A necessidade de contar o tempo surgiu durante o Neolítico, quando os primeiros agricultores notaram a importância do exato conhecimento das estações do ano para o sucesso de suas plantações. A partir daí, cada cultura desenvolveu seu próprio sistema de contagem do tempo.
Os diversos sistemas de contagem do tempo, fundamentados em maior ou menor grau em diferentes fenômenos astronômicos, são chamados de "calendários". O calendário moderno é do tipo solar e baseia-se no movimento descrito pela Terra em torno do Sol.
Unidades de tempo
O calendário atual, estabelecido em 1582, incorporou unidades de tempo de diferentes origens históricas. A mais antiga divisão do tempo, o dia, definida pela alternância cíclica da luz solar e da escuridão da noite é, provavelmente, anterior a 8000 a.C.
Mais tarde surgiram os meses, definidos originalmente pelas fases da lua, e depois o ano, baseado no movimento aparente do sol e no ciclo das estações. O mais antigo calendário solar foi desenvolvido no Egito por volta de 2773 a.C. Esse calendário tinha 365 dias e era ainda usado pelos gregos do Egito Ptolemaico durante o Período Helenístico.
A divisão do mês em 4 semanas de 7 dias, invenção babilônica baseado em conceitos astrológicos e desenvolvida no século VII a.C., foi adotada pelos romanos na época do Império, provavelmente no século I d.C.
O calendário grego
τῶι δὲ πέμπτωι καὶ δεκάτωι ἔτει, ἐπὶ Χρυσίδος ἐν Ἄργει τότε πεντήκοντα δυοῖν δέοντα ἔτη ἱερωμένης καὶ Αἰνησίου ἐφόρου ἐν Σπάρτηι καὶ Πυθοδώρου ἔτι δύο μῆνας ἄρχοντος Ἀθηναίοις (...)
Tucídides, 2.2.1
Em época muito remota, o tempo era medido de forma muito simples, com base nas quatro estações do ano e em diversos outros fenômenos climáticos e astronômicos (v. Hes. Op. 381-93). Posteriormente, as póleis instituíram um calendário baseado nos meses lunares e no ano solar, ao qual davam o nome de alguma autoridade civil ou religiosa. O início do ano e o nome dos meses variava de pólis para pólis e Tucídides, em sua obra sobre a Guerra do Peloponeso, dá uma idéia da complexidade desse sistema (ao lado).
O calendário mais conhecido é o ateniense ou ático. O ano ático tinha doze meses lunares, com número variável de dias, e durava apenas 354 dias. Periodicamente, acrescentava-se um mês intercalar de 30 dias, logo depois do mês Ποσεδειών, com o nome Ποσεδειών β' (Posedeion II), totalizando então 384 dias. O ano começava no solstício[1] de verão (julho, no calendário moderno) e o mês, no primeiro dia da lua crescente. Não havia semanas, mas cada mês era dividido em 3 décadas de 9 ou 10 dias, conforme a duração do mês.
Eis um quadro dos meses lunares atenienses e sua correspondência aproximada com o calendário cristão de 2004-2005 (nesse ano não houve mês intercalar):
Por volta de -432, os calendários gregos tornaram-se mais precisos. Nesse ano, o astrônomo Meton de Atenas estabeleceu um ciclo de 19 anos, o ciclo metônico (19 anos = 235 lunações[1] = 6940 dias). Um mês suplementar era introduzido no 3º, 6º, 9º, 11º, 14º, 17º e 19º anos do ciclo, o que reduziu a diferença a cerca de 2 horas, ou 1 dia a cada 290 anos, feito notável para os padrões da época.
Os astrônomos Calipo (c. 330 a.C.) e Hiparco (190-126 a.C.) fizeram posteriormente correções no ciclo metônico, deixando-o cada vez mais exato. Calipo sabia que a duração do ano era em torno de 365 + 1/4 e multiplicou então o ciclo metônico por quatro, obtendo assim um ciclo de 76 anos com um número inteiro de dias. Ao eliminar um dia do quarto ciclo de 19 anos, (76 anos = 940 lunações = 27.759 dias) aumentou a precisão do ciclo metônico. Esse ciclo, dito ciclo calípico, usava os nomes do calendário ático para os meses e começou a ser contado no solstício[2] de verão de 330 a.C. (= 28 de junho) e foi logo adotado pelos astrônomos (ver Ptol. Alm. 1.2.12). Mais tarde, Hiparco determinou que a duração do dia era ligeiramente menor do que a calculada por Calipo, e propôs uma correção de um dia a cada quatro ciclos calípicos; o ciclo de Hiparco tem, portanto, 304 anos (= 3760 lunações = 111.035 dias).
