ARTIGO
Guerrilha do Araguaia: memórias de uma luta contra o silêncio e o esquecimento
Lúcio Alberto Couto GUSMÃO1 Resumo: A resistência ao golpe militar (1964-1984) representada pela Guerrilha do Araguaia adquiriu uma grande dimensão. Uma luta que durou quase três anos e que envolveu a maior mobilização militar brasileira depois da II Guerra Mundial, sendo a jornada de resistência de maior duração na época da ditadura militar, contribuindo para fortalecer o ânimo da oposição à ditadura. A experiência da Guerrilha do Araguaia, luta armada organizada pelo PC do B no interior do Brasil entre os anos de 1972 a 1975, permanece enquanto memória que insiste em ser reivindicada por vários segmentos da sociedade brasileira, tanto nas versões oficiais do exército, quanto na retomada jornalística e literária dos últimos anos, colaborando novas interpretações dos ex-militantes virem à tona. Sendo assim, sua discussão amplia as condições no processo de se evitar a criação de mitos e lendas afastando o sentido da luta dos guerrilheiros de aumentar a consciência dos camponeses do Araguaia. PALAVRAS-CHAVE: guerrilha, memória, esquecimento. Abstract:
The resistance to the military blow (1964-1984) represented by the Guerrilla of the Araguaia acquired a great dimension. One fight that lasted three years almost and that it involved the biggest Brazilian military mobilization after the World War II, being the day of resistance of bigger duration at the time of the military dictatorship, contributing to fortify the spirit of the opposition to the dictatorship. For the guerrillas it was necessary to conquer the confidence of the local population through concrete actions, of daily examples, and not of ideological speeches. One fights armed in Brazil cannot be envolta in mist, therefore the memory insists on being reinvidicada. Being thus, its quarrel extends the conditions in the process of if preventing the creation of myths and legends moving away
1 Graduado em Licenciatura em História pela UESC e professor do ensino fundamental e médio de Ilhéus. Esse texto é parte da monografia de conclusão do curso de Licenciatura em História, revisada após comentários dos pareceristas, professores do DFCH/UESC Antônio Pereira Souza, André Luiz Rosa Rodrigues, e Luiz Henrique dos Santos Blume, orientador da monografia.
5
the direction from the fight of the guerrillas to increase the conscience of the camponeses of the Araguaia. KEY-WORDS: guerrilla, memory, fight
Considerações iniciais:
Os que se levantaram contra a Ditadura militar, no caso específico da Guerrilha do Araguaia, acreditaram que poderiam mudar a sua vida e a de seus compatriotas. Eles levaram adiante suas idéias, seus ideais, mesmo percebendo que sua luta poderia ser perdida perante as poderosas estruturas de seu tempo. Não se curvaram, porém. Correram riscos, sendo vítimas de todo tipo de atrocidades perpetradas pelo aparato militar do regime, e nos mostraram que a luta, mesmo que “perdida” no tempo, pode deixar vitórias à posteridade. Por isso, considero a Guerrilha do Araguaia um tema importante para se compreender a história brasileira durante o período da ditadura militar (1964-1984). O movimento foi empreendido e desencadeado pelo PC do B (Partido Comunista do Brasil), que após o rompimento com a linha pacifista do PCB (Partido Comunista Brasileiro), representada por Luís Carlos Prestes, procurou levar à prática a sua concepção de que a revolução brasileira passa inevitavelmente pela luta armada. Os documentos do PC do B pintavam com cores sombrias o momento que se vivia. A situação dos oprimidos e explorados era aterradora: salários baixos, miséria, carestia, crise na habitação, na saúde, na educação, mortalidade infantil, fome... (REIS Fº. 1990: 38).
