22.5.11

Alexandre, o visionário

Além da audácia no comando do exército e das brilhantes vitórias contra os persas, o rei da Macedônia também foi um grande empreendedor. Ele ergueu cidades, construiu estradas, usou diplomacia com os inimigos derrotados e planejou "globalizar" o mundo Antigo

POR RODRIGO GALLO


IMAGEM: WIKIPEDIA
Gravura de Alexandre falando a seus oficiais antes de importante batalha. O monarca macedônio pode ser considerado visionário, pouco compreendido em sua época, mas venerado por gerações futuras

Ele formou um dos exércitos mais bem treinados da história, subjugou o Império Persa, conquistou 90% do mundo conhecido e, mesmo depois de travar mais de cem batalhas, morreu sem jamais sofrer uma derrota em combate. Alexandre, filho de Olímpia e herdeiro de Filipe da Macedônia, realmente mereceu ser chamado de 'o Grande'. Mas suas qualidades como líder não se restringiram apenas às questões militares. Ele também revolucionou o mundo Antigo usando diplomacia e seu ambicioso projeto de ligar a Europa, Ásia e o norte da África, mais de dois mil anos antes de ser criado o termo 'globalização'.

Alexandre nasceu em Pela, no norte da Grécia, em 356 antes de Cristo, e desde cedo seu destino esteve ligado à glória e à conquista. Sempre impetuoso, o general macedônio foi venerado como um grande guerreiro. Além do sucesso no campo de batalha, ele também se destacou por ter levado a cultura helênica aos extremos do mundo, inaugurando uma nova era para a política de relações internacionais: transformou ex-inimigos em aliados, perdoou antigos adversários derrotados, casou-se com uma estrangeira e, o mais importante, vislumbrou a possibilidade de construir estradas ligando todos os territórios anexados durante anos de guerra.

Outro grande mérito atribuído a Alexandre foi a construção de diversas cidades pelos três continentes envolvidos em sua campanha contra os persas. De acordo com o historiador Paul Cartledge, professor de história grega da University of Cambridge (Inglaterra), as fontes mais antigas estimam que Alexandre construiu pelo menos 70 cidades, mas estudos modernos apontam números mais modestos: algo entre dez e 12 pólis (termo grego para cidades).

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Representação de Alexandre com Bucéfalo, que se tornaria seu cavalo. No relato de Plutarco, Alexandre dava sinais de brilhantismo desde jovem, quando conseguiu, por perspicácia, montar o cavalo que parecia indomável

De qualquer forma, o modo de concepção desses centros urbanos foi revolucionário. Essas cidades não foram erguidas ao redor de grandes templos, como era comum na Antiguidade. Alexandre pensava adiante e projetou suas metrópoles ancoradas em vastas áreas comerciais, transformando- as em pontos de encontro de negócios e cultura. Algumas delas, como Kandahar (Afeganistão) e Alexandria (Egito), existem até hoje - a segunda, inclusive, foi erguida nas margens do mar Mediterrâneo como forma de facilitar o escoamento de mercadorias, e até hoje é a segunda maior cidade do país, com cerca de oito milhões de habitantes.

O rei macedônio pode ser considerado um grande visionário, pouco compreendido em sua época, mas venerado por sucessivas gerações futuras. O próprio ditador romano Júlio César guardava uma grande admiração pelo monarca grego.

DO NASCIMENTO ÀS CONQUISTAS
De olho nos recursos naturais de um território O historiador queronéio Plutarco, grande biógrafo da Antiguidade, escreveu que o nascimento de Alexandre foi marcado por uma série de eventos míticos, que servem para reforçar sua predestinação para a glória. Verdadeiros ou não, o certo é que esses fatos demonstram a forma como as pessoas da época viam e idolatravam os feitos do monarca da Macedônia.

Alexandre nasceu no sexto dia do mês de Hecatombeon, enquanto o templo de Ártemis no Éfeso, uma das sete maravilhas do mundo antigo, era destruído em um incêndio. Além disso, outros presságios chegaram aos ouvidos de Filipe, que acabara de tomar a Potidéia em uma batalha. A primeira notícia é de que ele havia ganhado o prêmio na corrida de celas, nas Olimpíadas. Além disso, soube que naquele dia Parmenion, seu principal general, havia derrotado os ilírios, ao mesmo tempo em que seu filho nascia em Pela.


Os presságios não podiam ser melhores para o rei Filipe: três boas notícias em um único dia só poderiam ser sinal de prosperidade. Contudo, nem o pai e nem os videntes da época seriam capazes de imaginar até onde a audácia do jovem Alexandre o levaria.

