dessas sociedades “orientais”, cujos avanços nos campos econômico, militar e cultural deixam entrever seu particular brilhantismo, como também negligencia uma visão mais detida de suas particularidades histórico-culturais no período referido, relegando seus diversos modus vivendi ao estigma pejorativo do “exótico”, do “diferente”, das irredutíveis “barreiras geográficas”. Trata-se, fundamentalmente, da dominação ocidental da Ásia, e é sob esse ângulo que boa parte de sua história será construída e reificada para a exaltação do status-quo dos Estados europeus.
Dito isso, ocupemo-nos inicialmente da chamada Ásia oriental ou Extremo Oriente que, durante vários séculos esplendorosos, esbanjou o vigor de civilizações incontestavelmente pioneiras em avanços que só muito mais tarde dariam as caras na Europa. Não seria desnecessário ao menos citar, a título de exemplo, a precoce centralização administrativa chinesa, quando Qin Shi Huangdi subiu ao trono de Qin (século III a.C.), associada à transição paulatina para um sistema geral de concursos meritórios para a burocracia. Fatores estes essenciais para que a China assumisse uma posição de vanguarda econômica-político-tecnológica face ao mundo então conhecido. Alguns enfatizam, entretanto, a estagnação chinesa pós-era Sung (com as invasões estrangeiras que desde então permeariam todas as dinastias chinesas), cessando em definitivo o fulgor reconhecido que tivera no passado. Apesar de tal afirmação ser controversa, ela ilumina uma questão central da história da China: quando exatamente a brilhante civilização chinesa perderia sua tradicional liderança frente à Europa? Não entrarei nos debates daí decorrentes, que nos afastariam do objetivo fundamental. Mas é certo que no século XIX, no que já nos interessa, a ameaça vinda da Europa viria fagocitar o desenvolvimento chinês, pretendendo aumentar a penetração comercial nesse país, contra a vontade dos imperadores. À instabilidade política interna, decorrente da situação conflituosa de dinastias estrangeiras, vinha se somar a penetração política e econômica européia (com os reflexos essenciais da Segunda Revolução Industrial), engendrando um período de crise econômica, política e social na China. Como se vê, tal fato não se apreende só com a visão da dominação européia, mas necessita de um olhar mais complexificado.
Com efeito, o impacto da Revolução Industrial foi mundial, favorecendo a expansão comercial da Inglaterra onde surgira primeiro. Somente a partir da segunda metade do século XIX prevaleceu o imperialismo na política de outros países europeus. De acordo com a força das circunstâncias, a Inglaterra formara um novo império britânico, depois da perda das Treze Colônias, assentado no poder naval e na indústria. A passagem do capitalismo comercial para o industrial, na Europa Ocidental e depois nos EUA, acarretou importantes mudanças no Oriente. A crescente compra de produtos industrializados da Europa, especialmente os do Reino Unido durante o século XIX, despertou uma concorrência desigual e contribuiu para o empobrecimento da Ásia. Esta acabou por transformar-se em fornecedora de matérias-primas para as indústrias européias. Medidas políticas e aduaneiras eram tomadas para eliminar a concorrência e garantir os interesses europeus. Além disso, inverteu-se o fluxo de metais preciosos que, desde a Antiguidade, saldava a compra pelos europeus dos artigos de luxo e das especiarias. A balança comercial asiática tornava-se, pois, deficitária, após séculos de larga vantagem frente à Europa.
No século XIX o império turco, a China e o Japão mantinham a independência política, embora a influência econômica e política das potências européias tenha se acentuado pelo menos até o fim da Segunda Guerra Mundial. Só o Japão conseguiu modernizar-se a tempo, buscando um crescimento moderno baseado nas fórmulas do Ocidente, depois de forçado militarmente pela expedição estadunidense de Perry, a abrir seus portos ao comércio do Ocidente (1853). Na China, a partir de 1839, os interesses britânicos passaram a prevalecer de forma inconteste. Já em 1820, os britânicos obtêm exclusividade de comércio no porto de Cantão. Na primeira Guerra do Ópio (1839/1842), motivada pela destruição de carregamentos de ópio pertencentes a súditos ingleses, estes se aproveitaram da situação para declarar guerra à dinastia Manchu. Vitoriosos, os ingleses forçaram o Tratado de Nanquim (1842), através do qual os chineses se comprometiam a abrir ao comércio britânico cinco portos, entre os quais Xangai e Cantão, dois dos mais importantes, além de cederem o de Hong Kong.
Nos anos seguintes, além das conseqüências nefastas da massiva penetração estrangeira, prosseguiam as instabilidades internas, que decorrem tanto de fatores externos como de problemas mais particulares da política chinesa. Em meados da década de 1850, sucedem-se os levantes mulçumanos das regiões de Xinjiang e Yunan; a rebelião Taiping (1850-1864), de cunho religioso e milenarista, inspirada nas idéias de um místico auto-proclamado, que pretendia criar uma nova cultura substituindo a tradição confucionista e budista, conseguiu conquistar Nanjing e tentou expandir seu poder pelo norte da China. Uma intervenção militar franco-britânica obrigou a China a novas concessões, inclusive a abertura de 11 outros portos e mais vantagens aos estrangeiros; o império cedeu aos franceses o território vassalo do Vietnã e aos japoneses a ilha de Formosa e a Península da Coréia.
Em contrapartida, nas décadas de 70 e 80 os chineses não deixaram de oferecer respostas ou formas de resistência tanto à “bárbara” invasão européia, como aos movimentos internos contra a dinastia estrangeira no poder. Uma questão primordial então se colocava: como modernizar-se de forma “seletiva”, isto é, adotar as necessárias tecnologias européias sem perder a milenar identidade cultural chinesa? Esta questão põe luz, de forma bastante superficial, sobre uma perspectiva menos simplificada e mecanicista de abordar a história contemporânea chinesa. A rivalidade com o Japão, com a guerra sino-japonesa (1894-1895), motivada pela ambição pelo reino coreano, acarretou a derrota da China e o reconhecimento da independência da Coréia, além da anexação da península de Liaotung, Formosa e as Ilhas Pescadores pelo Japão.
