13.3.19

Antropocentrismo



Antropocentrismo é uma visão de mundo que considera o ser humano o fator mais importante e de valor no Universo.

Em contraste, a visão de mundo biocêntrica considera ser humano não mais do que uma determinada espécie de animal, sem maior valor intrínseco do que qualquer das outras espécies de organismos que ocorrem na Terra .

A visão de mundo egocêntrica incorpora a um biocêntrica, enquanto adicionalmente propondo que os seres humanos são um componente natural do ecossistema da Terra , e que os seres humanos têm uma necessidade absoluta e incontestável dos produtos e serviços dos ecossistemas, a fim de sustentar a si mesmos e suas sociedades.

Há uma série de implicações importantes da visão antropocêntrica, que influenciam fortemente as formas pelas quais os seres humanos interpretam as suas relações com outras espécies e com a natureza e os ecossistemas.

Algumas delas são discutidas a seguir:



1. A visão antropocêntrica sugere que os seres humanos têm maior valor intrínseco do que outras espécies. Um resultado disto é que a atitude quaisquer espécies que são de uso potencial para os seres humanos podem ser um “recurso” a ser explorado. Este uso, muitas vezes ocorre de forma insustentável, que resulta em degradação, às vezes ao ponto de extinção do recurso biológico.

2. A visão de que os seres humanos têm maior valor intrínseco do que outras espécies também influencia julgamentos éticos sobre interações com outros organismos. Ética é, muitas vezes, utilizada para legitimar o tratamento de outras espécies de forma que seriam considerados moralmente inaceitáveis se os seres humanos foram tratados de forma similar. Por exemplo, os animais são muitas vezes tratados com muita crueldade durante a investigação médica e na agricultura. Este tratamento preconceituoso de outras espécies tem sido rotulado como “especismo” por especialistas em ética.

3. Outra implicação da visão antropocêntrica é a crença de que os seres humanos classificam no auge da progressão natural de evolução das espécies e da vida. Esta crença é em contraste com a moderna interpretação biológica de evolução , o que sugere que não são espécies “superiores” que os outros, mas alguns têm claramente uma linhagem mais antiga evolutivo, ou pode ocorrer como formas de vida relativamente simples.

As habilidades individuais, culturais e tecnológicos de seres humanos estão entre os atributos que tornam a sua espécie, Homo sapiens , especial e diferente. As qualidades de seres humanos com poderes, em um grau que nenhuma outra espécie tem conseguido ao longo da história da vida na Terra, através do desenvolvimento de sistemas sociais e tecnologias que tornam possível uma exploração intensa e gestão do meio ambiente. Este poder permitiu que os seres humanos se tornassem a espécie mais bem sucedida na Terra. Este sucesso é indicado pela população de seres humanos que agora está sendo mantido, o crescimento explosivo desses números, e os montantes crescentes de recursos biológicos e ambientais da Terra que estão sendo apropriados para sustentar a espécie humana.

No entanto, a verdadeira medida do sucesso evolutivo, em contraste com a capacitação temporária e intensidade de exploração de recursos, está relacionado com o período de tempo que uma espécie permanece poderosa, a sustentabilidade do seu empreendimento. Há sinais claros de que a intensa exploração do meio ambiente pelo homem está causando degradação ecológica generalizada e uma diminuição da capacidade de transporte para sustentar pessoas, inúmeras outras espécies, e muitos tipos de ecossistemas naturais. Se essa deterioração ambiental prova para ser verdadeiramente importante, e há muitas indicações de que ele irá, em seguida, os últimos séculos de sucesso sem paralelo da espécie humana, vai passar a ser um fenômeno de curto prazo, e não vai representar o sucesso evolutivo. Esta será uma demonstração clara do fato de que os seres humanos têm sempre, exigem acesso a um fluxo contínuo de bens e serviços ecológicos para sustentar a si e suas sociedades.

Fonte: science.jrank.org
Antropocentrismo



Na Transição Feudal-capitalista tem-se um conjunto de mudanças ocorrendo na Europa Ocidental como forma de responder à crise do século XIV.

É a atuação dos Estados Nacionais no âmbito político, econômico e cultural, com apoio da nobreza (manutenção do status social e do poder político), da burguesia (interesses econômicos, unificação da moeda e participação no expansionismo marítimo) e da Igreja (difundir a fé católica nas terras a serem descobertas).

Neste período surge um homem questionador, crítico, que externa seu pensamento, que problematiza a realidade.

É a mudança de uma mentalidade baseada no Teocentrismo (tipicamente medieval) e a substituição dessa pelo Antropocentrismo, com o homem no centro do Universo a partir da qual esse homem se coloca como um ser racional, valorizando questões ligadas à matéria.


É o retrato do homem Renascentista, que acredita tudo ser explicado através da razão e da ciência, em oposição à idéia medieval.

Esta mudança de mentalidade estimula a pesquisa científica que faz com que as ciências, a arte e a literatura fiquem em constante evolução.

É a chegada de um novo tempo, um tempo que valoriza a razão, o homem, a matéria, um tempo em que, ter prazer em viver não mais é reconhecido universalmente como pecado.
O que é

Antropocentrismo, é ponto de vista filosófico argumentando que os seres humanos são as entidades centrais ou mais importantes do mundo.

Esta é uma crença básica incorporado em muitas religiões e filosofias ocidentais.

O antropocentrismo considera os humanos como separado e superior à natureza e sustenta que a vida humana tem valor intrínseco, enquanto outras entidades (incluindo animais, plantas, recursos minerais, e assim por diante) são recursos que podem justificadamente ser exploradas para o benefício da humanidade.

Fonte: www.medio.com.br
Antropocentrismo


ANTROPOCENTRISMO, ECOCENTRISMO E HOLISMO: UMA BREVE ANÁLISE DAS ESCOLAS DE PENSAMENTO AMBIENTAL

1. INTRODUÇÃO

O Direito Ambiental e o pensamento jurídico-ambiental sofreram modificações ao longo do tempo e evoluíram com as mudanças de paradigmas da sociedade.

Nesse processo evolutivo, novas concepções foram desenvolvidas, novos conceitos inseridose paradigmas alterados com o surgimento de novas escolas de pensamento ambiental.