Uma série de eventos místicos servem para reforçar a predestinação de Alexandre para a Glória

Moeda de Alexandre, O Grande, com representação da deusa grega Niqué. A fotografia foi feita no Museu Metropolitano de Arte de Nova york

Desde cedo, ele demonstrava muita segurança ao afrontar ordens e já dava sinais de que desafiaria qualquer liderança que se apresentasse a ele - inclusive o próprio pai. Conta Plutarco que, certa vez, um vendedor ofereceu um belo cavalo a Filipe, ao custo de 13 talentos. Contudo, logo perceberam que o animal era selvagem demais e não poderia ser montado. Desapontado, o rei mandou que fosse levado embora. Alexandre, que acompanhava a cena, teria dito, em tom jocoso. "Que cavalo estão perdendo! É por inexperiência e timidez que não conseguem nada."

Após muita insistência do filho, Filipe permitiu que o garoto tentasse montar o cavalo, com a condição de que pagaria os 13 talentos caso não tivesse êxito. Alexandre aproximou-se do animal, batizado de Bucéfalo, pegou as rédeas e virou-o de modo que não visse a sombra. Ele tinha percebido que o cavalo estava assustado com a própria imagem projetada pelo sol. Após acalmá-lo, o jovem conseguiu montá-lo. Ao ver a glória do filho, Filipe ficou emocionado, correu até ele e disse, chorando. "Meu filho, procura um reino digno de ti! Para teu valor é pequena a Macedônia." Esse relato é um forte indicativo de que Alexandre não era mesmo um jovem comum.

Três anos depois, já com 16, Alexandre ganhou de vez a confiança dos macedônios no campo de batalha, quando seu pai estava afastado por conta de uma guerra contra os bizantinos. Na ausência de Filipe, o jovem príncipe foi obrigado a comandar os exércitos e lutar contra os revoltosos nedaras, tomando duas cidades com bravura.

Pouco tempo após esse fato, Alexandre tomou parte da Batalha de Queronéia, na qual Filipe venceu a liga grega e deu início à hegemonia macedônia na Hélade. Plutarco conta que, durante o combate, Alexandre foi escalado para comandar a cavalaria e foi o primeiro soldado a atacar diretamente o lendário batalhão sagrado de Tebas - o que possibilitou a derrota dos inimigos.

Engana-se, porém, quem pensa que ele foi tratado com diferença durante sua formação. Alexandre recebeu o mesmo treinamento dado aos garotos de sua idade. Esse plano educacional fazia parte do ambicioso projeto de Filipe de educar a população inculta e formar uma nova geração bem preparada de macedônios - que incluía seu filho.

Alexandre foi o primeiro soldado a atacar diretamente o lendário batalhão sagrado de Tebas

O rei grego havia transformado o país de uma terra de pastores em uma grande potência militar e comercial, o que não foi uma jornada fácil. No auge do período clássico, espartanos e atenienses menosprezavam os macedônios, considerados inferiores por seus costumes pastoris. Os habitantes da Macedônia eram classificados como rudes, hostis e incultos - tanto que aceitavam viver sob o domínio de um único soberano, ao invés de exigirem a instauração de um regime democrático, como havia em Atenas.

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Afresco de Dario, que, derrotado em um primeiro combate, reuniu exército com 600 mil homens e comandou as tropas contra Alexandre pessoalmente. Em vão, pois os macedônios, em menor número, venceram

Para mudar isso, Filipe investiu forte na educação. Contratou Aristóteles, considerado o maior filósofo do período, para educar os jovens e lecionar para Alexandre e seus futuros generais.

O grande sonho do rei, no entanto, era unifi- car toda a Grécia sob uma única bandeira e marchar em direção à Ásia, para derrotar os persas, que já incomodavam os gregos há séculos. Contudo, ele nunca concretizaria esse objetivo. Filipe foi assassinado e, aos 20 anos, Alexandre herdou não apenas a coroa, mas também o sonho do pai.

Uma das principais diferenças entre os dois, do ponto de vista ideológico, era o objetivo final. Filipe queria simplesmente obliterar a ameaça representada pelos persas e conquistar seus territórios. Alexandre, no entanto, sonhava muito além. Seu intento era derrotar Dario III e assumir o controle da Babilônia. Ele ainda tinha a intenção de respeitar a cultura e a religião de cada povo, mantendo a grande diversidade asiática.

