19.9.13

Casamento em Roma: direito e dever de todo cidadão



Na cidade dos césares, o casamento era condição imprescindível para a manutenção da comunidade. Por isso, os solteiros eram até multados




BIBLIOTECA DO VATICANO

A celebração do casamento era um ato familiar, e não uma cerimônia religiosa.As núpcias de Aldobrandini (detalhe), afresco.

Casar é necessário ou não? Essa alternativa, que pode parecer totalmente banal, não encontra espaço em Roma: somente alguns irredutíveis contestadores (como os poetas Horácio ou Propércio) ousaram questionar a necessidade da união conjugal, uma vez que, para os cidadãos, o casamento era um dever que permitia o nascimento de filhos legítimos que poderiam herdar o patrimônio familiar. O matrimônio era, portanto, imprescindível à manutenção da comunidade social, e não uma união resultante da atração entre dois jovens. Era antes de tudo um acordo feito entre duas famílias.

Em Roma, o casamento era um direito cívico reservado aos cidadãos e às filhas dos cidadãos. Os demais moradores das fronteiras do império não tinham a possibilidade de se casar legalmente: eles só podiam contrair uniões qualificadas como concubinagem. Determinadas condições eram necessárias para a formação de um casal legítimo: interdição do incesto (mesmo sendo frequentes as uniões entre primos, sobretudo entre os germânicos), monogamia (no entanto, muitos homens abrigavam em seu domicílio uma concubina, que convivia com a esposa legítima), idade mínima legal (12 anos para as moças; 14 anos para os rapazes), consentimento dos futuros esposos e estabelecimento de um contrato entre as duas famílias.

Uma vez que o casamento era considerado indispensável à sobrevivência da sociedade, algumas leis instituídas por Augusto no ano 18 a.C. previam pesadas multas para os solteiros. Além disso, eles não podiam receber herança. E já que a procriação constituía a conclusão lógica do casamento, os homens casados e sem filhos eram também punidos de maneira similar.

MULHERES EMANCIPADAS Originalmente em Roma, o casamento era qualificado in manu, isto é, a mulher sob a autoridade do marido. Ela se tornava, por assim dizer, a filha deste último. No entanto, desde o século V a.C., o casamento in manu tendeu a desaparecer para dar lugar a uma união sine manu (sem autoridade): a mulher casada não passava mais da autoridade do pai à do marido, o que permitiria uma emancipação feminina em Roma.

A esposa dependia apenas de um tutor, escolhido fora de sua família, que podia ser trocado conforme sua vontade. A tutela se tornou uma formalidade que não trazia nenhum embaraço à liberdade da mulher. O casamento não era, então, em Roma, um fator de limitação aos direitos da mulher, uma notável exceção na Antiguidade.


ARLES MUSÉEE ARCHEOLOGIQUE

Escultura em sarcófago do séc. IV mostra um casal romano de mãos dadas: o “nó de Hércules”, na cintura da noiva, era desatado pelo marido na noite de núpcias.

A escolha dos cônjuges era importante, já que comprometia o futuro das duas famílias. Eram as considerações sociais que determinavam a decisão dos pais. Na eleição do futuro marido, quatro fatores deviam ser levados em conta, segundo o bispo Isidoro de Sevilha: a família, a coragem, a beleza e a sabedoria. Numa moça, quatro qualidades são apreciadas: a beleza, a família, as riquezas e os bons costumes.

Os “arranjadores de casamentos” apresentavam os candidatos que respondessem a tais critérios. O escritor Plínio, o Jovem. Desempenhou muito frequentemente a função de intermediador para apresentar jovens a seus amigos “para todo tipo de relacionamento”. Evidentemente, nas famílias da aristocracia e da alta burguesia, eram concluídas alianças no seu meio social. Contudo, os “casamentos desiguais” eram, por vezes, ditados pelos interesses. O todo-poderoso chefe do partido popular, Mário, de origem muito humilde, pôde assim esposar Júlia, jovem da família aristocrática dos Césares.

Eram geralmente os pais de família que tomavam a decisão de casar os filhos. Mas, em Roma, as mães tinham direito à palavra. Elas não se privavam de impor sua escolha. Como Terência, esposa de Cícero, que elegeu para o terceiro casamento da filha Túlia seu candidato, Dolabela, a despeito das reticências de seu marido. Desnecessário dizer que os futuros casados não eram sequer consultados.

Os dois esposos podiam ter uma grande diferença de idade. A filha de César, Júlia, não tinha nem 20 anos quando foi concedida em casamento a Pompeu, que já tinha passado dos 50. Cícero, com 60 anos de idade, desposou em segundas núpcias sua pupila Publília, ainda púbere. Antes do casamento, os esponsais (sponsalia) constituíam uma etapa importante e obrigatória. Podiam ser concluídos quando os futuros casados eram ainda crianças. O futuro imperador Tibério tinha 7 anos quando seus pais decidiram contratar seu casamento com a pequena Vipsânia Agripina, de apenas 1 ano de idade. Se, antes do casamento, uma das duas famílias rompesse seu compromisso, poderia ser processada e obrigada a pagar uma multa.

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Fonte: http://www2.uol.com.br/historiaviva/reportagens/casamento_em_roma_direito_e_dever_de_todo_cidadao.html