A primeira escola de pensamento acerca da proteção do meio ambiente foi aescolaantropocêntrica. No antropocentrismo ambiental a proteção do bem ambiental, encarado como res nulliuse não como bem autônomo, é vinculada às benesses trazidas à espécie humana, portanto, uma tutela mediata e indireta, cujo foco principal era o homem e seus interesses, sejam econômicos (fase econômica de proteção ambiental) ou sanitários (fase sanitária de proteção do meio ambiente).

Posteriormente, adveio a escola ecocêntrica, em que a vida, em todas as suas formas e, ressalte-se, não apenas a humana, tornou-se o valormais expressivo do ecossistema planetário, reconhecendo-se a importância de todos os seres vivos por si mesmos e para a mantençado equilíbrio dos ecossistemas e, consequentemente, do meio ambiente. A proteção da vida das demais espécies –e não humana –se tornou o foco principal.

Por fim, surgiu a visão holística, que firmou a tutela imediata e direta do bem ambiental com a preocupação de se protegeremos meios biótico (seres vivos) e abiótico (recursos ambientais) e suas inter-relações com vistas à manutenção do equilíbrio ambiental. A concepção holística esteou a proteção integral do ambiente, como sistema integrado de relações e processos dos quais advém e depende toda a vida na Terra, inclusivea humana.

Assim, tendo em vista a coexistência de diferentes paradigmas de proteção do meio ambiente, indaga-se: Como se caracterizam as escolas de pensamento ambiental?Eis a problemática que será trabalhada neste artigo.

2. ANTROPOCENTRISMO

A terminologia antropocentrismo advém de um vocábulo híbrido de composição greco-latina, do grego: antropos, o homem; do latim: centrum, centricum, o centro. Em suma, genericamente, tal concepção faz do ser humano o centro do Universo (Milaré, 2009, p. 86). A espécie humana ascende ao statusde referência máxima e absoluta de valores, em torno da qual gravitam os demais seres.

Por um longo tempo foi assim, os componentes do meio ambiente:


foram relegados a um papel secundário e de subserviência ao ser humano, que colocando-se no eixo central do universo, cuidava do entorno como um déspota, senhorio de tudo. (RODRIGUES, 2005, p.90)

Destarte, segundo a visão antropocêntrica, o Direito Ambiental é voltado para a satisfação das necessidades humanas (Fiorillo, 2012, p.69), não haveria proteção ambiental se não houvesse benefício direito e imediato à espécie humana, todas as benesses da tutela do meio ambiente deveriam convergir para o homem, centro de todo o ambiente.Antunes (2000, p.168) menciona que“meio ambiente é conceito que define um conjunto exterior ao Ser Humano”. Entretanto, o alcance da terminologia meio ambiente é bem mais extenso do que o simples entorno do ser humano.

Inicialmente, o meio ambiente recebia proteção de forma secundária, mediata, não sendo tutelado autonomamente, e sim, apenas como bem privado, visando-se a proteção do interesse financeiro do indivíduo, dono do bem. Os bens ambientais eram protegidos por sua valoração econômica, pelo valor econômico que demonstravam ter para a espécie humana. Tal visão é resultado de uma concepção egoísta e meramente econômica, a chamada fase econômica da proteção dos bens ambientais. (Rodrigues, 2005, p.90)

Ainda, com o mesmo viés ideológico de inexistência de preocupação com a tutela imediata do meio ambiente, a fase sanitária de proteção dos bens ambientais se estabeleceu (Rodrigues, 2005, p.94). A associação era entre os bens ambientais vitais e a saúde humana. A espécie humana passou a se preocupar em proteger os bens ambientais tidos como vitais por estar protegendo sua própria saúde.

Esclarece Rodrigues (2005, p. 94) que:


O homem continuava a assistir ao espetáculo da primeira fila, vendo apenas a si mesmo, sem enxergar os demais personagens e, próprio, de tudo, sem identificar que o personagem único e principal é o conjunto de interações decorrentes da participação de todos os personagens

A legislação ambiental preponderava a tutela da saúde e qualidade de vida humana, confundindo-se, inclusive, a proteção da saúde com a tutela do meio ambiente (Rodrigues, 2005, p.94). Todavia, a proteção do meio ambiente com vistas à saúde reflete o início da mudança de pensamento com o reconhecimento de que o ser humano deveria repensar a sua relação com o ambiente, em sua dependência deste e em como as atividades antrópicas afetam a natureza.

Na verdade, se reconheceu que a degradação ambiental gerada pelo homem é maior que a capacidade da natureza de auto-regulação, gerando, destarte, danos ao meio ambiente e, consequentemente, a quebra do equilíbrio dos sistemas naturais.

Entretanto, foi apenas um primórdio de consciência ambiental, já que “o paradigma ético-antropocêntrico continuava o mesmo, inalterado e imutável” (Rodrigues, 2005, p.94). Não existia, a proteção ética, altruísta, genuína e direta do meio ambiente, nem em nível constitucional quanto infra-constitucional.

Ensina Benjamin (1999, p.53):


Faltando uma base incontroversa de apoio na Constituição, o legislador ordinário foi buscar suporte na salvaguarda da saúde, sob o argumento de que ela não pode ser assegurada em ambiente degradado. Ou seja, degradação ambientalseria sinônimo de degradação sanitária. Uma argumentação de cunho estritamente homocêntrico [antropocêntrico], com indisfarçável conteúdo economicista e utilitarista. Naquele período, tal raciocínio vingou e serviu para dar sustentação à intervenção legislativa, recebendo, inclusive, respaldo judicial.

Apesarde inúmeras críticas possíveis ao paradigma antropocêntrico de proteção ambientale de já existirem novas escolas de pensamento, o antropocentrismo continua tendo adeptos e sendo disseminado, principalmente, na cultura jurídica e social do Brasil.

A concepção eminentemente antropocêntrica se mantém arraigada em alguns setores da sociedade contemporânea, o que impede muitos avanços em projetos que visam a conservação do meio, em especial, a conservação de espécies em vias de extinção e a instalação de Unidades de Conservação.

Entretanto, em outras searas do conhecimento como a Biologia e a Ecologia (ciências ambientais de modo geral) a escola antropocêntrica não tem destaque e é severamentecombatida.Percebe-se que ainfluência das ciências ambientais está alterandoa percepção ambiental dos juristas.

3. ECOCENTRISMO

É cediço que na história da humanidade o processo de modificação de paradigmas não é imediato, demanda um longo período de adaptação à nova realidade

Com a passagem da visão antropocêntrica para a biocêntrica, por óbvio, não foi diferente. Essa mudança de paradigma exigiu considerável lapso temporal. Assevera Milaré (2009, p.88) que: “A consideração aprofundada do sentido e do valor da vida sacudiu o jugo do antropocentrismo”.

