5.8.20

Revolução de 30

Revolução de 1930 - História do Brasil - InfoEscola

Para se compreender a Revolução de 30, necessário se faz conhecer os fatos que a antecederam. Importante é o texto acerca de Washington Luís para entender a situação nacional de então.

Dentre os fatores que levaram à Revolução de 30, válido seria ressaltar alguns. Em primeiro lugar, a emergência de uma classe média, do tenentismo, de uma incipiente burguesia e do movimento operário, todos insatisfeitos com a República Velha, contribuiu sobremaneira para a derrocada do regime.

Além disso, os demais Estados da Federação estavam insatisfeitos com a exclusão que São Paulo e Minas lhes impunha. Os outros setores econômicos – charqueadores, produtores de açúcar, de cacau, de borracha, de arroz, os industriais, etc – não viam com bons olhos a política de priorização do café. Os incentivos que lhes eram oferecidos eram parcos.

A crise de 29 recrudesceu a insatisfação desses setores. A valorização do café havia atingido níveis absurdos, a ponto de o Brasil produzir quase duas vezes mais do que a capacidade de absorção do mercado mundial.

Mesmo os membros da situação, que por anos estiveram coesos, começaram a desentender-se desde o início da década, culminando no racha das oligarquias para a sucessão de 30. De um lado, na Aliança Liberal, Getúlio Vargas; do outro, na Concentração Conservadora, Júlio Prestes. Parte da elite que por anos esteve unida estava agora na chapa oposicionista, aliada aos demais setores sociais.


Com a eleição de Júlio Prestes, parecia ter passado o “momento revolucionário”. Entretanto, ao reabrir-se o Congresso, a 3 de maio, verificaram-se sérias divergências entre parlamentares da oposição e a maioria governista.

Um fato imprevisto agravou a crise que se havia reacendido: foi assassinado a 26 de julho, numa confeitaria do Recife, o governador da Paraíba, João Pessoa.

Embora o assassino estivesse motivado por questões da política local, João Pessoa figurava como candidato à Vice-presidência, juntamente com Getúlio Vargas, o que fez da sua morte uma grande comoção nacional. Estava fornecido o pretexto para a eclosão da Revolução, cujas causas, já se sabe, eram mais profundas.

Preparou-se a revolução. No dia determinado, 5 de outubro de 1930, Osvaldo Aranha e Flores da Cunha iniciam o movimento tomando, com apenas 50 homens, o Quartel-general de Porto Alegre. Simultaneamente eclodia a revolução em Minas Gerais e na Paraíba.

Iniciando o levante no Recife, Juarez Távora pôs em fuga o governador de Pernambuco, Estácio Coimbra. Em breve o Norte e o Nordeste do país estavam em poder dos revolucionários.

Seguro da vitória da revolução naquelas regiões, empreendeu Juarez Távora sua marcha em direção à região Sudeste atravessando Alagoas, Sergipe e atingindo a Bahia.

No Sul, as forças revolucionárias comandadas por Getúlio Vargas depois de enfrentar pequena resistência no Rio Grande do Sul, encaminharam-se em direção a Santa Catarina e Paraná. Quando se preparavam para atacar Itararé, posição bem defendida e considerada imprescindível para a ocupação de São Paulo, um grupo de generais e almirantes sediados no Rio, decidiu atuar, depondo o Presidente Washington Luís.


Estabeleceu-se assim uma Junta Pacificadora composta pelo general Mena Barreto, general Tasso Fragoso e almirante Isaías Noronha. Não se sabe ao certo se a Junta Pacificadora estava comprometida com os revolucionários, se desejava mudar o encaminhamento da revolução ou se, patrioticamente, agiu para evitar mais derramamento de sangue e as conseqüências de uma guerra civil. Admitiu, sem resistência, a liderança de Getúlio Vargas, que, chegando ao Rio a 3 de novembro de 1930, assumiu provisoriamente o governo da República como delegado da Revolução, em nome do Exército, da Marinha e do “Povo”, por quem eles se julgavam legitimados. Estava vitorioso o movimento.

Fonte: elogica.br.inter.net
Revolução de 30


Os Antecedentes

O Dr. Washington Luís assumiu o poder em 15 de novembro de 1926. A tensão política logo se agravou quando ele recusou anistia aos revolucionários.

Em São Paulo, morrera o Presidente Carlos de Campos, sucedendo-lhe Júlio Prestes, que assumiu a presidência do Estado em 14 de junho de 1927.

Antônio Carlos Ribeiro de Andrade, Presidente de Minas Gerais, resolveu seguir outra orientação; de conservador tornou-se liberal, deixando entrever sua ambição de chegar à presidência da República.

Era praxe antiga, quebrada apenas pela ascensão de Hermes da Fonseca e Epitácio Pessoa, São Paulo e Minas Gerais alternarem-se nas sucessões presidenciais. Pela ordem natural caberia desta feita a Minas Gerais fazer o Presidente da República. Washington Luís, entretanto, prestigiou Júlio Prestes, demonstrando antipatia pelo governante mineiro e aproximando-se dos gaúchos.

Os mineiros, por seu turno, procuraram apoio no Rio Grande do Sul, com o propósito de afastar o candidato paulista, mesmo que importasse na renúncia de Minas. De um entendimento entre o Secretário do Interior de Minas Gerais. Francisco Campos, e o líder da bancada gaúcha, João Neves da Fontoura, nasceu a Aliança Liberal, em 17 de junho de 1929, com a indicação dos nomes de Getúlio Vargas ou Borges de Medeiros para candidatos. O primeiro, evitando desgastar-se, procurou não estabelecer áreas de atrito com o poder central. Em duas cartas secretas a Washington Luís, uma de dezembro de 1928 e outra de maio de 1929, afirmou apoiar o governo. Mas, para a perplexidade de Washington Luís, Vargas aceitava, em julho de 1929, a sua candidatura à presidência pela Aliança, tendo João Pessoa, Presidente da Paraíba, como companheiro de chapa. Em 15 de agosto, a Comissão Executiva da Aliança Liberal lançou a candidatura Getúlio Vargas – João Pessoa.


Os tenentes revolucionários foram abordados pela ala radical da Aliança, onde figuravam, entre outros líderes, Virgílio de Melo Franco, João Neves da Fontoura e Flores da Cunha. No Rio Grande do Sul, Siqueira Campos aproximou Luís Carlos Prestes de Getúlio, que lhe ofereceu o comando revolucionário, garantindo apoio em dinheiro e armamento. Prestes não estava acreditando no movimento, achando-o “competição de oligarquias”. As suas tendências para a esquerda causavam desconfianças.

O delegado Laudelino de Abreu detectou a conspiração em janeiro de 1930.

A rebelião crescia também nos meios políticos paulistas. Alguns oficiais revolucionários seguiram para São Paulo, conduzidos por Siqueira Campos e Djalma Dutra. A polícia paulista localizou-os em uma casa da rua Bueno de Andrade e esperou que saíssem. Ao se retirarem do referido prédio foram recebidos à bala.

Siqueira Campos reagiu a tiros, conseguindo escapar. Djalma Dutra e Correa Leal foram presos, sendo remetidos para o Rio de Janeiro. Caio Brant estreitava as ligações com Minas Gerais. No Rio de Janeiro atuavam os conspiradores Tasso Tinoco, Eduardo Gomes, Delso Fonseca, Adir Guimarães e Cordeiro de Farias.

No Nordeste, a conspiração também ia ganhando corpo.

A polícia apertou o cerco; a 11 de janeiro, Juarez Távora foi preso na Fortaleza de Santa Cruz. O Chefe de Polícia da capital. Dr. Pedro de Oliveira Sobrinho, acompanhava de perto os passos dos revolucionários e teve conhecimento de que Juarez planejava uma fuga. Mesmo assim ele conseguiu evadir-se (28 de fevereiro) com alguns companheiros. Miracema era o ponto de concentração de Estillac Leal e outros. Dezoito dias depois Juarez se juntaria a eles, após restabelecer-se de alguns ferimentos ocasionados pela fuga.

Aproximaram-se as eleições e as caravanas partiam para as campanhas eleitorais. A tônica dos discursos era a critica arrasadora à plataforma de Júlio Prestes e aos atos de intolerância do Presidente Washington Luís.

Com as manifestações, exasperavam-se os ânimos da população, João Neves, diante das reações do auditório do Teatro Princesa Isabel em Recife, Pernambuco, antecipou:


“Vamos para as urnas na expectativa de um pleito liso e límpido. Mas jamais, pernambucanos, aceitaremos como boa a sentença da fraude ou nos renderemos à imposição da violência oligárquica. (…) Ide, pernambucanos, para os comícios, confiantes no Direito que nos assiste. (…) Mas, se a 1º de março os donatários do Brasil tentarem apagar no mar morto da trapaça o pronunciamento da Nação, levantemo-nos então em armas por amor ao Brasil!”

Nem sempre as caravanas encontravam receptividade. Batista Luzardo, em Garanhuns, embora conseguisse sair ileso na fuga de um comício, teve o carro várias vezes perfurado a balas. Em Vitória, Espírito Santo, quando discursava o Senador Félix Pacheco, irrompeu um tiroteio que provocou mais de 100 vítimas, entre mortos e feridos.

Foi nesse clima de agitada campanha eleitoral que chegou o dia 1º de março. Além das várias sondagens sobre as possibilidades eleitorais feitas por Oswaldo Aranha, Lindolfo Collor e Joaquim Sampaio Vidal, seguiam paralelamente as providências para o movimento armado. Na época era comum a fraude eleitoral.

Júlio Prestes, ostentando boa margem de votos, foi aclamado pelos conservadores, inclusive pelo Presidente da República. E, em navio do Lloyd, embarcou para os Estados Unidos.

Vários próceres do Rio Grande do Sul opinavam que o melhor caminho seria o reconhecimento da vitória do adversário, acatando o resultado das urnas. Todavia, a reação dos extremados foi imediata. Não aceitavam a capitulação. Assis Brasil dizia que o Partido Libertador iria, com seus aliados, até às últimas conseqüências.

A conspiração cresceu e, a 20 de março, Batista Luzardo dirigiu-se a Epitácio Pessoa para pedir colaboração, afirmando que o Rio Grande do Sul estava pronto e à espera do apoio de Minas e da Paraíba. Oswaldo Aranha planejou a distribuição das armas trazidas da Tchecoslováquia.

O Norte ficara a cargo de Juarez Távora, que se evadira da Fortaleza de Santa Cruz, no Rio de Janeiro, a 28 de fevereiro de 1930, e viajara para a capital da Paraíba, instalando-se na casa do Tenente Juracy Magalhães; São Paulo, de Siqueira Campos; por Minas responderia o Capitão Leopoldo Nery da Fonseca. Intensificaram-se as articulações.

