18.6.13
Guerra do Vietnã
Introdução
A Guerra do Vietnã foi o mais longo conflito militar que ocorreu depois da II Guerra Mundial. Estendeu-se essa guerra em dois períodos distintos. No primeiro deles, as forças nacionalistas vietnamitas, sob orientação do Viet-minh (a liga vietnamita), lutaram contra os colonialistas franceses, entre 1946 a 1954. No segundo, uma frente de nacionalistas e comunistas - o Vietcong - enfrentaram as tropas de intervenção norte-americanas, entre 1964 e 1975. Com um pequeno intervalo entre os finais dos anos 50 e início dos 60, a guerra durou quase 20 anos.
Na verdade, devido a sua irradiação, seria melhor dizer Guerra da Indochina, do qual o Vietnã é uma das partes. A Indochina, região assim chamada por ser uma zona intermediária entre a Índia e a China, ocupa uma península do sudoeste asiático e está dividida entre o Vietnã (subdividido em Tonquim e Conchinchina), o Laos e o reino do Camboja. Toda essa região caiu sob domínio do colonialismo francês entre 1883-5 e assim ficou até a ocupação japonesa, entre 1941-45. Com a queda da França em 1940, formou-se o governo colaboracionista de Vichy, aliado dos nazistas. Em vista disso os japoneses permitiram uma certa autonomia administrativa feita por franceses. Mas em 1945, com a derrota do Japão, os franceses tentaram recolonizar toda a Indochina.
Ho Chi Minh
Ho Chi Minh ("aquele que ilumina"), nasceu em 1890 numa pequena aldeia vietnamita, filho de um professor rural. Tornou-se um dos mais importantes e lendários líderes nacionalistas e revolucionários do mundo do após-guerra. Viajou muito jovem como marinheiro e tornou-se socialista quando viveu em Paris, entre 1917 e 1923. Quando ocorreu as Conferências de Versalhes, em 1919, para fixar um novo mapa mundial, o jovem Ho Chi Minh (então chamado de Nguyen Ai quoc, o "patriota"), solicitou aos negociadores europeus que fosse dado ao Vietnã um estatuto autônomo. Ninguém lhe deu resposta, mas Ho Chi Minh tornou-se um herói para o seu povo.
Em 1930 ele fundou o Partido Comunista Indochinês e seu sucessor, o Viet-mihn (Liga da Independência do Vietnã), em 1941, para resistir à ocupação japonesa. Foi preso na China por atividade subversiva e escreveu na prisão os "Diários da Prisão", em chinês clássico, uma série de poemas curtos, onde enalteceu a luta pela independência.
Com seus companheiros mais próximos, Pahm Van Dong e Vo Nguyen Giap, lançou-se numa guerra de guerrilhas contra os japoneses, obedecendo à estratégia de Mao Tse Tung de uma "guerra de longa duração". Finalmente, em 2 de setembro de 1945, eles ocupam Hanói (a capital do norte) e Ho Chi Minh proclamou a independência do Vietnã. Mas os franceses não aceitaram. O Gen. Leclerc, a mando do Gen. De Gaulle, recebeu ordens de reconquistar todo o norte do país, nas mãos dos comunistas de Ho Chi Minh. Isso irá jogar a França na sua primeira guerra colonial depois de 1945, levando-a a derrota na batalha de Diem Biem Phu, em 1954, quando as forças do Viet-minh, comandadas por Giap, cercam e levam os franceses à rendição. Depois de 8 anos, encerrou-se assim a primeira Guerra da Indochina.
A Conferência de Genebra
Em Genebra, na Suíça, os franceses acertaram com os vietnamitas um acordo que previa:
1. o Vietnã seria momentaneamente dividido em duas partes, a partir do paralelo 17, no Norte, sob o controle de Ho Chi Minh e no Sul sob o domínio do imperador Bao Dai, um títere dos franceses;
2. haveria entre eles uma Zona Desmilitarizada (ZDM);
3. seriam realizadas em 1956, sob supervisão internacional, eleições livres para unificar o país. Os Estados Unidos presentes no encontro não assinaram o acordo.
A ditadura de Diem
Entrementes no Sul, assumia a administração em nome do imperador, Ngo Dinh Diem, um líder católico, que em pouco tempo tornou-se o ditador do Vietnã do Sul. Ao invés de realizar as eleições em 1956, como previa o acordo de Genebra, Diem proclamou a independência do Sul e cancelou a votação. Os americanos apoiaram Diem porque sabiam que as eleições seriam vencidas pelos nacionalistas e pelos comunistas de Ho Chi Minh. Em 1954, o Gen. Eisenhower, presidente dos Estados Unidos, explicou a posição americana na região pela defesa da Teoria de Dominó: "Se vocês porem uma série de peças de dominó em fila e empurrarem a primeira, logo acabará caindo até a última... se permitirmos que os comunistas conquistem o Vietnã corre-se o risco de se provocar uma reação em cadeia e todo os estados da Ásia Oriental tornar-se-ão comunistas um após o outro."