A vida, em todas as suas formas e não apenas a humana, passou a ser considerada o valor mais expressivo do ecossistema planetário, reconhecendo-se a importância de todos os seres vivos por si mesmos e para a manutenção do equilíbrio do ambiente.

Com o foco voltado para a vida e todos os aspectos a ela inerentes, surgiu o biocentrismo, vocábulo híbrido de composição greco-latina, do grego: bios, a vida; do latim: centrum, centricum, o centro. Em suma, a vida como personagem central da tutela ambiental. Enfatiza Milaré (2009,p.88) que “o valor vida passou a ser um referencial inovador para as intervenções do homem no mundo natural”.

Maddalena (1990, p. 84)traz alume que:


A um princípio antropocêntrico se vai lentamente substituindo um principio biocêntrico; obviamente, não no sentido de que ao valor homem se substitui o valor natureza, mas no sentido que se impõe como valor a ‘comunidade biótica’, em cujo vértice está o homem.

A concepção biocêntrica, em termos de ordenamento jurídico-ambiental brasileiro, surgiu com o advento da Lei da Política Nacional do Meio Ambiente (lei nº 6938/81), que, eliminou a concepção antropocêntrica, tornando personagem central “todas as formas de vida”, conforme disposição do art. 3°, inciso I do referido diploma legal, e não mais o ser humano como outrora.

Assevera Rodrigues (2005, p.99) acerca da mencionada lei:


O fato de marcar uma nova fase do Direito Ambiental deve-se, basicamente […] . Adoção de um novo paradigma ético em relação ao meio ambiente, colocando no eixo central do entorno a proteção a todas as formas de vida. Encampou-se, pois, um conceito biocêntrico.

Ainda com o mesmo diploma legal, exsurgiu a visão ecocêntrica, que amplia a preocupação central da proteção ambiental, não apenas para as diferentes formas de vida, mas também para o meio abiótico – “conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem química, física e biológica” (art. 3º, inciso I da Lei nº 6938/81) –que as cerca e que permite sua sobrevivência.

A Política Nacional do MeioAmbientetrouxe a lume a tutela do meio natural e seus componentes bióticos e abióticos de forma globalizada e não mais individualizada de acordo com os benefícios trazidos para o ser humano.Mas ainda se discute apenas o meio ambiente natural.

Acerca da relevância da proteção jurídica do meio ambiente, preleciona Milaré (2009, p.90):


Convindo em que o ecossistema planetário (ou mundo natural) tem valor intrínseco por força do ordenamento do Universo, não apenas valor de uso, estimativo ou de troca, é imperioso admitir que ele necessita da tutela do Direito, pelo que ele é em si mesmo, independentemente das avaliações e dos interesses humanos. Se o ordenamento jurídico humano não os tutela, o ordenamento natural do Universo fará isso por sua própria força, independente de nossas prescrições positivas, eis que não raras vezes a Natureza vingou-se do homem e das suas agressões e, certamente, continuará a fazê-lo.

Assim, a escola ecocêntrica (ou biocêntrica, como muitos preferem)coloca em primeiro plano de discussão e proteçãoo equilíbrio dos ecossistemase do meio ambiente natural.A natureza, de modo geral, tanto os fatores vivos(seres vivos–ressalte-se todas as espécies e não apenas a humana)quanto os fatores que auxiliam a vida(como água, ar atmosférico, solo, minerais etc)e suas inter-relaçõessão protegidos, tendo em vista, sua importância para a homeostase.

4. HOLISMO

A História do Direito ensina que o ser humano nem sempre foi o personagem central do sistema jurídico. No Direito Romano, por exemplo, se admitia a possibilidade decondenação de animais por danos causados às pessoas e havia a equiparação dos escravos ao statusde coisas. No Direito Brasileiro do período da escravidão, os escravos eram tidos como bens semoventes. Assim, “oabandono do antropocentrismo é, desta forma, uma tendência que tem precedentes na evolução da própria ciência jurídica”. (Antunes, 1998, p.21)

As normas de Direito Ambiental, cada vez mais, tanto a nível nacional quanto internacional, reconhecem direitos próprios do meio ambiente, independentemente do valor que anatureza protegida tenha para a espécie humana.A proteção ambiental toma grandes proporções e se torna tema rotineiramente discutido.

A Organização das Nações Unidas, por meio da resolução nº 37/7, de 28 de outubro de 1982, proclamada pela AssembléiaGeral enuncia:


Toda forma de vida é única e merece ser respeitada, qualquer que seja a sua utilidade para o homem, e, com a finalidade de reconhecer aos outros organismos vivos este direito, o homem deve se guiar por um código moral de ação.(ONU, 1982)

Destarte, fica marcada e devidamente comprovada a ruptura do Direito Ambiental com o retrógrado antropocentrismo, percebendo-se a aceitação, a divulgação e a positivação de direitos tipicamente da natureza, firmando-se uma tutela imediata e direta do bemambiental, não mais mediata e indireta como alhures.

Neste ínterim de modificação de paradigma, ergue-se no Brasil, em especial com a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil em 1988, a visão holística (ou sistêmica) do Direito Ambiental, enunciada no art. 225 caput:


Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

E em 1992, com o advento da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento(ECO-92), a concepção holística ambiental se fortaleceu com a ideia de desenvolvimento sustentável. A Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento(ONU, 1992b), em sua apresentação,estabelece a necessidade de que os Estados “protejam a integridade do sistema global de meio ambiente e desenvolvimento, reconhecendo a natureza integral e interdependente da Terra, nosso lar”.

O holismo, segundo o Glossário de Ecologia (1997, p. 139),é a “visão segundo a qual todas as entidades físicas e biológicas formam um único sistema interagente unificado e que qualquer sistema completo é maior do que a soma das partes componentes”.E é deste modo que se posiciona a escola de pensamentoambientalholística.

Segundo Milaré (2009, p. 1082), o holismo se refere à percepção ou conhecimento que integra partes ou componentes em um todo abrangente e compreensivo, a partir da constatação de que há uma integração entre eles e não apenas uma mera justaposição dos componentes de um todo.