O quadro revolucionário alterou-se com a declaração de Luís Carlos Prestes, que se convertera ao comunismo. Siqueira Campos e João Alberto rumaram para Buenos Aires, no início de maio, a convite de Prestes, onde lhes afirmou ainda não ser a revolução em marcha a que ele desejava. A reforma do Brasil, segundo ele, só seria alcançada com o regime marxista ao qual ele havia se convertido. Não foi possível demovê-lo de sua posição radical, colocada de público com o lançamento do seu Manifesto, nesse mesmo mês de maio. Na viagem de retorno, a 9 de maio, utilizaram um avião “Laté-28” monomotor que caiu no Rio da Prata, morrendo quatro passageiros, inclusive Siqueira Campos, mas João Alberto conseguiu sobreviver.

No dia 22 de maio, Júlio Prestes foi proclamado Presidente e a 1º de junho Getúlio lançou um manifesto que, censurando o resultado do pleito, aceitava no entanto a derrota como fato consumado. Oswaldo Aranha demitiu-se da Secretaria do Interior do Rio Grande do Sul. João Pessoa encontrava-se às voltas com os jagunços de José Pereira Lima, que dominava a cidade de Princesa. Era difícil conseguir armamento. O governo federal negava à Paraíba recursos para aparelhar a polícia. O Estado estava na iminência de sofrer intervenção federal. E a imprensa ligada a João Pessoa excedeu-se contra o advogado Dr. João Duarte Dantas, filho de Franklin Dantas, aliado de José Pereira. O ódio de João Dantas cresceu com a publicação de papéis particulares apreendidos em sua casa pela polícia. Jurou vingança. E às 17 horas do sábado 26 de julho de 1930, entrou na confeitaria Glória, em Recife, onde se encontravam em uma mesa o Presidente João Pessoa, Agamenon Magalhães e Caio Lima Cavalcanti e descarregou três tiros em João Pessoa. O crime teve muita repercussão no campo político; era um novo impulso dado à revolução.

Virgílio de Melo Franco, sem perda de tempo, reativou contatos com Minas Gerais e Rio Grande do Sul. Em São Paulo o Capitão Ricardo Hall assumiu o posto de Siqueira Campos, mas, descoberto, teve de fugir. Os irmãos Etchgoyen foram designados para Mato Grosso. Juarez reativava o Norte.

Em agosto, veio o apoio de Borges de Medeiros, resultado do esforço de Oswaldo Aranha. O movimento recebeu a adesão de outros oficiais do Exército. O Tenente-Coronel Pedro Aurélio de Goes Monteiro foi escolhido chefe do estado-maior revolucionário. A eclosão estava preparada para o dia 3 de outubro.
A revolução de 1930

A revolução de 1930 ocorreu porque uma grave crise econômica e política atingia o país. A quebra da bolsa de valores de Nova Yorque refletiu tremendamente no Brasil e fábricas fecharam, demissões em massa ocorreram, salários cairam e havia dois milhões de desempregados no país.

Cairam as cotações de café no mercado internacional e o Brasil, pricnipal exportador deste, ficou prejudicado, pois o café permaneceu estocado, sem compradores.

Politicamente também a situação se conduzia mal. Havia entre São Paulo e Minas Gerais um revezamento na presidência da república, o chamado esquema “café com leite”. Esse esquema sofreu um grande abalo.

Atendendo aos apelos dos fazendeiros paulistas, o presidente Washington Luis impôs o nome de Júlio Prestes para sua sucessão em 1930, quebrando o acordo anterior.

Inconformado, o partido republicano mineiro uniu-se ao do Rio Grande do Sul, formando a Aliança Liberal e lançando a candidatura de Vargas à presidência.

Mas por trás dessa aliança havia participantes do movimento tenentista, jovens oficiais que desde 1922 lutavam para derrubar a República Velha. Líderes como Miguel Costa, Luis Carlos Prestes, Juarez Távora, Siqueira Campos e outros, que eletrizaram o país em 1924/25 na campanha da coluna Prestes, representavam perspectivas de mudanças.

Em 1930 a Aliança Liberal era a grande esperança brasileira, mantendo um programa progressista. O programa apresentado por Getúlio Vargas prometia ainda solucionar as questões sociais isto é, fazer justiça ao povo.

A Aliança Liberal, com Getúlio à frente, partiu para o “assalto armado” ao poder e derrubou a velha situação.

Em 1930 Getúlio Vargas toma posse da presidência da república.

Fonte: www.conhecimentosgerais.com.br
Revolução de 30
A REVOLUÇÃO DE 30: LIÇÕES PARA A SAÍDA DA CRISE BRASILEIRA ATUAL

Introdução

A Revolução de 1930 é um marco da formação brasileira que assinala o fim da República Velha e a abertura de um novo período histórico no qual é implementado um modelo de desenvolvimento, mais tarde batizado de nacional-desenvolvimentismo, que elevou o país à condição de nação moderna e industrializada. Ela representa uma ruptura que leva ao abandono de uma economia agro-exportadora e dá início a uma nova etapa na qual são lançadas as bases para industrialização brasileira, tendo à frente o Estado como o grande fomentador do desenvolvimento econômico. Nos cinqüenta anos compreendidos entre 1930 e 1980, o Brasil destacou-se como uma das economias mais dinâmicas do mundo, comparável à do Japão e da União Soviética. Esta vitalidade se expressou na balança comercial de exportações, onde o peso dos produtos primários, sobretudo o do café, foi sendo superado pelo dos produtos industrializados. A partir de 1930, o capital industrial assume um papel de destaque no desenvolvimento brasileiro, fornecendo as bases que possibilitaram a implantação de um capitalismo moderno o qual, por várias décadas, assegurou um extraordinário surto de industrialização e afirmação do Brasil no cenário internacional.

Assim, diante do indiscutível legado desse período, liderado por Getúlio Vargas, chefe de governo responsável pela montagem de um cenário de desenvolvimento que começou na década de 30 e se estendeu até o início dos anos 80, pergunta-se: Qual o significado da Revolução de 30 para os dias atuais? Por que revisitar esse período histórico?

Os acontecimentos de 30 e as políticas adotadas no passado contêm, certamente, lições que, se aplicadas ao presente, poderiam apontar saídas para a superação da crise, a qual, nas últimas duas décadas, vem bloqueando o desenvolvimento do país.

Tal como no período iniciado com a crise do petróleo em 1973, em 1930 a economia mundial encontrava-se em um período depressivo e seus reflexos sobre a formação social brasileira impunham ajustes sócio-econômicos que se materializaram na vitória de um novo pacto de poder liderado por Getúlio Vargas.

Aliás, a evolução econômica brasileira, conforme assinala Ignácio Rangel, segue o comportamento dos ciclos longos ou ciclos de Kondratieff que regulam a economia mundial, havendo coincidência entre as fases recessivas desses ciclos e os grandes acontecimentos da história nacional, expressão dos ajustes estruturais que o país se vê obrigado a realizar para adaptar-se à conjuntura mundial e ao avanço das forças produtivas, os quais, no plano interno, geram mudanças nas relações sociais e na composição da classe dominante brasileira.

Se nos períodos de expansão o Brasil se insere dinamicamente numa nova divisão internacional do trabalho, nos períodos depressivos ele reage também positivamente, com um dinamismo próprio, substituindo importações. Isso se deu pela primeira vez na fase depressiva do primeiro ciclo longo (1815-1848), no interior das fazendas de escravos quando aconteceu uma substituição natural de importações; uma segunda substituição artesanal de importações ocorre já nos núcleos urbanos na fase depressiva do segundo ciclo longo (1873-1896) e, finalmente, a terceira, uma substituição industrial se consolida a partir de 1930.
A Revolução de 30: conjuntura nacional e internacional

Com a Proclamação da República prevalecera na composição da classe dominante brasileira uma associação de grandes comerciantes de importação e exportação com os latifundiários feudais, dissidência progressista das antigas fazendas escravistas transformadas em latifúndios feudais. A mudança de regime político representa o ponto de convergência dos acontecimentos históricos que, nesse período, no embalo das transformações econômicas provocadas pelo “crescimento das forças produtivas frente à fase depressiva do segundo ciclo longo (1873-1889), evidencia a incompatibilidade entre o sistema monárquico – leia-se centralismo administrativo e escravismo – e o desenvolvimento do país” (PEREIRA, 1997, p.226). A descentralização republicana, por sua vez, dera maior flexibilidade político-administrativa ao governo no campo econômico, beneficiando sobretudo os grandes exportadores. Assim, durante a República Velha foram se fortalecendo, no interior do bloco detentor do poder de Estado, as classes dirigentes representadas pelos comerciantes de exportação e importação e pelos grandes latifundiários, ligados basicamente à produção de café, que tinham seus interesses voltados especialmente para o mercado externo. A política de valorização do café é a expressão da hegemonia exercida, no contexto da federação brasileira, pelos cafeicultores. A intervenção governamental no mercado cafeeiro para implementar medidas favoráveis ao setor provoca uma crescente oposição de outros segmentos sociais que julgando-se prejudicados começam a romper a aparente inércia do processo histórico, tal como já acontecera em fases depressivas anteriores.

Neste contexto, os grandes proprietários de terras, cuja produção destinava-se ao mercado interno, sentiam-se marginalizados frente à hegemonia dos agro-exportadores e, insatisfeitos, exigiam as mudanças que fizeram eclodir a Revolução de 30. Os latifundiários feudais revolucionários – basicamente oriundos das áreas de feudalismo precoce ligadas à atividade pastoril – se aliaram à burguesia industrial nascente, originária da pequena produção mercantil, fruto do processo imigratótrio do século XIX. A revolução representa, portanto, uma luta entre as oligarquias regionais, em que aquelas mais preocupadas com a agroexportação, isto é, com o café, foram alijadas do poder e substituídas por latifundiários cuja produção voltava-se para o mercado interno. A ruptura interna na formação social brasileira era uma resposta à recessão mundial iniciada nos anos 20, cujo auge é representado pela Grande Depressão de 1929, e que somada à crise do café, por um lado restringia as exportações brasileiras e, por outro, diminuía as possibilidades de importação. Colocado outra vez diante da conjuntura internacional adversa correspondente à fase “b” do terceiro ciclo longo, o Brasil reage com mudanças estruturais que desembocam numa nova composição da classe detentora do poder de Estado, em que se aliam os latifundiários feudais – agora em posição hegemônica – e os industriais, setor dissidente dos comerciantes, sócios maiores da estrutura política na dualidade anterior.