Nesse sentido, hoje a discussão sobre a Guerrilha do Araguaia é reforçada. O país atravessa um processo de redemocratização e talvez viva o período de maior democratização da sua vida política elegendo um operário à Presidência da República. Vivemos um período, portanto, inédito como processo democrático, um novo ciclo político que poderá se abrir, porque forças políticas que nunca tinham antes conseguido chegar ao governo da República o fazem agora, forças de origem popular, de extração popular. O
6
próprio presidente da República, um ex-operário configura uma outra realidade, em que pela primeira vez o PC do B apóia e participa do governo nacional, e tem um dos seus membros, o deputado federal Aldo Rabelo, exercido a função de presidente da Câmara dos Deputados, entre 2005-2007. Na memória dessas práticas políticas, podemos tirar lições, nos debruçando sobre esses acontecimentos. Entender nossa história política, a história do país, onde nos apoiamos é uma tentativa de fugir de acomodações. Dessa maneira, analisar a luta do Araguaia passa a ser uma descoberta de uma nova história da esquerda. Devemos perceber que nem sempre é possível se apropriar do passado sem conflitos e sem rupturas. Dentro das pesquisas realizadas, “falar” do Araguaia se transformou em motivo de intensa divergência, tanto no PC do B, como na Imprensa em geral.
No PC do B, por exemplo, da morte dos guerrilheiros até o momento em que o partido admitiu que os combatentes do Araguaia tivessem sido mortos, houve um longo caminho percorrido. Seja pelo duro impacto da derrota, seja pelas dúvidas a respeito do que realmente havia acontecido com os militantes, se haviam sido presos ou assassinados. Somente em abril de 1976 a direção do PC do B admitiu publicamente, através do artigo “Invencível bandeira de luta”, publicado no seu jornal A Classe Operária, que havia acontecido um “temporário retrocesso na guerrilha”. Por outro lado, ressaltava que a bandeira da “guerra popular”, empunhada pelos combatentes, continuava válida e que a guerrilha seria, com “... o exército popular, adestrado em mil batalhas, capaz de assestar golpes demolidores nas forças de reação e libertar a pátria dos seus piores inimigos”. 2 A versão oficial do PC do B sobre o Araguaia, entretanto, nunca conseguiu aglutinar completamente em torno de si a totalidade, nem mesmo dos membros do partido, e abriu fendas que acarretaram graves conseqüências para o PC do B. No início dos anos 80, em grande parte por causa das divergências em relação ao significado da Guerrilha do Araguaia, muitos militantes foram expulsos ou deixaram o PC do B, e alguns fundaram o Partido Revolucionário Comunista (PRC), entre os quais José Genoíno Neto.
O PC do B acreditava que o golpe vinha para ficar, pois em sua análise “se tratava de uma ditadura “bárbara”, demonstrando que o objetivo dos militares era justamente barrar
2 A Classe Operária. Jornal criado pelo PCB (Partido Comunista Brasileiro) em 1925, e adotado posteriormente, pelo PC do B ( Partido Comunista do Brasil) após o rompimento em 1962.
7
a ascensão do movimento democrático e antiimperialista então em curso no país durante o governo de João Goulart”. “Os comunistas surgiam como “tutores” do povo, e as organizações como tutelares dos interesses políticos das classes revolucionárias”. (REIS Fº. 1990: 66). Incentivados pela Revolução Cubana de 1959, e pelo sucesso de Che Guevara e Fidel Castro, o PC do B fez um cronograma de possibilidade de uma revolta armada no Brasil, a partir da teoria do “foco”. Uma concepção de resistência pautada no desenvolvimento da luta armada prolongada através de um núcleo central único, saído da cidade e situando-se em regiões que oferecessem dificuldade de acesso. O crescimento do grupo que estivesse estabelecido inicialmente permitiria o desdobramento em outras colunas até a vitória final. Esta seria a linha de luta e de concepção político – militar conhecida como “foquismo”, estabelecida pelos dirigentes do PC do B. “O “foquismo” segundo o partido, representa uma concepção puramente militar. Ignora a importância dos fatores políticos e da participação das massas na revolução”. (MORAIS; SILVA. (2005: 36). A ruptura com a linha pacifista e revisionista do PCB, aproximou o PC do B da China. A Influência nessa concepção de tomada violenta do poder foi registrada: “Na resolução Guerra Popular- Caminho da Luta Armada no Brasil, aprovada pelo Comitê Central do PC do B em janeiro de 1969. O documento sacramenta a opção pelo caminho da revolução a partir da mobilização do campo” (MORAIS; SILVA. 2005: 35).
