11.8.08

Do descobrimento às colonizações







Durante trezentos anos, uma parte do continente americano foi colonizada pelo Reino português. Sendo um desdobramento da expansão marítima, a colonização da América portuguesa possuía as mesmas motivações mercantis e religiosas que haviam impulsionado aquela expansão. A partir das vilas e cidades coloniais, o sertão foi conquistado e ocupado: surgiam as regiões coloniais, onde brancos europeus, nativos americanos e negros africanos conviviam de modo forçado, como colonizadores, colonos e colonizados.

O descobrimento

Há cinco séculos, no início de Março de 1500, partiu de Lisboa, a principal cidade do Reino português, uma expedição de treze navios. Ia em direção a Calicute, nas Índias.

Era a maior e mais poderosa esquadra que saía de Portugal. Dela faziam parte mil e duzentos homens: famosos e experientes navegadores e marinheiros desconhecidos. Eram nobres e plebeus, mercadores e religiosos, degredados e grumetes. Parecia que todos os portugueses estavam nas embarcações que enfrentariam, mais uma vez, o Mar Tenebroso, como era conhecido o Oceano Atlântico.

A expedição dava prosseguimento às navegações portuguesas. Uma aventura que, no século XV, distinguira Portugal, por mobilizar muitos homens, exigir inúmeros conhecimentos técnicos e requerer infindáveis recursos financeiros. Homens, técnicas e capitais em tão grande quantidade que somente a Coroa, isto é, o governo do Reino português, possuía condições de reunir ou conseguir. Uma aventura que abria a possibilidade de obter riquezas: marfim, terras, cereais, produtos tintoriais, tecidos de luxo, especiarias e escravos. Uma aventura que também permitia a propagação da fé cristã, convertendo pagãos e combatendo infiéis. Uma aventura marítima que atraía e, ao mesmo tempo, enchia de medo, tanto os que seguiam nos navios, quanto os que permaneciam em terra.

O rei Dom Manuel I, que a seu nome acrescentara o título de "O Venturoso", confiou o comando da esquadra a Pedro Álvares Cabral, Alcaide - Mor

de Azurara e Senhor de Belmonte. Dom Manuel esperava concluir tratados comerciais com o governante de Calicute, o samorim, para ter, com exclusividade, acesso aos produtos orientais. Sua intenção era, também, que fossem criadas condições favoráveis à pregação da religião cristã, por missionários franciscanos. A missão da frota de Cabral reafirmava, assim, os dois sentidos orientadores da aventura das navegações portuguesas: o mercantil e o religioso.

E, ao que parece, Dom Manuel esperava ainda, com essa expedição, consolidar o monopólio do Reino sobre a Rota do Cabo, o caminho inteiramente marítimo até as Índias, aberto por Vasco da Gama, em 1498. Era preciso garantir a posse daquelas terras do litoral atlântico da América do Sul. Terras que, de direito, pertenciam a Portugal, desde a assinatura do Tratado de Tordesilhas, em 1494.

Quarenta e cinco dias após a partida, na tarde de 22 de Abril de 1500, um grande monte "mui alto e redondo" foi avistado e, logo em seguida, "terra chã com grandes arvoredos", chamada de Ilha de Vera Cruz pelo Capitão, conforme o relato do escrivão Pêro Vaz de Caminha ao rei de Portugal.

Em Vera Cruz os portugueses permaneceram alguns dias, entrando em contato com seus habitantes. Em 26 de Abril, frei Henrique de Coimbra, o chefe dos franciscanos, celebrou uma missa observada, a distância, por homens "pardos, maneira de avermelhados, de bons rostos e bons narizes, bem feitos, andam nus, sem nenhuma cobertura, nem estimam nenhuma coisa cobrir, nem mostrar suas vergonhas, e estão acerca disso com tanta inocência como têm em mostrar o rosto", na descrição de Caminha.

Os portugueses não puderam com eles conversar, porque nem mesmo o judeu Gaspar - o intérprete da frota - conhecia a língua que falavam. Neste momento de encontro, conhecido pelo nome de Descobrimento, a comunicação entre as culturas européia e ameríndia tornou-se possível, somente, por meio de gestos. Duas culturas apenas se tocavam, abrindo margem às interpretações que ressaltavam as diferenças entre elas. Assim, quando um dos nativos "fitou o colar do Capitão, e começou a fazer acenos com a mão em direção à terra, e depois para o colar", Caminha concluiu que era "como se quisesse dizer-nos que havia ouro na terra".