As dificuldades econômicas enfrentadas pelo setor agroexportador acabam provocando a decadência dos cafeicultores e a ascensão das oligarquias regionais concentradas na produção para o abastecimento interno. A supremacia dos paulistas, compartilhada com os mineiros, deixara, durante boa parte da Primeira República, afastados do núcleo central do poder as oligarquias agrárias regionais dedicadas à produção para o mercado nacional. Marginalizados pela deformação da federação, em que dominavam os interesses dos latifundiários feudais agroexportadores – em especial os paulistas – , os gaúchos lideram a luta contra o isolacionismo aglutinando as oligarquias dos Estados menores também voltadas ao mercado interno.

A Revolução de 30 representa um embate entre latifundiários feudais – entre as oligarquias agrárias – do qual saem vitoriosas as que não estão ligadas ao núcleo cafeeiro, mas dedicadas, como já foi sublinhado, à produção para o consumo interno, razão por que as classes que ascendem – os latifundiários regionais associados à burguesia industrial nascente – dão ao novo pacto de poder características nitidamente nacionalistas.

A fase depressiva do 3º Kondratieff, porém, além de provocar rupturas internas que culminam com a Revolução de 30, vai gerar disputas entre os países centrais em luta pela hegemonia do domínio internacional no plano externo.

Nessa disputa concorrem três nações capitalistas: a Inglaterra, a Alemanha e os Estados Unidos. No caso particular do Brasil, o “capitalismo industrial nascente teria que abrir caminho em luta porfiada contra o seu homônimo – o capitalismo industrial do centro – exatamente como, um século e pouco antes, o capitalismo mercantil nascente o fizera” (RANGEL, 1981, p. 27). Isto é, diante da fase recessiva que restringe as importações, o Brasil se industrializa substituindo produtos importados dos países cêntricos, sobretudo da Inglaterra, à qual estava atrelado desde a Independência e preserva para si parte do mercado antes abastecido principalmente pelos produtos ingleses. Por isso, o fortalecimento do capitalismo industrial no plano interno vai dispensar o capitalismo industrial inglês no plano externo e, “para recompor a dualidade, seria mister sua substituição por uma outra formação (superior). Assim, o lugar antes ocupado pelo capitalismo industrial cêntrico foi ocupado pelo capitalismo financeiro” (id). No que se refere às rupturas externas o alijamento do capital industrial inglês foi favorecido pela quase unilateralidade do comércio entre os dois países, visto que as exportações brasileiras para a Inglaterra, comparativamente às importações, eram insignificantes. Quem mais comprava os produtos brasileiros eram os Estados Unidos que, por sua vez, excetuando-se os derivados do petróleo, exportavam pouco para o Brasil. Esta contradição favoreceu a ruptura de 30, facilitada pelo fato de que a potência externa mais importante até então estava enfraquecida, não só no contexto mundial, mas enfraquecida também no plano das relações que mantinha com Brasil.

Portanto, no campo das relações externas, com o capitalismo industrial situado agora no lado interno, o país dispensa o capitalismo industrial inglês, incapaz de corresponder às necessidades do estágio de desenvolvimento em que a nação se encontrava. Diante dessa conjuntura, o Brasil começa a se articular com o capital financeiro norte-americano, que passa a ser a nova força dominante no pólo externo da dualidade, apoiando o processo de industrialização do país.

Daí decorre a terceira dualidade, iniciada em 1930, com a seguinte composição: no pólo interno, feudalismo (lado interno) e capitalismo mercantil (lado externo), e no pólo externo, capitalismo industrial (lado interno) e capitalismo financeiro (lado externo). E sobre esta base econômica reestrutura-se o edifício político do Estado em que os fazendeiros-comerciantes, representantes do pólo interno, compõem – agora na posição de sócios hegemônicos – com a burguesia industrial nascente uma nova coalizão de classes dirigentes.
As transformações na formação brasileira pós-30

A economia brasileira, até então centrada fundamentalmente nas exportações agrícolas que sustentavam as importações industriais, volta-se agora prioritariamente à produção para o mercado interno. Graças a uma reorientação econômica radical, com ênfase estatista e protecionista, a partir de 30 é deflagrado um vigoroso esforço de substituição de importações que faz a expansão industrial superar a expansão agrícola. O Governo Provisório, embora mantivesse a política de sustentação do café, que continuava a ser a principal fonte de divisas nacionais, passou a se dedicar mais aos interesses globais da economia. Porém, mesmo sob o controle de novas forças políticas, o Estado brasileiro não deixou de proteger o setor primário, fazendo-o de forma centralizada, como bem o demonstram a criação do Conselho Nacional do Café (1931), do Instituto do Pinho, do Mate, entre outros. A política centralizadora do Estado assume um sentido industrializante e nacionalista que necessitava das fontes de divisas geradas pela produção agrícola. Dando prosseguimento a esta mesma tendência, já no Estado Novo surgem vários conselhos técnicos, entre os quais o Conselho Nacional do Petróleo (1938) e a Comissão do Plano Siderúrgico Nacional (1942), além da Comissão do Plano Rodoviário Nacional.

Ao mesmo tempo em que, do ponto de vista conjuntural, a formação social brasileira atravessa um período recessivo, ela passa também por uma expansão do seu mercado interno, estimulada pelo considerável aumento da população e pelo próprio desenvolvimento da industrialização substituidora de importações que acarretava a elevação do nível de especialização desse mesmo contingente populacional. É o crescimento da demanda interna que constitui a base da industrialização, uma industrialização substitutiva de importações, que avança mediante a implantação de ramos industriais antes inexistentes, os quais passam a fabricar produtos até então importados de países mais desenvolvidos ou através da reorganização de ramos manufatureiros pré-existentes, introduzindo mudanças que permitem aumentar a produtividade. Este processo de substituição de importações estava, entretanto, condicionado a uma margem de proteção que garantisse ao produto nacional uma vantagem competitiva decisiva, o que não ocorreu até 1930.

Neste cenário, o Estado agora comandado pela oligarquia agrária gaúcha, líder da aliança vitoriosa em 1930, tendo em vista os interesses econômicos globais, implementa várias medidas para direcionar o esforço nacional de industrialização. Uma dessas medidas diz respeito à estatização do câmbio que permite o controle de divisas pelo Estado. Evitando que as moedas fortes chegassem às mãos dos fazendeiros, o governo pôde estabelecer uma estratégia de industrialização em que algumas importações eram taxadas como essenciais e outras como secundárias. Esse controle das importações,


ao mesmo tempo em que dificultava ou pelo menos encarecia as importações de bens de consumo, liberava (e barateava) divisas para a importação de bens de equipamento necessários à industrialização das atividades supridoras, principalmente, dos bens que haviam tido suas importações proibidas e/ou encarecidas (RANGEL, 1985, p. 23).

A ausência de uma política protecionista para a indústria nacional, antes de 30, esbarrava na oligarquia cafeicultora, que dava prioridade à produção para o mercado externo e temia que qualquer política nesse sentido ocasionasse discriminações, que gerassem represálias contra as mercadorias brasileiras nos países industrializados.

Dentre as medidas implantadas pelo governo em 1930, destaca-se também a determinação para que o Loyde Brasileiro e a Estrada de Ferro Central do Brasil, adquirissem o carvão produzido pelas companhias nacionais de mineração. Em 1931, o governo determinava que todo o importador comprovasse a aquisição de produto nacional correspondente a 10% do que pretendesse importar, porcentagem esta elevada para 20%, em 1937. Todas estas medidas impostas pelas oligarquias vitoriosas na Revolução de 30, ao contrário do que ocorrera na República Velha, tinham como centro de interesse o mercado nacional.

Para Mamigonian (2000, p. 49), outra medida de apoio ao processo de industrialização, introduzida pelo Governo Vargas foi a legislação trabalhista, responsável pelo enfraquecimento das organizações operárias combativas e pela criação de sindicatos atrelados ao Estado autoritário paternalista. Ao mesmo tempo em que atendia a algumas reivindicações dos operários, a classe dominante procurava frear a organização do proletariado com uma legislação que colocava os trabalhadores sob a direção e tutela do Estado, como bem o ilustra a “lei de sindicalização”, de 1931. A legislação trabalhista implantada por Vargas será uma das pedras angulares de sua ação populista que tem como novidade uma política dirigida às classes populares, responsáveis por movimentos grevistas movidos por aspirações de “modernos” setores urbanos que já haviam se antagonizado com os interesses das elites. Como se sabe, a figura central dessa política instituída por Getúlio Vargas foi Lindolfo Collor, cuja experiência nas indústrias “alemãs” do Rio Grande do Sul forneceu a base de conhecimento necessário à introdução deste modelo inspirado na Alemanha bismarckiana.

Dentre os mecanismos acionados pelo governo para promover o desenvolvimento industrial está também a retirada de barreiras fiscais internas entre os Estados.

Esse fato tem grande significado para a transformação da estrutura sócio-econômica brasileira porque promove a integração do território nacional, invertendo a tendência do exclusivismo regional para o unitarismo, em vigor desde o início da República, quando as fazendas de escravos foram substituídas por latifúndios feudais. A partir de 1889, a vida de cada unidade da federação brasileira tendera a fechar-se sobre si mesma e, agora, o poder central emergia como um prolongamento no âmbito nacional, dos absolutismos regionais. Antes, porém, fora necessário


que esses absolutismos se constituíssem, que as oligarquias estaduais se firmassem, habilitando-se ao complicado jogo político que enche a Primeira República, e conduziu a um novo centralismo que, com o apoio da burguesia industrial (que ainda não existia em 89), começaria a unificar novamente o país (RANGEL, 1957, p. 65).
O Brasil como Nação

Assim, tal como acontecera com as nações européias, também a nação brasileira se constitui a partir de feudos que se unem para atender as conveniências da expansão capitalista. A tendência geral das nações, do exclusivismo regional para o unitarismo, repete-se aqui, visto que a nação é uma estrutura que emerge e se desenvolve no processo de transição do feudalismo para o capitalismo. Nascida do capitalismo, a formação nacional resulta de um complexo de inter-relações engendradas historicamente. Nas diferentes regiões do mundo, os Estados nacionais se organizam a partir de realidades sociais geradas por contextos históricos próprios, em que atuam fatores internos e externos. Durante o século XIX, a formação das nações constitui peça vital para o avanço do capitalismo que, atingindo proporções globais (mundiais), destrói o isolamento local e cria internamente aspirações de unidade e independência nacional. Pode-se, assim, considerar que o conceito de nação é muito recente e fundamenta-se em “uma unidade territorial soberana e idealmente homogênea, cujos habitantes, membros de uma ‘nação’, definida por uma série de critérios convencionais (étnicos, lingüísticos, culturais, históricos, etc.), seriam os ‘cidadãos’” (HOBSBAWM, 1980, p. 294).

