Quem são, de onde vieram, para onde vão? Cinco séculos depois do primeiro encontro, os índios brasileiros permanecem sendo um mistério para o homem branco. Não se pode afirmar com certeza de onde vieram, embora a teoria da migração via estreito de Bering continue sendo a mais provável - mesmo tendo perdido a primazia e, principalmente, a exclusividade. Quando teriam chegado à América também é assunto ainda polêmico: 12 mil, 38 mil ou a 53 mil anos atrás? Ninguém sabe ao certo. Sabe-se apenas que aqui estavam.
De qualquer forma, sua simples presença já era um enigma. Quem seriam aqueles homens "nus, pardos, de bons narizes e bons corpos", que negros não eram, nem mouros, nem hindus? Descenderiam de qual das dez tribos de Israel? Ou de qual dos três filhos de Noé? Teriam alma? Em caso afirmativo, como poderiam ter vivido tanto tempo à margem de Deus?
Cristóvão Colombo decidira chamá-los de índios - mas índios os portugueses sabiam que não eram. O que seriam então esses "negros da terra"? Bons selvagens, como sugeriu Pero Vaz de Caminha (e os filósofos Rosseau, Montaigne e Diderot ecoaram), ou antropófagos bestiais, como quiseram outros cronistas? Defini-los de que forma se alguns eram brutais e intratáveis, como os aimorés - que comiam carne humana "por mantimento e não por vingança ou pela antiguidade de seus ódios" -, e outros tão mansos e pacíficos, como os carijós, "o melhor gentio da costa"?
Passados 500 anos de convivência sempre conflituada, o índio continua sendo pouco mais do que um mito brasileiro. Afinal, são defensores da ecologia, como o caiapó Paulinho Paiakan? São pessimistas incuráveis, que se suicidam por puro desespero, como os guaranis-caiovás, ou empresarios bem-sucedidos, como os caiapós? Podem ser três, como os xetás, ou 23 mil, como os ticunas. Para onde vão? A resposta não depende deles.
A história brasileira não registra um único herói indígena - nem aqueles que ajudaram os portugueses a conquistar a terra, como Tibiriça, que salvou São Paulo; Araribóia, que venceu os franceses, ou Felipe Camarão, que bateu os holandeses. Não há um só atleta ou escritor nativo. Houve um político indígena, o cacique Mário Juruna - mas ele foi abandonado em Brasília. Raoni é um herói - mas não no Brasil. É um herói de Sting, o popstar cheio de boas intenções e má consciência. Raoni se tornou só uma mensagem. Uma imagem tão incongruente quanto a do quadro O Último Tamoio. Nenhum jesuíta jamais chorou a morte do último tamoio, que eram aliados dos franceses e foram traídos pelos padres. Haverá alguém para chorar pelo último ianomâmi?
Fonte:
Eduardo Bueno/Zero Hora
http://cledir.hpg.ig.com.br/historia/02a.htm