GUERRAS DE ALEXANDRE
De fato, Alexandre o Grande colocou o plano em ação. Após controlar insurreições internas na Grécia, o presunçoso rei marchou à Ásia com um exército de cerca de 30 mil homens na infantaria, além de cinco mil cavaleiros. A linha de frente lutava com sarissas: lanças com até seis metros de comprimento.

ALTE PINAKOTHEK, MUNICH
Detalhe de pintura intitulada Batalha de Issus, do pintor Altdorfer, feita em 1529. Atualmente, a obra se encontra no Pinakothek Museum, em Munique, Alemanha

Conta-se que a audácia era tamanha que ele partiu da Macedônia sem recursos suficientes para concluir a campanha. A idéia era confrontar e derrotar os bárbaros e, desta forma, tomar suas riquezas em cada cidade tomada para custear o restante da guerra.

GALLERIA NAZIONALE D
Alexandre, o Grande diante do Túmulo de Aquiles, obra pintada em óleo sobre tela no ano de 1630, pelo pintor Johann Heinrich Schonfeld (1609-1683)

Logo após cruzar o Helesponto, Alexandre visitou Tróia, onde ofereceu sacrifícios a Minerva, e fez reverências no túmulo de Aquiles. Em seguida, seguiu viagem e, em pouco tempo, teve seu primeiro grande confronto contra as tropas de Dario III, em 334 aC.

O rei persa havia ordenado que um exército fosse reunido nas margens do rio Granico, para impedir o avanço da Macedônia. Os hoplitas de Alexandre temiam atravessar o rio por conta da profundidade. O general Parmenion tentou dissuadi-lo da idéia. O macedônio, porém, obcecado e inabalável, mergulhou nas águas acompanhado de 13 companhias de cavalaria, embaixo de uma nuvem de flechas atirada pelos inimigos, que aguardavam do outro lado.

Após muitas baixas e muito sacrifício, os macedônios conseguiram atingir a outra margem, muito íngrime e defendida por uma cavalaria persa. "Uma multidão de inimigos precipitou-se sobre Alexandre, pois o reconheciam pelo brilho de seu escudo e pelo penacho de seu capacete encimado por duas asas de alvura deslumbrante e de tamanho maravilhoso. Roesaces e Spitridates, dois generais de Dario, chegam juntos para atacar; mas ele evita o segundo e bate com a lança na couraça de Roesaces. A lança voa em estilhaço", relata Plutarco. "Enquanto estão os dois lutando com furor, Spitridates aproxima-se, para tomar Alexandre de flanco e, erguendo-se sobre seu cavalo, dá-lhe na cabeça um golpe de cimitarra, que lhe abate o penacho com uma de suas asas. Spitridates preparava- se para assentar uma segunda pancada, quando foi prevenido por Clito, o Negro, que o atravessou com seu dardo. Ao mesmo tempo, Roesaces caiu morto por um golpe de espada de Alexandre."

LOUCURAS DE ALEXANDRE

Embora tenha sido um grande visionário, a vida de Alexandre também foi marcada por alguns excessos, como o massacre de Tebas e o assassinato de Clito, o homem que o salvou da morte na Batalha de Granico.

Muitos detratores afirmam que Alexandre sempre foi megalomaníaco. Outros garantiam que o filho de Filipe desejava demais o trono do pai e não mediria esforços para conquistá-lo. Enfim, o certo é que o general macedônio cometeu atos de barbárie semelhante aos praticados pelos inimigos 'bárbaros' em muitas situações. Uma das teorias considera que Alexandre o Grande perdeu o controle quando visitou o oráculo de Siwa, no Egito, e foi reconhecido como um filho legítimo de Zeus. Com o título de faraó, seus súditos passaram a ser obrigados a fazer reverências em eventos oficiais da corte - algo que não combinava com os costumes macedônios da época.

Porém, anos antes disso ele já demonstrava que sua fúria fugia do controle, em algumas ocasiões. Logo após assumir o trono, ele cruzou as Termópilas e rumou à Grécia Central para conter uma grande rebelião, impelindo com violência contra os tebanos. "Chegado diante de Tebas, deu a esta cidade o tempo de se arrepender. Pediu tão somente que lhe entregassem Fênix e Piruetes", narra o historiador Plutarco. Contudo, diante da recusa imediata - e de outras barganhas feitas pelos tebanos - Alexandre avançou contra a cidade.