A formação dos Estados nacionais pode ter origem em duas situações distintas: uma em que domina a dinâmica própria da sociedade, e a segunda, em que predomina o papel do Estado. Na França e na Inglaterra, por exemplo, a constituição do Estado-nação decorre fundamentalmente de uma dinâmica interna que brota das bases. A segunda situação, na qual se enquadram a Alemanha e o Brasil, registra uma tendência mais elitista, uma vez que o processo de constituição da nação se realiza a partir de decisões tomadas “pelo alto”. Esse percurso é, na verdade, característico de países de capitalismo tardio onde a ação e o pensamento do grupo político que assumiu o controle do Estado são impostos como valores comuns da nacionalidade. Nesses países em que a perda de espontaneidade do processo de construção nacional é compensada pelo papel do Estado e pelo desempenho de uma elite, a transformação se dá “pelo alto” – é a chamada “via prussiana”, que consiste numa modernização conservadora.

Guardadas as especificidades próprias de cada uma das formações sócio-espaciais, percebe-se uma semelhança entre os traços definidores da construção nacional na Alemanha e no Brasil em que, diante do caráter tardio do desenvolvimento capitalista, ganham importância, igualmente, a nobreza feudal e o controle estatal. Em ambos, são estas as forças estimuladoras da transição da economia agrária para uma economia industrial.

É a aristocracia agrária “Junker”, detentora do comando da sociedade e do Estado prussiano, que vai dirigir o processo de unificação do território alemão, como parte de um horizonte político e econômico mais amplo que visa a ultrapassar a posição inferior ocupada pela Alemanha entre as nações européias. Colocada como uma condição para o avanço das relações capitalistas num país que precisa pensar urgentemente a sua modernização, a renovação será feita “pelo alto”, impulsionada pela agressividade dos “Junkers”, dominantes no leste, associados à burguesia industrial nascente, dominante no oeste. É esta aliança de classes que viabiliza a formação do Estado nacional alemão e cria condições para o desenvolvimento capitalista, sem romper com a ordem vigente.

No caso do Brasil, em 1930, são as oligarquias agrárias regionais (os senhores feudais), aliadas aos industriais, que constituem a elite detentora do Poder Central, cujos interesses convergem para o mercado interno. É essa coalizão de classes dominantes que dá impulso ao processo de industrialização e que derruba os obstáculos regionais, promovendo a unificação nacional. A implantação das relações capitalistas impõe, pois, a unificação do espaço interno brasileiro, tal como se deu com a Alemanha na segunda metade do século passado. Eliminando os mercados regionais cativos, forçados pela concorrência, o capitalismo industrial em construção no país cria uma nova realidade de dimensões nacionais.

A organização espacial brasileira até então, conforme assinala Golbery do Couto e Silva (1981, p.43), tinha uma configuração de “arquipélago”, na qual se destacavam um “núcleo central” e três grandes “penínsulas”, que se projetavam para o nordeste, para o sul e para o noroeste, fragilmente ligadas ao núcleo por “ístmos”. A configuração de “arquipélago”, que prevalece até os anos 30, expressa o papel de destaque das atividades agroexportadoras no contexto econômico brasileiro, herança colonial presente ainda no século XX. No plano espacial, a política desencadeada por Getúlio Vargas age no sentido de eliminar as barreiras regionais, iniciando a formação de um mercado nacional baseado no sistema rodoviário, pois o avanço das relações capitalistas de produção dependia da constituição de um território unificado. Fazia-se necessário, então, desenvolver uma infra-estrutura de transportes e comunicações de dimensões nacionais que desarticulando os mercados regionais geraria uma nova organização sócio-espacial. Ampliar o mercado para o capital industrial e, portanto, a base para a sua acumulação significa, na prática, abrir as regiões semi-isoladas, integrando economicamente todo o país. A compartimentação do mercado brasileiro numa constelação de mercados delimitados regionalmente era compatível com uma substituição pré-industrial de importações, porém não mais com uma substituição industrial.

A integração econômica do território – exigência do capitalismo industrial – se fez apoiada no desenvolvimento rodoviário, que passou a substituir as ferrovias como principal meio de transporte terrestre. A partir de 1930 a construção de rodovias sofre uma aceleração, enquanto a de ferrovias praticamente cessa. A rede ferroviária passa de 31.851,2 Km em 1928 a 34.206,6 Km em 1938 e a 37.092 em 1955, enquanto que a de rodovias cresce de 113.570 Km em 1928 para 258.390 Km em 1939 e para 459.714 Km em 1955. É com o traçado das rodovias que se concretiza espacialmente a unificação do mercado, eliminando as sobrevivências do espírito federalista e fazendo surgir a Nação.

O processo de implantação do capitalismo industrial implica, simultaneamente, na expansão do mercado, cuja delimitação e estruturação conduz às duas faces da questão nacional: o fechamento das barreiras externas, de modo a demarcar as fronteiras do espaço econômico no qual o capitalismo se desenvolve, e a unificação do mercado nacional, com a quebra das barreiras internas. A Grande Depressão Mundial de 1930, ao mesmo tempo em que


fechou os mercados externos aos nossos produtos de exportação, ao reprimir violentamente nossa capacidade para importar, fechou o mercado interno a uma fatia considerável das importações. Restava-nos, apenas, converter aquilo que se apresentava como uma contração indiscriminada das importações, numa contração discriminada, e potencialmente orientada, da oferta de importações (RANGEL, 1980, p. 52).

O grupo que ascende ao poder, liderado por Getúlio Vargas está empenhado na busca de alternativas à crise internacional e o país consegue reagir, apesar das dificuldades conjunturais, voltando-se ao atendimento do mercado interno. Como se observa, a evolução da formação econômica brasileira não responde apenas às emanações externas oriundas dos países situados no centro do sistema capitalista. A história do Brasil não representa um mero reflexo das pressões exógenas. Há, na formação brasileira um dinamismo próprio através do qual as dificuldades geradas pelas crises internacionais são aproveitadas positivamente para estimular um desenvolvimento voltado para a autonomia do país. A partir de 30, sob o comando de Vargas, latifundiários feudais, aliados a uma burguesia industrial ainda frágil, abrem caminho para um projeto nacionalista de desenvolvimento, transformando o Brasil num país industrializado.
A crise atual

Na atual crise, a insistência com que se debate a globalização da economia traz subjacente a idéia de que os projetos nacionais estariam, por assim dizer, superados, como se não houvesse mais clima nem espaço para a defesa de políticas de desenvolvimento capazes de preservar a soberania nacional. Aliás, falar em Estado ou Nação hoje parece estar fora de moda porque a abertura comercial apresentada como inevitável e indispensável à modernização da economia representa, na verdade, o enfraquecimento das fronteiras nacionais por imposição do capital financeiro internacional, sobretudo o americano que é o maior credor da dívida externa brasileira.

O discurso em defesa da globalização possui uma enorme carga ideológica e se dissemina através de um combate acirrado travado incansavelmente para minimizar o papel do Estado, pois “sua base essencial é o fato de que os condutores da globalização necessitam de um Estado flexível aos seus interesses” (SANTOS, 2000, p.66). A globalização solapa a soberania dos estados, ameaçando a autonomia e as identidades nacionais. Se por um lado ela parece levar à homogeneização, por outro, a crise prolongada agrava as tensões sociais e desperta para a defesa dos interesses locais, para o direito a diversidade. A tentativa de uniformização promove manifestações cada vez mais freqüentes de resistência a imposição do pensamento único.

É necessário frisar que, diante da conjuntura depressiva atual, “neoliberalismo e globalização são as duas idéias-força mais importantes impostas ao mundo pelo imperialismo norte-americano desde 1980 aproximadamente” (MAMIGONIAN, 2001, p. 38), quando a economia dos Estados Unidos inicia um processo de recuperação, adotando no governo Reagan políticas keynesianas, o que comprova o papel ativo do Estado na defesa dos interesses das nações hegemônicas, diferentemente do que é apregoado para a periferia.

A tremenda crise com a qual o Brasil se deparou em 1930 foi responsável por ajustes estruturais, tanto no plano das relações internas, como no das relações externas e oferecem inúmeros elementos para uma reflexão acerca da realidade brasileira atual, quando novamente o país se defronta com uma crise que exige a reorientação de sua economia. Os acontecimentos de 30 e as políticas adotadas pelo governo no passado podem ser interpretadas como lições na busca de alternativas para os problemas com os quais o país se depara hoje. A prioridade atribuída à produção para o mercado interno e a defesa clara de políticas que visavam proteger os interesses nacionais poderiam ser tomadas como fontes de inspiração para a elaboração de um projeto autônomo que permitisse uma reação frente à crise atual.

Há uma insistência na valorização do lado externo, quando tantas vezes na evolução da formação brasileira o lado interno mostrou, como em 1930, suas possibilidades na condução dos destinos do país.

O impulso de desenvolvimento nacional dado pelo pacto de poder que se estabelece em 30 e que implantou uma política econômica capaz de edificar o parque industrial brasileiro de forma completa, se esgota na década de 80. Ao invés de se concretizar uma reestruturação revolucionária no bloco detentor do poder do estado – como já ocorrera anteriormente em fases depressivas da economia mundial, e em especial em 30 – ou seja, que tornasse os industriais brasileiros sócios hegemônicos, em substituição aos latifundiários feudais decadentes, aliados à dissensão latifundiária capitalista,


resultante do surgimento das empresas agrícolas e também dos bancos brasileiros, que seriam chamadas a substituir os bancos americanos com a função de financiar internamente a instalação de novas infra-estruturas: ferrovias, duplicação de rodovias, modernização portuária, metrôs urbanos, saneamento básico, etc., que impulsionariam nova fase de crescimento acelerado brasileiro (Mamigonian, 2004, 129).

O que ocorre é uma contra-revolução com a chegada de Collor e FHC ao poder, substituindo o nacional-desenvolvimentismo pelo anti-nacionalismo neo-liberal:


1) o capital financeiro americano (bancos e indústrias) se tornou hegemônico,
2) a industria brasileira, sócia subalterna do pacto de 30, foi afastada do poder,
3) o latifúndio feudal (Norte e Nordeste), com poder político, mas agonizante economicamente, participou da contra-revolução, assim como
4) os bancos brasileiros ocuparam um espaço econômico e político subalterno ao capital financeiro norte-americano. Todo este bloco contra-revolucionário, sob o comando dos EUA, passou a paralisar a economia brasileira e o Estado nacional, bem como a provocar o apodrecimento da vida política e cultural no Brasil. (id.)

A contra-revolução dos anos 90, quebra a espinha dorsal da soberania nacional ao derrubar as fronteiras do mercado brasileiro, tão arduamente conquistado e defendido pela política econômica do período nacional-desenvolvimentista.

