12.12.11

A guerra e a racionalização assassina

Na foto de 2008, iraquiano passa em frente a prédio destruído na cidade de Fallujah, a cerca de 50 quilômetros da capital Bagdá. Fallujah foi .... Foto: Ali Al-Saadi/AFP
Na foto de 2008, iraquiano passa em frente a prédio destruído na cidade de Fallujah, a cerca de 50 quilômetros da capital Bagdá. Fallujah foi praticamente demolida durante os ataques americanos em 2004

A qualquer um causa espanto e indignação que soldados de países tidos como civilizados possam cometer seguidas atrocidades. Atacar prédios civis com bombas incendiárias, tocar fogo em casebres de camponeses pobres, metralhar aleatoriamente a população das aldeias ou mesmo de cidades grandes, lançar bombas e mísseis contra alvos imprecisos e, em meio a tudo isto, ficar imperturbável, sem um átimo de sentimento de culpa ou ultrajado com a covarde missão recebida.

Imunes ao sofrimento
Como isto é possível? Como indivíduos que frequentaram a escola na Europa e nos Estados Unidos, chegando inclusive a cursos superiores, normalmente vindos de lares de famílias religiosas e que se manifestam orgulhosos da sua cultura, tendo muitos deles lido os clássicos, fiquem tão insensíveis à dor e ao sofrimento generalizado que suas ações militares provocam?

Mesmo sabendo que suas bombas causarão enorme devastação quando lançadas de centenas de quilômetros de altura, ainda que, em seguida, em voos rentes ao chão, vejam as choupanas queimadas, os prédios em ruínas, os corpos dilacerados e estraçalhados pelos foguetes, nada disto os perturba, nada os demove. Poucos, raríssimos têm sido os casos daqueles que se negam a tal tipo de operação.

Vão, assassinam friamente a população e, depois de um tempo, retornam para casa, para o acolhimento familiar e para o desfile com honra nos dias patrióticos, ostentando uma medalha de herói no peito e garantidos por uma generosa pensão. Quando, mais tarde na vida, se põem a escrever suas façanhas de guerra, nunca se encontram remordimentos em suas páginas. As lembranças concentram-se nos "feitos", nas "operações", nas baixas provocadas no inimigo, e quando há uma demonstração de algum sentimento de perda ou de dor o é pelo companheiro de farda caído, nunca pelas vitimas civis que causaram. Ou quando tal registro é feito, se é que é feito, sempre merece ser debitado na conta do "engano", do "efeito colateral", de uma ordem mal compreendida.

Nunca há intencionalidade assassina na ação militar, portanto, não há remorso. Todo e qualquer horror provocado sempre está amparado na pronta racionalização, nas necessidades da pátria na luta contra o adversário atroz, no empenho a favor de uma ideia nobre, na defesa da nacionalidade ou da raça ameaçada. Como isto é possível? Que imunidade moral protege estas pessoas de serem atormentadas pela culpa? (*)

(*) Exemplo desta amoralidade é o livro do major-general australiano Jim Molan com o título de Running the War in Iraq, que registrou os efeitos da operação "Phantom Fury¿, que levou ao total arrasamento Fallujah, a "cidade das mesquitas", situada às margens do Eufrates, provocando milhares de mortos entre março e dezembro de 2004.

Fonte:

VOLTAIRE SCHILLING