O meio ambiente é um todo constituído por diversos elementos interdependentes e co-relacionados, que interagem mutuamente entre si, estabelecendo seu próprio equilíbrio. O ambiente deve ser globalmente considerado, em todos os seus aspectos e componentes, vez que dessa relação inextricável surge a harmonia ecológica.

O ambiente não é meramente a junção de seus elementos constituintes, sua concepção vai além. A análise do meio ambiente deve considerar o contexto amplo e global de todas as variáveis intrínsecas e extrínsecas que geram influências diversas e, primordialmente, a interação entre essas variáveis, para que não haja uma visão distorcida, simplória e reducionista do bem ambiental.

Na fase holística de proteção, “o ambiente passa a ser protegido de maneira integral, vale dizer, como sistema ecológico integrado (resguardando-se as partes a partir do todo) e com autonomia valorativa (é, em si mesmo, bem jurídico)”(BENJAMIN, 1999, p.78).

Agora, não apenas os seres vivos são protegidos, mas também os recursos ambientais (meio abiótico), dos quais derivam as condições para o efetivo desenvolvimento da vida. A bem ambiental éconsiderado autônomo e não mais valorado segundo as necessidades humanas.

A Carta da Terra, documento também advindo da ECO-92, em seu princípio I, sub-princípio 1, alínea a, reafirma o holismo ambiental com o reconhecimento da interação e do valor de todos os seres vivos e dos aspectos ambientais, conforme se verifica:


PRINCÍPIOS

I. RESPEITAR E CUIDAR DA COMUNIDADE DA VIDA

1. Respeitar a Terra e a vida em toda sua diversidade.

a. Reconhecer que todos os seres são interligados e cada forma de vida tem valor,independentemente de sua utilidade para os seres humanos.(ONU, 1992a)

Essa visão holística é essencial à visão do mundo e à formulação de políticas ambientais, vez que o meio ambiente é um todo interligado, que deve ser globalmente considerado em todos os seus aspectos para que seja efetivamente tutelado.

E mais, com o desenvolvimento das ciências ambientais e da escola holística houve uma ampliação da abrangência do meio ambiente. Em uma perspectiva lato sensu, Milaré (2009, p.99) conceitua meio ambiente como “toda a natureza original (natural) e artificial, assim como os bens culturais correlatos”. O meio ambiente artificial (urbano ou humano) é formado pelo espaço urbano construído pelo homem, id est, as construções, edificações –espaço urbano fechado –e equipamentos públicos (praças, áreas verdes, ruas) –espaço urbano aberto. (Silva, 2002, p.21)

Nessa concepção ampla de meio ambiente existe a unicidade entre o meio ambiente natural e o meio ambiente artificial (que foiconstruído pelo homem), além da inclusão do patrimônio cultural e, modernamente, do meio ambiente do trabalho, formando-se essa visão holística do conceito.

Meio ambiente compreende o ar, o solo, a água, as belezas naturais, a flora, os patrimônios histórico, turístico, arqueológico, artístico, paisagístico e o ambiente de trabalho.Exsurge, desse modo, que “meio ambiente é, assim, a interação do conjunto de elemento naturais, artificiais e culturais que propiciem o desenvolvimento equilibrado da vida em todas as suas formas”. (Silva, 2002, p.20)

Asseveram Abreu & Sampaio (2007, p.76) que tutelar o bem ambiental é uma forma de buscar a qualidade do meio ambiente e de garantir que todos os seres vivos permaneçam vivos, inclusive o ser humano, afinal, o ser humanoé parte integrante da naturezae do meio ambiente, tanto quanto indivíduo (espécie) tanto quanto coletivamente (sociedade).

No holismo ambiental não apenas o meio natural e seus elementos são tutelados. A vida humana e suasexpressões também se tornam objeto de proteção, mas não pelos motivos apregoados pelo antropocentrismoe sim, pela espécie humana (e os fatores que se relacionam com sua existência e desenvolvimento)ser parte do meio ambiente e indispensável ao equilíbrio ambiental.

5. CONCLUSÃO

Na atual situação em que se encontra a degradação ambiental a proteção do ambiente com vistas àmanutenção do equilíbrio ecológico é um dos grandes desafios da humanidade.Para se analisaremmelhor as formas de tutelar o ambiente é imprescindível compreender as escolas de pensamento que norteiam osestudosjurídico-ambientais.

A primeira escola de pensamento está pautada no ser humano: o chamado antropocentrismo. Com base na escola antropocêntrica, toda a proteção do meioambiente está vinculada a vida humana e aos benefícios trazidos aos seres humanos.O foco de todos os cuidados com o meio ambiente é a vida humana, hierarquicamente superior as demais formas de vida.

A segunda escola de pensamento, que se traduz ao extremo oposto da primeira, está pautada na vida não humanae nos ecossistemas: o biocentrismo ou ecocentrismo.Nesta corrente, a proteção danatureza está desvinculada completamente das implicações que tal tutela traz aos seres humanos.O meio ambiente é protegido por si só, não por seus benefícios aos humanos, e a vida dos demais seres vivos é o focoprincipal.

E por último a escola de pensamento holística, pautada na ideia de meio ambiente como sistema integrado. No holismoambiental, o ambiente não é visto como vários fatores isolados(fauna, flora, recursos mineirais),e sim,comoum sistema único, integrado e tendente ao equilíbrio,em que todos os vários fatores interagem mutuamente entre si, sendo interdependentes.

Com o aprimoramento da concepção de meio ambiente e o desenvolvimento desta visão holística, não apenas o meio biótico e os recursos naturais são protegidos, também os processos que ocorrem naturalmente no ambiente e dos quais resulta o equilíbrio ecológico, são tutelados.

A concepção holística do meio ambiente permite a tutela da natureza por si mesma, pela importância dos elementos naturais para o equilíbrio ecológico do planeta como um todo e não pelo valor que têm para a espécie humana. Desta forma, a natureza passou a ter valor em si mesma e o ser humano deixou de estar ao lado do meio natural e passou a integrá-lo como ser vivo dependente que é.