Na era Vargas, ao contrário do que se passa atualmente, do ponto de vista ideológico, as idéias nacionalistas eram veiculadas com uma intensidade até então desconhecida no cenário político brasileiro. O período rico em iniciativas que permitiram alavancar as potencialidades do país, contava com uma classe dirigente independente, preocupada em promover mudanças capazes assegurar o desenvolvimento do país. Hoje, entretanto, parece haver entre as elites um consenso de que o nacional situa-se num plano secundário, pois os discursos enfatizam a inserção do país no processo de globalização a qualquer preço. Há uma insistência na valorização do lado externo, quando tantas vezes na evolução da formação brasileira o lado interno mostrou, como em 1930, suas possibilidades na condução dos destinos do país. Diante da crise atual, as condições internas não são discutidas, perdendo-se de vista alternativas capazes de proporcionar saídas para que o país retome a autonomia nacional.

O exemplo de 30, ou da chamada era Vargas, contém lições que permitem orientar a reconstrução da soberania da nação e do povo brasileiros, razão pela qual devem ser melhor pesquisados e debatidos. Negar tais ensinamentos autóctones, é seguir o caminho da total dependência e da subordinação aos interesses imperialistas.

Raquel Maria Fontes do Amaral Pereira

REFERÊNCIAS

HOBSBAWM, E. “Nacionalismo e marxismo”. In: Questão nacional e marxismo. ( Org. Jaime Pinky). São Paulo: Brasiliense, 1980.
MAMIGONIAN, A. Teorias sobre a industrialização brasileira. In: Cadernos Geográficos. Universidade Federal de Santa Catarina. Centro de Filosofia e Ciências Humanas. Departamento de Geociências, n.2 (maio de 2000). Florianópolis: Imprensa Universitária, 2000.
_____ Neoliberalismo versus Projeto Nacional no Mundo e no Brasil. Revista Paranaense de Geografia, n. 6. Curitiba: AGB, 2001.
_____ O Enigma Brasileiro Atual: Lula será Devorado? Ciência Geográfica, n. 2, v. X. Bauru:AGB, mai/ago, 2004.
PEREIRA, R. M. F. do A. A geografia e as bases da formação nacional brasileira. 1997. 277 f. Tese (Doutorado em Geografia Humana). Universidade de São Paulo, São Paulo, 1997.
11725Anais do X Encontro de Geógrafos da América Latina – 20 a 26 de março de 2005 – Universidade de São Paulo
RANGEL, I. A dualidade básica da economia brasileira. Rio de Janeiro: MEC-ISEB, 1957.
_____ “Revisitando a questão nacional”. Encontros com a Civilização Brasileira Rio de Janeiro: (27), 1980.
_____ “A história da dualidade brasileira”. In: Revista de Economia Política. n. 4, v. 1. São Paulo, out/dez , 1981.
_____ Economia: milagre e anti-milagre. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editores, 1985.
SANTOS, M. Por uma outra globalização: do pensamento único à consciência universal. 3. ed. Rio de Janeiro/ São Paulo: Record, 2000.
SILVA, G. do C. e. Conjuntura Política Nacional: o poder executivo e a geopolítica no Brasil. 3. ed. Rio de Janeiro: J.Olímpyo, 1981 (Coleção Documentos do Brasil).

Fonte: www.univali.br
Revolução de 30

O movimento de outubro de 1930, tradicionalmente denominado Revolução de 30, foi um dos principais acontecimentos políticos da República Velha na medida em que alterou a composição de forças até então vigente no cenário político brasileiro. Apesar dos limites bastante próximos dos seus efeitos quanto a uma mudança significativa na estrutura sócio-política do país – daí questionar-se a utilização do termo revolução para classificar tal movimento, – a dita revolução rompeu o monopólio exercido até então pelas oligarquias cafeeiras e abriu caminho para a modernização do capitalismo no país, viabilizando a implantação de uma política econômica voltada também para a industrialização.

A Revolução de 30 foi o momento final de um processo que teve início com o rompimento da tradicional política do café com leite, na qual as oligarquias de Minas Gerais e São Paulo promoviam um revezamento no poder federal. A indicação de Júlio Preste, um paulista, para a sucessão do também paulista Washington Luís, provocou a dissidência dos mineiros, que se aliaram a Aliança Liberal, apoiando a chapa de oposição composta por Getúlio Vargas para presidente e João Pessoa, da Paraíba, como vice. Nas eleições de 1930, como de costume, a máquina eleitoral, fraudulenta e viciada, foi manipulada por ambos os lados, porém a vitória coube ao candidato da situação, Júlio Preste.

O resultado das eleições não foi aceito pelos aliancistas e um fato novo atuou como elemento desencadeador da Revolução, o assassinato, na Paraíba, do candidato a vice na chapa de Getúlio Vargas, João Pessoa.

A Aliança Liberal, formada para disputar as eleições, apoiou o movimento que conduziu Vargas ao poder. Apesar de sua composição heterogênea, os aliancistas uniam-se em torno da necessidade de desarticular a estrutura vigente, obviamente por motivos diferentes. Entre os aliancistas encontravam-se representantes de oligarquias agrárias regionais secundárias, dissidentes da oligarquia paulista (fundadores do Partido Democrático), representantes do operariado sob a liderança do Partido Comunista Brasileiro, militares do movimento tenentista, que já na década de 20 provocou abalos na hegemonia política da oligarquia cafeeira, ainda que com um vago programa de oposição antioligárquica e de moralização do processo eleitoral, e também elementos ligados ao setor industrial, relegado a um segundo plano em benefício do café.

A Revolução foi desencadeada em 3 de outubro de 1930 e a 3 de novembro Getúlio Vargas assumia como o novo presidente do Brasil.

Fonte: www.portaldaeducacao.com.br
Revolução de 30

A Revolução de 1930, que pôs fim à Primeira República, foi, para muitos historiadores, o movimento mais importante da história do Brasil do século XX.

Foi ela quem, para o historiador Boris Fausto, acabou com a “hegemonia da burguesia do café, desenlace inscrito na própria forma de inserção do Brasil, no sistema capitalista internacional”¹. Na Primeira República, o controle político e econômico do país estava nas mãos de fazendeiros, mesmo se as atividades urbanas eram o pólo mais dinâmico da sociedade. Entre 1912 e 1929, a produção industrial cresceu cerca de 175%. No entanto, a política econômica do governo continuava privilegiando os lucros das atividades agrícolas. Mas, com a crise mundial do capitalismo em 1929, a economia cafeeira não conseguiu manter-se. O Presidente Washington Luís (1926-1930), com algumas medidas, tentou conter a crise no Brasil, mas em vão. Em 1929, a produção brasileira chegava a 28,941 milhões, mas só foram exportados 14, 281 milhões de sacas, e isto num momento em que existiam imensos estoques acumulados.

O maior partido de oposição ao partido republicano de Washington Luís era a Aliança Liberal. Era liderado pelo então governador do Rio Grande do Sul, Getúlio Dorneles Vargas.

Mesmo sendo apoiado por muitos políticos que tinham sido influentes na Primeira República, como os ex-presidentes Epitácio Pessoa e Artur Bernardes, seu programa apresentava um certo avanço progressista: jornada de oito horas, voto feminino, apoio às classes urbanas. A Aliança Liberal foi muito influenciada pelo tenentismo, que foi um movimento de jovens militares que defendiam a moralização administrativa e cujo slogan era “representação e justiça”.

Nas eleições de 1930, a Aliança Liberal perdeu, vencendo o candidato republicano Júlio Prestes. Mas, usando como pretexto o assassinato do aliancista João Pessoa por um simpatizante de Washington Luís, João Dantas, Getúlio Vargas e seus partidários organizaram um golpe que, em outubro de 1930, tirou Washington Luís do poder. Getúlio Vargas tomou posse do governo no dia 3 de novembro 1930, data que ficou registrada como sendo o fim da Primeira República.

No início de seu governo, com a centralização do poder, Vargas iniciou a luta contra o regionalismo. A administração do país tinha que ser única e não, como ocorria na República Velha, ser dividida pelos proprietários rurais. Muitas medidas que tomou “no plano econômico financeiro não resultaram de novas circunstâncias, mas das circunstâncias impostas pela crise mundial”². O Brasil dependia demais do comércio do café para que o novo presidente o abandonasse.

Para controlar a superprodução e a crise no Brasil, Vargas mandou destruir todos os estoques de café. Mesmo, com a crise mundial, conhecida como “crash de 1929”, houve uma intensa aceleração do desenvolvimento industrial. Entre 1929 e 1939, a indústria cresceu 125%, enquanto na agricultura o crescimento não ultrapassou 20%. Esse desenvolvimento deu-se por causa da diminuição das importações e da oferta de capitais, que trocaram a lavoura tradicional em crise, pela indústria. Mas, foi a participação do Estado, com tarifas protecionistas e investimentos, que mais influiu nesse crescimento industrial. Diferentemente do que ocorreu na República Velha, começaram a surgir planos para a criação de indústrias de base no Brasil. Esses planos realizar-se-iam com a inauguração da usina siderúrgica de Volta Redonda em 1946.

A partir de 1930, a sociedade brasileira viveu importantes mudanças. Acelerou-se o processo de urbanização e a burguesia começa a participar cada vez mais na vida política. Com o progresso da industrialização, a classe operária cresceu muito.

Vargas, com uma política de governo dirigida aos trabalhadores urbanos, tentou atrair o apoio dessa classe que era fundamental para a economia, pois tinha em mãos o novo motor do Brasil: a indústria. A criação do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, em 1930, resultou numa série de leis trabalhistas.

Parte delas visava ampliar direitos e garantias do trabalhador: lei de férias, regulamentação do trabalho de mulheres e crianças.

Todo esse processo de desenvolvimento, no Brasil, foi acompanhado por uma verdadeira revolução cultural e educacional que acabou garantindo o sucesso de Vargas na sua tentativa de transformar a sociedade. Como disse Antônio Cândido, “não foi o movimento revolucionário que começou as reformas [do ensino]; mas ele propiciou a sua extensão para todo o país”³. Em 1920, reformas promovidas separadamente por Sampaio Dória, Lourenço Filho, Anísio Teixeira e Fernando Campos já buscavam a renovação pedagógica. A partir de 1930, as medidas para a criação de um sistema educativo público foram controladas oficialmente pelo governo. Esta vontade de centralizar a formação e de torná-la acessível aos mais pobres ficou clara com a criação do Ministério da Educação e Saúde em novembro de 1930. Seu primeiro ministro foi Francisco Campos (1930-1932). Com a difusão da instrução básica, Vargas acreditava poder formar um povo mais consciente e mais apto às exigências democráticas, como o voto, e uma elite de futuros políticos, pensadores e técnicos. Em 1931, o governo decretou a obrigatoriedade do ensino religioso nas escolas públicas. Esta aproximação entre Estado e Igreja também foi marcada pela inauguração, a 12 de outubro de 1931, da estátua do Cristo Redentor no Corcovado. O historiador Boris Fausto afirmou que a Igreja, em troca, “levou a massa da população católica a apoiar o novo governo”. Em relação ao ensino superior, o governo procurou estabelecer as bases do sistema universitário, investindo nas áreas de ensino e pesquisa. Foram contratados jovens professores europeus como Claude Lévy-Strauss que se tornaria, mais tarde, o criador da antropologia estruturalista.