Apesar dos esforços de Meton, Calipo e Hiparco, os ciclos padeciam, em grau maior ou menor, do eterno problema da discrepância entre a duração dos dias, dos meses lunares e do ciclo solar. Ademais, a adoção dos calendários baseados nesses ciclos não era universal. Depois da conquista romana, no entanto, as póleis gregas adotaram o calendário juliano.
O calendário juliano
Os romanos utilizavam primitivamente um calendário lunar, com adição periódica de um mês suplementar para compensar o atraso em relação às estações do ano, dependentes do ano solar. O método, extremamente rudimentar, acumulou em 47 a.C. uma diferença de 80 dias, gerando enorme confusão na vida civil e religiosa.
No ano seguinte, 46 a.C., o ditador romano Júlio César (100-44 a.C.) instituiu o calendário juliano, conforme as recomendações do astrônomo Sosígenes de Alexandria (séc. I a.C.):
- O ano de 46 a.C. teve a duração prolongada: 445 dias;
- O ano passou a ser calculado em 365,25 dias;
- Os doze meses passaram a ter duração diferente, quase igual à que têm até hoje;
- O primeiro dia do ano, antes situado em 15 de março, foi fixado em 1º de janeiro;
Em 1582, tornou-se necessário um pequeno ajuste, instituído pelo Papa Gregório III (1502-1585 d.C.), conforme as recomendações do astrônomo bávaro Christoph Clavius (1537-1612 d.C.):
- 10 dias do ano de 1582 foram suprimidos (o dia 4 de outubro foi seguido do dia 15 de outubro);
- Os anos terminados em "00" e não divisíveis por 400 deixaram de ser considerados bissextos (1700, 1800 e 1900 d.C., não foram bissextos; 2000 d.C., sim).
A Era Cristã
Para computar tempo superior a um ano, as antigas civilizaçõe utilizavam em geral a duração de reinados (Egito), a sucessão de magistrados (Roma Republicana), a enumeração das gerações (Grécia Arcaica), ou então um fato memorável, como por exemplo a fundação de Roma.
Durante o Império Romano, contava-se o tempo conforme a sucessão dos Cônsules[3] e também Ab Vrbe Condita (AVC), isto é, "desde a fundação da cidade de Roma". Mais tarde, a referência passou a ser o ano 284 d.C., data da posse do Imperador romano Diocleciano (240-313 d.C.).
Em 523, o monge católico Dionísio, o Pequeno, decidiu efetuar a contagem a partir do nascimento de Jesus Cristo. Ele calculou que o nascimento de Cristo havia ocorrido em 753 AVC, no dia 25 de dezembro, e fixou o início da "nova era" no dia 1º de janeiro do ano seguinte, o 754º da fundação de Roma.
O novo sistema cronológico não foi aceito de imediato, nem mesmo pela Igreja Católica. Finalmente admitido no século X d.C. pela Cúria Romana, foi gradualmente adotado pelas nações cristãs, assim como o calendário gregoriano.
Devido à adoção do calendário gregoriano e da Era Cristã pela maioria das nações não-cristãs a partir do século XIX d.C., muitos eruditos preferem empregar o termo "Era Comum" no lugar de "Era Cristã".
a.C. e d.C.
Sabe-se, hoje, que Dionísio, o Pequeno, cometeu um pequeno erro de cálculo: Jesus Cristo, na verdade, nasceu pouco antes de 749 AVC, quatro a oito anos antes da data "oficial". No entanto, por tradição, até hoje o ano 754 AVC continua sendo o "Ano 1" da Era Cristã.
Com a adoção quase universal do calendário gregoriano e da Era Cristã no Ocidente, os anos posteriores à data tradicional do nascimento de Cristo (assinalado com um "X" na linha do tempo abaixo) passaram a ser contados em ordem crescente, e os anos anteriores em ordem decrescente.
É costume, principalmente entre os historiadores modernos, utilizar as abreviações a.C., "antes de Cristo", e d.C., "depois de Cristo", para especificar se a data se refere à Era Cristã ou ao período anterior. Os países de língua inglesa também utilizam, para a Era Cristã, a sigla AD[4] antes do número: AD 1997.