Ivy de Souza Abreu

Elda Coelho de Azevedo Bussinguer

REFERÊNCIAS

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______. Lei nº 6938, de 31 de agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L6938.htm>. Acesso em: 28abr. 2013.
BENJAMIN, Antônio Herman de Vasconcellos. Introdução ao Direito Ambiental Brasileiro. Revista de Direito Ambiental, n.14. São Paulo: RT, 1999. FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. 13. ed. rev. atual. ampl. São Paulo: Saraiva, 2012.
Holismo. In: Glossário de Ecologia. 2. ed. rev. ampl. São Paulo: ACIESP, 1997.
MADDALENA, Paolo. Danno pubblico ambientale. Rimini: MaggioliEditores, 1990.
MILARÉ, Edis. Direito do Ambiente: doutrina, prática, jurisprudência e glossário. 4.ed. rev. ampl. atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.
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RODRIGUES, Marcelo Abelha. Elementos de Direito Ambiental: parte geral. 2. ed. rev. atual. ampl. São Paulo: Revista do Tribunais, 2005.
SILVA, José Afonso da. Direito Ambiental Constitucional. 4. ed. rev. atual. São Paulo: Malheiros, 2002.

Fonte: www.derechoycambiosocial.com
Antropocentrismo

O antropocentrismo é uma concepção que coloca o ser humano no centro das atenções e as pessoas como as únicas detentoras plenas de direito.

Poderia parecer uma manifestação natural, mas, evidentemente, é uma construção cultural que separa artificialmente o ser humano da natureza e opõe a humanidade às demais espécies do Planeta. O ser humano se tornou a medida autorreferente para todas as coisas.

A demografia, assim como a economia e as demais ciências humanas, foi fortemente marcada pelo antropocentrismo, desde suas origens. Aliás, o antropocentrismo tem suas raízes mais profundas em antigos registros religiosos.

O livro do Gênesis, do Velho Testamento, descreve que Deus criou o mundo em sete dias, sendo que no sexto dia, no cume da criação e antes do descanso do sétimo dia, Ele criou o ser humano (primeiro o homem e depois a mulher) à sua própria imagem e semelhança, ordenando: “Frutificai, multiplicai-vos, enchei a terra e sujeitai-a; dominai sobre os peixes do mar, sobre as aves do céu e sobre todos os animais que se arrastam sobre a terra”. Esta concepção teo-antropocêntrica de superioridade e dominação humana reinou na mente das pessoas e nas diversas instituições durante milênios, especialmente no hemisfério Ocidental, e ainda está presente no mundo contemporâneo. Mesmo nos dias atuais, o “crescei e multiplicai-vos” orienta, por exemplo, as reações religiosas e conservadoras contra o processo de universalização dos métodos contraceptivos modernos.

Em reação ao mundo teocêntrico, o Empirismo e o Iluminismo – movimentos que surgiram depois da Renascença – buscaram combater os preconceitos, as superstições e a ordem social do antigo regime. Em vez de uma natureza incontrolável e caótica, passaram a estudar suas leis e entender seu funcionamento.

Associavam o ideal do conhecimento científico com as mudanças sociais e políticas que poderiam propiciar o progresso da humanidade e construir o “paraíso na terra”. Os pensadores iluministas procuraram substituir o Deus onipresente e onipotente da religião e das superstições populares pela Deusa Razão. Em certo sentido, combateram o teocentrismo, mas não conseguiram superar o antropocentrismo, mantendo de forma artificial a oposição entre cultura e natureza, entre o cru e o cozido, a racionalidade e a irracionalidade.

Dois expoentes do Iluminismo foram fundamentais para lançar as bases da demografia. No bojo da Revolução Francesa e no espírito da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (aprovada em 26/08/1789 pela Assembleia Constituinte), o marquês de Condorcet escreveu o livro Esquisse d’un tableau historique des progrès de l’esprit humain (1794) e William Godwin escreveu Enquiry concerning political justice, and its influence on general virtue and happiness (1793). Eles combateram o teocentrismo, mas não chegaram a questionar o antropocentrismo, pois estavam mais preocupados com o progresso material e cultural dos seres humanos, sem prestar a devida atenção aos direitos da natureza e das outras espécies.

Estes autores defendiam as ideias de justiça, progresso, mudanças nas relações sociais (inclusive nas relações de gênero) e perfectibilidade humana, de certa forma antecipando, teoricamente, o fenômeno da Transição Demográfica. Ambos acreditavam que os avanços da educação e da ciência e os progressos tecnológicos iriam reduzir a pobreza e as taxas de mortalidade e aumentar a esperança de vida da população. As mesmas forças racionais que ajudariam a diminuir as taxas de mortalidade também possibilitariam o decréscimo das taxas de natalidade.

Como disse Condorcet: o perigo de uma superpopulação estaria afastado, pois os casais humanos não iriam racionalmente “sobrecarregar a terra com seres inúteis e infelizes”. Godwin chegou a calcular a “capacidade de carga” do Planeta e era (assim com Adam Smith) muito otimista quanto aos efeitos positivos do crescimento populacional humano (eles não estavam muito preocupados com as outras espécies e com a biodiversidade).

Foi para rebater estas concepções progressistas (e no seio da reação conservadora à Revolução Francesa) que Thomas Malthus publicou o seu panfleto anônimo, de 1798: An essay on the principle of population, as it affects the future improvement of society with remarks on the speculations of Mr. Godwin, Mr. Condorcet, and other writers. Nota-se, pelo próprio título do ensaio, que Malthus não pode ser considerado o pioneiro da demografia moderna, pois ele estava apenas rebatendo as ideias, estas sim pioneiras, de Condorcet e Godwin. E Malthus rebateu da pior maneira possível.

O princípio de população malthusiano – “A população, quando não controlada, cresce numa progressão geométrica, e os meios de subsistência numa progressão aritmética” – não tem base histórica e nem estatística. Para fundamentar a sua “lei”, Malthus utilizou as taxas de crescimento da população dos Estados Unidos e as taxas de crescimento da produção de alimentos da Inglaterra. Este procedimento, elementarmente incorreto, não questionava os limites do Planeta e nem os direitos da biodiversidade, mas apenas dizia que, quaisquer que fossem os limites da natureza, o crescimento exponencial da população, mais cedo ou mais tarde, ultrapassaria a capacidade de produzir meios de subsistência. O objetivo era mostrar que o progresso do bem-estar humano e a redução da pobreza, objetivos básicos do iluminismo, seriam impossíveis diante da “miséria que permeia toda a lei da natureza”. Portanto, Malthus defendia que o controle da população fosse realizado via aumento das taxas de mortalidade, o que ele chamava de “freios positivos”, isto é, miséria, doenças e guerras. Se fosse hoje em dia, Malthus teria colocado as mudanças climáticas na sua lista de freios positivos e como um meio de aumentar a mortalidade dos pobres, pois o seu antropocentrismo era apenas para os ricos.