Os tebanos defenderam-se com bravura, mas não foram capazes de resistir à força dos atacantes. Envolvidos por todos os lados no campo de batalha, as defesas de Tebas caíram. A cidade foi completamente saqueada e destruída, e muitos habitantes foram passados à lança, como forma de assustar outros pretensos revoltosos. Outros tantos homens e mulheres foram vendidos como escravos.

Em 328 aC, já na Pérsia, Alexandre novamente viria a cometer mais atos impensados. Diante de suspeitas de conspiração e traição, mandou que o general Filotas fosse torturado na frente de todos, até a morte. Nem as súplicas serviram para que sua morte fosse menos dolorosa. Em seguida, enviou soldados a Meda, para matar outro suposto conspirador, Parmenion, aliado dos tempos de Filipe e grande guerreiro.

Pouco depois, foi a vez de Clito ser enviado a Hades pela fúria do rei macedônio. Durante um banquete, ele e Alexandre discutiram. O general, segundo Plutarco, teria dito. "Como invejamos a felicidade dos que morreram antes de ver os macedônios flagelados pelas vergas dos medos, e obrigados, para serem recebidos por seu rei, a implorar a proteção dos persas!"

Bêbado, Clito deixou claro que estava insatisfeito com o fato de ser obrigado a banquetear à mesa com ex-inimigos bárbaros. Alexandre levantou- se de sobressalto e, Furioso com as acusações, trespassou o peito do amigo com uma lança.

Durante o choque da cavalaria, a infantaria macedônia conseguiu atravessar o Granico, que despedaçou a resistência persa em pouco tempo.

Diante da derrota, Dario reuniu um exército de 600 mil homens, segundo Plutarco, e comandou pessoalmente as tropas contra Alexandre. Os dois exércitos enfrentaram-se em Íssus, já na Ásia Menor, em 333 aC. Porém, um erro estratégico na escolha do campo de batalha deu a vantagem aos macedônios, que mesmo em menor número conseguiram dominar a situação.

O grande trunfo de Alexandre foi saber manobrar bem as falanges. "Apesar da multidão inumerável dos bárbaros, soube proteger seu exército, tão inferior em número, contra o perigo de ficar envolvido: fez sua ala direita avançar sobre a ala esquerda dos bárbaros que tinha defronte, combatendo ele próprio nas primeiras fileiras."


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Ilustração de um contra-ataque de falange Macedônia em combate. Alexandre sabia manobrar bem as divisões de seu exército, por vezes ele mesmo combatendo nas primeiras fileiras

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Gravura de Tiro perseguido e capturado por Alexandre. A cidade recusou a única oferta de rendição às cidades marítimas da Fenícia e do Chipre, que o macedônio desejava controlar. Sitiada por meses, Tiro, por fim, sucumbiu

Novamente, a audácia de Alexandre garantia mais uma vitória sobre Dario, que fugiu. Os macedônios conseguiram, no entanto, capturar a mãe, a esposa e as duas filhas do persa. Ao invés de executá-las, Alexandre foi diplomático: garantiu conforto e segurança às cativas e a seus servos. Além disso, ao saber que dois soldados de Parmenion haviam estuprado algumas prisioneiras persas, Alexandre enviou uma carta ao general exigindo a execução dos violadores.

Antes de prosseguir rumo ao Oriente, Alexandre decidiu garantir a posse das cidades marítimas da Fenícia e do Chipre, para assegurar a hegemonia do comércio no Mediterrâneo. Apenas Tiro recusou a oferta de rendição. A cidade foi sitiada por sete meses e caiu diante das máquinas de guerra e das trirremes da Macedônia, em 332 aC.

Dario, vendo o perigo que corria, enviou uma embaixada até Alexandre, para fazer uma proposta de paz. Propôs o pagamento de dez mil talentos pelo resgate dos prisioneiros, além de entregar todos os territórios próximos do rio Eufrates e uma das suas filhas em casamento. O macedônio, por sua vez, exigiu que Dario se entregasse.

Portanto, não houve acordo e os dois exércitos voltaram a se confrontar em Gaugamela (331 aC). No confronto, Alexandre impeliu sua cavalaria diretamente contra a guarda real de Dario, causando muitas baixas e obrigando o inimigo a recuar. A vitória só não foi absoluta porque Parmenion estava sendo derrotado na ala esquerda do combate e, ao pedir ajuda, Alexandre foi obrigado a abandonar a perseguição ao rei persa para auxiliar os companheiros. Mesmo assim, caia definitivamente o grande Império persa e o filho de Filipe e Olímpia era proclamado monarca de toda a Ásia - com apenas 25 anos.