A Posse do Território

Em 1º de maio, com a celebração de outra missa, tomou-se posse do território em nome do rei de Portugal. Caminha resumiu aquele acontecimento, ao mesmo tempo em que destacava os sentidos mercantil e religioso que orientavam a expansão marítima: "...até agora não podemos saber se haja ouro nem prata, nem nenhuma coisa de metal, nem de ferro (...); porém a terra em si é de muitos bons ares (...); as águas são muitas, infindas; em tal maneira é graciosa, que querendo-a aproveitar, dar-se-á nela tudo por bem das águas que tem; porém o melhor fruto, que nela se pode fazer, me parece, que será salvar esta gente e esta deve ser a principal semente de Vossa Alteza em ela deve lançar; e que aí não houvesse mais que ter aqui esta pousada, para esta navegação de Calicute, bastaria, quanto mais disposição para nela cumprir e fazer o que Vossa Alteza tanto deseja, a saber: o acrescentamento da nossa santa fé".

No dia seguinte, 2 de maio, a expedição partia rumo a Calicute. Uma das embarcações, comandada por Gaspar de Lemos, retornava a Lisboa, levando notícias e alguns produtos encontrados na terra descoberta. Em Vera Cruz permaneceram dois degredados com a incumbência de colher informações sobre o lugar e aprender a língua dos naturais. Soube-se depois que, na noite anterior, dois grumetes haviam fugido de bordo.

Aos dois degredados e dois grumetes, os primeiros europeus a habitar o novo território, aos poucos se somaram outros portugueses, espanhóis e franceses. Eram náufragos, desertores, guerreiros, marinheiros e, sobretudo, traficantes de pau-brasil. Homens que iniciavam a exploração da terra, erguiam feitorias e conviviam com os grupos indígenas, ou a eles se impunham.

Estes momentos da colonização por feitorias, ou período pré-colonizador, e da colonização acidental permitiram ao Reino português acumular informações sobre a terra: acidentes geográficos, flora, fauna e riquezas. Possibilitou, também, maior conhecimento a respeito de seus habitantes: línguas, hábitos e costumes. Entretanto, essas primeiras experiências colonizadoras não seriam suficientes para garantir a posse daquele território, constantemente ameaçado pelas incursões de corsários e traficantes dos reinos europeus rivais.

Três décadas após a chegada da expedição de 1500 ao "porto seguro" da atual baía Cabrália, já no reinado de Dom João III, os governantes portugueses sentiam a necessidade de manter seus domínios americanos. Para tal era preciso um povoamento efetivo, só conseguido com o patrocínio da Coroa.


Povoar para defender, colonizar para povoar. A aventura da expansão marítima começava a se desdobrar em uma nova aventura, a da colonização oficial.

Uma aventura que seria tão emocionante quanto aquela que lhe dera origem, porque tanto atraía quanto provocava medo. Uma aventura que trocaria o Mar Tenebroso pelo amplo, silencioso e não menos amedrontador Sertão. E, ainda, uma aventura que transformaria o encontro de duas culturas na convivência forçada de europeus e ameríndios, logo seguida de negros africanos, sob a dominação dos primeiros


Os Nomes da Terra

Durante muitos anos, as terras pertencentes ao rei de Portugal na América receberam diferentes denominações: Ilha de Vera Cruz, Terra de Santa Cruz e Terra do Brasil. Os dois primeiros nomes refletiam o sentido da propagação da fé e, o terceiro, o sentido mercantil da expansão marítima portuguesa. O brasil, madeira útil para tingir tecidos, era o único produto encontrado no litoral com possibilidade de comercialização em larga escala.