Em termos morais, para Malthus, a privação e a necessidade eram uma escola de virtude e os trabalhadores somente sujeitar-se-iam às péssimas condições de trabalho se estivessem premidos pela falta de meios de subsistência. Evidentemente, Malthus subestimou de forma deliberada os progressos tecnológicos e os avanços da Revolução Industrial, quando previu o aumento linear dos meios de subsistência. Em relação ao crescimento exponencial da população e às altas taxas de fecundidade, Malthus, enquanto pastor da Igreja Anglicana, simplesmente era contra os métodos contraceptivos e o aborto. Após ser criticado por William Godwin, Malthus introduziu, na segunda versão do ensaio (desta vez assinada), de 1803, a noção de “freios preventivos”, isto é, restrições morais ao casamento precoce e adiamento da nupcialidade como forma de redução da parturição (a fecundidade marital continuaria natural, ou seja, sem a regulação humana). Malthus era contra o sexo e os filhos fora do casamento, sendo que a união conjugal (unicamente heterossexual) tinha função prioritariamente procriativa. Por tudo isso, Malthus rebateu as considerações de Condorcet e Godwin sobre os progressos da ciência e da tecnologia e sobre a redução das taxas de mortalidade e natalidade, para argumentar que o desenvolvimento humano seria impossível e que os trabalhadores deveriam receber apenas um salário de subsistência suficiente para manter o equilíbrio homeostático entre população e economia.

Evidentemente, Malthus virou alvo das críticas dos pensadores progressistas e socialistas. Por exemplo, Karl Marx considerava que a sociedade capitalista é capaz de produzir meios de subsistência em progressão bem maior do que o crescimento demográfico. Para ele, o “excesso” de população não é fruto de leis naturais como afirmava Malthus, mas sim um subproduto da lógica do capital, que continuamente gera mudança qualitativa de sua composição orgânica, com o permanente acréscimo de sua parte constante (meios de produção) à custa da parte variável (força de trabalho). Este processo produz uma “superpopulação relativa” ou um “exército industrial de reserva”, o qual regula a oferta e a demanda de trabalhadores de tal forma que, pela pressão dos desempregados sobre a massa de trabalhadores ocupados, o salário pode manter-se ao nível de subsistência. O exército de reserva também proporciona a manutenção de um estoque humano à disposição do capital.

Para Marx, bastava resolver o conflito final da luta de classes a favor do proletariado e todos os problemas do mundo seriam resolvidos, podendo haver desenvolvimento irrestrito das forças produtivas, sem restrições da natureza.

Contra a “lei de população” de Malthus, Marx formulou uma prototeoria relativista e não falseável: “Todo modo histórico de produção tem suas leis próprias de população, válidas dentro de limites históricos”. O fato é que Marx não tinha teorias nem demográfica e nem ecológica. Além disso, o lema romântico utópico do comunismo – “De cada um, de acordo com suas habilidades, a cada um, de acordo com suas necessidades” – é fortemente antropocêntrico, como se as necessidades humanas pudessem ser satisfeitas sem restrições aos direitos da Terra e das demais espécies. Engels chegou a escrever um livro glorificando o domínio humano sobre a natureza. Por conta disso, as correntes ecossocialistas atuais tentam corrigir, ainda sem grande sucesso, o evolucionismo produtivista e a instrumentalização da natureza, ideias embutidas nos fundamentos das teorias marxistas.

Porém, não é uma tarefa simples substituir o vermelho (do socialismo) pelo verde (da ecologia).

Historicamente, a demografia nasceu e cresceu em torno do debate sobre população humana e desenvolvimento econômico. Este debate foi sintetizado no livro de Ansley Coale e Edgar Hoover Population growth and economic development in low-income countries, de 1958. A ideia apresentada no livro é a de que o processo do desenvolvimento econômico acontece de forma sincrônica com a transição demográfica, sendo que o desenvolvimento reduz as taxas de mortalidade e fecundidade e a transição demográfica altera a estrutura etária, diminuindo o ônus da dependência de crianças e jovens, o que favorece ao desenvolvimento. Porém, o livro alerta para a possibilidade de uma redução exógena das taxas de mortalidade nos países de baixa renda, sem uma queda das taxas de fecundidade e sem modificação endógena do processo de desenvolvimento econômico. Nestes casos, haveria uma situação de “armadilha da pobreza”, pois existiria a possibilidade de ocorrer uma aceleração do crescimento populacional juntamente com um aumento do ônus da dependência demográfica de crianças e jovens, o que poderia impedir a decolagem (take off) do desenvolvimento.

Foi para resolver este problema que se avolumaram as recomendações neomalthusianas. Nota-se que, ao contrário de Malthus, os neomalthusianos propunham o freio da população por meio da limitação da fecundidade e não do aumento da mortalidade. Malthus achava que era impossível acabar com a pobreza. Os neomalthusianos acreditavam que seria possível acabar com a pobreza e avançar com o desenvolvimento econômico promovendo a transição da fecundidade.

Este debate, típico das décadas de 1960 e 1970, esteve no centro das discussões da Conferência sobre População de Bucareste, em 1974. Os países ricos queriam promover o controle da natalidade, enquanto os países pobres queriam impulsionar o desenvolvimento.

Venceram os segundos, com a seguinte palavra de ordem: “O desenvolvimento é o melhor contraceptivo”. Diversos países (e os fundamentalismos religiosos) aproveitaram o argumento para combater ou relaxar as políticas de acesso aos métodos de regulação da fecundidade. A China promoveu o desenvolvimento econômico juntamente com o controle da natalidade mais draconiano da história (a política de filho único), todavia, o resultado aparece em uma enorme degradação ambiental. Portanto, em qualquer cenário, o grande vencedor tem sido o antropocentrismo, pois o desenvolvimento das forças produtivas e o aumento do bem-estar da humanidade têm ocorrido em detrimento da natureza e das outras espécies.

A Conferência de Meio Ambiente de Estocolmo, de 1972, já havia alertado sobre os limites do Planeta e a rápida degradação ambiental.

Desde aquela época, já não era mais possível ignorar os danos ao meio ambiente.