Desde sua origem, em 1962, o PC do B defendera a luta armada. Essa posição rendeu-lhe prestígio no período imediatamente posterior ao golpe civil-militar de 1964 quando boa parte da esquerda brasileira divergiu do caminho pacífico ao socialismo propugnado pelo PCB (Partido Comunista Brasileiro), trazendo ao partido uma nova leva de militantes. A escolha do PC do B por iniciar a luta no campo foi na contramão do que fizeram o restante dos agrupamentos também adeptos da luta armada, no final da década de 60. A Ação Libertadora Nacional (ALN), o Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8), a Vanguarda Popular Revolucionária (VPR), o Partido Comunista Brasileiro Revolucionário (PCBR) e outras organizações principiaram pelas ações urbanas: panfletagens, assaltos a bancos, roubos de armamentos e munições, assassinatos de agentes do aparato de repressão política. Mas consideravam a guerrilha urbana preparatória, já que
8
garantiria recursos materiais, experiência militar e propaganda de sua atuação, à luta no campo, vista como a etapa verdadeiramente decisiva da revolução. Ao longo da década de 60, o PC do B aproximou-se ideológica e politicamente do regime comunista chinês. Vários de seus quadros passaram por formação militar e teórica naquele país, inclusive guerrilheiros que viriam a ser deslocados para o Araguaia. “O PC do B pretendia implantar um movimento armado no Brasil inspirado na experiência da China. Planejava abrir uma frente revolucionária no interior do país, incorporar as massas da área rural, criar um exército regular, envolver os trabalhadores urbanos e deflagrar uma guerra popular prolongada. (...) O partido considerava que existia no Brasil condições objetivas para uma transformação radical por meio da luta armada. As contradições em um país semi-industrializado, os conflitos gerados pelas desigualdades sociais e os abusos da ditadura davam suporte às propostas de uso da violência contra o regime”. (MORAIS; SILVA.2005) Só restava descobrir um terreno mais propício para plantar a semente da guerrilha. A forma de mobilização da população do local a ser escolhido tinha que ser debatida. A guerra de guerrilhas seria a forma principal de luta para o PC do B, seguindo a linha chinesa de Mao Tsé Tung, que sintetiza: “Quando o inimigo avança, recuamos; quando pára, o fustigamos; quando se cansa, o atacamos; quando se retira, o perseguimos” (MORAIS; SILVA. 2005:35). Por outro lado, o regime militar procurou organizar uma guerra de extermínio para enfrentar a resistência do Araguaia. Uma guerra de extermínio, com censura férrea e da qual ninguém pudesse saber, desrespeitando a Convenção de Genebra. Uma luta que acabou praticamente por levar à dizimação da quase totalidade da resistência. É algo semelhante ao que aconteceu em outros países que passaram por períodos de ditadura, como são os casos do Chile e da Argentina. Existiu um movimento de resistência que durou três anos e praticamente foi dizimado, e isso chama a atenção. Por que isso aconteceu? O que motivou essa resistência? Por que se sucede um movimento como esse? Quais os motivos de ocultá-lo? Combateram as Forças guerrilheiras do Araguaia, todo um aparelho militar e policial do regime que mobilizou aproximadamente 20 mil homens.