Essas denominações falam, também, dos portugueses e de suas concepções do mundo à época das navegações. Quando, em meados do século XVI, o nome Brasil começou a prevalecer sobre o de Santa Cruz, o cronista João de Barros afirmou ser aquela uma "mudança inspirada pelo demônio, pois a vil madeira que tinge o pano de vermelho não vale o sangue vertido para a nossa salvação". E quando, no início do século seguinte, frei Vicente do Salvador escreveu a primeira História do Brasil, sustentou que "como o demônio com o sinal da cruz perdeu todo o domínio que tinha sobre os homens, receando perder também o muito que tinha em os desta terra, trabalhou para que se esquecesse o primeiro nome e lhe ficasse o de Brasil, por causa de um pau assim chamado de cor abrasada e vermelha com que tingem panos, que o daquele divino pau, que deu tinta e virtude a todos os sacramentos da Igreja".

As disputas a respeito do nome do território evidenciam as divisões da sociedade portuguesa, na qual os valores e personagens, associados ao que então começava a ser identificado como moderno, encontravam grandes dificuldades para se afirmar. Predominava um verdadeiro temor a todo tipo de inovação vinda de fora. Muitos atribuíram aos estrangeiros e aos cristãos-novos a responsabilidade das inovações. Diziam que os estrangeiros eram impuros nas idéias, contaminados por terem entrado em contato com o mundo exterior e seus pensamentos. E os judeus, recém convertidos à fé cristã, eram impuros na fé e no sangue. Contra ambos seriam mobilizadas forças poderosas como a Companhia de Jesus e o Tribunal do Santo Ofício - a Inquisição.

Os nomes dados à Terra, assim como a tudo mais, falam ainda sobre o modo como os europeus encaravam os mundos que descobriam. A nenhum deles ocorria respeitar a nomenclatura existente dos lugares e das coisas. Talvez só uns poucos se interessaram em saber por que os nativos chamavam Ibirapitanga à terra que habitavam.

Os territórios alcançados por Cristóvão Colombo em 1492, ficariam conhecidos como América, numa espécie de homenagem ao navegador Américo Vespúcio, que fornecera inúmeras informações aos europeus sobre o novo continente. Aos habitantes das terras portuguesas chamaram índios, demonstrando ignorar a imensa diversidade que apresentavam entre si. Da mesma forma como há muito tempo, em Portugal, eram chamados negros todos aqueles que ocupavam uma posição inferior, independente da cor da pele.

Assim, desde o início, a intenção dominadora marcou as imagens do novo território: dar nomes é conquistar; nomear é tomar; batizar é dominar


O Sertão

A colonização foi, antes de tudo, a aventura da conquista e ocupação do sertão.

Para os colonizadores portugueses, as terras americanas significavam um imenso vazio a ser preenchido com seus interesses, concepções e valores. Um grande deserto, um desertão como as representavam. Daí a origem do nome sertão.

Um sertão que, como o Mar Oceano, exercia atração e gerava medos.

Medos de seres reais e imaginários, de animais e plantas fantásticos, dos índios considerados bárbaros e selvagens, dos caminhos e grotões. Medos que ainda hoje se apresentam em denominações que traduzem angústia, ameaça e dúvida: Turvo, Encruzilhada, Sumidouro, Brumado, Rio das Mortes.

Atração provocada pelas riquezas do sertão: valiosas madeiras, plantas miraculosas, aves e animais desconhecidos e metais preciosos. Atração provocada pelo número incalculável de pagãos e de idólatras - os adoradores de ídolos que deveriam ser convertidos à fé cristã.

Empreender a colonização significava, então, impor a ordem e a dominação sobre um território e sobre as pessoas que ali viviam, para transformá-las em súditos do Rei de Portugal, em cristãos e trabalhadores forçados. Pessoas sempre apresentadas como portadoras de falhas, faltas e ausências. Em sua carta a Dom Manuel I, o escrivão Pero Vaz de Caminha já sublinhara a ausência de vestimentas dos nativos, o fato de não lavrarem a terra nem criarem animais, a necessidade e a importância da conversão à verdadeira fé. Anos mais tarde, outros cronistas e viajantes, como Pero de Magalhães Gandavo, em 1570, chamavam a atenção para um outro tipo de ausência. A língua falada pelos nativos não possuía as letras F, L e R, demonstrando que lhes faltavam Fé, Lei e Razão. Daí a permanente desordem em que viviam. Não por outras razões, tais pessoas e as terras que habitavam deveriam ser dominadas e ordenadas pelos colonizadores.