Aliás, até 1929, a política do Japão para com a China foi de penetração econômica pacífica, modificando-se a partir de 1931. A partir daí tornou-se agressiva, com o enrijecimento do boicote a mercadorias japonesas pelos chineses e, especialmente, com o reconhecimento dos direitos e interesses japoneses na Manchúria. Durante o período Meiji (1868-1912), as transformações socioeconômicas japonesas seguiram aceleradas, o feudalismo foi abolido, bem como o sistema de “Xogunato”, a igualdade dos japoneses e a introdução do desenvolvimento da grande indústria e do moderno sistema bancário foram medidas paulatinamente implantadas, dentre outras mudanças no sistema educacional, militar e tecnológico que merecem uma menção. O Japão foi o único país asiático a industrializar-se já no século XIX, cujo “ethos” guerreiro dos antigos samurais foi transferido para o âmbito dos negócios. Outro fato que merece menção na história japonesa, pelo fato de ter marcado profundamente os movimentos nacionais, foi a vitória do Japão sobre a Rússia, em 1905 (pela primeira vez a imposição da derrota a uma potência colonial “européia”). Em setembro de 1940, o Japão firmou um pacto com a Alemanha e a Itália; a entrada na Segunda Guerra foi o passo seguinte. O famoso episódio da invasão japonesa da base militar americana de Pearl Harbor, no Havaí, em 7 de dezembro de 1941, fez os EUA entrar na guerra. Se os primeiros meses foram favoráveis ao Japão, que se apoderou das Filipinas, Indonésia, Indochina e Malásia, a partir de 1943 a vitória americana tornara-se iminente. As bombas de Hiroxima e Nagasaki, lançadas em 6 de agosto de 1945, aceleraram a rendição japonesa. Reduzido aos limites que possuía antes do período Meiji, a partir da segunda metade do século XX o Japão apresentou notável crescimento econômico.
A China de 1900, imbuída de contradições internas e externas, em reação à política imperialista das potências estrangeiras e de tentativas internas de modernização, tentara ainda livrar-se dessas influências indesejáveis. Essa tentativa veio de círculos muito próximos à imperatriz Cixi, motivando motins xenófobos que culminaram quando os boxers, em 1900, sitiaram as legações européias em Pequim. A intervenção conjunta de forças estrangeiras libertou as legações e obrigou a imperatriz a acatar as condições econômicas desejáveis aos europeus. A dinastia Qing, já agonizante, não sobreviveu por muito mais tempo. Em 1911, a Revolução Xin Hai derrubou a dinastia Qing, que cedeu lugar à República da China, proclamada em janeiro de 1912. Sun Yat-sen é proclamado presidente provisório, mas a República não alcança todo o país, que entra em período de guerra civil (1916-1934), motivada pelos conflitos entre caudilhos militares. Em 1921 é criado o Partido Comunista Chinês, sob poderosa influência do Comintern, o qual forçou uma aliança com o partido nacionalista fundado por Sun Yat-sen, o Kuomitang, principal força política que esperava levar-se a efeito uma “revolução democrática burguesa”. A entrada dos comunistas no Kuomitang deu-se em caráter individual, no seio do qual se realizaria a unidade das forças populares. O massacre promovido em Xangai (1927) por Chiang Kai-shek, que tentara unificar o país, anunciou a ruptura do PCC com o Kuomitang, agora aliado à “burguesia compradora” e às grandes classes proprietárias da China. O período que vai de 1927 a 1934 é aquele em que Mao Tsé-tung irá elaborar os elementos de uma estratégia revolucionária; particular ênfase se dá para o caráter genuinamente revolucionário do campesinato. Para escapar ao cerco do Kuomitang, 90 mil comunistas, liderados por Mao, percorreram dez mil quilômetros rumo ao interior do país. É a Grande Marcha (1934/1935), dando grande prestígio e dimensão aos comunistas. Enquanto isso, o cerco japonês aumentava, tomando Pequim e outras grandes cidades. De 1937 a 1945 deu-se nova aliança PCC-Kuomitang contra a ameaça estrangeira. Com a derrota japonesa na Segunda Guerra, as ofensivas dos comunistas tiveram maior êxito. Em 1949, o exército comunista tomou Xangai e Nanquim e, em outubro deste ano, Mao proclamou a República Popular da China.
A China é logo organizada em moldes comunistas, com coletivização das terras, nacionalização das empresas estrangeiras e controle estatal da economia. A perseguição contra os intelectuais e as oposições no regime é intensa. O Grande Salto para a Frente (1958/1960), pretendendo desenvolver rapidamente a China e torná-la mais igualitária, num projeto ambicioso de conduzir a China ao comunismo (as Comunas agrícolas dão mostra dessa aspiração), levou à total desorganização econômica; milhares de camponeses morreram de fome. A Revolução Cultural de Mao serviu para depurar o partido e afastar os elementos moderados, mas contribuiu para que a ala reformista do PCCh reconquistasse posições. Este episódio, entretanto, é coerente do ponto de vista da teoria maoísta, na perspectiva de um certo “alinhamento das massas”. Com Deng Xiaoping à frente do governo, o país adota a política das Quatro Grande Modernizações (da indústria, da agricultura, da ciência e tecnologia e das Forças Armadas). São criadas as Zonas Econômicas Especiais, abertas a investimentos estrangeiros, e incentiva-se a propriedade privada no campo. Embora a luta pela democracia e pelo fim da repressão política não cessasse desde então, o país mantém há cerca de 30 anos taxas de crescimento de 9,8% ao ano (até a recente crise econômica de 2008), assombrando até os economistas mais céticos.