9
“Durante mais de dois anos travou-se renhida luta. O Exército realizou três grandes e aparatosas campanhas, em conjunto com a Aeronáutica, a Marinha e a Polícia Militar, contando com armamentos modernos e vastos recursos materiais. Na primeira – em abril/junho de 1972 – pôs em ação 5 mil homens; na segunda – em setembro/novembro de 1972 – empregou 15 mil homens; na terceira, de outubro de 1973 a maio de 1974, mobilizou de 5 a 6 mil soldados” 3. Nesse caminho, se apresenta um momento de usar todas as forças na construção e elaboração de uma história da guerrilha onde se admitem os erros que possam ter sido cometidos, em ambos os lados, fugindo da tentativa de, até mesmo, apagar a memória da participação dos agentes desse episódio da história recente do Brasil. Durante três anos, de 1972 até 1975, toda uma região foi conflagrada por uma “guerra revolucionária”:
A luta travada no Araguaia possui profundo significado político. O povo brasileiro, oprimido por uma infame ditadura, ansioso de liberdade e de independência, tem nessa luta uma manifestação, autêntica e conseqüente, dos seus mais caros anseios. Ali foi dado o passo inicial da marcha que é preciso empreender na conquista de uma vida melhor. Esse fato auspicioso demonstra que a idéia de pegar em armas para alcançar um regime popular não só amadurece como pode ser levada à prática4. Informar e motivar a sociedade brasileira a interessar-se e a participar dos debates e decisões relacionados com a defesa nacional é um dos grandes desafios que o processo de enraizamento da democracia reserva para os historiadores, jornalistas, intelectuais, políticos e os formadores de opinião no Brasil. Nas discussões de questões nacionais como a Guerrilha do Araguaia, não esquecendo, não mitificando, refletimos sobre elementos na construção e identidade de uma memória social não exclusivamente relacionada com a história oficial, na qual o governo militar fez todo o esforço possível para apagar da História a Guerrilha do Araguaia. “No Passado, podiam-se acusar os historiadores de querer conhecer somente as “gestas dos reis”. Hoje, é claro não é mais assim. Cada vez mais se interessam pelo que seus predecessores haviam ocultado deixado de lado ou simplesmente ignorado”. (GINZBURG. 1987: 15).
3 Folheto do Partido Comunista do Brasil. A Resistência Armada do Araguaia. Coleção Política Revolucionária. Edições bandeira Vermelha. s/d: p. 111-112. 4 Folheto do Partido Comunista do Brasil. A Resistência Armada do Araguaia. Coleção Política Revolucionária. Edições bandeira Vermelha. s/d: p. 113
10
Sua importância na memória, no esquecimento e no silêncio, portanto, projeta-se na história, assim como as campanhas de Canudos (1896-1897), tipo de luta popular, que mobilizou uma grande massa camponesa no interior da Bahia, em que as tentativas de imposição ao silêncio e esquecimento se assemelham à Guerrilha do Araguaia.
Referências na construção da memória
País de proporções continentais, historicamente o Brasil desenvolveu-se fechado sobre si próprio, sob a liderança de elites provincianas e temerosas do mundo. No ambiente rarefeito que elas criaram e no qual se perpetuaram no poder, questões como a política externa ou a defesa nacional tornaram-se searas exclusivas de setores da burocracia, do estamento militar e de uns poucos supostos iluminados. “A Guerrilha do Araguaia, que ficou durante tanto tempo como uma das áreas proibidas da nossa história atual não pode ser mais negada. Cabe, portanto a todos aqueles que vêem na História um instrumento ativo de transformação social procurar interpretá-la, situá-la social e historicamente para que a sua experiência possa servir dinamicamente àqueles que estão fazendo política no Brasil”. (MOURA. 1985: XV). Nos anos 1960 e 1970 já estava em curso a meta de acelerar o desenvolvimento do capitalismo no campo, estimulando a concentração fundiária, quando a questão da terra (e do subsolo) tornava-se uma questão militar. A ditadura oferecia uma política para as grandes empresas, mediante incentivos financeiros, voltando-as para a grande agropecuária. A origem disso estava no próprio golpe militar de 1964, que, entre outros objetivos, buscou modernizar latifúndios e impedir o crescimento das lutas camponesas, que construíam suas organizações desde meados dos anos 50. “Os primeiros dentre os futuros guerrilheiros começaram a chegar à região em fins de 1967. No ano anterior começaram a se implantar ali os primeiros projetos agropecuários selecionados e subsidiados pela SUDAM – Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia. A internacionalização da economia brasileira, o seu ajustamento à dinâmica das multinacionais, consumada pelo golpe de Estado de 1964, produziu a grave repressão política, a drástica intolerância ideológica que encaminhou para a clandestinidade as tendências político-partidárias opostas ao novo regime a as tendências ideológicas que dele mais significamente divergiam. ( DÓRIA, et. al. 1978: 8).