Eis mais alguns conceitos úteis:
- Não existiu o "ano zero"; o dia 31 de dezembro de 1 a.C. foi seguido pelo dia 1º de janeiro de 1 d.C.
- Alguém nascido em março de 10 a.C. e morto em abril de 20 d.C. terá vivido, portanto, não 30 anos, e sim 29.
Regra: 10 + 20 - 1 (subtrai-se, naturalmente, o inexistente ano zero).
- O século compreende um período de 100 anos e é habitualmente representado por um algarismo romano; como não houve ano zero, o último ano de cada século d.C. termina sempre em "00", assim como o primeiro ano de cada século a.C.
- O milênio compreende um período de 1000 anos (o primeiro e o último ano são calculados como no caso do século).
Desse modo, o 2º milênio da Era Cristã termina em 31 de dezembro de 2000; o 3º milênio começa, portanto, em 1º de janeiro de 2001.
Convenções utilizadas no Portal
Adoto, em minhas páginas, uma variação do sistema usado pelos astrônomos para as datas anteriores à Era Cristã (ou Era Comum): números negativos. Você encontrará o ano 753 a.C., por exemplo, escrito deste modo: -753.
Os matemáticos acham desnecessário colocar o sinal "+" quando utilizam números posivos; do mesmo modo, não utilizo a notação "d.C." ou "AD" para datas posteriores à Era Cristã ou Comum. O ano 284 d.C., por exemplo, fica simplesmente assim: 284.
Algumas datas situadas na Pré-História são eventualmente referidas segundo a notação arqueológica "AP" (antes do presente, tradução do inglês "BP", before present). O ponto de partida desse método é, convencionalmente, o ano 1950 de nossa Era. Assim, -46 é o mesmo que 1996 AP.
Para assinalar nascimentos, mortes ou, simplesmente, um intervalo de tempo, utilizo uma barra inclinada para a direita: "Júlio César (-100/-44)"; "Idade do Bronze, -3000/-1100"; etc. Quando as datas são um tanto imprecisas, costumo colocar uma única referência temporal: "Sosígenes de Alexandria (séc. -I)".
Notas
- A lunação é o tempo médio decorrido para um ciclo lunar completo, i.e., que abrange todas as fases da lua. Dura, em média, 29,530589 dias, ou 29 dias, 12 horas, 44 minutos e 3 segundos. Nos calendários lunares, cada mês corresponde a uma lunação; a fase de referência é, em geral, a lua nova.
- O solstício, do latim sol, "sol", e sistere, "ficar fixo", é um evento astronômico que ocorre duas vezes por ano, quando a inclinação do eixo da terra atinge o ponto mais distante do sol, ao sul ou ao norte. No solstício, o movimento aparente do sol para o sul ou para o norte cessa e ele parecetornar-se fixo. No hemisfério norte, onde fica a Grécia, o solstício de verão cai entre 20 e 23 de junho e o de inverno, entre 21 e 22 de dezembro, marcando respetivamente o início do verão e do inverno (no hemisfério sul é o oposto). O solstício era um dos fenômenos a que os navegantes da Antiguidade, que se orientavam pela posição dos corpos celestes, davam grande importância. Em certas culturas, a época tinha importante significado religioso.
- O cônsul era um magistrado romano eleito pela Comitia Centuriata, assembléia constituída por todos os cidadãos romanos, mas que na prática era dominada pelos patrícios. Eram eleitos anualmente dois cônsules e, durante a República (-509/-31), tinham poder civil e militar (imperium) quase ilimitado. Assumiam suas funções no dia 1º de janeiro, e era costume dar seu nome ao ano: "próximo às calendas de junho, pois, sendo cônsules Lucius Caesar e Caius Figulus..." (Salústio,Catilina 17). Na época imperial (após -31), passaram a ser nomeados pelo Imperador e, embora o cargo ainda tivesse muito prestígio, o imperium eram exercido pelo próprio Imperador.
- "AD" é a abreviatura habitual da expressão latina Anno Domini, "no ano do Senhor". Usa-se, em geral, antes do número: AD 1500 = "no ano do senhor de 1500".
Fonte:RIBEIRO JR., W.A. A contagem do tempo. Portal Graecia Antiqua, São Carlos. Disponível em www.greciantiga.org/arquivo.asp?num=0194. Consulta: 16/11/2011.