Além de haver um desenvolvimento educacional, houve uma verdadeira revolução cultural em relação à República Velha. O modernismo, tão criticado antes de 1930, tornou-se o movimento artístico principal a partir do golpe de Vargas. A Academia de Letras, tão admirada antes, não tinha mais nenhum prestígio. A cultura predominante era a popular que, com o rádio, desenvolveu-se por todo o Brasil. Como analisou Antônio Cândido, “nos anos 30 e 40, por exemplo, o samba e a marcha, antes praticamente confinados aos morros e subúrbios do Rio, conquistaram o país e todas as classes, tornando-se um pão-nosso quotidiano de consumo cultural”.

No entanto, foram os intelectuais partidários da Revolução de 1930, como Caio Prado Júnior, quem tiveram um papel essencial no processo de desenvolvimento cultural do Brasil. Sérgio Buarque de Holanda, com Raízes do Brasil principalmente, influenciou muito o desenvolvimento do nacionalismo no Brasil. Em este ensaio, Sérgio Buarque de Holanda buscou entender como se fez o processo da formação do Brasil como nação. Analisou a história desde a chegada dos ibéricos à América até os anos 1930. Este livro, como apontou Antônio Cândido, formou a mentalidade de muitos estudantes a partir de 1936, quando foi publicado. Nesse livro, Sérgio Buarque de Holanda não só analisa o passado mas também dá os objetivos brasileiros para o futuro, principalmente no último capítulo do livro ( Nossa Revolução).

Raízes do Brasil demonstrou que a independência do Brasil não se fez em 1822, pois a formação de uma nação não só se devia entender em relação à administração. O Brasil, para o autor, só seria independente quando não houvesse mais marcos, a não ser o passado, da era colonial. O retrato que Sérgio Buarque fez do livro é extremamente comparativo e psicológico. O conceito de “homem cordial”, que estudou em seu quinto capítulo, caracterizou o brasileiro como tendo uma personalidade única, diferente da dos europeus. Mas, como disse, “com a simples cordialidade não se criam os bons princípios”. Por isso, defendeu tanto a industrialização e a centralização do poder, pois eram características da era pós 30

Sérgio Buarque de Holanda, com Giberto Freyre, formavam uma nova ala de intelectuais inovadores do Brasil. São os fundadores da Universidade de Ciências Sociais do Brasil e são os pioneiros dos movimentos nacionais e a favor da democratização da sociedade. Raízes do Brasil, mas também outros livros como Casa-Grande e Senzala de Gilbetro Freyre, quebra com todos os pensamentos expostos antes da Revolução de 1930. Como aponta Renato Ortiz, “o que era mestiço torna-se nacional” 8. Na República Velha, como o mostra Os Sertões de Euclides da Cunha, todas as raças que não fossem brancas eram inferiores. Mas, com suas obras, o entendimento popular da escravidão transformou-se muito. Sérgio Buarque de Holanda entende que não adianta mais separar o mundo em classes. Mas uni-las para formar uma nação.

Vem daí a crítica dos sociólogos dos anos 30 aos movimentos integralistas (fascismo brasileiro) e comunistas. Nisto ele foi importantíssimo para a Revolução de 1930 pois os grupos extremistas já estavam bem fortes e, com sua obra-prima, queriam até tomar o poder. Mesmo não sendo oficialmente marxista, sua análise do processo histórico que abriria, no futuro, a total independência do país em relação à agricultura e à Europa.

Fonte: www.culturabrasil.pro.br
Revolução de 30

O movimento político-militar que determinou o fim da Primeira República (1889-1930) originou-se da união entre os políticos e tenentes que foram derrotados nas eleições de 1930 e decidiram pôr fim ao sistema oligárquico através das armas. Após dois meses de articulações políticas nas principais capitais do país e de preparativos militares, o movimento eclodiu simultaneamente no Rio Grande do Sul e Minas Gerais, na tarde do dia 3 de outubro. Em menos de um mês a revolução já era vitoriosa em quase todo o país, restando apenas São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia e Pará ainda sob controle do governo federal. Finalmente, um grupo de militares exigiu a renúncia do presidente Washington Luís e pouco depois entregou o poder a Getúlio Vargas.

Foi a vitória do candidato governista Júlio Prestes nas eleições de março de 1930, derrotando a candidatura de Getúlio Vargas, que era apoiada pela Aliança Liberal, que deu início a uma nova rearticulação de forças de oposição que culminou na Revolução de 1930. Os revolucionários de 30 tinham como objetivo comum impedir a posse de Júlio Prestes e derrubar o governo de Washington Luís, mas entre eles havia posições distintas quanto ao que isso representava e quais seriam as conseqüências futuras.

Dentre os jovens políticos que se uniram em torno do levante, destacavam-se Getúlio Vargas, Oswaldo Aranha, Flores da Cunha, Lindolfo Collor, João Batista Luzardo, João Neves da Fontoura, Virgílio de Melo Franco, Maurício Cardoso e Francisco Campos. Além de derrubar o governo, esses líderes pretendiam reformular o sistema político vigente. Dos tenentes que haviam participado do movimento tenentista, os nomes de maior destaque eram Juarez Távora, João Alberto e Miguel Costa. A meta particular desse grupo era a introdução de reformas sociais e a centralização do poder. Havia ainda uma ala dissidente da velha oligarquia, que via no movimento revolucionário um meio de aumentar seu poder pessoal. Era o caso de Artur Bernardes, Venceslau Brás, Afrânio de Melo Franco, Antônio Carlos Ribeiro de Andrada e João Pessoa, entre outros.

Por sua vez, o ex-líder da Coluna Prestes, Luís Carlos Prestes, optou por um caminho mais radical. Crítico da união dos jovens políticos com a dissidência oligárquica, Prestes decidiu não participar da revolução e lançou seu próprio Manifesto Revolucionário. Declarava-se socialista e sustentava que a mera de troca de homens no poder não atenderia às reais necessidades da população brasileira.

Intermináveis negociações preliminares retardaram as ações militares dos conspiradores contra o governo de Washington Luís. Finalmente, em 26 de julho, o inesperado assassinato de João Pessoa, presidente da Paraíba e candidato derrotado à vice-presidência na chapa da Aliança Liberal, estimulou as adesões e acelerou os preparativos para a deflagração da revolução. Alçado à condição de mártir da revolução, João Pessoa foi enterrado no Rio de Janeiro e seus funerais provocaram grande comoção popular, levando setores do Exército antes reticentes a apoiar a causa revolucionária.

Enfim, a 3 de outubro, sob a liderança civil do gaúcho Getúlio Vargas e sob a chefia militar do tenente-coronel Góes Monteiro, começaram as diversas ações militares. Simultaneamente deu-se início à revolução no Rio Grande do Sul, à revolução em Minas Gerais e à revolução no Nordeste, os três pilares do movimento.

Com a ocupação de capitais estratégicas como Porto Alegre e Belo Horizonte e de diversas cidades do Nordeste, e com o deslocamento das forças revolucionárias gaúchas em direção a São Paulo, o presidente Washington Luís recebeu um ultimato de um grupo de oficiais-generais, liderados por Augusto Tasso Fragoso. O grupo exigiu a renúncia do presidente. Diante de sua negativa, os militares determinaram sua prisão e o cerco do palácio Guanabara, no dia 24 de outubro. A seguir, formou-se a Junta Provisória de governo, composta pelos generais Tasso Fragoso e João de Deus Mena Barreto e o almirante Isaías de Noronha.

Em virtude do maior peso político que os gaúchos detinham no movimento e sob pressão das forças revolucionárias, a Junta finalmente decidiu transmitir o poder a Getúlio Vargas. Num gesto simbólico que representou a tomada do poder, os revolucionários gaúchos, chegando ao Rio, amarraram seus cavalos no Obelisco da avenida Rio Branco. Em 3 de novembro chegava ao fim a Primeira República e começava um novo período da história política brasileira, com Getúlio Vargas à frente do Governo Provisório. Era o início da Era Vargas. Entender o significado desse movimento, saber se representou uma ruptura ou continuidade na vida nacional, tem sido objeto de inúmeros livros e artigos escritos desde então.

Fonte: www.cpdoc.fgv.br
Revolução de 30

Os primeiros boatos que circularam na cidade diziam que o movimento revolucionario rebentara em Bello Horizonte.

Succederam-se outras noticias. O agitador Assis Chateaubriand, bem como o Sr. Nelson Paixão, redator do “Diario da Noite”, teriam sido presos. Momentos após, a nossa reportagem era informada que a policia havia efetuado mais a prisão de varios jornalistas pertencentes aos jornaes “Diario da Noite”, “O Jornal”, “A Batalha”, “Diario Carioca” e “A Patria”.

Em todos os quarteis da cidade, a promtidão era rigorosa. O quartel-general, do mesmo modo, mantinha-se guarnecido por um grande numero de sentinellas. Em varios pontos da cidade viam-se piquetes de cavallaria e a estação da Central do Brasil mantinha-se vigiada por um grande numero de agentes policiaes, que fiscalisavam a entrada e sahida de pessoas. (…)” A Crítica, 4 de outubro de 1930.

“Apesar do terrorismo dos fantasiados pela imaginação exaltada de certos derrotistas, o rythmo normal da vida carioca não soffreu alterações de natureza alguma. O mesmo movimento dos dias communs, a mesma calma imperturbavel que é caracteristica não se modificou.

A cidade quase não commentou o que os boatos vehiculavam. Nas casa de diversões a concurrencia foi normal. Os cafés e logares publicos apresentavam o aspecto de sempre, algo mais vivo por ser sabbado – dia ordinariamente consagrado a expansões maiores.

A Avenida – mostruario da elegancia e da fitilidade do Rio – não se despovoou, nem, ao menos, seu ruidoso movimento envolvente. Não se viam physionomias sobressaltadas, nem se ouviam commentarios reciosos.

Estava sob a mais completa calma a cidade, hontem. E, o carioca, generoso, bom, nobre, e respeitador, teve seu somno absolutamente tranquillo.” A Crítica, 5 de outubro de 1930.

