30.1.11

A Guerra de Troia aconteceu?

O épico Ilíada, escrito por Homero, descreve uma das mais famosas guerras desenvolvidas na Antiguidade. Mais do que o relato militar, o conflito chama a atenção pelas motivações do mesmo, as atitudes tomadas por seus mais importantes personagens e a sua incrível reviravolta. Por conta de sua rica narrativa, muitos duvidam da veracidade de uma guerra tão singular. Em termos gerais, toda essa dúvida seria capaz de desmoronar a paixão de Páris, o rapto de Helena, o feito dos heróis participantes e a engenhosa construção do cavalo que determinou o fim do combate.

Tomado por todas essas perguntas, o arqueólogo amador, Heinrich Schilemann, estudou vários textos de Homero para assim definir a possível localização de Troia. Realizando diversas escavações no monte Hissarlik, próximo ao famoso Estreito de Dardanelos, ele acabou descobrindo uma série de vasos, jarras e apetrechos feitos em ouro e prata. Observando esse material, ele concluiu que os artefatos faziam parte do Tesouro de Príamo, antigo rei troiano e pai de Páris. Com isso, a existência de Troia e do conflito ganhavam significativa sustentação.

No entanto, vários historiadores saíram a campo para revisar as teorias e fontes expostas pelo aventureiro alemão. Por meio de novas escavações no mesmo lugar concluiu-se que os artefatos encontrados foram obtidos em diferentes pontos da região e que, desse modo, não poderiam integrar o tesouro de Príamo. Apesar do erro, a pesquisa feita pioneiramente por Schilemann serviu para que outros pesquisadores descobrissem que naquela região existiram diversas "Troias", uma reconstruída em cima das antigas estruturas da outra, ao longo dos séculos.

As novas pesquisas revelaram a existência de noves Troias, sendo as cinco primeiras construídas no início da Idade de Bronze; Troia VI sendo pertencente à segunda metade da mesma Idade de Bronze; Troia VII teria sido habitada por um povo que controlou a região até o ano de 700 a.C.. Logo em seguida, Troia VIII e, por fim, a cidade romana de Ilium Novum, que corresponderia à última versão do lendário centro urbano. Em geral, as diversas cidades foram identificadas pelos diferentes tipos de ruínas que se acumularam cada vez, ao longo do tempo, que o local fora atingido por algum incêndio ou desastre natural.

Entre essas várias cidades descobertas abriu-se caminho para novas pesquisas que pudessem determinar qual daquelas Troias foi a que verdadeiramente teria vivenciado o combate descrito por Homero. Entre 1932 e 1938, um grupo de pesquisadores norte-americanos determinou pela análise da extensão de Troia VII, que esta, seria a cidade que vivenciou a lendária guerra. Além do mais, o linguista Calvert Watkins revelou uma antiga inscrição hitita que fazia menção das rochas escarpadas de Ílinon, também retratadas na obra de Homero.

Ainda assim, os céticos diziam que a cremação de Pátroclo, parceiro de Aquiles, descrita na Ilíada, seria outra grande incoerência, já que tal costume não é registrado nesse período. Contudo, uma recente pesquisa feita por arqueólogos alemães derrubou esse mesmo argumento ao descobrirem uma série de vestígios de corpos que teriam sido cremados nessa mesma época. Se por um lado tais descobertas reforçam a existência de Troia, por outro, não conseguem responder ao questionamento daqueles que duvidam das motivações e feitos que imperam na narrativa que nos relata a guerra.

Atualmente, vários estudiosos acreditam que Troia funcionava como um entreposto comercial que realizava a interligação entre as cidades gregas encontradas nos mares Negro e Egeu. Naturalmente, eles deduzem que a dependência dos gregos em relação aos troianos fosse motivo para a ocorrência de pequenas divergências que desgastavam a relação política e comercial entre tais povos. Com isso, os gregos talvez realizassem essa invasão quando os troianos estivessem fragilizados por alguma contenda ou desastre natural que poderia ter instigado o desenvolvimento da guerra.

Observamos que a determinação de um veredicto sobre a Guerra de Troia, tal qual a conhecemos, nunca poderá ser alcançado em bases seguras. Isso não quer dizer que o chamativo relato da Guerra de Troia seja deixado de lado como uma invenção desprovida de qualquer valor. Ao contrário, os versos desse poema atestam uma forma única de se reinventar, imaginar e sentir. Sem dúvida, a construção formada pelas palavras de Homero configura um belo legado cultural das antigas civilizações.


Por Rainer Sousa

Fonte:Brasil Escola