Durante o século XIX, a Coréia, o “reino eremita”, sofreu mais influência de países asiáticos, sobretudo China e Japão, do que de potências ocidentais. Após a derrota japonesa na Segunda Guerra, a Coréia foi dividida pelo paralelo 38o em duas zonas de ocupação, atribuídas respectivamente à URSS e aos EUA. Ficaram sendo as duas partes de orientações ideológicas distintas, mesmo após a retirada das tropas soviéticas e americanas, e também repúblicas independentes. Em 1850, entretanto, tropas da Coréia do Norte invadiram a do Sul, na chamada Guerra da Coréia. A Coréia do Sul recebeu importantes auxílios internacionais, sobretudo o apoio estadunidense. Apesar disso, os invasores foram repelidos para as imediações do paralelo 38o. Analogamente, o Vietnã, de acordo com a Conferência de Genebra (1954), separado de Laos e Camboja após a derrota francesa, foi dividido pelo paralelo 17o em Vietnã do Norte, comunista, e Vietnã do Sul, com um governo de direita. Os EUA se opuseram à unificação das duas partes e passaram a ajudar financeiramente e militarmente o Vietnã do Sul. Aí, entretanto, alastraram-se as guerrilhas dos vietcongs, apoiadas pelo Norte, por sua vez apoiado pela China. Os EUA empenharam-se na tarefa de deter o comunismo no Sul, bem como em todo o sudeste da Ásia, fornecendo ajuda econômica, conselheiros militares e armas em proporção crescente. Os bombardeios no Norte alcançaram proporções sem precedentes causando, além de o desgaste militar e financeiro, a hostilidade da opinião pública norte-americana. Aos poucos, os EUA procuraram “vietnamizar” a guerra, retirando as tropas norte-americanas e dando maior participação às do Sul. Em 1973 foi assinado um acordo de pacificação, e os EUA retiraram os remanescentes de suas forças. Em abril de 1975, Saigon assinou a rendição e um governo provisório comunista se instalou no sul. Diferentemente da Coréia, entretanto, o Vietnã foi reunificado em 1976, com o nome de República Socialista do Vietnã e capital em Hanói.
A referência ao Vietnã não é despropositada, pois nos permite ilustrar uma questão importante acerca dos destinos dos movimentos nacionais no sudeste asiático. Enquanto em vários países asiáticos os partidos comunistas dividiam com os partidos e grupos nacionalistas os processos de libertação nacional, como é o caso da China (em que o Kuomitang gozou de momentos hegemônicos), o caso da península indochinesa, em particular do Vietnã, é significativamente diverso. A frente nacionalista vietnamita, em que os comunistas hegemonizavam, o Viet Minh, angariou força considerável para definir os futuros nacionais de acordo com as teorias práticas de Ho Chi Minh. A sua estratégia de subordinação incondicional do projeto político às condições práticas vietnamitas, expressa nas alianças com amplos setores da sociedade (inclusive com os camponeses ricos), é sinal da habilidade dos comunistas em liderar o movimento nacional contra os imperialismos estrangeiros (francês e norte-americano, além de um breve período japonês). A forte presença comunista na Ásia, em geral, é devida a um processo interno, a evolução da ala radical dos movimentos nacionais e a capacidade de liderá-los (já que os antagonismos sociais não poderiam ser criados artificialmente); e também de um processo externo, a extensão das atividades do Komintern sobre a Ásia, cujas influências e instruções foram quase sempre adaptadas às particularidades dos países asiáticos, ao invés de conhecer uma aplicação indiscriminada.
Voltando-nos agora para o sul da Ásia, mais especificamente seu maior representante, a Índia, contemplaremos uma região que outrora fora palco de uma das mais antigas civilizações do mundo. A civilização do Rio Indo ou de Harappa, nome derivado de uma de suas capitais, floresceu durante cerca de mil anos (de 2500 a 1500 a.C.), e representou um grande salto civilizacional na história da Ásia meridional. Maior por sua extensão do que a Suméria, ocupava um enorme triângulo cujos lados mediam 1500 km. Os povos da civilização de Harappa já conheciam o cobre, o bronze, o ouro, a prata e o chumbo e comerciavam com a Mesopotâmia; tinham arte desenvolvida; a língua, ao que parece, da família dravídica. No século terceiro a.C., a maior parte do sul da Ásia foi unida no império Mauria, de 321 a 185 a.C., e Gupta, de 320 a 540 d.C., estendendo-se até o Nepal, Himalaia, Tibet, Sião, Indonésia, Sri Lanka e o reduto dravídico do Deccan. As artes e o pensamento alcançaram grande esplendor, e a sociedade hierarquizou-se cada vez mais com a criação de milhares de castas. A principal religião da Índia atual, tornada próspera após o fim do império Gupta, é também uma ordem social, fundamentadora da civilização indiana e da organização societária em castas. Sua visão admite a coexistência de três deuses máximos: Brahma, o criador do mundo, Vishnu, o conservador, e Shiva, o destruidor.
A penetração ocidental na Índia iniciou-se já nos séculos XV e XVI. No que nos toca mais especificamente, entretanto, foi o domínio inglês que garantiu os interesses imperialistas predominantes na Índia. O domínio inglês consolidou-se já no século XVIII, quando da vitória de Robert Clive, representante da Companhia Inglesa das Índias Orientais, sobre o príncipe bengali Siraj ud-Daula, em Plassey (1757). Afastados os interesses holandeses na Índia, os combates entre ingleses e franceses prolongaram-se até 1761, quando estes perderam Pondichéry; o Tratado de Paris (1763) assegurou a supremacia inglesa na Índia. Formou-se uma complexa estrutura de domínio que adota governos indiretos (indirect rule), acordos com marajás e administração direta por parte de funcionários da Companhia. O predomínio britânico baseou-se na superioridade econômica e na capacidade administrativa dos funcionários civis. A política econômica livre-cambista, adotada na Inglaterra após 1850, estendeu-se às colônias, uniformizando a relação econômica tanto com a Inglaterra quanto com os demais países do mundo.
Destaca-se, nesse período, o Grande Motim que se transformou em guerra civil, provocando a perda de Delhi e Lucknow e constituindo grave ameaça ao domínio britânico. A rebelião do exército nativo dos cipaios (soldados indianos que serviam no exército da Companhia Britânica das Índias Orientais), em Bengala, em 1857, culminou com a retomada britânica de Delhi e o fim do governo exercido pela Companhia. Em 1858, a coroa britânica assumiu a responsabilidade direta pelo governo da colônia; a rainha Vitória foi proclamada imperatriz da Índia e começou o período dos vice-reinos. Não houve, entretanto, uma dominação formal de toda a Índia (o que se entenderia por um processo colonizador), assim como também aconteceu com a China e o Japão. No nível da administração, ao lado de 15 províncias administradas diretamente por governadores, sob a autoridade superior de um vice-rei, existiam uns 600 “estados nativos” (native states), governados pelos respectivos marajás, rajás (sob a supervisão inglesa) etc. As “concessões” e “territórios arrendados” predominavam na China.
