26.1.12

Jurema Sagrada

Os poderes atribuídos à jurema organizam uma religião típica do Nordeste brasileiro.


Desde os primeiros tempos da colonização, vários cronistas e observadores falam sobre o desenvolvimento de rituais ligados à população indígena. Por meio de cantos, danças, infusões, cachimbos e dizeres sagrados, os índios se colocavam em contato com seus antepassados e com outros seres do plano espiritual. Logicamente, aos olhos dos colonizadores e dos jesuítas, tais práticas eram um grande empecilho à divulgação da fé cristã em terras brasileiras.

Nesse conjunto de manifestações, a jurema sagrada, jurema nordestina ou catimbó, aparece como uma religião indígena, mas também influenciada por elementos dos cultos cristãos e afro-brasileiros. Antes de tudo, a jurema é uma árvore da caatinga e do agreste que tem sua casca utilizada para a fabricação de uma bebida mágica que concede força, sabedoria e contato com seres do mundo espiritual. É dessa forma que o uso da árvore desencadeia a formulação de uma experiência religiosa com mesmo nome.

Ao longo do tempo, a Jurema incorporou uma série de influências que impedem a formulação de um padrão ritualístico mais extenso. Assim, definimos como praticantes da Jurema todos aqueles que se reúnem em terreiros ou casas para realizarem a ingestão da bebida feita a partir da árvore, empregando o uso de tabaco e buscando o contato com um mundo espiritual alcançado através do transe. No mais, observamos variações que abraçam desde os elementos da Umbanda até o Cristianismo Católico.

Nos cultos da Jurema temos a figura dos mestres que ocupam a função de líderes, responsáveis pela incorporação de espíritos que curam e aconselham os praticantes, mais conhecidos como “juremeiros”. Além de fornecedora de um elo com o chamado “reino dos encantados”, a jurema é considerada poderosa por ter, nos tempos bíblicos, escondido Jesus Cristo quando este fugia para o Egito. Ao entrar em contato com o pé de jurema, o Salvador teria lhe preenchido com poderes diversos.

A fabricação da bebida sagrada conta com uma mistura que leva cascas de jurema e uma espécie de vinho preparado com álcool, mel, gengibre, hortelã, cravo e canela. Segundo alguns pesquisadores, a ingestão oral desta mistura não provoca nenhum tipo de transformação em quem a ingere. Dessa forma, tudo indica que os procedimentos ritualísticos que envolvem a ingestão, são indispensáveis para que a fórmula preparada determine o estado de transe.

As duas entidades incorporadas em uma sessão de jurema são os mestres que já se foram e os caboclos. O reconhecimento dessas entidades acontece através da observação dos gestos e falas, que o incorporado assume assim que começa dar voz a um determinado ser do mundo espiritual. Nesse âmbito, o mundo dos espíritos construído pela jurema era formado por várias cidades, sendo que cada um deles tinha capacidade de atender uma espécie de pedido.

Cercada por uma série de instrumentos, a sessão de Jurema é sonoramente povoada pela execução da maraca (um chocalho indígena feito de cabaça) e o ilu (uma espécie de tambor). Sem um conteúdo fixo, a jurema oferece os seus ditos “segredos” de forma especial a cada um dos “enjuremados”. Dispostos em uma mesma roda, os participantes deste ritual pontuam mais uma das várias religiões que determinam a diversidade da cultura brasileira.


Por Rainer Sousa
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