Na África do Sul, a segregação racial é legitimada,
o sistema de leis garante fartos privilégios à minoria branca
– e ninguém consegue fazer nada para mudar o quadro
'Com passes, somos escravos': manifestação de mulheres contra a obrigatoriedade do porte das infames cadernetas
Regime sem precedentes na história mundial, idealizado e executado com eficiência nos campos político, cultural, econômico, agrícola e industrial, o apartheid, política oficial governamental de segregação racial orquestrada pela minoria branca, vem há 12 anos espalhando seus tentáculos contra os negros na África do Sul. O sistema que assombra o mundo moderno começou a ser implantado em 1948, assim que o Partido Nacional emergiu vitorioso nas eleições gerais do país – em sufrágio exclusivo aos brancos, obviamente. As diretrizes de segregação estavam descritas no programa de governo, mas poucos poderiam imaginar que as cabeças do nacionalismo afrikâner obteriam tanto êxito, em tão pouco tempo, em sua pérfida cruzada.
A segregação, o preconceito e o ódio racial afligem a África desde a chegada dos europeus e da colonização, há séculos. Na África do Sul, que de possessão holandesa passou às mãos inglesas em 1815, por determinação do Congresso de Viena, já existiam alguns decretos dispondo sobre o tema – o mais conhecido deles a Lei da Terra, de 1913, que dividiu desproporcionalmente as terras nacionais. Na ocasião, a minoria branca ficou com mais de 90% das áreas, enquanto a maioria negra recebeu menos de 10%. A partir de 1948, porém, o governo habilmente lançou mão de uma série de leis que regulariam e legitimariam o apartheid, tirando-o da esfera das convenções sociais para incluí-lo, de forma sistemática, na própria constituição do país. A lei do passe, que motivou a manifestação que acabaria em tragédia em Sharpeville, é apenas uma das inúmeras disposições que instituem a segregação. A seguir, alguns desses instrumentos:
Lei da proibição de casamentos mistos (1949)
Proíbe o casamento entre brancos e pessoas de outras raças.
Lei da imoralidade (1950)
Proíbe e criminaliza a relação sexual entre brancos e pessoas de outras raças.
Lei de registro populacional (1950)
Obriga a população a cadastrar-se em um registro nacional, separando-a por raças.
Lei de agrupamentos urbanos (1950)
Força a separação física entre as raças ao criar áreas residenciais separadas. Permitiu a remoção forçada de negros de suas áreas de origem.
Lei dos nativos (1952)
Mais conhecida como a lei do passe, obriga os negros a carregar uma caderneta de identificação. Sua não-apresentação à polícia, quando solicitada, é crime.
Lei de reserva de benefícios sociais separados (1953)
Garante a segregação em todos os locais e equipamentos públicos, para eliminar o contato entre brancos e outras raças. Determina a afixação de sinais de “Somente europeus” e “Somente não-europeus”.
Lei de Educação Bantu (1953)
Cria medidas para reduzir o nível de educação recebida pela população negra – seu objetivo real, de acordo com seu idealizador, Hendrik Verwoerd, é impedir que os negros aspirem a posições às quais não podem ter na sociedade sul-africana
Em que pese a organização de negros para combater o regime – e a clara oposição da comunidade internacional –, o apartheid segue em pleno funcionamento, sem sinais de cansaço. Ao contrário: o líder Verwoerd não se cansa de espalhar as supostas virtudes do regime, definido em seu âmago pelo ex-primeiro-ministro Daniel Malan. “A consciência da cor, profundamente arraigada nos sul-africanos brancos – um fenômeno inacessível à compreensão dos mal informados – provém das diferenças fundamentais existentes entre os dois grupos: o branco e o preto. A diferença de cor é meramente uma manifestação física do contraste existente entre dois modos de vida irreconciliáveis, entre o barbarismo e a civilização, entre o idolatrismo e a cristandade, e finalmente entre números esmagadores, de um lado, e números insignificantes, de outros.”
Fonte: http://veja.abril.com.br/historia/apartheid-africa-sul/apartheid-quando-racismo-lei.shtml
19.2.15
Quando o racismo é lei.
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