26.3.11

A situação da Igreja Católica na Idade Média

Por Patrícia Braik

D

urante a Idade Média, a Igreja Católica experimentou seu momento de maior poder e expressão na sociedade. Toda a vida civil estava regulada pelas observações religiosas.

As estações do ano agrícola, as reuniões das assembleias consultivas, o calendário anual eram marcados pelas atividades religiosas.

A vida cotidiana era toda impregnada por pequenos rituais católicos, que demonstravam o grande poder da religião. As doenças epidemias e catástrofes eram geralmente atribuídas ao Diabo, e eram resolvidas por meio de exorcismos, sinais da cruz e outros simbolismos católicos. O poder da Igreja diferenciava-se dos demais, uma vez que além do território sob sua jurisdição política ela tinha o poder espiritual sobre quase todo o território europeu.

Esse domínio, construído durante a Idade Média, consistia em estar presente na vida das diferentes camadas sociais. Era a Igreja que representava, pela sua função religiosa, a segurança para a população medieval atemorizada com a morte e, sobretudo, com o que pudesse ocorrer depois da morte. Essa influência, a princípio puramente espiritual, passa a estender-se para o político, na medida em que eram os papas que coroavam os imperadores, nas cerimônias de sagração.

Entre os nobres a Igreja atuava como fornecedora de justificativas religiosas, para as guerras contra os infiéis - as Guerras Santas. Entre os movimentos mais conhecidos da Idade Média, orientados pela Igreja, estão as Cruzadas, que contaram com o apoio dos dirigentes políticos das monarquias feudais, para retomar a Terra Santa , então em poder dos turcos.Entretanto os interesses econômicos e sociais rapidamente superaram os motivos religiosos, que em um primeiro momento serviram de incentivo aos movimentos cruzadísticos.

No plano intelectual a Igreja Católica foi durante o período medieval, a guardiã do conhecimento sistematizado, uma vez que as bibliotecas ficavam em seu poder.

O clero era constituído na sua maioria por indivíduos ricos, que nem sempre possuíam vocação religiosa para praticarem a fé. A religião nesse momento também era vista como uma forma de enriquecimento fácil às custas de tributos dos camponeses e artesãos.

Ao longo de todo o período medieval a Igreja contou com diversos movimentos que tentaram reformar a Instituição nascidos no seio da própria Igreja. A Igreja enfrentou também grande número de guerras, movidas por reis, príncipes e senhores feudais, muitas vezes com o apoio da população, que lutavam contra o abusivo poder dos papas. Entretanto a Igreja saiu vitoriosa na maioria das vezes, mantendo sua unidade, até meados do século XVI, quando ocorreu o movimento da Reforma Protestante.

Durante a Idade Média as relações da Igreja com os banqueiros encontraram um único obstáculo: os juros. Entendia-se que um usurário, ao exigir uma importância maior e proporcional à duração do empréstimo, estava vendendo algo que pertencia somente a Deus (o tempo). Este problema, entretanto acabou sendo contornado. E enquanto se fazia uma cuidadosa revisão dos dogmas da religião, aos “vendedores do tempo” restava a possibilidade, aplicada a todos os demais pecados, de arrepender-se e doar aos pobres e à própria Igreja parte da riqueza acumulada durante toda a vida.

O homem medieval vivia aprisionado em seu pequeno mundo. As informações sobre a Ásia e a África eram muito esparsas e contraditórias. A América não fazia parte dos mapas. Os mercadores eram em geral homens melhor informados do que o restante da população. Estes procuravam compreender as diferenças das civilizações e, ao mesmo tempo, integrá-las dentro da ótica do cristianismo. Com Marco Polo, viajante do século XII, podemos perceber duas grandes questões: as dificuldades em se definir a geografia do globo e o peso ético que a narrativa bíblica impunha aos seus relatos.

O que mais surpreendia o ouvinte medieval, era a exuberância das descrições sobre reinos distantes e não a geografia dos continentes. Cada região era descrita através de cenas cujo impacto fixava uma determinada imagem:

O rei anda também todo nu, como os outros, mas cobre a sua virilidade com um pano mais rico, e usa um colar de ouro, que é uma fiada de safiras, rubis, esmeraldas e outras pedras preciosas. Também usa posto no pescoço um cordão com 104 pérolas grandíssimas e rubis de grande valor. E são 104 pérolas e pedras, porque tem que dizer, todas as manhãs e todas as noites, 104 preces ou invocações aos seus ídolos. É que lhe mandam a fé e os costumes; assim o fizeram seus antepassados, e assim o faz ele, e é por isso que usa um tal colar[...] Contei-vos tudo isto, mas no entanto ainda me fica muita coisa maravilhosa por dizer. Sabei que este rei tem quinhentas mulheres legítimas [...] (O livro das maravilhas).

Numa época em que ouvir valia mais do que ver, os olhos enxergavam primeiro o que se ouvia dizer; tudo quanto se via era filtrado pelos relatos de viagens fantásticas de terras longínquas, de homens monstruosos que habitavam os confins do mundo conhecido. Aos poucos, talvez com traumatismos, as evidências da novidade cresceriam sobre o acervo milenar do imaginário europeu, destruindo sonhos e fantasias, somando-se a outros elementos desencantadores do mundo feudal.

O que era a realidade da terra para o homem do século XIV? Acreditava-se na existência do Equador, dos trópicos, de cinco zonas climáticas, três continentes, três mares, doze ventos. A Europa setentrional e o Atlântico já se confundiam com o imaginário, sendo descritos quase como ficção. Mais tarde a expansão ultramarina desenrolou-se pois sob forte influência do imaginário europeu tanto na vertente positiva quanto na negativa.

A expansão nesse momento é multifacetada, ou seja, meio real, meio fantástica, meio comercial, meio mental, ligado à própria estrutura do comércio do Ocidente medieval, importador de produtos preciosos longínquos, com suas ressonâncias psicológicas.

Fonte:Início