11
A política agrária do regime militar promoveu a expansão das grandes empresas no campo. Este foi um dos principais motes para a instalação do “foco” guerrilheiro. Os militantes do PC do B acreditavam nessa tese, e fazem uma análise do conflito no campo num panfleto:
“As Forças Armadas dão cobertura à ação dos grilheiros. Sentindo que cresce o ódio contra as expulsões arbitrárias, o Estado-Maior do Exército programa uma espetacular manobra militar na região do Araguaia e do Tocantins, coisa jamais vista por lá. 5. Nesse ponto já sentimos a indicação da existência de uma brecha entre o passado e o futuro, um espaço e um tempo no qual nossas antigas referências estão esgarçadas e dissolvidas em memórias oficiais “sem sentido”, que procuram continuar negando qualquer possibilidade de investigação sobre a guerrilha. Isso se deve ao fato de que a memória enquanto um modo do pensamento torna-se ineficaz sem um quadro de referências que lhe permita reter o conhecimento. Essas referências são o acabamento que todo acontecimento vivido deve ter, suas reflexões, questionamentos e lembranças. Para que o presente possa usufruir dessa herança do passado é preciso que a memória seja articulada e retomada, com o fito de construirmos uma história. Durante os momentos mais duros da ditadura, pensar e ainda mais, agir em defesa da democracia, foi um exercício perigoso, uma expressão do desejo de lutar pelas liberdades democráticas. Hoje, na construção da democracia, pensar no que foi e significou o regime militar para o presente também se encontra no campo dos anseios e desejos, pois há os que temem que esse passado recente possa ameaçar a democracia. Entretanto, pensar que o olhar sobre o passado impede o desenvolvimento dos acontecimentos e que os erros históricos devem ser esquecidos é não perceber que a perda do passado equivale à trágica privação de sentido na existência humana: “destruindo os suportes materiais da memória, a sociedade capitalista bloqueou os caminhos da lembrança, arrancou seus marcos e apagou seus rastros”. (BOSI, 1994: 19)
A vigilância e o controle estabelecido pelo regime militar, dentro da lógica da segurança nacional implantada pelo golpe militar de 1964 eram enormes: entidades da sociedade civil, espaços de sociabilidade e cultura, atuação pública de personalidades
5 Folheto do Partido Comunista do Brasil. A Resistência Armada do Araguaia. Coleção Política Revolucionária. Edições bandeira Vermelha. s/d: 33.
