Durante os primeiros anos da colonização brasileira, notamos que o governo de Portugal não teve condições necessárias para empreender ações que viabilizassem a exploração econômica do espaço colonial. Por conta deste impasse, o sistema de capitanias hereditárias foi adotado como um sistema de administração indireta em que a Coroa abria mão de várias obrigações e gastos com a colonização, repassando-as para a responsabilidade de particulares.
O donatário, recebedor da capitania hereditária, tinha entre outros direitos, realizar a doação de sesmarias para os demais colonizadores. O termo “sesmaria” era empregado para todo aquele terreno pertencente à Coroa Portuguesa onde não era observado o desenvolvimento de atividades econômicas ou a ocupação do espaço colonial. Tendo em vista as grandes dimensões do espaço colonial brasileiro, a possibilidade de realizar a doação de sesmarias era bem relevante.
A doação de sesmarias é um hábito político antigo de Portugal, tendo sido inicialmente empregado no século XIV. Nessa época, os constantes problemas gerados pela falta de alimentos motivaram o governo português a realizar a distribuição de sesmarias como um meio de incrementar a produção agrícola do país. No entanto, repassado para o contexto da colônia brasileira, o sistema sesmarial teria outras características e objetivos.
Intimamente ligadas à lógica mercantilista, as sesmarias brasileiras deveriam ser utilizadas para a formação de atividades agrícolas que atendiam às demandas do mercado europeu. Notamos que a exploração da cana-de-açúcar foi uma das primeiras ações econômicas ligadas às sesmarias. Desse modo, os donos das sesmarias (também chamados de “sesmeiros”) transformavam-se em peça-chave no desenho da colonização do Brasil, realizando a junção entre os interesses públicos e privados.
Ao longo da colonização, os proprietários das sesmarias tornaram-se os grandes proprietários de terra que compunham a elite colonial. Ocupando o topo da hierarquia social, não só concentravam terras, mas também abriam caminho para a conquista de vários outros direitos restritos aos seus semelhantes. Não raro, os sesmeiros ocupavam importantes cargos públicos, integravam os altos postos das instituições militares e garantiam seus interesses em desfavor da maioria da população.
Nas últimas décadas, as intensas discussões e conflitos envolvendo a questão do acesso à terra no Brasil, evocam com grande destaque a utilização do sistema de sesmarias. Por meio das funções políticas e sociais que tiveram, vemos que as sesmarias explicam a origem do problema de concentração de terras no Brasil. Ao mesmo tempo, revelam a primeira das várias e imprecisas leis que garantiram o uso da terra para uma pequena parcela da população brasileira.
Por Rainer Sousa
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