Em 1885, fruto de períodos de crise econômica iniciada na década de 1870 (fome, epidemias, revoltas camponesas, surto de nacionalismo), fundou-se o Partido do Congresso Nacional Indiano, quando ainda não se falava em independência (sob forte influência dos “ocidentalistas”). A mobilização das massas contra a colonização, no início do século XX, foi liderada pelas idéias de um homem excepcional, ao menos sob a visão de estrategista político, o “mahatma” Gandhi, influente defensor da “Satyagraha”, busca incessante da “verdade”, e da “Ahimsa” (princípio da não-agressão, forma não violenta de protesto, por exemplo, o “swadeshi”). Depois da Guerra, tanto o Partido do Congresso, como a Liga Muçulmana só se contentavam com a independência. Soma-se a isso o esgotamento financeiro da metrópole pós-Segunda Guerra, momento em que seu poderio militar já não era o mesmo. Em 1947, o India Independence Act atendeu finalmente às reivindicações de independência, embora esta não tenha se dado de acordo com o desejo do “líder” do movimento: ao contrário do que queria Gandhi, a Índia foi dividida em dois Estados, a União dos Estados Indianos e o Paquistão. A independência da Índia foi seguida de violentos conflitos étnico-religiosos. Com a cooperação do governo indiano, em 1971, o então Paquistão Oriental tornou-se independente (Bangladesh). As relações entre Índia e Paquistão se agravaram na década de 1990. Na Caxemira, uma guerrilha mulçumana pretendeu transformá-lo em país autônomo (ou região paquistanesa), apoiada pelo Paquistão, gerando combates com a Índia que deixaram milhares de mortos. A questão Caxemira, no entanto, continuou longe de uma solução pacífica. Apesar das conseqüências maléficas desses conflitos, a Índia é um país que vem crescendo significativamente nas últimas décadas; a tecnologia percorre uma escala que vai do mais primitivo ao mais sofisticado. Além de ser uma potência nuclear, com um considerável arsenal de bombas, no ano 2000 se tornara um dos principais produtores de programas de computador do mundo.
Após a Segunda Guerra Mundial, os conflitos políticos e ideológicos entre EUA e URSS marcariam toda a história da Ásia durante a segunda metade do século XX. O nacionalismo asiático, já afirmado no período pós-primeira guerra mundial e acentuado pela crise de 1929, foi reforçado pelo apoio americano e soviético aos movimentos de independência, em meio ao enfraquecimento geral da Europa, pelo apoio da ONU (que reconhecia o direito à “autodeterminação dos povos asiáticos”), e pela própria consciência dos povos asiáticos quanto às suas contribuições diversas para a vitória das metrópoles. Depois de 1945, a ONU substitui o antigo sistema de mandato (do entre guerras, confiando territórios coloniais a potências ocidentais para futura autonomia) pelo de tutela, através do qual fica a potência tutora ocidental encarregada de preparar o país para a independência. O comunismo freqüentemente identificava-se com as idéias nacionalistas e às aspirações das populações contra o jugo político e econômico estrangeiro. Sua capacidade de liderar o movimento nacional, como na China (após a Segunda Guerra) ou Vietnã, teria conseqüências relevantes nos destinos dos processos revolucionários, como rapidamente foi apontado. As vias de independência comumente seguiam dois caminhos: a pacífica, realizada progressivamente pela metrópole, e a violenta, resultante da intransigência metropolitana em conceder a autonomia às colônias. A independência da Indonésia, das Filipinas, da Índia, Malásia e Myanmar (antiga Birmânia), bem como a revolução chinesa, consumaram o processo de descolonização. Este processo, entretanto, é muito mais complexo e abarca boa parte do século XX, indo desde o fim do protetorado britânico sobre o Afeganistão (1919), até independência do Timor Leste (2002), já no século XXI.
Para finalizar, cabe fazer algumas observações finais sobre os processos de penetração imperialista na Ásia. Primeiramente que alguns países asiáticos nunca foram “oficial” ou “formalmente” colonizados, como é o caso da China, Japão e Tailândia, por exemplo. Um fator preponderante que talvez explique esse aspecto, além das habilidades políticas e processos conjunturais, reside no fato de que os países acima constituíram estados centralizados, o que teria facilitado a resistência. O sudoeste da Ásia (Oriente Médio) estivera basicamente sob domínio do Império Otomano no século XIX, enquanto a Ásia central sofrera principalmente da penetração de povos turcos e islâmicos, do império russo e da China. Assim, é fato que nem todos os países asiáticos sofreram penetrações coloniais ou influências imperialistas diretas das potências ocidentais, as quais, aliás, nada explicam por si sós. Mas suas histórias dificilmente se alijam de processos exógenos diversos. Como escreveu Chesneaux, “a história da Ásia não se desenrola em compartimentos fechados. Mas possui seu ritmo próprio, sem que por isso seja irredutível à história do Ocidente no nível da reflexão teórica” (CHESNEAUX, A Ásia Oriental nos séculos XIX e XX, 1976, p. 209).