12
críticas, todo o tecido social e os espaços públicos eram virtualmente vigiados assim como a Imprensa, em particular a “Imprensa Alternativa”, “que tinham como traço comum a oposição intransigente ao regime militar”, (KUCINSKI. 1991: IX). Desligada da política dominante, essa linha de Imprensa se apresentava como um espaço para denunciar as torturas e violações dos direitos humanos, criticando também o modelo econômico. O regime militar brasileiro, como de resto outras ditaduras latino-americanas, concentrou-se em vigiar e controlar a imprensa, “o aparelho militar distinguia os jornais alternativos dos demais, perseguindo-os e submetendo os que julgavam mais importantes a um regime especial, draconiano, de censura prévia”, (KUCINSKI. 1991: XIV), regido por uma lógica de desmobilização política da sociedade como garantia da "paz social". Neste sentido, esses regimes poderiam ser caracterizados como autoritários, pois sua atuação voltava-se para o controle da informação, preservando certas formas de liberdade individual privada. Se a violência policial, legal e ilegal, era sistemática e utilizada contra inimigos e críticos do regime em casos extremos e em situações nas quais os generais no poder sentiam-se particularmente ameaçados, a vigilância sobre a sociedade civil e as informações era constante. A obsessão pela vigilância como forma de prevenir a atuação "subversiva", sobretudo naquilo que os manuais da Doutrina de Segurança Nacional chamavam de "propaganda subversiva" e "guerra psicológica” contra as instituições democráticas e cristãs: “em uma ditadura militar, orientada pela Doutrina de Segurança Nacional, levantar-se em armas contra o regime constitui um crime gravíssimo” (CHIAVENATO. 1994: 118), acabando por gerar uma lógica da suspeita. Considero que apesar do dogmatismo, refletindo o marxismo e os preceitos morais do PC do B, a “Imprensa alternativa”, principalmente os jornais alternativos políticos, perceberam os supostos perigos do crescente endividamento brasileiro, ainda em 1973, (a Guerrilha do Araguaia já era combatida), oferecendo uma oportunidade para que o agravamento das iniqüidades sociais, que na região do Araguaia era tão visível e sentida, fossem divulgadas.
Mais de duas décadas de governos militares apenas acentuaram essas tendências. No combate à “subversão” e em nome da “segurança nacional” o regime militar cerceou a liberdade de expressão, manteve a imprensa sob censura formal durante sete anos,
13
perseguiu e assassinou jornalistas. A Guerrilha do Araguaia foi marcada pela mordaça da censura da Ditadura Militar que temia, caso fosse divulgada pelos meios de comunicação, a adesão aos que contrapunham na cidade aquele regime de exceção comandado pelos militares, tornando hegemônico a imposição do “silêncio” a respeito do conflito. Deu-se o oposto. Os militares venceram a guerra das armas e perderam a guerra do discurso. Como afirma Jarbas Passarinho:
“O apoio da imprensa, perdemo-lo quando lhe foi imposta a censura e, por cima disso, por censores despreparados, incapazes de distinguir uma notícia de um recado para a guerrilha. Como a liberdade é para a imprensa o mesmo que o oxigênio para a vida, a mídia não demorou a ficar contra o governo e a adubar, habilmente, terreno para os líderes de oposição”.6 A imposição ao “silêncio” sobre a guerrilha, nos mostra o quanto devemos recuperar a voz dos militares, não para torná-la única a respeito do tema, mas sim para apontá-la como contradição enriquecedora para a constituição de uma história mais ampla do conflito. “A destruição do passado – ou melhor, dos mecanismos sociais que vinculam nossa experiência pessoal à das gerações passadas – é um dos fenômenos mais característicos e lúgubres do final do século XX. Quase todos os jovens de hoje crescem numa espécie de presente contínuo, sem qualquer relação orgânica com o passado público da época em que vivem. Por isso os historiadores, cujo ofício é lembrar o que outros esquecem, tornam-se mais importantes que nunca...” (HOBSBAWM: 1995: 13) O nosso objetivo é ampliar a discussão sobre os sentidos da guerrilha. Deve-se, portanto, efetuar a exploração das divergências. Os militares são os únicos que têm informações que são úteis ao esclarecimento do episódio, como relata o repórter José Mitchell em reportagem no Jornal do Brasil:
“Documentos secretos do Exército, revelados há dois meses pelo Jornal do Brasil, mostraram que mais de 60 guerrilheiros do PC do B foram mortos e estão sepultados em locais de difícil acesso e que 16 militares
6 Jarbas Passarinho é coronel da reserva. Foi governador do Pará (1964-65) e senador pelo Estado em três mandatos (1967-74, 1975-82 e 1987-95), além de ministro da Educação (governo Médici), da Previdência (governo Figueiredo) e da Justiça (governo Collor).
