Cidadão Americano, Cidadão do Mundo.
Cristóvão Colombo é considerado o descobridor não só do Novo Continente, a América, mas também de seu mais reputado alimento, o Milho. Rico em lipídios, proteínas, vitaminas (A e C) e carboidratos, esse cereal branco ou amarelo, protegido por camadas de folhas fibrosas, era há muito tempo a principal fonte de energia consumida pelos índios americanos.
O modo mais comum de utilização do milho pelos nativos americanos era como farinha ou fubá. Depois de pilado, o cereal era então fervido e comido como polenta ou ainda, transformado em deliciosas tortilhas e massas comestíveis que faziam a festa dos Mexicas (ou Astecas), Maias, Incas e demais povos da região centro-americana e andina. Essas tradições foram preservadas até os dias de hoje e esses alimentos derivados do milho continuam sendo muito populares.
Além das mencionadas tortilhas e polentas, também é comum o consumo do milho cozido temperado apenas com sal (aos quais algumas pessoas gostam de adicionar manteiga) ou ainda assado na grelha (sendo que em algumas regiões coloca-se a espiga no fogo sem que se retire a palha). Recomenda-se que o Milho Verde seja sempre comprado com a palha que o recobre intacta, pois o açúcar contido em seus grãos se transforma em amido quando se retira sua camada protetora que é justamente essa palha.
Entre os povos que o consumiam regularmente nas Américas deve ser dado um destaque todo especial aos Maias, Astecas e aos Incas, civilizações desenvolvidas que foram encontradas nas Américas pelos europeus. Seus habitantes tinham muitos conhecimentos em astronomia, arquitetura, matemática, irrigação, agricultura, drenagem, artesanato e economia, entre outras. Destaque-se também que souberam se apropriar dos elementos naturais que lhes eram fornecidos nas regiões em que se estabeleceram para não apenas sobreviver, e sim, para viver de forma confortável e majestosa.
As tortilhas produzidas à base de milho constituíam uma das principais fontes alimentares dos Maias, Incas e Astecas.
Muito ligados à religiosidade, costumavam atribuir os ciclos da natureza a seus deuses. Como conseqüência disso, a fertilidade dos solos, o período de chuvas, a época apropriada para o plantio ou o momento exato de colher seus alimentos eram motivo de festas e celebrações rituais em agradecimento pela fartura.
Nesse sentido o milho ou maiz era o principal motivo de satisfação e orgulho desses povos. Para obter o milho e os outros alimentos basilares de sua alimentação, essas avançadas civilizações pré-colombianas tiveram que desenvolver técnicas agrícolas que solucionassem as dificuldades encontradas em seus territórios.
Os Astecas, por exemplo, construíram canais, ilhas artificiais flutuantes (conhecidas como chinampas) e drenaram ou irrigaram as regiões onde esse trabalho era necessário. Os Incas lidaram com terrenos montanhosos onde criaram um engenhoso sistema de plantio nas encostas que evitava a erosão e o desgaste do solo. Em ambos os casos há registros de que o principal alimento a ser preservado e produzido era justamente o milho.
O que também chamou muito a atenção dos conquistadores espanhóis que dominaram essas civilizações foram os mercados públicos onde se vendiam muitos e muitos produtos, alguns conhecidos pelos europeus e outros totalmente desconhecidos, como é o caso do próprio milho, do cacau (e consequentemente do chocolate), do tomate e de várias espécies de pimentas. O mercado principal da maior cidade asteca, Tenochtitlán, acomodava 5 mil barracas vendendo produtos e tinha uma circulação de aproximadamente 60 mil pessoas por dia.
O consumo de milho e dos produtos feitos a base desse cereal eram parte do cotidiano das civilizações pré-colombianas que dominaram a América Central, o México e a América Andina.
Incas, Maias e Astecas ficaram historicamente conhecidos como “civilizações do milho” por sua relação tão intensa e mística com esse cereal. Conta-se que, a despeito da luxuosidade das refeições dos líderes desses povos, o dia a dia era pautado em refeições simples, onde o granturco (milho em italiano) era presença obrigatória.
O maïs (milho em francês), quando fresco, dura cerca de três dias sob refrigeração. Como o processo de resfriamento é contemporâneo, esse alimento também se destacou entre os povos antigos por poder ser estocado quando maduro. Era então colocado em local seco e protegido onde acabava sendo guardado durante algum tempo e servia para sustentar as comunidades em períodos de escassez e fome. O controle desses estoques de alimentos, entre os quais o milho, também se tornava fonte de poder e autoridade dos imperadores e reis em relação a seus povos.