Os colonizadores portugueses conquistaram o sertão: formando cidades e vilas, plantando canaviais, extraindo metais preciosos ou criando gado. Impunham a autoridade do rei, difundiam a fé cristã e transformavam índios e negros africanos em escravos. Buscavam construir o Novo Mundo à semelhança do Velho Mundo, de onde vieram. No final do século XVI, o padre jesuíta Fernão Cardim, com certo orgulho, observava: "Este Brasil já é outro Portugal."

Quase sempre a imposição da ordem e da dominação dos colonizadores significou o desaparecimento de parte considerável das populações indígenas e africanas, além de muitos dos seus conhecimentos.


Papel dos Núcleos Urbanos

A ocupação do vasto território - o sertão - tinha como ponto de partida a criação

de núcleos urbanos: vilas e cidades coloniais.


Foi assim desde a primeira vez, em 1532, com a expedição de Martim Afonso de Sousa. Ao chegar ao porto de São Vicente - ponto de interseção da costa do pau-brasil e da costa do ouro e da prata, o Capitão fundou, em 22 de janeiro, a primeira vila portuguesa na América: São Vicente. Pouco tempo depois fundou uma outra, "nove léguas dentro pelo sertão, a borda de um rio que se chama Piratininga", conforme anotou seu irmão, Pero Lopes de Sousa, no Diário da Navegação. Martim Afonso de Sousa cumpriu o principal objetivo de sua expedição: iniciar a colonização do litoral para melhor defendê-lo das incursões estrangeiras. O Capitão repartiu os homens que o acompanhavam pelas duas vilas inauguradas. Logo após, distribuiu sementes, cabeças de gado, instrumentos agrícolas e lotes de terras, as sesmarias. Nomeou autoridades e impôs a justiça régia.

Da mesma forma ocorreu entre 1534 e 1536, quando Dom João III criou o sistema de capitanias hereditárias. Na Carta de Doação o rei determinava, aos donatários ou capitães-generais, a fundação de vilas nas capitanias que deveriam possuir "termo e jurisdição, liberdades e insígnias de vilas, segundo foro e costumes de meus Reinos". Duarte Coelho, donatário da capitania de Pernambuco, ergueu cinco povoações, depois representadas em seu brasão. Apenas três ficaram conhecidas: Igaraçu, Olinda e Paratibe.

Foi ainda assim em 1548, quando Dom João III instituiu o Governo Geral. Tomé de Sousa, escolhido para exercer o cargo de governador, recebeu o Regimento que ordenava fosse feita "uma povoação grande e forte em um lugar conveniente, para daí se dar favor e ajuda às outras povoações". A "povoação forte e grande" seria Salvador, a primeira cidade brasileira, inaugurada de forma solene, em primeiro de novembro de 1549. Localizada na capitania da Bahia de Todos os Santos, foi comprada pelo rei dos herdeiros do antigo donatário para ser a sede do novo governo.

São Vicente, Olinda, Igaraçu, Salvador, Rio de Janeiro, Filipéia de Nossa Senhora das Neves, e as demais cidades surgidas nos primeiros tempos de colonização, eram núcleos pequenos. Além das casas dos poucos moradores, apenas se destacavam a igreja, a sede da câmara municipal e a cadeia. Em todos estava presente o pelourinho: coluna de madeira ou pedra, colocada em praça ou lugar público, simbolizando a autoridade e a justiça régias. Em alguns núcleos encontravam-se o forte, o colégio dos jesuítas e a santa casa da misericórdia. Essas construções representavam monumentos da conquista empreendida pelos colonizadores, expressando a ordem do Império e da Fé que ia sendo imposta.


As cidades e vilas coloniais nem sempre possuíam muralhas de defesa. As que existiam eram de madeira ou de palha, bastante vulneráveis e prontas para remoção quando havia expansão ou mudança do núcleo. Em nada se pareciam com as muralhas das antigas e medievais cidades da Europa, cujas pesadas portas, abertas durante o dia, davam passagem aos forasteiros e às mercadorias que chegavam de regiões próximas ou longínquas.