Fonte: http://www.webartigos.com/articles/58131/1/Historia-da-Asia-Contemporanea/pagina1.html#ixzz1DPkPL39a
O principal eixo temático pelo qual os estudos ocidentais abordaram a história da Ásia, nos séculos XIX e XX, gira em torno da dominação européia e da expansão da ideologia imperial neocolonialista sobre os países orientais. Este estudo não se afastará dessa questão visceral, mas tentará tão somente apontar caminhos alternativos. Essa engenhosidade dominadora, ao engendrar um tipo de discurso “viciado” pelos interesses geopolíticos da Europa, contribuiu para construir uma história apologética do desenvolvimento europeu fundada na expansão “civilizacional” de seus centros difusores que, desde épocas remotas (ao menos desde a Renascença), já esbanjavam ilustremente ares de superioridade e acelerado crescimento econômico e militar. Sem intentar, como se disse, desviar-se visceralmente dessa narrativa tradicional, cuja contraposição crítica já se faz supor nas obras incipientes de historiadores revisionistas, é sensato logo ressaltar suas limitações estruturais. Ela não só é tendente a detratar o passado histórico dessas sociedades “orientais”, cujos avanços nos campos econômico, militar e cultural deixam entrever seu particular brilhantismo, como também negligencia uma visão mais detida de suas particularidades histórico-culturais no período referido, relegando seus diversos modus vivendi ao estigma pejorativo do “exótico”, do “diferente”, das irredutíveis “barreiras geográficas”. Trata-se, fundamentalmente, da dominação ocidental da Ásia, e é sob esse ângulo que boa parte de sua história será construída e reificada para a exaltação do status-quo dos Estados europeus.
Dito isso, ocupemo-nos inicialmente da chamada Ásia oriental ou Extremo Oriente que, durante vários séculos esplendorosos, esbanjou o vigor de civilizações incontestavelmente pioneiras em avanços que só muito mais tarde dariam as caras na Europa. Não seria desnecessário ao menos citar, a título de exemplo, a precoce centralização administrativa chinesa, quando Qin Shi Huangdi subiu ao trono de Qin (século III a.C.), associada à transição paulatina para um sistema geral de concursos meritórios para a burocracia. Fatores estes essenciais para que a China assumisse uma posição de vanguarda econômica-político-tecnológica face ao mundo então conhecido. Alguns enfatizam, entretanto, a estagnação chinesa pós-era Sung (com as invasões estrangeiras que desde então permeariam todas as dinastias chinesas), cessando em definitivo o fulgor reconhecido que tivera no passado. Apesar de tal afirmação ser controversa, ela ilumina uma questão central da história da China: quando exatamente a brilhante civilização chinesa perderia sua tradicional liderança frente à Europa? Não entrarei nos debates daí decorrentes, que nos afastariam do objetivo fundamental. Mas é certo que no século XIX, no que já nos interessa, a ameaça vinda da Europa viria fagocitar o desenvolvimento chinês, pretendendo aumentar a penetração comercial nesse país, contra a vontade dos imperadores. À instabilidade política interna, decorrente da situação conflituosa de dinastias estrangeiras, vinha se somar a penetração política e econômica européia (com os reflexos essenciais da Segunda Revolução Industrial), engendrando um período de crise econômica, política e social na China. Como se vê, tal fato não se apreende só com a visão da dominação européia, mas necessita de um olhar mais complexificado.
Com efeito, o impacto da Revolução Industrial foi mundial, favorecendo a expansão comercial da Inglaterra onde surgira primeiro. Somente a partir da segunda metade do século XIX prevaleceu o imperialismo na política de outros países europeus. De acordo com a força das circunstâncias, a Inglaterra formara um novo império britânico, depois da perda das Treze Colônias, assentado no poder naval e na indústria. A passagem do capitalismo comercial para o industrial, na Europa Ocidental e depois nos EUA, acarretou importantes mudanças no Oriente. A crescente compra de produtos industrializados da Europa, especialmente os do Reino Unido durante o século XIX, despertou uma concorrência desigual e contribuiu para o empobrecimento da Ásia. Esta acabou por transformar-se em fornecedora de matérias-primas para as indústrias européias. Medidas políticas e aduaneiras eram tomadas para eliminar a concorrência e garantir os interesses europeus. Além disso, inverteu-se o fluxo de metais preciosos que, desde a Antiguidade, saldava a compra pelos europeus dos artigos de luxo e das especiarias. A balança comercial asiática tornava-se, pois, deficitária, após séculos de larga vantagem frente à Europa.
No século XIX o império turco, a China e o Japão mantinham a independência política, embora a influência econômica e política das potências européias tenha se acentuado pelo menos até o fim da Segunda Guerra Mundial. Só o Japão conseguiu modernizar-se a tempo, buscando um crescimento moderno baseado nas fórmulas do Ocidente, depois de forçado militarmente pela expedição estadunidense de Perry, a abrir seus portos ao comércio do Ocidente (1853). Na China, a partir de 1839, os interesses britânicos passaram a prevalecer de forma inconteste. Já em 1820, os britânicos obtêm exclusividade de comércio no porto de Cantão. Na primeira Guerra do Ópio (1839/1842), motivada pela destruição de carregamentos de ópio pertencentes a súditos ingleses, estes se aproveitaram da situação para declarar guerra à dinastia Manchu. Vitoriosos, os ingleses forçaram o Tratado de Nanquim (1842), através do qual os chineses se comprometiam a abrir ao comércio britânico cinco portos, entre os quais Xangai e Cantão, dois dos mais importantes, além de cederem o de Hong Kong.
Nos anos seguintes, além das conseqüências nefastas da massiva penetração estrangeira, prosseguiam as instabilidades internas, que decorrem tanto de fatores externos como de problemas mais particulares da política chinesa. Em meados da década de 1850, sucedem-se os levantes mulçumanos das regiões de Xinjiang e Yunan; a rebelião Taiping (1850-1864), de cunho religioso e milenarista, inspirada nas idéias de um místico auto-proclamado, que pretendia criar uma nova cultura substituindo a tradição confucionista e budista, conseguiu conquistar Nanjing e tentou expandir seu poder pelo norte da China. Uma intervenção militar franco-britânica obrigou a China a novas concessões, inclusive a abertura de 11 outros portos e mais vantagens aos estrangeiros; o império cedeu aos franceses o território vassalo do Vietnã e aos japoneses a ilha de Formosa e a Península da Coréia.