A partir de então Diem conquistou a colaboração aberta dos EUA, primeiro em armas e dinheiro e depois em instrutores militares. Diem reprimiu as seitas sul-vietnamitas, indispôs-se com os budistas e perseguiu violentamente os nacionalistas e comunistas, além de conviver, como bom déspota oriental, com uma administração extremamente nepótica e corrupta. Em 1956, para solidificar ainda mais o projeto de contenção ao comunismo, especialmente contra a China, o secretário John Foster Dulles criou, em Manilla, a OTASE (Organização do Tratado do Sudeste Asiático), para servir de suporte ao Vietnã do Sul.
A segunda guerra da Indochina
A Guerra Civil e a intervenção americana
Com as perseguições desencadeadas pela ditadura Diem, comunistas e nacionalista formaram, em 1960, uma Frente de Libertação Nacional (FLN), mais conhecida como Vietcong, e lançaram-se numa guerra de guerrilhas contra o governo sul-vietnamita. Em pouco tempo o ditador Diem mostrou-se incapaz de por si só vencer seus adversários. O presidente Kennedy envia então os primeiros "conselheiros militares" que, depois de sua morte em 1963, serão substituídos por combatentes. Seu sucessor, o presidente L.Johnson aumenta a escalada de guerra, depois do incidente do Golfo de Tonquim, em setembro de 1964. Esse incidente provou-se posteriormente ter sido forjado pelo Pentágono para justificar a intervenção. Um navio americano teria sido atacado por lanchas vietnamitas em águas internacionais (na verdade era o mar territorial norte-vietnamita), quando patrulhava no Golfo de Tonquim. Assim os norte-americanos consideraram esse episódio como um ato de guerra contra eles, fazendo com que o Congresso aprovasse a Resolução do Golfo de Tonquim, que autorizou o presidente a ampliar o envolvimento americano na região.
Aumento da escalada americana no Vietnã (em soldados)
1960
900
1962
11.000
1963
50.000
1965
180.000
1967
389.000
1969
540.000
Em represália a um ataque norte-vietnamita e vietcong a base de Pleiku e Qui Nhon o presidente Johnson ordena o bombardeios intenso do Vietnã do Norte. Mas as tentativas de separar o Vietcong das suas bases rurais fracasssa, mesmo com a adoção das chamadas "aldeias estratégicas" que na verdade eram pequenas prisões onde os camponeses deveriam ficar confinados.
A reação contra a guerra e a contra-cultura
A participação crescente dos EUA na Guerra e a brutalidade e inutilidade dos bombardeios aéreos - inclusive com bombas napalm - fez com que surgisse na América um forte movimento contra a guerra. Começou num bairro de São Francisco, na Califórnia, o Haight - Aschbury, com "as crianças das flores" (flower children), quando gente jovem lançou o movimento "paz e amor" (peace and love), rejeitando o projeto da Grande Sociedade do pres. Johnson.
A partir de então tomou forma a movimento da contra-cultura - chamado de movimento hippy - que teve enorme influência nos costumes da geração dos anos 60, irradiando-se pelo mundo todo. Se a sociedade americana era capaz de cometer um crime daquele vulto, atacando uma pobre sociedade camponesa no sudeste asiático, ela deveria ser rejeitada. Se o americano médio cortava o cabelo rente como um militar, a contracultura estimulou o cabelo despenteado, cumprido, e de cara com barba. Se o americano médio tomava banho, opunham-se a ele andando sujos. Se aqueles andavam de terno e gravata, aboliram-na pelo brim e pela sandália. Repudiaram também a sociedade urbana e industrial, propondo o comunitarismo rural e a atividade artesanal, vivendo da fabricação de pequenas peças, de anéis e colares. Se o tabaco e o álcool era a marca registrada da sociedade tradicional, aderiram à maconha e aos ácidos e as anfetaminas. Foram os grandes responsáveis pela prática do amor livre e pela abolição do casamento convencional e pela cultura do rock. Seu apogeu deu-se com o festival de Woodstock realizado no Estado de N.York, em 1969.
A revolta instalou-se nos Campi Universitários, particularmente em Berkeley e em Kent onde vários jovens morrem num conflito com a Guarda Nacional. Praticamente toda a grande imprensa também se opôs ao envolvimento. Surgiu entre os negros os Panteras Negras (The Black Panthers) um expressivo grupo revolucionário que pregava a guerra contra o mundo branco americano da mesma forma que os vietcongs. Passeatas e manifestações ocorriam em toda a América. Milhares de jovens negaram-se, pela primeira vez na história do país, a servir no exército, desertando ou fugindo para o exterior.
Esse clima espalhou-se para outros continentes e, em 1968, em março, eclodiu a grande rebelião estudantil no Brasil contra o regime militar, implantado em 1964, e em maio, na França, a revolta universitária contra o governo do Gen. de Gaulle. Outras ainda ocorreram no México e na Alemanha e Itália. O filósofo marxista Herbert Marcuse afirmou que a revolução seria feita doravante pelos estudantes e outros grupos não assimilados pela sociedade de consumo conservadora.