Apesar de destacado em praticamente todas as referências como um alimento típico das Américas, o milho, a partir de algumas de suas variedades, é mencionado na história desde a Antiguidade. A partir de escritos do romano Plínio, o Velho - há menções ao uso e consumo do milho miúdo (milium) e do milhete (panicum) entre os etruscos, célebres e desenvolvidos ancestrais dos romanos. Não se tratava, evidentemente, do milho verde encontrado em terras americanas, mas é importante lembrar esse registro tão antigo sobre parentes próximos do Zea Mays (nome científico).
As menções ao milhete e ao milho miúdo na história européia não se restringem a Idade Antiga e aos Etruscos e Romanos, estendem-se também ao Medievo. Nesse outro período verifica-se que o consumo desses cereais constituiu um adendo alimentar expressivo para alguns períodos do ano, particularmente para as épocas de crise.
Somente a partir da chegada de Colombo e de outros navegadores europeus a América é que o mundo extra-americano veio a conhecer o milho. Por esse motivo alguns historiadores notórios como Fernand Braudel chamaram as Américas de Civilização do Milho.
É, no entanto, a partir da visita de Colombo que o milho que conhecemos embarca em direção a Europa de forma definitiva para se tornar cidadão do mundo. Na Europa da Modernidade o consumo do milho se consolidou primeiramente entre as pessoas mais humildes. A elite européia, constituída pelos nobres e burgueses, reagia de forma discriminatória em relação a um cereal que também era utilizado como ração animal e, por esse motivo, só se renderia aos encantos do Corn (milho em inglês) algumas décadas depois da plebe.
Entre a população mais pobre dessa Europa Moderna (séculos XV a XVIII), a utilização do milho se deu principalmente enquanto farinha grossa que dava substância e sustentação a sopas, papas e guisados confeccionados em suas pobres residências. A aceitação se deu principalmente a partir da Itália, onde o milho verde rapidamente suplantou seus antecessores (milhete e milho miúdo) e fez surgir uma das maiores tradições gastronômicas da Bota, a polenta.
Os franceses, que também acabaram aderindo ao consumo do milho americano a partir do século XVII, fabricavam a partir de sua farinha grossa ou mesmo do fubá uma iguaria conhecida como milhade ou millasse. Ao se espraiar pelo Velho Continente ao longo dos séculos XVIII e XIX, o milho juntamente com a Batata acabou também ajudando a resolver um dilema fundamental dos novos tempos, ou seja, como aumentar a produção de alimentos a ponto de abastecer os cada vez mais densamente povoados centros urbanos surgidos na esteira das revoluções burguesas.
As polentas celebrizaram-se a partir da Itália, país europeu que melhor acolheu o milho. No Brasil, além das polentas e do cuscuz, celebrizaram-se as sobremesas a base desse aclamado cereal, como o curau, o creme de milho, as pamonhas, os bolos de milho verde...
Atualmente o milho é utilizado na confecção de pratos doces e salgados das mais variadas espécies. Do fubá surgem pratos deliciosos como o cuscuz, pães, bolos e polentas. Há também as pamonhas, o curau, o creme de milho ou ainda saborosos sucos e sorvetes. Além desses acepipes devemos destacar que o milho é utilizado para a confecção de subprodutos como óleo de milho, xarope de milho, farinha de milho e até bebidas destiladas.
Na história do Brasil há informações a respeito do milho desde a chegada dos portugueses. Era também uma das bases alimentares de nossa terra juntamente com a mandioca, se bem que, diferentemente dos demais povos americanos, tinha importância secundária quando comparado ao pão da terra dos índios tupi-guaranis, muito mais ligados à chamada Rainha do Brasil, como era conhecida a Mandioca.
Os portugueses não demoraram - como os espanhóis em outras regiões americanas - a se apropriar do milho tanto para seu próprio consumo como também para a alimentação de seus animais. Em 1618, conforme nos diz Câmara Cascudo, “o milho dava bolos, havendo ovos, leite, açúcar e a mão da mulher portuguesa para a invenção”. O que não se pode negar, definitivamente, é que a partir de suas matrizes americanas, o milho ganhou o mundo e se tornou, sem dúvida alguma, um dos mais importantes alimentos de que se tem notícia.
Fonte: Planeta Educação