28.4.10

Radiação: radiator tabajara

A radioatividade, há 80 anos, prometia acabar com cólicas. E mais: dar energia. Se você comprasse logo, ainda ganhava mais pique sexual!

por Bárbara Axt

"Rádio: cientistas descobriram. Governos aprovam. Médicos indicam. Usuários endossam. Nós garantimos: com certeza é bom.”

Por mais absurdo que pareça hoje, há 80 anos a radioatividade fazia bem. Ao menos era o que propagandas de diversos produtos alardeavam – como essa aí de cima, da fábrica Radium Health Products, de Michigan (Estados Unidos). Trazer de volta a energia da juventude, acabar com distúrbios menstruais e até devolver a visão a cegos: praticamente qualquer problema de saúde podia ser curado com tônicos, cremes para a pele, pasta de dente, anticoncepcionais e supositórios radioativos.

A onda de acreditar no poder curativo da radioatividade foi causada graças a uma série de raciocínios até que lógicos – mas bastante equivocados. Tudo começou quando pesquisadores descobriram a presença de radioatividade na água de estações visitadas por pessoas em busca de cura para enfermidades. Essa radioatividade é causada pela desintegração do elemento rádio presente no solo, que gera o gás radônio. Hoje, sabe-se que o radônio, em doses altas, afeta seriamente os ossos e pode causar câncer. Na época, uma associação apressada levou à conclusão que o rádio era responsável pelos poderes curativos da água.

“É claro que ir a uma estação de águas faz bem à saúde. A pessoa fica ao ar livre, descansa, faz exercício. Mas quando fica sabendo que a água do local é radioativa, pensa que foi isso que a curou”, afirma o especialista em segurança Paul Frame, um dos autores do livro Living with Radiation: the First 100 Years (“Vivendo com a Radiação: os Primeiros 100 Anos”, inédito em português). “Imagino também que, graças aos usos da radiação pela medicina, em radiografias ou tratamento de tumores, ela passou a ser associada à saúde e, conseqüentemente, a poderes curativos.”

Portanto, as indústrias começaram a disponibilizar esses poderes curativos ao público que não podia viajar até uma estação de águas. Logo, mais uma dedução: se água radioativa faz bem, utilizar o rádio diretamente devia ser melhor ainda. O que não faltou foi criatividade para abastecer o mercado com todo tipo de produto. “Na verdade, a radioatividade na água tem níveis baixos e não afeta asaúde. Quando os níveis são altos demais, podem causar queimaduras na pele. Pior: se a substância for ingerida, a radioatividade destrói os ossos”, afirma Paul Frame. A folia acabou conforme as leis foram definindo níveis máximos de segurança de exposição.

Isso não significa que a crença nos poderes de cura da radioatividade tenha acabado: ainda hoje estações de águas radioativas, assim como as areias monazíticas das praias brasileiras de Guarapari, são um sucesso. No Japão, por exemplo, a moda continua: “Há produtos para tornar a água radioativa e para transformar a água da banheira semelhante à de uma fonte. Mas todos possuem níveis seguros de radiação”, diz o outro autor do livro, William Kolbe.

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Os prudutos tinham diversas apresentações: de supositórios à placa banhada a ouro

Essa espécie de filtro dos anos 1920, com paredes internas revestidas de argila e minério de urânio, dizia que deixava a água radioativa. Bastava enchê-lo com água normal à noite que, de manhã, o líquido daria muita energia a quem o tomasse. O manual tinha um teste com fotos que “provavam” a melhora na saúde: nas imagens, duas plantas eram regadas, uma com água normal e outra com água de Revigator. A segunda crescia mais vistosa.

Eram pastilhas de “genuíno rádio”, que deveriam ser tomadas com água, dois tabletes antes ou depois de cada refeição. Um trecho da propaganda veiculada em 9 de fevereiro de 1923, no Newark Ohio Advocate, afirmava: “Rádio acaba com a agonia do reumatismo, neurite, nevralgia e gota. Os médicos dizem que simples e inofensivos tabletes de rádio – como Arium – trazem um espantoso e durável alívio até mesmo para casos que pareciam perdidos. Recompensa de 5 milhões de dólares se os tabletes falharem”. Na semana seguinte, o anúncio prometia uma recompensa de apenas 5 mil. Por que será?

Em formato de supositórios, prometia recuperar a energia sexual e melhorar o funcionamento dos sistemas nervoso e circulatório. Feito de “rádio solúvel em uma base de manteiga de cacau”, garantia rápida absorção da substância pela corrente sangüínea. Eram entregues em embalagem lacrada, que não permitia identificação. Outro produto semelhante eram os supositórios Torb, lançados em 1927, pelo preço de 1 dólar a embalagem com 12 unidades.

Foi o mais popular dos produtos, apesar de ser caro, e virou manchete do Wall Street Journal. Depois de dois anos tomando pelo menos duas garrafinhas de Radithor ao dia, o industrial Eben Byers teve um câncer, que o fez perder os dentes e destruiu seus ossos. Sua morte em 1932, aos 51 anos, foi um escândalo nacional. O jornal publicou: “A água com rádio funcionava muito bem, até que sua mandíbula caiu”. O Radithor ainda foi comercializado por alguns anos até ser proibido pelas autoridades americanas.

Lançado em 1928, consistia em uma placa radioativa banhada em ouro 14 quilates, que vinha numa embalagem de couro e veludo. A indicação era que fosse usado diretamente sobre as glândulas endócrinas, “a fonte de saúde do organismo”, e até sobre o saco escrotal. Custava mil dólares, mas, com o mercado de remédios radioativos saturado, chegou a ser vendido por 150 dólares. William J. Bailey, o criador do produto, garantia tanto a eficácia das invenções que usava todas – acabou morrendo de câncer de bexiga aos 64 anos.

Fonte:Aventuras na História