A ofensiva do Ano Tet e o desengajamento
Em 30 de janeiro de 1968, os vietcongs fizeram uma surpreendente ofensiva - a ofensiva do Ano Tet (o ano lunar chinês) - sobre 36 cidades sul-vietnamitas, ocupando inclusive a embaixada americana em Saigon. Morreram 33 mil vietcongs nessa operação arriscada, pois expôs quase todos os quadros revolucionários, mas foi uma tremenda vitória política. O gen. Wetsmoreland, que havia dito que "já podia ver a luz no fim do túnel", predizendo uma vitória americana para breve, foi destituído, e o presidente Johnson foi obrigado a aceitar negociações, a serem realizadas em Paris, além de anunciar sua desistência de tentar a reeleição. Para a opinião pública americana tratava-se agora de sair daquela guerra de qualquer maneira. O novo presidente eleito, Richard Nixon, assumiu o compromisso de "trazer nossos rapazes de volta", fazendo com que lentamente as tropas americanas se desengajassem do conflito. O problema passou a ser de que maneira os Estados Unidos poderiam obter uma "retirada honrosa" e manter ainda o seu aliado, o governo sul-vietnamita.
Desde 1963, quando os militares sul-vietnamitas, apoiados pelos americanos, derrubaram e mataram o ditador Diem (aquela altura extremamente impopular), os sul-vietnamitas não conseguiram mais preencher o vácuo de sua liderança. Uma série de outros militares assumiram a chefia do governo transitoriamente enquanto os combates mais e mais eram tarefa dos americanos. Nixon passou a reverter isso, fazendo com que os sul-vietnamitas voltassem a ser encarregados das operações. Chamou-se isso de "vietnamização" da guerra. Imaginou que abastecendo-os o suficiente de dinheiro e armas eles poderiam lutar sozinhos contra o vietcong. Transformou o presidente Van Thieu num simples títere desse projeto. Enquanto isso as negociações em Paris marcavam passo. Em 1970, Nixon ordenou o ataque a célebre trilha Ho Chi Minh que passava pelo Laos e Camboja e que servia como estrada de abastecimento do vietcong. Estimulou também um golpe militar contra o neutralista príncipe N.Sianouk do Camboja, o que provocou uma guerra civil naquele país entre os militares direitistas e os guerrilheiros do Khmer Vermelho (Khmer Rouge) liderados por Pol Pot.
A derrota e a unificação
Depois de imobilizarem militarmente as forças americanas em várias situações, levando-as a serem retiradas do conflito, os norte-vietnamitas de Giap, juntamente com os vietcongs, prepararam-se para a ofensiva final. Deixaram de lado a guerra de guerrilhas e passaram a concentrar suas forças para um ataque em massa. Desmoralizado, o exército sul-vietnamita começou a dissolver-se. Haviam chegado a 600 mil soldados, mas reduziu-se apenas a um punhado de combatentes. Em dezembro de 1974, os nortistas ocupam Phuoc Binh, a 100 quilômetros de Saigon. Em janeiro de 1975 começou o ataque final. O pânico alcança os sul-vietnamitas que fogem para as cercanias da capital. O presidente Thieu embarca para o exílio e os americanos retiram o resto do seu pessoal e grupos de colaboradores nativos. Finalmente, no dia 30 de abril, as tropas nortistas ocupam Saigon e a rebatizam como Ho Chi Minh, em homenagem ao líder falecido em 1969. A unificação nacional foi formalizada em 2 de julho de 1976 com o nome de República Socialista do Vietnã, 31 anos depois de ter sido anunciada. Mais de um milhão de vietnamitas perecem enquanto que 47 mil mortos e 313 mil feridos ocorreram pelo lado americano, a um custo de US$ 200 bilhões.
Consequências da guerra
O Vietnã foi o país mais vitimado por bombardeios aéreos no século XX. Caíram sobre suas cidades, terras e florestas, mais toneladas de bombas do que as que foram lançadas na II Guerra Mundial. Para tentar desalojar os guerrilheiros das matas foram utilizados violentos herbicidas - o agente laranja - que dizimou milhões de árvores e envenenou os rios e lagos do país. Milhares de pessoas ficaram mutiladas pelas queimaduras provocadas pelas bombas de napalm e suas terras ficaram imprestáveis para a lavoura. Por outro lado, aqueles que não aceitaram viver no regime comunista fugiram em precárias condições, tornaram-se boat people, navegando pelo Mar da China em busca de um abrigo ou vivendo em campos de refugiados em países vizinhos. O Vietnã regrediu economicamente a um nível de antes da II Guerra Mundial. Os Estados Unidos por sua vez saíram moralmente dilacerados, tendo que amargar a primeira derrota militar da sua história. Suas instituições - a CIA e o Pentágono - foram duramente criticadas e um de seus presidentes, Richard Nixon, foi obrigado a renunciar em 1974, depois do escândalo de Watergate. Nunca mais o establishment americano voltou a ganhar a integral confiança dos cidadãos.
Fonte: http://www.algosobre.com.br/historia/guerra-do-vietna.html