Em contrapartida, nas décadas de 70 e 80 os chineses não deixaram de oferecer respostas ou formas de resistência tanto à “bárbara” invasão européia, como aos movimentos internos contra a dinastia estrangeira no poder. Uma questão primordial então se colocava: como modernizar-se de forma “seletiva”, isto é, adotar as necessárias tecnologias européias sem perder a milenar identidade cultural chinesa? Esta questão põe luz, de forma bastante superficial, sobre uma perspectiva menos simplificada e mecanicista de abordar a história contemporânea chinesa. A rivalidade com o Japão, com a guerra sino-japonesa (1894-1895), motivada pela ambição pelo reino coreano, acarretou a derrota da China e o reconhecimento da independência da Coréia, além da anexação da península de Liaotung, Formosa e as Ilhas Pescadores pelo Japão.
Aliás, até 1929, a política do Japão para com a China foi de penetração econômica pacífica, modificando-se a partir de 1931. A partir daí tornou-se agressiva, com o enrijecimento do boicote a mercadorias japonesas pelos chineses e, especialmente, com o reconhecimento dos direitos e interesses japoneses na Manchúria. Durante o período Meiji (1868-1912), as transformações socioeconômicas japonesas seguiram aceleradas, o feudalismo foi abolido, bem como o sistema de “Xogunato”, a igualdade dos japoneses e a introdução do desenvolvimento da grande indústria e do moderno sistema bancário foram medidas paulatinamente implantadas, dentre outras mudanças no sistema educacional, militar e tecnológico que merecem uma menção. O Japão foi o único país asiático a industrializar-se já no século XIX, cujo “ethos” guerreiro dos antigos samurais foi transferido para o âmbito dos negócios. Outro fato que merece menção na história japonesa, pelo fato de ter marcado profundamente os movimentos nacionais, foi a vitória do Japão sobre a Rússia, em 1905 (pela primeira vez a imposição da derrota a uma potência colonial “européia”). Em setembro de 1940, o Japão firmou um pacto com a Alemanha e a Itália; a entrada na Segunda Guerra foi o passo seguinte. O famoso episódio da invasão japonesa da base militar americana de Pearl Harbor, no Havaí, em 7 de dezembro de 1941, fez os EUA entrar na guerra. Se os primeiros meses foram favoráveis ao Japão, que se apoderou das Filipinas, Indonésia, Indochina e Malásia, a partir de 1943 a vitória americana tornara-se iminente. As bombas de Hiroxima e Nagasaki, lançadas em 6 de agosto de 1945, aceleraram a rendição japonesa. Reduzido aos limites que possuía antes do período Meiji, a partir da segunda metade do século XX o Japão apresentou notável crescimento econômico.
A China de 1900, imbuída de contradições internas e externas, em reação à política imperialista das potências estrangeiras e de tentativas internas de modernização, tentara ainda livrar-se dessas influências indesejáveis. Essa tentativa veio de círculos muito próximos à imperatriz Cixi, motivando motins xenófobos que culminaram quando os boxers, em 1900, sitiaram as legações européias em Pequim. A intervenção conjunta de forças estrangeiras libertou as legações e obrigou a imperatriz a acatar as condições econômicas desejáveis aos europeus. A dinastia Qing, já agonizante, não sobreviveu por muito mais tempo. Em 1911, a Revolução Xin Hai derrubou a dinastia Qing, que cedeu lugar à República da China, proclamada em janeiro de 1912. Sun Yat-sen é proclamado presidente provisório, mas a República não alcança todo o país, que entra em período de guerra civil (1916-1934), motivada pelos conflitos entre caudilhos militares. Em 1921 é criado o Partido Comunista Chinês, sob poderosa influência do Comintern, o qual forçou uma aliança com o partido nacionalista fundado por Sun Yat-sen, o Kuomitang, principal força política que esperava levar-se a efeito uma “revolução democrática burguesa”. A entrada dos comunistas no Kuomitang deu-se em caráter individual, no seio do qual se realizaria a unidade das forças populares. O massacre promovido em Xangai (1927) por Chiang Kai-shek, que tentara unificar o país, anunciou a ruptura do PCC com o Kuomitang, agora aliado à “burguesia compradora” e às grandes classes proprietárias da China. O período que vai de 1927 a 1934 é aquele em que Mao Tsé-tung irá elaborar os elementos de uma estratégia revolucionária; particular ênfase se dá para o caráter genuinamente revolucionário do campesinato. Para escapar ao cerco do Kuomitang, 90 mil comunistas, liderados por Mao, percorreram dez mil quilômetros rumo ao interior do país. É a Grande Marcha (1934/1935), dando grande prestígio e dimensão aos comunistas. Enquanto isso, o cerco japonês aumentava, tomando Pequim e outras grandes cidades. De 1937 a 1945 deu-se nova aliança PCC-Kuomitang contra a ameaça estrangeira. Com a derrota japonesa na Segunda Guerra, as ofensivas dos comunistas tiveram maior êxito. Em 1949, o exército comunista tomou Xangai e Nanquim e, em outubro deste ano, Mao proclamou a República Popular da China.
A China é logo organizada em moldes comunistas, com coletivização das terras, nacionalização das empresas estrangeiras e controle estatal da economia. A perseguição contra os intelectuais e as oposições no regime é intensa. O Grande Salto para a Frente (1958/1960), pretendendo desenvolver rapidamente a China e torná-la mais igualitária, num projeto ambicioso de conduzir a China ao comunismo (as Comunas agrícolas dão mostra dessa aspiração), levou à total desorganização econômica; milhares de camponeses morreram de fome. A Revolução Cultural de Mao serviu para depurar o partido e afastar os elementos moderados, mas contribuiu para que a ala reformista do PCCh reconquistasse posições. Este episódio, entretanto, é coerente do ponto de vista da teoria maoísta, na perspectiva de um certo “alinhamento das massas”. Com Deng Xiaoping à frente do governo, o país adota a política das Quatro Grande Modernizações (da indústria, da agricultura, da ciência e tecnologia e das Forças Armadas). São criadas as Zonas Econômicas Especiais, abertas a investimentos estrangeiros, e incentiva-se a propriedade privada no campo. Embora a luta pela democracia e pelo fim da repressão política não cessasse desde então, o país mantém há cerca de 30 anos taxas de crescimento de 9,8% ao ano (até a recente crise econômica de 2008), assombrando até os economistas mais céticos.
