Castro Alves revelou seus posicionamentos ideológicos em favor das classes sociais
Castro Alves: o defensor das causas abolicionistas, o poeta dos escravos. Tais atributos são dados a esse grande mestre em virtude de sua habilidade em fazer da palavra um instrumento das causas sociais, haja vista que uma das vertentes que norteou suas criações foi exatamente a chamada “poesia social”. Assim, dada a nobreza de nossa discussão, contextualizemo-nos à época em que se fez visto o representante em questão.
Independência sim (1822), em partes! Pois em termos políticos e econômicos, ao contrário de outros países latino-americanos que também se encontravam na mesma situação, o Brasil continuava preso às amarras da grande elite, haja vista que era ela quem detinha plenos poderes das mais diversas ordens. Assim, imperava a monarquia, bem como a situação dos latifundiários, da escravidão, do tráfico negreiro (associado a todos os aspectos que dele prescindem, tais com os castigos, a exploração sexual), etc.
Assim, mediante tal situação, nada mais podia ocorrer senão o surgimento das ideias republicanas, e com elas o desejo de libertação. Era o Brasil ansiando por novas mudanças em todos os planos possíveis, mesmo porque, lá “fora”, tais ideários já há muito se manifestavam, como com o manifesto Comunista, as ideias positivistas de Auguste Comte, o surgimento dos movimentos operários, enfim. Aqui, em solo brasileiro, tais influências trouxeram à luz novas reivindicações. E no plano literário?
Claro, o poeta representa um ser à frente de seu tempo; e foi assim que se manifestou Castro Alves, notoriamente influenciado pelas ideias do escritor francês Vitor Hugo, cujos posicionamentos ideológicos se pautavam por uma arte de cunho social, como na sua obra “Os miseráveis”. Eis aí uma das razões de a poesia de Alves ser conhecida, também, como hugoana.
Tais poesias recebem também outra denominação – condoreiras – em virtude da influência de um pássaro (condor) cuja característica se demarca pela capacidade de atingir grandes alturas com seu voo, as quais simbolizam tão somente a liberdade. Liberdade essa que fez com que Castro Alves em muito se distinguisse dos representantes da segunda geração romântica, haja vista que a fuga e o desejo de solidão eram instrumentos dos quais os demais representantes faziam uso para expressar seus posicionamentos frente à realidade, ao contrário de Alves, que optou pelo engajamento nas causas sociais, empenhando-se ardentemente em uma luta incansável de mudanças.
Assim, de modo a constarmos como tais intenções se operaram, analisemos alguns fragmentos expressos em uma de suas criações, intitulada “Navio negreiro”:
V
Senhor Deus dos desgraçados!
Dizei-me vós, Senhor Deus!
Se é loucura... se é verdade
Tanto horror perante os céus?!
Ó mar, por que não apagas
Co'a esponja de tuas vagas
De teu manto este borrão?...
Astros! noites! tempestades!
Rolai das imensidades!
Varrei os mares, tufão!
Quem são estes desgraçados
Que não encontram em vós
Mais que o rir calmo da turba
Que excita a fúria do algoz?
Quem são? Se a estrela se cala,
Se a vaga à pressa resvala
Como um cúmplice fugaz,
Perante a noite confusa...
Dize-o tu, severa Musa,
Musa libérrima, audaz!...
São os filhos do deserto,
Onde a terra esposa a luz.
Onde vive em campo aberto
A tribo dos homens nus...
São os guerreiros ousados
Que com os tigres mosqueados
Combatem na solidão.
Ontem simples, fortes, bravos.
Hoje míseros escravos,
Sem luz, sem ar, sem razão. . .
[...]
Enlevados por tal grandiosidade, resta-nos somente conhecer um pouco mais sobre quem realmente foi esse nobre poeta, Castro Alves. Ele, Antônio Frederico de Castro Alves, nasceu em 1847, em Curralinho, estado da Bahia. Estudou Humanidades no Ginásio Baiano e, em 1862, transferiu-se para Recife, com a intenção de estudar Direito. Chegando lá, engajou-se na campanha abolicionista, fato que deu ainda mais impulso às suas criações. Manteve um relacionamento com Maria Eugênia Câmara, atriz portuguesa, por mais de cinco anos.
Mudando-se para Salvador, em 1867, fizeram a carreira profissional juntos, obtendo bastante êxito. Um ano depois se mudaram para São Paulo, depois de passar pelo Rio de Janeiro, onde Castro Alves foi apresentado ao poeta José de Alencar e a Machado de Assis, contemporâneos dele. Lá retomou os estudos de Direito e assim os êxitos prosseguiram. No final desse mesmo ano, feriu o pé num acidente enquanto praticava a caça. Com isso, seu estado de saúde veio a se agravar ainda mais. Associado ao fato de ser tuberculoso, faleceu em 1871, prematuramente, aos 24 anos de idade.
Por Vânia Maria Do Nascimento Duarte
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