De acordo com os dicionários, caudilho é chefe militar ou simplesmente chefe, quem dirige um bando o.u facção. É o mesmo que cacique. Se o fenômeno é universal, adquire vigor em áreas caracterizadas pelo subdesenvolvimento, como forma política rudimentar. Convencionou-se mesmo ser típico da América Latina, notadamente dos países surgidos do Império espanhol.
Como se escreveu, nas lutas pela Independência, os líderes em realce subordinam tudo mais, encampando o poder político, do qual não abrem mão. O caudilho sobrepõe-se à lei, sua vontade é lei. Não admite crítica ou oposição, pois se considera entidade não contestável. Cerca-se de servidores fiéis, designados para cargos importantes, como prepostos. Forma-se assim máquina administrativa de traços rudimentares, a coisa pública vista como particular, organização patrimonial, feita para o exercício de um homem ou grupo, desconhecendo as normas de racionalida de, de eficiência em tom impessoai. Premiando os submissos e perseguindo desafetos, obtém fidelidades totais - tudo fora do esquéma é perseguido ou exterminado. . Se os primeiros caudilhos foram lutadores pela Independência, mantém-se entre eles a tradição de falar em liberdade.
Surgem, quase sempre, chefiando movimento pela derrubada de quem usurpa o poder e o exerce tiranicamente. O novo chefe projeta-se invocando a liberdade, assume o govemo com o apoio popular; aí instalado, quer manter-se e repete a experiência contra a qual lutou, para enfrentar a oposição, necessariamente logo formada.
A falta de tradição política explica o fenômeno do caudilho. Ele pode ser simples agente dos grandes proprietários de terras contra as inquietaçòes populares, das senhores do comércio com o exterior ou dos agentes do capital imperialista explorador do país. Ou é um elemento do povo, inflamado por sua causa e pregando-a com vigor e até demagogia, fascinando as massas, nos raros momentos de estabilidade institucional, até tomar o gaverno e subverter a ordem. A pobreza geral e a falta de perspectivas para superação do quadro econômico condicionam o aparecimento de um novo líder.
Na História da América Latina há chefes lúcidos e broncos, estes em maior número. Como na Europa no tempo do absolutismo se falou em déspota esclarecido, o dirigente sem contestação, mas com programa de trabalho conduzindo ao bem-estar do maior número, o mesmo pode ser encontrado no Novo Mundo. Houve caudilhos com programas inteligentes, dedicados à causa do seu povo ou da nação. No comum, no entanto, eles se conduzem em termos apenas de continuísmo, submetendo tudo e todos a uma disciplina rígida e até eliminadora de qualquer pretensão livre. O apoio do Exército é imprescindível, se o governo está fundado na força: dele provém o maior número` desses dirigentes. Se a oposição tem origem popular, se é o povo a maior vítima, com o tempo alguma figura de militar de prestígio passa a ambicionar o posto supremn. Conspira e quando deflagra o movimento e depõe o governante malquisto, conta com o apoio entusiástico do povo, com o qual às vezes já mantinha relação com vistas ao golpe político.
Demais, nunca faltou à dasse dirigente o apoio externo. O caudilhismo, para se perpetuar, entrega-se à corrupção, interna e externa. As forças da ùonomia mundial, com interesses em países americanos, não negam apoio a essas autoridades, conquanto resguardem seus negòcios. Chegam mesmo a dar dinheiro, para armar o poder. Completam-se assim dois interesses escusos: o de quem deseja continuar e aceita o apoio externo e o das forças exploradoras dos recursos nacionais, se têm a garantia dos mesmos grupos arn~ados para continuarem no ramo rendoso, com baixos salários ao povo sem meios de revolta. Nem todos os caudilhos foram corruptos, é certo, mas é decorrência do pròprio sistema a corrupção, pois o único valor é a continuidade do poder.
Todos os países latino-americanos conheceram essa figura. Elas surgem, crescem e muitas vezes acabam derrubadas por força adversa, com vigor adquirido ao longo dos anos. O fim comum do caudilho é a fuga para o exterior ou ser assassinado pelo inimigo que lhe ocupa o lugar. Em quase regra esse novo govemante, se aparece em nome da liberdade, acaba também por ser caudilho. Dezenas de exemplos poderiam ser invocados.
Lembre-se, entre outros, Porfirio Diaz, com o govemo do México de 1876 até 1910 - homem lúcido, realizou grandes obras em seu país, marcando o seu período com trabalhos notáveis.
Começou como liberal, adquirindo aos poucos os traços de intolerância. De fató,`é impossível a alguém perpetuar-se no poder sem adquirir conotações de violência, corrupção, desprezo pelo povo. Porfirio Diaz tentou modemizar o México, negando-lhe a tradição e com o desapreço de seu povo. Atraiu técnicos estrangeiros - a capital teve urbanização à maneira francesa. Para ele, civilizar era desindianizar.
Contra o seu sistema se fez a Revolução em 1910: ela vai exatamente valorizar ao máximo o índio, a tradição. Contará em seu princípio com vários caudilhos de acidentada trajetória, como Pancho Villa, Zapata, Obregon e outros. Na História do país, antes e depois de 19Jo, como na das outras nações do continente, o caudilhismo foi quase regra.
A política da América é uma sucessão de_absolutismos, não de liberdades: não há longos períodos de leis interrompidos por golpes, mas longos períodos de violência intercalados por momentos de paz, de ordem e respeito às normas legais.
História para o Vestibular e Cursos de Segundo Grau
Francisco Iglesias
DIFEL