9.2.14

Revolução Mexicana: Cordova e Paz


Revolução Mexicana: Cordova e Paz

Para que se possa compreender os processos históricos ocorridos na America Latina é fundamental fazer um levantamento a respeito de seu contexto geral e suas especificidades como objeto de estudo da história. É necessário ter conhecimento sobre a produção historiográfica latino-americana procurando relacionar as suas obras e seus autores com o seu tempo e lugar. O presente artigo tem o objetivo de demonstrar duas diferentes visões sobre a Revolução Mexicana (1910). Serão abordados textos deArnaldo Córdova (1980, 1989) e Octavio Paz (1976) no sentido de tentar apontar seus distanciamentos e aproximações como pensadores latino-americanos.

Por meio da análise dos argumentos de Paz (1976) é possível identificar como o autor defende aRevolução Mexicana como um processo “natural”, um fato singular, sem programa prévio ou planejamento antecedente que a objetivasse e sem estruturação para criar-se um projeto modernizador futuro pós-revolução.

Por outro lado, Arnaldo Córdova (1980, 1989) constrói um argumento considerando as diversas “influências históricas” que teriam possibilitado a formulação e difusão de ideias que levariam a formulação de um projeto revolucionário no México.

Ambos os autores partem das críticas que emergem sobre o governo de Porfírio Diaz, e apesar de concordarem quanto ao fato de ter sido um período problemático da história do país – envolto em violência e repressão -, têm abordagens bem distintas quanto ao mesmo.

O debate dos autores perpassa por umas das questões centrais nas discussões sobre as temáticas da America Latina: a identidade nacional pós-independência. Para Córdova todo o período porfirista converge na Revolução Mexicana e sua motivação parte da adesão das massas ao movimento, enquanto que Paz defende que aqui não houve o desenvolvimento das estruturas “modernas” que levassem a formação de uma burguesia e um proletariado possibilitando assim a via revolucionária tradicionalmente articulada por essas classes. Além disso, para Paz, as relações desgastadas com a antiga colônia levaram à fragmentação política do país na independência e à estagnação no desenvolvimento da “modernidade” durante o porfirismo que, somente será superada com a ruptura total propiciada por um movimento de revolução autêntico, nativo.

Córdova se apresenta contrário a ideia de que a Revolução Mexicana se deu diante de um surgimento “natural” e desconexo de acontecimentos predecessores, sua proposição é de que o país recebeu influência de diversos outros eventos passados e contemporâneos como também de movimentos ideológicos e pensamentos políticos que levaram a formação dos elementos revolucionários. Além de ressaltar que setores médios urbanos se utilizaram das massas como ferramenta política. Torna-se perceptível que Córdova contempla certas permanências nas práticas políticas pós-independência que, como em uma seqüência lógica, levaram a constituição de uma elite burguesa juntamente com uma massa proletária e rural, os pilares da revolução.

Para o autor a presença e participação política das massas existiram de fato – mesmo como uma ferramenta política dos setores médios urbanos, como mencionado anteriormente – e foram cruciais ao movimento revolucionário. Ele destaca que em diversos países da America Latina os processos de independência não levaram a formação de classes ligadas à massa que dessem sustentação a instituições estáveis e fortes que mantivessem sua representatividade, porém:


En Mexico, por El cotrario, La irrupcion de las masas trabajadoras em La política nacional, através de La revolución de 1910 a 1917, aparte de que trajo aparejada, com em ninguna outra parte del continente, La más completa destrución del antiguo Estado oligárquico y de su sistema econômico, provocando com elo La mayor comoción social experimentada por America Latina desde lãs guerras de Independencia, constituyó además El móvil, La causa y La plataforma sobre La que se levanto um Estado cuyo poderio sobre La sociedad y cuya estabilidad siempre han sido reconocidos como sus características más notables. (CORDOVA, 1980: 59).

