Frases de Johann Heinrich Pestalozzi:
“As faculdades do homem têm de ser desenvolvidas de tal forma que nenhuma delas predomine sobre as outras”
“A natureza melhor da criança deve ser encorajada o mais cedo possível a combater a força prepotente do instinto animal”
Johann Heinrich Pestalozzi nasceu em 1746 em Zurique, na Suíça. Na juventude, ele abandonou os estudos religiosos para se dedicar à agricultura. Quando a empreitada se tornou o primeiro de muitos fracassos materiais de sua vida, Pestalozzi levou algumas crianças pobres para casa, onde encontraram escola e trabalho como tecelãs, aprendendo a se sustentar. Alguns anos depois, a escola se inviabilizou e Pestalozzi passou a explorar suas idéias em livros, entre eles Os Crepúsculos de um Eremita e o romance Leonardo e Gertrudes. Uma nova chance de exercitar seu método só surgiu quando ele já tinha mais de 50 anos, ao ser chamado para dar aulas aos órfãos da batalha de Stans. Mais duas experiências se seguiram, em escolas de Burgdorf e Yverdon. Nesta última, que existiu de 1805 a 1825, Pestalozzi desenvolveu seu projeto mais abrangente, dando aulas para estudantes de várias origens e comandando uma equipe de professores. Divergências entre eles levaram a escola a fechar. Yverdon projetou o nome de Pestalozzi no exterior e foi visitada por muitos dos grandes educadores da época.
Para a mentalidade contemporânea, amor talvez não seja a primeira palavra que venha à cabeça quando se fala em ciência, método ou teoria. Mas o afeto teve papel central na obra de pensadores que lançaram os fundamentos da pedagogia moderna. Nenhum deles deu mais importância ao amor, em particular ao amor materno, do que o suíço Johann Heinrich Pestalozzi (1746-1827).
Antecipando concepções do movimento da Escola Nova, que só surgiria na virada do século 19 para o 20, Pestalozzi afirmava que a função principal do ensino é levar as crianças a desenvolver suas habilidades naturais e inatas. “Segundo ele, o amor deflagra o processo de auto-educação”, diz a escritora Dora Incontri, uma das poucas estudiosas de Pestalozzi no Brasil.
A escola idealizada por Pestalozzi deveria ser não só uma extensão do lar como inspirar-se no ambiente familiar, para oferecer uma atmosfera de segurança e afeto. Ao contrário de muitos de seus contemporâneos, o pensador suíço não concordava totalmente com o elogio da razão humana. Para ele, só o amor tinha força salvadora, capaz de levar o homem à plena realização moral – isto é, encontrar conscientemente, dentro de si, a essência divina que lhe dá liberdade. “Pestalozzi chega ao ponto de afirmar que a religiosidade humana nasce da relação afetiva da criança com a mãe, por meio da sensação de providência”, diz Dora Incontri.
Inspiração na natureza
A vida e obra de Pestalozzi estão intimamente ligadas à religião. Cristão devoto e seguidor do protestantismo, ele se preparou para o sacerdócio, mas abandonou a idéia em favor da necessidade de viver junto da natureza e de experimentar suas idéias a respeito da educação. Seu pensamento permaneceu impregnado da crença na manifestação da divindade no ser humano e na caridade, que ele praticou principalmente em favor dos pobres.
A criança, na visão de Pestalozzi, se desenvolve de dentro para fora – idéia oposta à concepção de que a função do ensino é preenchê-la de informação. Para o pensador suíço, um dos cuidados principais do professor deveria ser respeitar os estágios de desenvolvimento pelos quais a criança passa. Dar atenção à sua evolução, às suas aptidões e necessidades, de acordo com as diferentes idades, era, para Pestalozzi, parte de uma missão maior do educador, a de saber ler e imitar a natureza – em que o método pedagógico deveria se inspirar.
Bondade potencial
Tanto a defesa de uma volta à natureza quanto a construção de novos conceitos de criança, família e instrução a que Pestalozzi se dedicou devem muito a sua leitura do filósofo franco-suíço Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), nome central do pensamento iluminista. Ambos consideravam o ser humano de seu tempo excessivamente cerceado por convenções sociais e influências do meio, distanciado de sua índole original – que seria essencialmente boa para Rousseau e potencialmente fértil, mas egoísta e submissa aos sentidos, para Pestalozzi.
“A criança, na concepção de Pestalozzi, era um ser puro, bom em sua essência e possuidor de uma natureza divina que deveria ser cultivada e descoberta para atingir a plenitude”, diz Alessandra Arce, professora da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo, em Ribeirão Preto. O pensador suíço costumava comparar o ofício do professor ao do jardineiro, que devia providenciar as melhores condições externas para que as plantas seguissem seu desenvolvimento natural. Ele gostava de lembrar que a semente traz em si o “projeto” da árvore toda.
Desse modo, o aprendizado seria, em grande parte, conduzido pelo próprio aluno, com base na experimentação prática e na vivência intelectual, sensorial e emocional do conhecimento. É a idéia do “aprender fazendo”, amplamente incorporada pela maioria das escolas pedagógicas posteriores a Pestalozzi. O método deveria partir do conhecido para o novo e do concreto para o abstrato, com ênfase na ação e na percepção dos objetos, mais do que nas palavras. O que importava não era tanto o conteúdo, mas o desenvolvimento das habilidades e dos valores.
Sem notas, castigos ou prêmios
Ao contrário de Rousseau, cuja teoria é idealizada, Pestalozzi, segundo a educadora Dora Incontri, “experimentava sua teoria e tirava a teoria da prática”, nas várias escolas que criou. Pestalozzi aplicou em classe seu princípio da educação integral – isto é, não limitada à absorção de informações. Segundo ele, o processo educativo deveria englobar três dimensões humanas, identificadas com a cabeça, a mão e o coração. O objetivo final do aprendizado deveria ser uma formação também tripla: intelectual, física e moral. E o método de estudo deveria reduzir-se a seus três elementos mais simples: som, forma e número. Só depois da percepção viria a linguagem. Com os instrumentos adquiridos desse modo, o estudante teria condições de encontrar em si mesmo liberdade e autonomia moral. Como alcançar esse objetivo dependia de uma trajetória íntima, Pestalozzi não acreditava em julgamento externo. Por isso, em suas escolas não havia notas ou provas, castigos ou recompensas, numa época em que chicotear os alunos era comum. “A disciplina exterior, na escola de Pestalozzi, era substituída pelo cultivo da disciplina interior, essencial à moral protestante”, diz Alessandra Arce.
Para pensar
A pesquisadora Dora Incontri vê na obra dos filósofos da educação anteriores ao século 19 uma concepção do ser humano “mais integral” do que a que passou a prevalecer então. Segundo Dora, naquela época a ciência, incluindo a pedagogia, se tornou materialista. “Pensadores como Pestalozzi levavam em conta aspectos hoje negligenciados, como o espiritual.” Ela lamenta a ausência dessa dimensão. No seu dia-a-dia na escola ou em seus estudos sobre educação, você já sentiu a sensação de que falta algo à teoria pedagógica? Chegou a pensar que carência é essa? De que forma ela se reflete na prática?
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