O resultado foi o surgimento do conceito de desenvolvimento sustentável, apresentado oficialmente pelo relatório Brundtland, de 1987: “O desenvolvimento que satisfaz as necessidades presentes, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias necessidades”. Todavia, se o conceito de desenvolvimento sustentável foi um avanço no sentido de se preocupar com as futuras gerações humanas, não chegou a formular alternativas para a preservação das outras espécies e a conservação do Planeta. Por isto se diz que o desenvolvimento sustentável é um antropocentrismo intergeracional. Isto ficou claro quando a Cúpula do Rio (1992) aprovou a concepção antropogênica: “Os seres humanos estão no centro das preocupações para o desenvolvimento sustentável”.

Desde a década de 1970, a ONU organiza conferências paralelas e desencontradas sobre “Meio ambiente” e “População e Desenvolvimento”. Em uma ela diz defender a natureza e na outra ela diz defender o desenvolvimento. Na Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento (CIPD), realizada no Cairo, em 1994, foi dito que o desenvolvimento é um direito dos povos e todas as pessoas possuem direitos reprodutivos para decidir livremente sobre o tamanho da prole. Enquanto os pessimista veêm cada nova pessoa como mais uma “boca” (consumidor) , os otimistas veêm como mais um “braço” (produtor).

Embora essa idéias possam ser vistas sob diferentes óticas, não deixam de serem compatíveis com o pensamento de Ester Boserup e Julian Simon que viam o crescimento populacional como um indutor positivo do desenvolvimento econômico. Este último autor considera que quanto mais gente existir, melhor para o mundo, pois o que conta não são as bocas ou os braços, mas sim os cérebros (a inventividade humana). Embora poucas pessoas usem adequadamente os seus cérebros, Julian Simon serviu de inspiração para as políticas neoliberais do governo Ronald Reagan, sendo também um modelo teórico para os atuais céticos das mudanças climáticas, ou seja, daquelas pessoas que negam os problemas ambientais em nome do crescimento econômico e da continuidade da exploração dos combustíveis fósseis e da eterna dominação da natureza. Para estes positivistas e fundamentalistas de mercado, o aquecimento global ou não existe ou seria resolvido pela geoengenharia. Por tudo isto, Simon pode ser considerado o suprasumo do antropocentrismo, pois não leva em conta os impactos negativos das atividades humanas, inclusive o impacto negativo dos produtos de alguns dos cérebros mais “brilhantes” e das tecnologias mais sofisticas. Por estas e outras, a CIPD do Cairo nem tocou nos direitos reprodutivos das outras espécies e no direito de vida e reprodução da natureza. Não foram discutidas metas para a estabilização da economia e da população e o desenvolvimento continuou sendo visto como uma panacéia para resolver os problemas do mundo.

Porém, cresce a percepção de que não pode haver desenvolvimento sustentável por meio do contínuo crescimento da população e da economia. São cada vez maiores os riscos de se ignorar os limites ambientais do Planeta. Pela metodologia da Pegada Ecológica, as atividades antrópicas já ultrapassaram em 50% a capacidade de regeneração da Terra. O fato é que o incremento do consumo, de um lado, e o aumento da população, de outro, estão contribuindo, mesmo que de forma diferenciada, para uma rápida degradação ambiental. Não existe consumo sem população e nem população sem consumo. Crescimento econômico e populacional ilimitado é uma equação impossível em um Planeta finito.

A solução milagrosa do avanço tecnológico como forma de resolver os problemas do desenvolvimento e do meio ambiente também tem sido questionada, pois a maior eficiência microeconômica – produção de mais produtos com menos insumos – não significa menor demanda agregada. Ao contrário, o que tem acontecido nos últimos 200 anos é o aumento macroeconômico do consumo de energia e de recursos naturais à medida que cresce a eficiência produtiva. Isto é o que se chama de Paradoxo de Jevons, fenômeno observado pelo economista britânico WilliamJevons e que realça o fato de que, conforme as novas tecnologias conseguem elevar a eficiência de um dado recurso natural, seu uso total tende a aumentar ao invés de diminuir.

O fetichismo da ciência e da tecnologia já havia sido questionado no início do século XIX. Enquanto os iluministas e, posteriormente, os positivistas apostaram todas as suas fichas no avanço científico e tecnológico para resolver os problemas da humanidade, os efeitos não antecipados da criatividade humana foram problematizados por ninguém menos do que Mary Shelley – filha de William Godwin e da feminista Mary Wollstonecraft –, que publicou, em 1818, o livro Frankenstein, the modern Prometheus. Na mitologia grega, Prometeu foi o herói que robou o fogo (a sabedoria) dos deuses para “iluminar” a humanidade e foi castigado por Zeus, que o amarrou a uma rocha enquanto uma águia comia o seu fígado dia após dia, durante a eternidade. No livro de Mary Shelley, Victor Frankenstein foi o médico (e químico) que desenvolveu uma tecnologia para dar vida a uma criatura, que ele mesmo renegou e que, involuntariamente, acabou causando grande infelicidade a todos ao seu redor. Na realidade, Frankenstein é uma metáfora sobre as consequências imprevistas dos avanços da ciência, da tecnologia e do desenvolvimento econômico. Um libelo precoce contra a tendência de hipostasiar o progresso. O livro de Mary Shelley serve de alerta quanto aos perigos da racionalidade humana – característica que define o homo sapiens e o diferencia dos animais irracionais –, mostrando que a inteligência pode ser razão de sucesso ou de fracasso. Ou os dois ao mesmo tempo.

Foi também no século XIX que o economista inglês John Stuart Mill publicou, em 1848, o livro Principles of political economy, em que questiona o impacto do crescimento populacional e econômico sobre o meio ambiente e defende o “Estado Estacionário”, ou seja, o fim do crescimento econômico quantitativo e o estabelecimento de uma relação harmoniosa e qualitativa entre economia, população e meio ambiente. Stuart Mill deu um primeiro passo para a superação do antropocentrismo, ao deixar de engrossar o coro que vangloria o crescimento sem limites das forças produtivas. Hoje em dia, surge no debate não só a questão do Estado Estacionário, mas também a ideia do Decrescimento Econômico.

Todavia, mesmo após 220 anos, não existe consenso na comunidade internacional de como tratar as questões de população, desenvolvimento e ambiente. Os ricos culpam os pobres pelos problemas da miséria e da degradação ambiental e os pobres culpam os privilégios dos ricos pela pauperização das pessoas e da natureza. Os países desenvolvidos, em geral, tendem a buscar soluções para o desenvolvimento nos avanços tecnológicos.