O autor não faz uma problematização acerca de uma possível incoerência entre um poder centralizador, ditatorial e a revolução das massas, pelo contrario, a revolução necessariamente surgiria da emergência deste poder. Além disto, o autor coloca este poder central como a forma que o Estado encontrou de se manter estável, de impedir que a massa insurgente aderisse ao que considera subversão: o zapatismo, anarquia etc. Segundo o autor a Revolução Mexicana foi:


[...] um gran debate ideológico en el que no sólo se puso en discusión nuestro ser nacional, el sentido de nuestra historia, la organización y la composición de nuestra sociedad, la idea del gobierno de la misma, las injusticias que prevalecian en la organización social, el tipo de desarrollo económico, político y cultural que debía promoverse, las classes sociales e los componentes etnicos de la sociedad mexicana, el sistema nacional de relaciones de propriedad y de produción, los valores a los cuales se debían los mexicanos y aquellos que debían sobresalir para consumar nuestra formación nacional. (CORDOVA, 1980: 56).

Octavio Paz, de maneira distinta de Cordova, aponta para os problemas dessa narrativa histórica que apresenta a Revolução Mexicana como um desenvolvimento do processo de independência. O autor afirma que o regime porfirista foi um atraso, uma estagnação política e econômica, uma descontinuidade no desenvolvimento pleno da nação. Segundo ele, a nação fragmentada, formada por revolucionários não intelectuais, ou seja, que não haviam sofrido influência do pensamento liberal estrangeiro teve como cerne da revolução um ideal nativista, singular, historicamente autentico. Isto se daria, ainda segundo o autor, devido ao relativo isolamento do país no âmbito internacional, pois não conseguia estabelecer relações políticas satisfatórias com EUA e nem com os países europeus que eram pontos centrais do desenvolvimento do capitalismo, acarretando duplamente no seu dito atraso e na possibilidade de se re-criar como uma nação com princípios e valores próprios.


Na literatura revolucionária do México, do final do século passado até 1917, não se usa a terminologia socialista européia; e é porque o nosso movimento social nasceu do próprio solo, do coração sangrando do povo e fez-se drama doloroso e ao mesmo tempo criador. A ausência de precursores ideológicos e a escassez de vínculos com uma terminologia universal constituem traços característicos da Revolução e a raiz de muitos conflitos e confusões posteriores. (PAZ, 1976: 124).

Para Paz a revolução mexicana foi mais um movimento social devido a situação instável e de fragilidade do governo porfirsta, do que um ato revolucionário arquitetado. Isso devido à própria simplicidade das contestações da revolução que estavam ligadas diretamente a redistribuição de terras e a resolução objetiva de problemas mais imediatos das classes emergentes do que a um debate político-ideologico mais sofisticado como argumenta Cordova.


Nosso movimento se distingue pela carência de um sistema ideológico prévio e pela fome de terras. Os camponeses mexicanos fazem a revolução não somente para obter melhores condições de vida, mas também para recuperar as terras que, no decorrer da Colônia e do século XIX, os colonos e os latifundiários lhes tinham arrebatado. (PAZ, 1976: 128).

Portanto, viu-se que os dois pensadores assumem posicionamentos distintos diante deste mesmo processo histórico, contudo entram em concordância em alguns pontos. Evitando cair na infrutífera discussão sobre quem está certo ou errado, sobre quem esta falando a verdade ou mentira, tenta-se afastar-se de tais posicionamentos bipolares e defende-se aqui a necessidade de historicizar a Revolução Mexicana e buscar compreender suas diferentes interpretações em seus próprios tempos históricos. Entre um movimento histórico processual causal e um insurgente natural singular, é possível que a Revolução do México tivesse em sua ideologia apropriações externas como também pensamentos, releituras e adaptações que as tornaram possíveis e originais dentro de seu próprio contexto histórico, este sim singular.

Referências Bibliográficas

CORDOVA, Arnaldo. Cap.II: México. Revolución burguesa y política de massas in Interpretaciones de La revolución mexicana. Editorial Nueva Imagen S. A. México 1980.

CORDOVA, Arnaldo. Prólogo, Cap.III :La lucha ideológica em La Revolución Mexicana in La revolución y el Estado en México. Editorial Nueva Imagen S. A. México 1989.

PAZ, Octavio. Cap. VI: Da Independência a Revolução in O Labirinto da Solidão e Post-Scriptum. Tradução de Eliane Zargury. Rio de Janeiro, Paz e Terra 1976.

Fonte: http://www.sobrehistoria.org/revolucao-mexicana-cordova-e-paz/

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