1. 335 a.C.: BATISMO DE SANGUE
As cidades de Tebas e Atenas se rebelam por duas vezes contra o recém-empossado Alexandre. Tebas resiste ao exército do macedônio até o final e é completamente destruída. Atenas, mesmerizada pelo exemplo da cidade vizinha, rende-se

2. 334 a.C.: BRIGA NOS PORTÕES DA ÁSIA
Com a Grécia estabilizada, Alexandre parte para a Pérsia. Já perto da cidade de Tróia, os 42 mil homens do Macedônio enfrentam o inimigo na batalha de Granico. Por causa da impulsividade de seu líder, que por pouco não foi morto, o exército macedônio ganhou a vantagem da surpresa ao atacar imediatamente o exército rival e destruí-lo

3. 333.a.C.: ENCRENCA GROSSA COM O MAIORAL
O imperador Dario III recruta cerca de 100 mil homens de toda a Ásia e vai de encontro ao abusado invasor. Apesar da força duas vezes superior, a cavalaria de Alexandre infringiu pânico e desbaratou as tropas de Dario

4. 332 a.C.: UMA PARADA VIOLENTA
A cidade de Tiro se recusa a aceitar uma cerimônia dos macedônios e Alexandre levanta um cerco. Após meses, os macedônios tomam a cidade, chacinam 8 mil tirenses e escravizam os 30 mil restantes

5. 331 a.C.: A VITÓRIA DEFINITIVA
A força de 50 mil homens de Alexandre era de qualidade superior ao exército persa, com 90 mil soldados. A tática ousada da cavalaria e o treinamento superior da infantaria macedônia na batalha de Gaugamela resultaram numa vitória conclusiva para Alexandre, agora "rei de toda a Ásia"

6. 326 a.C.: ÍNDIA, A FRONTEIRA FINAL
Alexandre ruma para o leste até se deparar com a resistência do rei Porus, às margens do rio Jelum. A luta, conhecida como batalha de Hisdaspes, resultou em vitória macedônia, mas foi tão sangrenta, que obrigou "o Grande" a dar meia volta e seguir para a Babilônia


Apenas Tiro recusou a oferta de rendição: foi sitiada por sete meses e caiu diante das máquinas de guerra da Macedônia

Camafeu de sardônix (um tipo da pedra ônix), provavelmente feito pelo entalhador de Alexandre, Pyrogoteles, por volta de 325 a.C. Alexandre é representado com chifres, como Zeus Ammon

Ao entrar na Babilônia e em Persépolis, Alexandre mostrou novamente sua diplomacia: respeitou unilateralmente a cultura dos povos conquistados, não permitindo o saque das cidades e autorizando inclusive os cultos aos seus deuses.

Ele até mesmo incentivou que seus generais se casassem com mulheres persas, gesto muito criticado pelos muitos macedônios que não aprovavam a miscigenação.

Ele próprio desposou uma nativa da Báctria, durante a perseguição ao fugitivo ex-rei persa. Praticamente todos os seus generais criticaram o casamento de Alexandre com Roxana, pois consideravam que ela descendia de um povo inferior e, portanto, não era digna do trono da Macedônia.

Após a conquista das terras de Dario III, o líder macedônio vislumbrou a possibilidade de construir estradas unindo todas as cidades criadas por ele e os territórios anexados, como uma espécie de globalização. Segundo o historiador escocês A. R. Burn, professor da University of Glasgow, Alexandre aprendeu com seus tutores que os persas eram meros bárbaros, mas passou a respeitá-los quando conheceu de perto sua cultura. "O rei macedônio aprendeu a respeitar os inimigos após reconhecer sua coragem em campo de batalha. Além disso, ele passou a admirar até mesmo as questões burocráticas do Império de Dario, como a eficiência do sistema administrativo das pólis", conta ele.

DO LIMITE AO FIM
A campanha de Alexandre rumo ao Oriente chegou ao fim em 326 aC, pouco depois de derrotar o rajá Porus às margens do rio Hidaspes, na Índia. Além do forte calor e as chuvas que castigavam a região, os hoplitas macedônicos ficaram atônitos diante dos quase 90 elefantes de batalha usados pelo exército inimigo. Foi um dos combates mais sangrentos da Antiguidade.