Durante o século XIX, a Coréia, o “reino eremita”, sofreu mais influência de países asiáticos, sobretudo China e Japão, do que de potências ocidentais. Após a derrota japonesa na Segunda Guerra, a Coréia foi dividida pelo paralelo 38o em duas zonas de ocupação, atribuídas respectivamente à URSS e aos EUA. Ficaram sendo as duas partes de orientações ideológicas distintas, mesmo após a retirada das tropas soviéticas e americanas, e também repúblicas independentes. Em 1850, entretanto, tropas da Coréia do Norte invadiram a do Sul, na chamada Guerra da Coréia. A Coréia do Sul recebeu importantes auxílios internacionais, sobretudo o apoio estadunidense. Apesar disso, os invasores foram repelidos para as imediações do paralelo 38o. Analogamente, o Vietnã, de acordo com a Conferência de Genebra (1954), separado de Laos e Camboja após a derrota francesa, foi dividido pelo paralelo 17o em Vietnã do Norte, comunista, e Vietnã do Sul, com um governo de direita. Os EUA se opuseram à unificação das duas partes e passaram a ajudar financeiramente e militarmente o Vietnã do Sul. Aí, entretanto, alastraram-se as guerrilhas dos vietcongs, apoiadas pelo Norte, por sua vez apoiado pela China. Os EUA empenharam-se na tarefa de deter o comunismo no Sul, bem como em todo o sudeste da Ásia, fornecendo ajuda econômica, conselheiros militares e armas em proporção crescente. Os bombardeios no Norte alcançaram proporções sem precedentes causando, além de o desgaste militar e financeiro, a hostilidade da opinião pública norte-americana. Aos poucos, os EUA procuraram “vietnamizar” a guerra, retirando as tropas norte-americanas e dando maior participação às do Sul. Em 1973 foi assinado um acordo de pacificação, e os EUA retiraram os remanescentes de suas forças. Em abril de 1975, Saigon assinou a rendição e um governo provisório comunista se instalou no sul. Diferentemente da Coréia, entretanto, o Vietnã foi reunificado em 1976, com o nome de República Socialista do Vietnã e capital em Hanói.
A referência ao Vietnã não é despropositada, pois nos permite ilustrar uma questão importante acerca dos destinos dos movimentos nacionais no sudeste asiático. Enquanto em vários países asiáticos os partidos comunistas dividiam com os partidos e grupos nacionalistas os processos de libertação nacional, como é o caso da China (em que o Kuomitang gozou de momentos hegemônicos), o caso da península indochinesa, em particular do Vietnã, é significativamente diverso. A frente nacionalista vietnamita, em que os comunistas hegemonizavam, o Viet Minh, angariou força considerável para definir os futuros nacionais de acordo com as teorias práticas de Ho Chi Minh. A sua estratégia de subordinação incondicional do projeto político às condições práticas vietnamitas, expressa nas alianças com amplos setores da sociedade (inclusive com os camponeses ricos), é sinal da habilidade dos comunistas em liderar o movimento nacional contra os imperialismos estrangeiros (francês e norte-americano, além de um breve período japonês). A forte presença comunista na Ásia, em geral, é devida a um processo interno, a evolução da ala radical dos movimentos nacionais e a capacidade de liderá-los (já que os antagonismos sociais não poderiam ser criados artificialmente); e também de um processo externo, a extensão das atividades do Komintern sobre a Ásia, cujas influências e instruções foram quase sempre adaptadas às particularidades dos países asiáticos, ao invés de conhecer uma aplicação indiscriminada.
Voltando-nos agora para o sul da Ásia, mais especificamente seu maior representante, a Índia, contemplaremos uma região que outrora fora palco de uma das mais antigas civilizações do mundo. A civilização do Rio Indo ou de Harappa, nome derivado de uma de suas capitais, floresceu durante cerca de mil anos (de 2500 a 1500 a.C.), e representou um grande salto civilizacional na história da Ásia meridional. Maior por sua extensão do que a Suméria, ocupava um enorme triângulo cujos lados mediam 1500 km. Os povos da civilização de Harappa já conheciam o cobre, o bronze, o ouro, a prata e o chumbo e comerciavam com a Mesopotâmia; tinham arte desenvolvida; a língua, ao que parece, da família dravídica. No século terceiro a.C., a maior parte do sul da Ásia foi unida no império Mauria, de 321 a 185 a.C., e Gupta, de 320 a 540 d.C., estendendo-se até o Nepal, Himalaia, Tibet, Sião, Indonésia, Sri Lanka e o reduto dravídico do Deccan. As artes e o pensamento alcançaram grande esplendor, e a sociedade hierarquizou-se cada vez mais com a criação de milhares de castas. A principal religião da Índia atual, tornada próspera após o fim do império Gupta, é também uma ordem social, fundamentadora da civilização indiana e da organização societária em castas. Sua visão admite a coexistência de três deuses máximos: Brahma, o criador do mundo, Vishnu, o conservador, e Shiva, o destruidor.
A penetração ocidental na Índia iniciou-se já nos séculos XV e XVI. No que nos toca mais especificamente, entretanto, foi o domínio inglês que garantiu os interesses imperialistas predominantes na Índia. O domínio inglês consolidou-se já no século XVIII, quando da vitória de Robert Clive, representante da Companhia Inglesa das Índias Orientais, sobre o príncipe bengali Siraj ud-Daula, em Plassey (1757). Afastados os interesses holandeses na Índia, os combates entre ingleses e franceses prolongaram-se até 1761, quando estes perderam Pondichéry; o Tratado de Paris (1763) assegurou a supremacia inglesa na Índia. Formou-se uma complexa estrutura de domínio que adota governos indiretos (indirect rule), acordos com marajás e administração direta por parte de funcionários da Companhia. O predomínio britânico baseou-se na superioridade econômica e na capacidade administrativa dos funcionários civis. A política econômica livre-cambista, adotada na Inglaterra após 1850, estendeu-se às colônias, uniformizando a relação econômica tanto com a Inglaterra quanto com os demais países do mundo.