Mesmo nesses núcleos sem muralhas, duas "portas" marcavam a existência cotidiana dos habitantes. Por uma delas, sempre aberta para o exterior, em especial para o Reino português, chegavam coisas e pessoas necessárias à difusão da Fé e à construção do Império. Eram religiosos, funcionários régios e escravos negros africanos. Por esta mesma porta saíam riquezas geradas pela colonização, súditos e fiéis que se dirigiam ao Reino. A outra porta abria-se para o sertão. Por ela passavam tudo e todos cuja missão era preencher aquele imenso vazio. Ao mesmo tempo, entravam, sobretudo, atração e medo.

Do Sertão às Regiões Coloniais

Cidades e vilas coloniais eram o ponto de partida da colonização portuguesa na América.

Pela "porta" que se abria para o sertão passavam todos que iam conquistar e ocupar aquele vasto território, transformando-o em uma região colonial. Eram leigos e religiosos, guerreiros e missionários, comerciantes e funcionários régios.

Os donatários doavam sesmarias aos cristãos que demonstrassem condições para aproveitá-las. Esses homens escravizavam os nativos, plantavam cana-de-açúcar, criavam gado e erguiam engenhos. Estavam se transformando em colonos.

Nas últimas décadas do século XVI, o número de negros africanos nas fazen

das de cana-de-açúcar e nos engenhos começou a aumentar. Eles eram utilizados como escravos, em substituição aos nativos.

Homens livres, mas sem recursos para conseguir uma sesmaria, obtinham autorização de um senhor de engenho ou de um fazendeiro para morar em suas terras. Em troca, prestavam alguns serviços e assumiam certas obrigações. A defesa da propriedade era uma delas. Defesa em caso de ataques de grupos indígenas hostis, de insurreição ou fuga de escravos, de hostilidade de proprietários vizinhos ou ameaça de estrangeiros. Estes homens livres passaram a ser chamados de moradores ou agregados, à medida que também estavam se tornando colonizados.

Os jesuítas fundavam aldeamentos, onde os nativos reunidos recebiam ensinamentos da fé cristã e eram habituados ao trabalho sedentário. Nativos que estavam sendo transformados em fiéis e em colonizados.

A colonização começava a preencher o vasto sertão com canaviais, cabeças de gado, escravos negros e índios. E ainda com senhores de engenho, fazendeiros, jesuítas, guerreiros, comerciantes, moradores e agregados. Enfim, com colonizadores, colonos e colonizados. A colonização ia transformando o sertão em região colonial, um território dominado e submetido aos interesses do Reino de Portugal.

No decorrer dos séculos XVI, XVII e XVIII a colonização avançou pelo território e as diferentes regiões foram se constituindo. O ponto de partida continuava o mesmo: a criação de núcleos urbanos.

Foi assim nas Minas Gerais. Nos últimos anos do século XVII e primeiros do século seguinte, a descoberta de metais preciosos nos sertões das Gerais provocou conflitos de extrema violência - a Guerra dos Emboabas. Paulistas que haviam descoberto ricas jazidas se opunham aos "estrangeiros" que para lá afluíam, os emboabas. As autoridades portuguesas transformaram os arraiais criados por paulistas e emboabas em vilas "para que nelas, e em seus termos, vivessem os mesmos Povos em sociedade, segundo as leis", conforme recorda José João Teixeira Coelho, na sua Instrução para o governo da Capitania de Minas Gerais. A imposição da ordem metropolitana fazia surgir a região das Minas Gerais, um território submetido aos interesses dos colonizadores.


A Aventura da Colonização

A aventura da colonização criava a Colônia, um território e sua população submetidos à dominação política e jurídica de uma Metrópole. A colonização do vasto sertão sob a direção da Coroa portuguesa estabelecia uma relação colonial.

Colônias enquanto regiões submetidas ao poder de um Estado metropolitano existiram em diferentes momentos das experiências históricas vividas pelos homens. E em cada um desses momentos a experiência da relação colonial assumiu um caráter particular.

Durante a Idade Moderna, as relações entre a Metrópole - o Reino português - e a Colônia - a Terra do Brasil - estiveram sempre referidas aos sentidos ou objetivos da expansão marítima. Naquela época, a Colônia era vista como o espaço que possibilitava a concretização dos interesses mercantis e religiosos que moviam aquela expansão. Era o território onde deveria ocorrer a expansão da Fé e do Império, ampliando-se, assim, o número de súditos da Monarquia portuguesa e de fiéis da Igreja. E a Colônia deveria existir em benefício da Metrópole, assegurando-lhe riqueza, poder e prestígio no conjunto dos Estados modernos europeus.