“Diante da situação anormal creadas pelos acontecimentos de Minas Geraes e do Rio Grande do Sul, despertando os appetites de alguns retalhistas inescrupulosos, que pretendiam explorar o povo, o governo da Republica resolveu tomar immediatas e energicas providencias, tendentes a evitar o assalto á bolsa do povo.

Apezar das difficuldades de transporte entre os Estados de Minas e Rio Grande, nada justificava o assalto dos “profiteurs” do momento (…)” A Crítica, 8 de outubro de 1930.

“A impressão causada no espirito publico pelo manifesto do presidente Washington Luis prova a necessidade de um contato permanente entre os governantes do paiz. Os moldes da nossa republica isolaram do povo os seus dirigentes. Desse isolamento se aproveitam os exploradores para a interpretação capciosa de certos atos governativos que permaneceriam inattingiveis ao desvirtuamento si a palavra presidencial os defendesse perante a Nação. (…)

O presidente Washington Luis – si já tinha a confiança do Brasil que trabalha e deseja prosperar em paz multiplicou, com o seu manifesto, a efficiencia do apoio que a Nação lhe dava. Nada falará melhor do que esse documento sobre a indignidade do golpre desferido contra o Brasil quando os beneficios de um quadriennio honesto e laborioso se refletiam em todas as classes.

A magoa do patriota não diminue, porém, a sua fé. Fortalece-a . Á politica do Rio Grande do Sul coube, para maior sorpreza do administrador probo, o papel de Brutus. A unidade sulina recebeu do governo Washington Luis os maiores auxilios e honrarias.

Escolhido para ministro da Fazenda neste Governo, o Sr. Getulio Vargas habilitou-se á presidencia do seu Estado graças ao prestigio que lhe adveio dessa escolha. A sua lealdade é conhecida do paiz. Passando por cima de um documento garantindo a sua colaboração na questão da candidatura presidencial – elle candidatou-se á revelia dos compromissos assumidos. Declarando acceitar o veredictum das urnas como epilogo da sua felonia, elle armou, ou consentiu que se armassem, os seus correliogionarios.

Brutus em escala maior, o Sr. Getulio Vargas depois de apunhalar pelas costas o amigo, apunhalou pelas costas o Brasil. (…)” A Crítica, 11 de outubro de 1930.

O termo da intimação, dirigida ao presidente Washington Luis, estava redigido nos seguintes termos:

Rio de Janeiro, 24 de outubro de 1930 – Exmo. Sr. presidente da República – A Nação em armas, de Norte a Sul, irmãos contra irmãos, paes contra filhos, já retalhada, ensanguentada, anseia por um signal que faça cessar a luta ingloria, que faça voltar a paz aos espiritos, que derive para uma benefica reconstrução urgente as energias desencadeadas para a entre destruição.

As forças armadas, permanentes e improvisadas têm sido manejadas como argumento civico para resolver o problema politico e só têm conseguido causar e soffrer feridos, luto e ruina, o descontentamento nacional, sempre subsiste e cresce, porque, vencida, não pôde convencer-se de que, o que teve mais força, tenha mais razão. O mesmo resultado reproduzir-se-á como desfecho da guerra civil, a mais vultosa que se viu no paiz. A solução politica, a integridade da Nação, o decoro do Brasil e até mesmo a glória de v. ex. instam, urgem e imperiosamente commandam a v. ex. que entregue os destinos do Brasil, no atual momento, aos seus generaes de terra e mar.

Tem v. ex. o prazo de meia hora a contar do recebimento desta para communicar ao portador a sua resolução e, sendo favoravel, como toda Nação livre o deseja e espera, deixar o poder com todas as honras garantidas.

(aa.) João de Deus Menna Barreto, general de Divisão, inspetor do I Grupo de Região; João Fernandes Leite de Castro, general de Brigada, commandante do 1o DAC; Firmino Antonio Borba, general de Brigada, 2o sub-chefe do EMB; Pantaleão Telles, general de Brigada, e varios generaes e almirantes de que não houve tempo de colher as assignaturas.

Pela Avenida Rio Branco corria anormal o movimento. O povo – depois de longa tyrannia e liberto, saltava, pulava, dando expansão á alegria immensa que o empolgava.

Automoveis, repletos de militares, em fraternal mistura com o povo, passavam aos gritos de – Viva a Revolução! – Viva João Pessoa! – Viva Getulio Vargas!

É quando um carro passa, repleto de elemento civil. Ha um movimento geral de curiosidade. O povo cala-se por instantes.

Foi obra de um segundo. Immediatamente, um grito irrompe em todas as bocas:


– Mauricio! Era o Mauricio de Lacerda que passava.

O grande tribuno, notava-se sem sua phisionomia alegre, transpirando jubilo intenso, estava cansado e mantinha-se ali, com custo porque (talvez effeito dos rudes golpes por que passou nestas duas ultimas semanas) elle estava mais magro, e abatido, physicamente.

O povo pediu, em altos brados, que Mauricio, o seu estremecido tribuno, falasse.

Mauricio, entretanto, não poude fazel-o. Limitou-se a sorrir, enquanto dirigia um cumprimento ao povo e acenava com as mãos pedindo-lhe calma.

Depois, a massa popular que cercava-lhe o auto abriu alas, dando-lhe passagem, aos gritos de:


– Viva Mauricio! Viva Getulio Vargas! Viva a Revolução!

Pouco atrás do carro em que vinha Mauricio, o povo agglomerava-se, aos gritos, incessantes, de “Viva a Revolução”, emquanto acenava com varios pedaços de pannos vermelhos ao ar.

Approximámo-nos, e, então, pudemos comprehender a causa do enthusiasmo do povo. Ali estava, parada, a “barata” n. 12.026. No seu interior uma moça gentil e bella rasgava o vestido de côr rubra, para distribuir os pedaços entre o povo.

Quizemos falar-lhe, mas foi impossivel, tão compacta era a massa popular que cercava a sympathica brasileira! (…)

O povo suburbano, constituido na sua grande parte pelos menos favorecidos da fortuna, explodiu em vibrantes e enthusiasticas manifestações, dando expansões ruidosas ao seu incontido jubilo pela victoria dos ideaes revolucionarios.

Os sentimentos de revolta do povo, por tanto tempo suffocados pelos atos da mais torpe prepotencia, romperam tumultuosos, enthusiasticos e delirantes. (…)” A Esquerda, 24 de outubro de 1930.

“Neste instante é difficil fixar no papel, no torvelinho da hora historica que a Nação atravessa, as impressões extraordinarias que nos envolvem. O aturdimento da victoria inebria o povo. Defronte á nossa redação, povo e exercito, povo na sua mais ampla expressão, senhoras e crianças, em verdadeiro delirio, acclamam a liberdade.

A Avenida é toda uma visão alucinante. Os aviões cortamn-a sob a vibração das massas. As sirenes atordoam. Em outros pontos, defronte do Paiz e da Noticia as fogueiras improvizadas pelo povo consomem jornaes velhos, livros, escrivaninhas, cadeiras, tudo quanto o povo, no primeiro impeto arrancou de dentro daquelles jornaes atirando para a rua.

Pelas ruas desfilam multidões inebriadas. O espetaculo é emocionante. A cidade está sob a impressão de desafogo. Apparecem retratos de Getulio Vargas, em quadros estampados, deante dos quaes o povo prorompe em vivas.

Era de causar funda impressão o verem-se senhoras quando mais viva era a agitação distribuirem flores ao povo. Lenços vermelhos, bandeiras vermelhas, um delirio vermelho vermelho empolgou a capital. O povo victorioso explodia em vibrações permanentes. São 11,30. (…)

Diário da Noite publica com o jubilo natural o documento abaixo, dictado nesta redação, á hora em que chegava á Avenida Rio Branco noticia da quéda do governo, pelo capitão Raymundo da Silva Barros, do Corpo de Intendencia, a valorosa corporação que se associou immediatamente á causa do povo.

São as seguintes as palavras do valoroso militar que falou ao povo de uma das janellas deste jornal, o primeiro militar que falou sobre o golpe definitivo da Revolução.

Pela madrugada de hoje, ás 5,30, os officiaes, general Menna Barreto, Firmino Borba e Leite de Castro e João Gomes Ribeiro Filho, apoiados pelo 1o C/P de São Christovam lançaram um manifesto aos militares da 1a Região, convidando para o pronunciamento militar que fizesse para de uma fez para sempre o modo impatriotico de governar o Brasil.

Nesse momento o coronel Bastos, da Intendencia da Guerra, parlamentou com o 1o grupo para saber se se tratava de uma resolução definitiva e não de um embuste.

Á adhesão do grupo depuzemos immediatamente o general Xavier de Barros que não oppoz resistencia. Esse official general tinha em seu poder um documento pelo qual lhe haviam sido adiantados para operações 1.000 contos de réis pelo Banco do Brasil.

Reuniu-se immediatamente o Conselho de Administração para tomar conta dos dinheiros publicos, sendo presos e desarmados, quando se hasteavam a bandeira brasileira e revolucionaria o coronel Heitor Abrantes e tenente Ravedutti.

o 1o de Cavallaria fez a guarda da revolução, reaffirmando o valor patriotico de seus homens que vivavam a causa do povo e mantendo as suas tradições de heroismo, apoiados pelo 1o Grupo de Artilharia Pesada, disposto e prompto a proteger a marcha revolucionaria sobre a capital.

São essas as palavras que nos ditou, entre vivas e acclamações o capitão Silva Barros que o povo pediu que falasse e que depois saiu carregado pela multidão para reunir-se aos seus companheiros.” Diario da Noite, 24 de outubro de 1930.

“Após um periodo de 21 dias de allucinante expectativa e fundas appreensões, os imperativos da alma popular determinaram os memoraveis acontecimentos que culminaram, hontem, nessa apotheose á liberdade coroando a redempção de um povo nobre e altivo, que parecia pequeno porque permanecia de joelhos.

Trazendo no peito o fogo sagrado que levou João Pessôa ao sacrificio supremo da vida, abalado pelo enthusiasmo santo que o patriotismo communica a todas as almas bem formadas, o povo carioca saiu hontem para a rua, realizando galhardamente a conquista de seus direitos conspurcados.

Vibrando em estos de civismo, delirante de alegria, na qual tomaram parte senhoras e creanças, ao tremular do Pavilhão Nacional a ao aceno dos lenços vermelhos, symbolos e distinctivos da revolução redemptora, soube o povo, usando de suas prerogativas de conscio de seus deveres, dar o merecido castigo a todos quantos tripudiavam sobre a caudal de sangue patricio, generoso e bom que a caricata de um Cesar de papelão desencadeára sobre o solo da Patria.

Castigou e purificou a fogo o ambiente emprestado pela covardia inonimavel dos lacaios agachados por traz dos communicados officiaes, supremo escarneo atirado ás faces de um povo, cuja capacidade de soffrimento se esgotou, emfim.