Alguns países em desenvolvimento ainda repetem frases do tipo: “Não existe problema populacional, mas sim população com problema”, como se o impacto populacional fosse neutro e fosse possível resolver os problemas humanos apelando para uma exploração desregrada do meio ambiente. Por isto mesmo, no movimento ambientalista, a noção de crescimento econômico tem sido questionada e o conceito de desenvolvimento sustentável tem sido visto como um oximoro.

Em pleno século XXI e às vésperas da Conferência Rio + 20, as posturas convencionais sobre a natureza ainda têm como base uma visão instrumental da utilização do conjunto de recursos ambientais disponíveis em função das pessoas.

A modernidade avançou defendendo a ampliação dos direitos humanos, em suas diversas gerações: direitos políticos, civis, culturais, sociais, econômicos, direitos reprodutivos, etc. Mas a crise ecológica da modernidade decorre justamente da incapacidade de expandir estes direitos para outras espécies e para o Planeta. O atual modelo de desenvolvimento “marron” (poluidor), além de insustentável, pode fazer a humanidade caminhar rumo ao suicídio e ao ecocídio.

Segundo dados de Angus Maddison, entre 1800 e 2011, a população mundial cresceu “aritmeticamente” sete vezes e a economia cresceu “geometricamente” cerca de 90 vezes, mostrando que o otimismo de Condorcet e Godwin estava mais próximo das tendências históricas do que o pessimismo de Malthus. Houve grande aumento da renda per capita mundial e a esperança de vida ao nascer passou de menos de 30 anos para cerca de 70 anos. Mas esta vitória humana teve como base a exploração de uma dádiva da natureza que forneceu imensas reservas de combustíveis fósseis para turbinar a economia. No processo produtivo, monstruosidades foram criadas, como imaginou Mary Shelley, em o Frankenstein (por exemplo, a bomba atômica). A produção de bens e serviços cresceu utilizando tecnologias (agro) tóxicas e queimando os recursos fósseis. Existem dúvidas quando será atingido o “Pico de Hubbert” (o início do declínio da produção da energia fóssil), mas o futuro pode não ser tão promissor quanto foi o passado, pois o custo acumulado da dívida com a natureza (o “pacto faustiano”) deverá ser pago no século XXI.

Isto fica claro quando se observa que o aumento do padrão de consumo da humanidade deixou sinais de insustentabilidade ambiental por todos os lados: a erosão dos solos; desertificação de amplas áreas terrestres; desmatamento e aniquilamento de biomas; uso e abuso dos aquíferos; poluição e salinização das águas dos rios; e acidificação dos oceanos, com a consequente diminuição da fertilidade das fontes de vida. Mais da metade dos mangues e dos recifes de coral do mundo já foram destruídos. As atividades antrópicas trouxeram a maior extinção em massa da vida vegetal e animal da nossa história, com cerca de 30 mil espécies sendo extintas a cada ano. O ser humano mudou a química da terra e do céu, aumentando o dióxido de carbono na atmosfera e provocando o aquecimento global, com todas as consequências negativas deste processo sobre a biodiversidade.

Diante do aumento da probabilidade de colapso ecológico, nos últimos anos têm havido tentativas de incorporar os direitos ambientais – de terceira geração – junto aos demais direitos humanos. Mas estes direitos ambientais giram em torno das pessoas e continuam tratando a natureza como objeto. A perspectiva antropocêntrica considera normal a mercantilização das espécies e da natureza, porém a Terra e os seres vivos deveriam possuir direitos intrínsecos, independentemente de suas utilidades para a população hegemônica. Cresce o movimento de advocacy em favor dos direitos dos seres sencientes e contra os maus tratos aos animais. As ciências humanas já abordaram, com maior ou menor profundidade, as discriminações provocadas pelo classismo, sexismo, escravismo, racismo, xenofobismo e homofobismo, mas pouco se falou do especismo, que é a discriminação existente com base nas desigualdades entre as espécies. Para tanto, o altruísmo ecológico deve substituir o egoísmo humano e a regulação dos “bens comuns” deve substituir a “tragédia dos comuns”. A água, por exemplo, deve ser vista como um bem comum, mas não só da humanidade e sim de todas as manifestações de vida do Planeta. A água limpa e pura deve inclusive ter o direito de continuar sendo limpa e pura e não ser instrumentalizada por uma ou outra espécie.

Por tudo isto, a demografia não pode se preocupar apenas com o tamanho e o ritmo de crescimento da população humana. Também não basta conhecer as características de sexo e idade e a distribuição espacial das diversas subpopulações. Parafraseando Keynes, todo demógrafo vivo é escravo das ideias de algum demógrafo (ou economista) morto. Mas o grande desafio inovador da atualidade é romper com a perspectiva baseada em valores antropocêntricos e assumir uma mudança de paradigma, adotando uma postura voltada para os valores ecocêntricos (centralizados nos direitos da Terra, do conjunto das espécies e no respeito à biodiversidade). O ser humano não vive em um mundo à parte. Ao contrário, a humanidade ocupa cada vez mais espaço no Planeta e tem investido de maneira predatória contra todas as formas de vida ecossistêmicas da Terra. Darwin mostrou que as espécies vivas possuem um ancestral fóssil comum. Todas as espécies são parentes e vivem no mesmo lar. Não há justificativa para a dinâmica demográfica humana sufocar a dinâmica biológica e ecológica. A sustentabilidade deve estar baseada na convivência harmoniosa entre todos os seres vivos.

A Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio + 20, deveria enfrentar as ambiguidades do conceito de desenvolvimento sustentável, buscando abordar as questões demográficas e os direitos da Terra e dos animais, numa perspectiva ecológica e holística. Contudo, a preocupação com a Economia Verde não tem dado espaço para se pensar formas alternativas de organização social e de interação econômica que superem o modelo atual de produção e consumo. O colapso ecológico pode se tornar irreversível se a comunidade internacional não entrar em um acordo para reverter as tendências do aquecimento global e da depleção dos recursos naturais. O passo mais fundamental e necessário passa pelo rompimento com o antropocentrismo e a construção de um mundo justo e ecocêntrico.

Referência: Este texto é uma versão um pouco ampliada do artigo:

ALVES, J.E.D. Do antropocentrismo ao ecocentrismo: uma mudança de paradigma. In: MARTINE, George (Ed.) População e sustentabilidade na era das mudanças ambientais globais: contribuições para uma agenda brasileira. Belo Horizonte: ABEP, 2012.

Fonte: www.ie.ufrj.br