As relações Metrópole - Colônia nos tempos modernos possuíam uma outra marca distintiva, também decorrente do modo como se dera a expansão marítima: o monopólio ou o "exclusivo", como então se costumava dizer.

Os navegadores portugueses haviam enfrentado o Mar Tenebroso. Desejavam controlar, com exclusividade para o Reino, o comércio dos produtos que encontrassem e os caminhos que a eles conduzissem. Os missionários aproximavam-se dos pagãos e infiéis para convertê-los à fé cristã, ou seja, monopolizar suas almas. E o soberano português esperava transformar as populações que habitavam terras distantes em súditos do Estado absoluto que governava.

Colonizadores, Colonos e Colonizados


Com a aventura da colonização do território americano não deveria ser diferente. Funcionários régios, missionários, mercadores e nobres transformaram-se em colonizadores. E, a partir dos núcleos urbanos, procuravam monopolizar as atividades que caracterizavam o dia-a-dia das regiões coloniais. Eram colonizadores os mercadores que monopolizavam as trocas comerciais, como os negociantes de grosso trato que faziam o comércio com o Reino. Eram colonizadores também os traficantes de escravos negros do litoral africano para os portos da colônia americana; os mercadores de sobrado, com suas lojas; e os mascates ou cometas que percorriam o interior das regiões abastecendo fazendas, engenhos e outros pontos distantes. E havia os religiosos: bispos, párocos e missionários que convertiam os pagãos, zelavam pela manutenção da fé cristã, davam instrução aos filhos dos colonos e aldeavam os nativos. Eram colonizadores ainda os responsáveis pela administração colonial, como os governadores, os donatários, os ouvidores, os provedores da fazenda, os almotacés, entre muitos outros, que arrecadavam os tributos, vigiavam os súditos e impediam a difusão de idéias que se opunham ao poder absoluto do soberano português. Mas o principal dos colonizadores era o próprio Rei de Portugal. Dessa forma, os colonizadores dedicavam-se às atividades comerciais, administrativas e religiosas, cabendo aos colonos as atividades ligadas à produção.

Nos primeiros tempos, a colonização pôde se efetivar através da lavoura açucareira. A atividade agrícola imprimia à experiência colonizadora a marca de uma colonização de exploração. Num primeiro momento voltava-se para a obtenção de gêneros agrícolas e, mais tarde, de metais preciosos, para o mercado europeu. Isso atendia aos objetivos da política mercantilista do Reino português.

Eram colonos os senhores de engenho, os fazendeiros, os lavradores, os proprietários de lavras auríferas e de oficinas artesanais, os donos de charqueadas e os criadores de gado. Eles eram os proprieetários dos meios - escravos, terra e equipamentos - que permitiam a realização de atividades produtivas numa colonização de exploração.

Os colonizados eram os escravos. Inicialmente, eram apenas os nativos americanos e, a partir das duas últimas décadas do século XVI, cada vez mais, africanos. Colonizados eram também os agregados, os moradores, os capangas e os vadios: homens livres e pobres que raramente encontravam ocupação produtiva.

As regiões coloniais ganhavam vida com as relações do dia-a-dia entre colonizadores, colonos e colonizados. Elas revelavam a condição de superioridade desfrutada pelos colonizadores. Ressaltavam, ainda, a importância que os colonos possuíam em suas propriedades e as variadas formas de dominação a que os colonizados estavam submetidos.

Inconformados com sua condição, muitas vezes os negros escravos fugiam, abandonando a região, um espaço de opressão. Formavam, então, um quilombo, um espaço de liberdade. Entretanto, entre as regiões coloniais e os quilombos sempre existiram trocas dos mais diversos tipos e trânsito de habitantes.

Insatisfeitos com a vida que levavam, agregados, moradores e outros homens livres e pobres abandonavam, com freqüência, as terras onde viviam. Buscavam outras regiões ou perambulavam pelos sertões à procura de riquezas e aventuras.

Fonte: Multirio

Disponivel: http://www.multirio.rj.gov.br/historia/modulo01/desc_colonizacoes.html