Do ilustrador Andre Castaigne, representação de Alexandre ao aceitar a rendição do rajá indiano Porus. O evento marcou o fim da campanha rumo ao Oriente

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Gravura simboliza a morte de Alexandre, que teria morrido por conta da bebida, aos 33 anos, embora existam teorias que defendam como causa mortis a sífilis, a malária, ou um envenenamento

O confronto começou ainda na madrugada. Porus impeliu todas as suas tropas contra os macedônios e lutou com uma fúria 'quase espartana', sobretudo após perder dois filhos na batalha. Alexandre, vendo sua cavalaria refugar diante dos paquidermes inimigos, reorganizou as tropas e investiu contra o rajá que, pressionado, assumiu a derrota e pediu rendição, após oito horas de escaramuças. Contudo, ao invés de ser executado, o indiano recebeu o perdão do rei macedônio e foi poupado, permanecendo leal a Alexandre.

No local da batalha, foi fundada mais uma cidade, batizada de Bucefália em homenagem ao cavalo Bucéfalo, que tombou no combate.

O monarca queria prosseguir e adentrar mais a fundo no território indiano, mas suas tropas, cansadas de anos de guerra, recusaram a prosseguir a jornada.

Chegava ao fim a vitoriosa campanha de Alexandre o Grande, que retornou à Babilônia, onde, em 324, perdeu o grande amigo Heféstion, supostamente por conta do excesso de ingestão de vinho.

No ano seguinte, o próprio Alexandre viria a adoecer em decorrência da bebida, embora algumas teorias falem de sífilis, malária ou mesmo envenenamento. O certo é que no dia 10 de junho de 323 aC, o soberano do mundo Antigo caiu aos 33 anos, sem nunca ter encontrado um adversário que o derrotasse em batalha.

Após sua morte, os generais deram início a uma briga pela sucessão, que culminou na fragmentação dos territórios conquistados. Ptolomeu foi o único que conseguiu manter a hegemonia local, no Egito. Nas outras partes do Império, disputas internas enfraqueciam cada vez mais a Macedônia. O sonho chegava ao fim.

ENTREVISTA: PAUL CARTLEDGE

O historiador Paul Cartledge, da Cambridge University, é um dos maiores especialistas contemporâneos de história grega, e afirma que há muitas lendas referentes a Alexandre. Em entrevista a Leituras da História, ele afirmou que o número de cidades construídas pelo macedônio certamente é superestimado, além de garantir que houve um motivo real para seu casamento com a báctria Roxana.

Leituras da História - Fala-se muito do ambicioso projeto de Alexandre, de unificar o mundo antigo sob uma mesma bandeira. Além disso, ele concedeu o perdão para muitos ex-inimigos. Seus generais acreditavam nesse sonho?
Paul Cartledge - Poucos generais macedônios compartilhavam esse sonho do rei. Alexandre, contudo, realmente tinha um grande projeto. Ele certamente tinha a idéia de criar um império politicamente unificado, e as estradas seriam um aspecto chave para concretizar esse plano na prática. Os inimigos derrotados de Alexandre transformaram-se, portanto, em assuntos de extrema importância para seu novo império, mesmo porque muitos deles seriam empregados na construção das estradas.

LH - É comumente aceito que Alexandre morreu invicto, sem jamais ter perdido uma batalha. Essas fontes são confiáveis ou há controvérsias?
Paul Cartledge - Houve quatro grandes batalhas durante a campanha: Granico (334), Íssus (333), Gaugamela (331) e Hidaspes (326). Porém, Alexandre e seus generais lutaram muitas outras batalhas menores, especialmente durante a campanha na Ásia Central, entre 330 e 327, além de alguns cercos (o mais importante foi o de Tiro). Houve sim algumas pequenas derrotas, como a falha no cerco de Halicarnasso.

Mas de qualquer maneira, Alexander foi totalmente vitorioso em sua expedição.

LH - Alguns historiadores afirmam não existir um motivo plausível para justifi- car o casamento de Alexandre com Roxana. O senhor tem alguma teoria?
Paul Cartledge - O pai de Roxana, Oxyartes, governava uma parte vital do território onde hoje fica o Afeganistão. Assim como seu pai Filipe, Alexandre lutou suas guerras em busca de alianças, ou seja, contraiu alianças diplomáticas com as filhas dos líderes derrotados em áreas estratégicas vitais. O casamento com Roxana foi uma forma de criar laços com líderes daquela região.

REFERÊNCIAS:
CARTLEDGE, Paul. Alexander the Great: The Hunt for a New Past. Estados Unidos: Editora Overlook, 2004, 1ª edição. PLUTARCO, Alexandre e César: Vidas Comparadas. São Paulo: Editora Escala. São Paulo: Atual, 1993.

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