por Christophe Courau | ||||||||||||||||||||||||
Uma das primeiras etapas na história da domesticação da água foi o surgimento da agricultura, o que levou ao desenvolvimento das técnicas de irrigação. De acordo com os indícios arqueológicos, as primeiras sociedades que transferiram a água dos rios para suas lavouras foram a babilônica, no atual Iraque, e a egípcia. Esta última foi responsável também por construir, no Nilo, as primeiras barragens conhecidas, inventando o que hoje chamamos de hidrologia. Os antigos tiveram de criar também uma maneira de levar água às plantações que estavam acima do nível dos rios e canais. Os mesopotâmicos foram os pioneiros, criando o chadouf, sistema de alavanca e contrapeso que elevava alguns metros cúbicos de água por hora. O invento foi sucedido pela nória, uma roda vertical com copos que alimentavam uma canaleta, responsável por transportar o líquido até as lavouras.
Mas egípcios e babilônios não foram os únicos capazes de controlar a água na Antiguidade. Por volta de 2500 a.C., a ilha de Creta já contava com um sistema de canais que levava o líquido até as casas. O palácio de Cnossos, por exemplo, possuía água corrente, fontes, banheiras e latrinas. Na mesma época, a civilização harappeana, originária do vale do rio Indo, no atual Paquistão, também possuía casas com chuveiros e latrinas, além de contar com uma rede urbana de esgotos. Por volta de 700 a.C., foi a vez dos assírios construírem um canal com mais de 100 km de comprimento para transportar a água das montanhas da região do atual Iraque para o palácio de Nínive. Enquanto isso, na Grécia, Arquimedes inventava um aparelho de elevação da água que ficaria conhecido como “parafuso”. Roma também se destacou na domesticação do líquido. No século VI a.C., a cidade inaugurava seu primeiro sistema de esgotos. Cerca de 300 anos depois, o primeiro aqueduto, chamado deAqua Appia, começava a levar água até a cidade por canais de alvenaria. Os romanos souberam também explorar e aperfeiçoar as invenções dos povos que conquistavam. Em meados do século I a.C., por exemplo, a nória mesopotâmica era usada pelos latinos na região do estreito de Bósforo, na Turquia. No final do império, Roma contava com 11 aquedutos, e o maior deles, chamado Aqua Claudia, percorria 68 km e transportava cerca de 1 milhão de metros cúbicos de água por dia. Isso não quer dizer que a população comum era bem abastecida. Cerca de um quarto da água que chegava à cidade ia para a casa imperial; metade ficava com os cidadãos “ilustres”, como os senadores; e a população comum tinha de se contentar com apenas um quarto de todo o líquido, que era coletado nas fontes públicas. Embora as civilizações antigas tenham desenvolvido vários tipos de sistemas hidráulicos, a sociedade medieval parece ter abandonado esses conhecimentos. O abastecimento de água do período era irrisório, e a falta de locais para coletar o líquido usado causava graves problemas: as tinturarias e curtumes instalavam-se nas margens dos rios, poluindo-os; como não havia esgotos, cada família jogava seus detritos nas ruas, onde permaneciam até que a chuva os levasse; e as nascentes e os poços eram muitas vezes contaminados pela água suja. Essa situação de escassez fez com que leis rígidas fossem criadas para regulamentar o uso dos recursos hídricos. No ano 960, por exemplo, o califa de Córdoba criou o Tribunal das Águas de Valência, uma instância responsável por organizar a distribuição do recurso natural e julgar eventuais irregularidades em seu uso. Essa corte especial ainda existe na Espanha e é sem dúvida a mais antiga instituição de justiça da Europa. Há mais de mil anos, oito síndicos (representantes nomeados pelos camponeses locais) se reúnem em um pequeno recinto e discutem os problemas referentes à divisão das águas do rio Turia. Se acusado, o agricultor é convocado diante dos magistrados e tem, no máximo, três dias para comparecer. Muitas vezes, os camponeses que vivem às margens do Turia respondem por roubo de água – crime que há séculos é cometido durante os períodos de fome e estiagem – ou rompimento dos canais e muros, o que causa um excesso de irrigação nas plantações locais. Outra preocupação do período foi o excesso de água. Os mesopotâmicos novamente saíram na frente e inventaram o primeiro sistema de drenagem da história: um pequeno declive que levava o excedente do líquido para um fosso de coleta na parte mais baixa do terreno. Graças a essas técnicas criadas na Idade do Bronze, as superfícies cultiváveis se multiplicaram.
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26.4.11
Água - A busca milenar pelo ouro azul
A domesticação da água foi decisiva para o surgimento das primeiras civilizações. Por séculos, os homens desenvolveram técnicas para controlar o recurso que pode detonar as grandes guerras do século XXI.