E no momento justo em que a Nacionalidade reclamava a sua collaboração decisiva, eil-o que entra em ação vibrando o golpe de misericordia, na tyrannia inconsciente e moribunda.

Da sua atuação na jornada gloriosa de patriotismo e redempção, que hoje inicia a sua primeira etapa vitoriosa, damos a seguir detalhados informes. (…)

Desde as sete horas da manhã, que a aristocratica Avenida Atlantica, se encontrava em verdadeiro delirio e sob os impulsos incontidos de alegria sem par, que a todos causou a victoria da revolução brasileira.

Nas immediações do Forte de Copacabana – o tradicional forte da immortal epopéa dos dezoito heróes – a massa popular era consideravel.

Ali, como em todo o percurso da elegante praia, o enthusiasmo dos moradores, attingiu ao auge, e, á passagem de carros conduzindo praças revolucionarias, todas com um laço vermelho no fuzil ou na farda, o povo prorompia em vivas ardorosos ao “Brasil Livre” e á “Revolução Victoriosa”. Senhoras e crianças, populares e militares viveram horas da mais completa confraternização.

Foi um brilhante espetaculo, o da manhã de hontem, na aristocratica avenida, espetaculo que se prolongou até á noite.

O povo na sua incontida expansão de vindicta contra os conspurcadores de sua liberdade, praticou varias depredações. Os mais sacrificados com a ira do povo foram os jornaes que apoiaram o governo derrubado.

Assim as sédes dos jornaes “A Noticia”, “A Critica”, “Vanguarda”, “Gazeta de Noticias”, “A Ordem”, “O Paiz, “Jornal do Brasil” e “A Noite” foram violentamente alvejados.

Destes, as redações do “Jornal do Brasil”, “A Noite” e “O Paiz” e as officinas da “Gazeta de Noticias”, chegaram a ser incendiadas, sendo necessario o comparecimento do Corpo de Bombeiros para abafar as chammas. O edificio da “A Noite” ficou damnificado até ao 4o andar, alem das avarias da redação.

Enquanto isso, o povo victoriava “A Esquerda” e “A Batalha” e outros orgãos das sympathias populares eram victoriados. (…) A Batalha, 25 de outubro de 1930.

“Triumphou hontem em toda a linha, pela intervenção dos generaes que intimaram o Presidente da Republica a deixar o poder, triumphou desde as primeiras horas nesta capital e pode-se considerar victoriosa em todo o paiz, a revolução desencadeada por Minas Geraes, Rio Grande do Sul, Parahyba e elementos de outros Estados, contra o governo da Republica.

Movimento de reivindicações legitimas, necessarias á normalização do paiz, perturbado pelas injustiças do poder – foi uma revolução eminentemente civil, dos elementos politicos e populares dos governos estaduaes irmanados com o povo, a que as forças armadas do Exercito e da Marinha, confraternizadas com a Nação, como sempre, em todas as phases graves da nossa historia, déram o concurso indispensavel a uma decisão mais rapida.

Minas Geraes teve, por seu governo e pelo seu povo, um papel preponderante nesta grande jornada civica.

Ainda ao Rio Grande do Sul e a Parahyba, foi o nucleo central da resistencia e da offensiva contra o governo que, transviado da sua missão, tendo enveredado para os caminhos da prepotencia e da injustiça, interveiu nos dissidios politicos, empregando em favor de um grupo todos os recursos que ao poder foram dados para garantia de todos, para tranquillidade e progresso da Nação.

É cedo nesta primeira hora, de paixões ainda candentes, é cedo para julgar definitivamente da conducta que entendeu observar o ex-presidente, homem honrado, de qualidades sem duvida apreciaveis, probidade, caracter e patriotismo, mas violento e obstinado, que a ninguem ouvia, ou antes só obedecia ás inspirações da sua vontade discrecionaria.

Não lhe falaram com franqueza seus ministros e conselheiros, ou não os escutou.

De que a norma por elle adoptada no exercicio da sua magistratura, que desviou de sua verdadeira missão pacificadora – prova a revoluçÃo, ora victoriosa em todo o paiz e nesta Capital, por entre demonstrações de regosijo popular bem maiores do que as que assignalaram o advento da Republica.

É o regimen que sahe victorioso desta provação, a que o paiz inteiro se associou orientado e dirigido por um pugilo de patriotas destemerosos civis e militares, cujos nomes estão já inscriptos no kalendario republicano como regeneradora de uma época, descortinando o futuro.

Getulio Vargas, Olegario Maciel, Antonio Carlos, Arthur Bernardes, Oswaldo Aranha, Juarez Tavora, e seus bravos companheiros de armas, Flores da Cunha, João Neves, e tantos outros heroes, civis e militares, desta jornada de altivas repulsas e corajosas affirmações, com os generaes e almirantes que hontem déram o golpe final da campanha, assumiram grandes compromissos com a Nação.

Estamos seguros de que vão abrir para o Brasil um novo ato de garantias efetivas, de trabalho, de progresso, e civilização.

Liberdade e Justiça sejam o lemma desse periodo historico, que se abre para a nossa patria, deante do olhar vigilante do continente e do mundo.

Liberdade, autoridade, direito, justiça – tudo isso temperado pela equidade, emanação da bondade constructora.

Bondade que desarma e pacifica, fundando os alicerces do edificio social no coração do povo, fraternisado e feliz. Viva a Republica! Viva o Brasil unido e forte!” A Patria, 25 de outubro de 1930.

“A população do Rio de Janeiro sabe que o edificio da A Noite foi assaltado, que as suas officinas foram quasi totalmente destruidas, que os escriptorios e empresas installados no arranha-céu foram roubados, mas ainda não conhece os autores dessas brutalidades, que surprehenderam a todos, e ninguem attribuiu, nem poderia logicamente attribuir, ao generoso, ao culto povo carioca.

As attitudes da A Noite no momento que passava não explicariam taes crimes, que tiveram origem no odio e na inveja, procurando aproveitar-se de uma situação anormal para destruir um jornal em cujas columnas têm amparo todos os desgraçados e que despende uma média mensal de trinta contos para soccorrer os necessitados que batem á sua porta.

O jornal que tem aberto em favor dos humildes as subscripções mais vultosas, que dá conta minuciosa, aos doadores dos donativos que lhe são entregues, que tem collocado nos hospitaes milhares de enfermos pobres, que levanta das ruas os infelizes sem teto, que affronta os poderosos na defesa dos fracos, nunca seria, e não foi atacado pelo povo a que se devotou.

Conforme declarações espontaneamente feitas deante das novas autoridades, alguns communistas, auxiliados por individuos despedidos da A Noite, no momento em que se atacava O Paiz, conseguiam arrastar os elementos communistas e grupos de individuos fluctuantes, sem classificação,, nem idéas, para atiral-os contra a nossa folha, cujos empregados, em grande parte, como adiante demonstraremos, estavam nas fileiras da revolução, enfrentando os corpos que ainda não se haviam definido contra o governo.

Na A Noite, á hora do assalto, estavam, apenas, um dos diretores da Sociedade Anonyma, o gerente, o redator-chefe, alguns empregados do escriptorio e parte do pessoal das officinas.

Quando os aggressores se aproximaram, suppondo-os revolucionarios, recebemol-os como amigos janellas e portas abertas. Um delles, porém, destacando-se exigiu que arriassemos a bandeira nacional, hasteada no terceiro pavimento, gritando-nos:


– Arrie a bandeira burgueza! Outro exigiu: – Levanta a bandeira vermelha!

Fizemos então baixar as portas exteriores de aço. Uma dellas foi arrebentada com auxilio de um caminhão. Arrancada de nosso fachada a bandeira do Brasil, foi pisada pelos communistas, que a rasgaram, levando um de seus pedaços como um trophéo, a redação do “Diario da Noite”, como noticiou esse vespertino.

Assistimos depois á invasão do nosso edificio e á depredação do nosso material. Pensamos no primeiro momento que soffriamos, apenas, a “revanche” do communismo e só mais tarde viemos a saber que outros elementos por despeito e inveja tinham-se reunido aos subversores da sociedade. (…)” A Noite, 4 de novembro de 1930.
AS MANCHETES


As Ultimas Informações Sobre O Movimento Subversivo De Minas Geraes e Rio Grande – Foi Decretado O Estado De Sitio Para Minas, Rio Grande, Parahyba, Districto Federal E E. Do Rio (A Critica)As Tropas Federaes Estão Senhoras Da Situação – Reina Completa Calma Em Todo O resto Do Paiz – Todas as Altas Patentes Do Exercito Solidarias Com O Governo (A Critica)Como Será Feito O Abastecimento De Generos Alimenticios Á Cidade – O Governo, Attento, Ao Bem Estar Publico, Toma Energicas E Efficazes Providencias Para O Abastecimento De Generos Á População (A Critica)

Brutus (A Critica)

Num Gesto Que Bem Define A Sua Mentalidade E Tanto Ennobrece Os Seus Sentimentos, O Povo Da Capital Da Republica Acaba De Vibrar O Golpe Decisivo Nesse Montão De Miserias E Sordices Que Era O Governo Que Acaba De Cair, Afogado Na Propria Ignominia. Precipitando Os Acontecimentos E Dando A Victoria Á Causa Sagrada Da Patria, O Povo Carioca Pôz Um Dique, Á Caudal De Sangue Desencadeada Pelos Moribundos E Avultou, Aureolado, No Coração Do Brasil – Salve Povo Carioca! (A Esquerda)

Viva O Brasil ! Viva A Republica Nova E Redimida ! Os Ideaes Da Patria Venceram ! (Diario da Noite)

O Sr. Washington Luis Que, Diziam Os Seus Amigos, Era Destemido E Bravo, Teimoso E Valente, capaz De Morrer No Seu Posto, Sem Recuar, Teve Medo Do Povo. Teve Medo E Até Ás 14 Horas De Hontem Permanecia No Palacio Guanabara, De Onde Teimava Em Não Sair, Porque O Povo Estacionava Nas Immediações. Doloroso Epilogo De Uma Farça; Triste Fim De Um Regabofe Indecoroso Que Se Esvae Por Entre Arrepios De Pavor E Temores De Medo… (A Batalha)

Alliando-se Á Republica Triumphante, Os Generaes De Terra E Mar Apressam A Victoria. O Povo Carioca, Numa Confraternização Commovedora, Tomou Parte Na Arrancada Final Em Que As Forças Armadas Depuzeram O Governo Que Nos Infelicitava E Desagradava. O Ex-Presidente Foi Conduzido, Preso, Para O Forte De Copacabana. A Victoria Da Revolução (A Patria)

As Attitudes Da “A Noite” (A Noite)

Fonte: www.uol.com.br