Destaca-se, nesse período, o Grande Motim que se transformou em guerra civil, provocando a perda de Delhi e Lucknow e constituindo grave ameaça ao domínio britânico. A rebelião do exército nativo dos cipaios (soldados indianos que serviam no exército da Companhia Britânica das Índias Orientais), em Bengala, em 1857, culminou com a retomada britânica de Delhi e o fim do governo exercido pela Companhia. Em 1858, a coroa britânica assumiu a responsabilidade direta pelo governo da colônia; a rainha Vitória foi proclamada imperatriz da Índia e começou o período dos vice-reinos. Não houve, entretanto, uma dominação formal de toda a Índia (o que se entenderia por um processo colonizador), assim como também aconteceu com a China e o Japão. No nível da administração, ao lado de 15 províncias administradas diretamente por governadores, sob a autoridade superior de um vice-rei, existiam uns 600 “estados nativos” (native states), governados pelos respectivos marajás, rajás (sob a supervisão inglesa) etc. As “concessões” e “territórios arrendados” predominavam na China.
Em 1885, fruto de períodos de crise econômica iniciada na década de 1870 (fome, epidemias, revoltas camponesas, surto de nacionalismo), fundou-se o Partido do Congresso Nacional Indiano, quando ainda não se falava em independência (sob forte influência dos “ocidentalistas”). A mobilização das massas contra a colonização, no início do século XX, foi liderada pelas idéias de um homem excepcional, ao menos sob a visão de estrategista político, o “mahatma” Gandhi, influente defensor da “Satyagraha”, busca incessante da “verdade”, e da “Ahimsa” (princípio da não-agressão, forma não violenta de protesto, por exemplo, o “swadeshi”). Depois da Guerra, tanto o Partido do Congresso, como a Liga Muçulmana só se contentavam com a independência. Soma-se a isso o esgotamento financeiro da metrópole pós-Segunda Guerra, momento em que seu poderio militar já não era o mesmo. Em 1947, o India Independence Act atendeu finalmente às reivindicações de independência, embora esta não tenha se dado de acordo com o desejo do “líder” do movimento: ao contrário do que queria Gandhi, a Índia foi dividida em dois Estados, a União dos Estados Indianos e o Paquistão. A independência da Índia foi seguida de violentos conflitos étnico-religiosos. Com a cooperação do governo indiano, em 1971, o então Paquistão Oriental tornou-se independente (Bangladesh). As relações entre Índia e Paquistão se agravaram na década de 1990. Na Caxemira, uma guerrilha mulçumana pretendeu transformá-lo em país autônomo (ou região paquistanesa), apoiada pelo Paquistão, gerando combates com a Índia que deixaram milhares de mortos. A questão Caxemira, no entanto, continuou longe de uma solução pacífica. Apesar das conseqüências maléficas desses conflitos, a Índia é um país que vem crescendo significativamente nas últimas décadas; a tecnologia percorre uma escala que vai do mais primitivo ao mais sofisticado. Além de ser uma potência nuclear, com um considerável arsenal de bombas, no ano 2000 se tornara um dos principais produtores de programas de computador do mundo.
Após a Segunda Guerra Mundial, os conflitos políticos e ideológicos entre EUA e URSS marcariam toda a história da Ásia durante a segunda metade do século XX. O nacionalismo asiático, já afirmado no período pós-primeira guerra mundial e acentuado pela crise de 1929, foi reforçado pelo apoio americano e soviético aos movimentos de independência, em meio ao enfraquecimento geral da Europa, pelo apoio da ONU (que reconhecia o direito à “autodeterminação dos povos asiáticos”), e pela própria consciência dos povos asiáticos quanto às suas contribuições diversas para a vitória das metrópoles. Depois de 1945, a ONU substitui o antigo sistema de mandato (do entre guerras, confiando territórios coloniais a potências ocidentais para futura autonomia) pelo de tutela, através do qual fica a potência tutora ocidental encarregada de preparar o país para a independência. O comunismo freqüentemente identificava-se com as idéias nacionalistas e às aspirações das populações contra o jugo político e econômico estrangeiro. Sua capacidade de liderar o movimento nacional, como na China (após a Segunda Guerra) ou Vietnã, teria conseqüências relevantes nos destinos dos processos revolucionários, como rapidamente foi apontado. As vias de independência comumente seguiam dois caminhos: a pacífica, realizada progressivamente pela metrópole, e a violenta, resultante da intransigência metropolitana em conceder a autonomia às colônias. A independência da Indonésia, das Filipinas, da Índia, Malásia e Myanmar (antiga Birmânia), bem como a revolução chinesa, consumaram o processo de descolonização. Este processo, entretanto, é muito mais complexo e abarca boa parte do século XX, indo desde o fim do protetorado britânico sobre o Afeganistão (1919), até independência do Timor Leste (2002), já no século XXI.
Para finalizar, cabe fazer algumas observações finais sobre os processos de penetração imperialista na Ásia. Primeiramente que alguns países asiáticos nunca foram “oficial” ou “formalmente” colonizados, como é o caso da China, Japão e Tailândia, por exemplo. Um fator preponderante que talvez explique esse aspecto, além das habilidades políticas e processos conjunturais, reside no fato de que os países acima constituíram estados centralizados, o que teria facilitado a resistência. O sudoeste da Ásia (Oriente Médio) estivera basicamente sob domínio do Império Otomano no século XIX, enquanto a Ásia central sofrera principalmente da penetração de povos turcos e islâmicos, do império russo e da China. Assim, é fato que nem todos os países asiáticos sofreram penetrações coloniais ou influências imperialistas diretas das potências ocidentais, as quais, aliás, nada explicam por si sós. Mas suas histórias dificilmente se alijam de processos exógenos diversos. Como escreveu Chesneaux, “a história da Ásia não se desenrola em compartimentos fechados. Mas possui seu ritmo próprio, sem que por isso seja irredutível à história do Ocidente no nível da reflexão teórica” (CHESNEAUX, A Ásia Oriental nos séculos XIX e XX, 1976, p. 209).
Fonte: http://www.webartigos.com/articles/58131/1/Historia-da-Asia-Contemporanea/pagina1.html#ixzz1DPkPL39a