14
morreram. As famílias receberam indenização sob a condição de não falarem no assunto”. 7 Na mesma reportagem podemos perceber uma forma de comando no sentido de incentivar o extermínio e forçar o “silêncio”:
“Cada guerrilheiro morto valia um ou dois pacotes de cigarros a mais para o soldado e para o pelotão. Era o Prêmio que o general Antonio Bandeira (comandante na época da 3ª Brigada de Infantaria e um dos coordenadores da repressão à Guerrilha do Araguaia) mandava dar por morto. E sei disto porque era eu quem controlava o fornecimento de cigarros, comida e combustível. Nesta primeira fase de combates, a gente sabia também quando os guerrilheiros eram mortos: saía sempre um helicóptero, com um fotógrafo e um datiloscopista para tirar fotos e impressões digitais. O Exército ficou com estes documentos como prova da morte dos guerrilheiros, mas acho difícil localizar os mortos da primeira fase: os guerrilheiros eram enterrados em buracos abertos na terra, no local do combate”.8 No caso dos militares, portanto, não se pode alegar que no Araguaia alguns pequenos grupos tenham adquirido “autonomia” sem que os generais em Brasília, em especial os generais presidentes, tenham qualquer responsabilidade sobre esses atos. Possivelmente, durante o governo Médici, um chefe de operações dos serviços de inteligência tinha independência quase total para agir, mas não autonomia. Mas quem realmente deu a ordem para liquidar os guerrilheiros? Orlando Geisel (Ministro do Exército) disse a Milton Tavares: “Não sai ninguém da área”. Não era uma senha. Era uma ordem para matar? Todos entenderam. Essa ordem do Ministro do Exército na forma de combate à “subversão” fica mais patente quando o colégio eleitoral instituído pela ditadura militar escolheu o general Ernesto Geisel, irmão do Ministro Orlando Geisel, para Presidente da República, e que em diálogo com seu velho amigo, o general Dale Coutinho afirma: “Ah, o negócio melhorou muito. Agora, melhorou, aqui entre nós, foi quando nós começamos a matar. Começamos a matar” – afirmou Coutinho. “Porque antigamente você prendia o sujeito e o sujeito ia lá para fora(...) Ô Coutinho, esse troço de matar é uma barbaridade, mas eu acho que tem que ser”, respondeu Geisel. (GASPARI, Apud, MORAIS; SILVA.2005: 492).
7 Jornal do Brasil. 1º Caderno. Brasil. 1992 8 Oliveira, Ernane.2º Ten. Exército da reserva. Jornal do Brasil: Brasil. 1992.
15
Para os familiares nessa incessante busca pelas informações supostamente “escondidas” questões se perpetuam. Por que é tão difícil encontrar os corpos dos guerrilheiros? Os militares acenderam fogueiras na Serra das Andorinhas, com pneus, e supostamente queimaram alguns corpos? Em reportagem publicada na Folha de São Paulo os procuradores Guilherme Schelb e Marlon Welchert, em 2001, afirmam: “O Estado brasileiro tem uma obrigação jurídica e ética para com todas as famílias de desaparecidos políticos”. Segundo a mesma reportagem:
“Busca o Ministério Público propiciar a dezenas de famílias de desaparecidos, o comezinho, imprescritível e inalienável direito de enterrar e chorar dignamente seus mortos, o que, aliás, é reconhecido como imperativo moral e jurídico desde as sociedades mais remotas e em todas as religiões, bem como é fato comum após eventos bélicos” 9. Este desconhecimento imposto acirra ainda mais certos ranços revanchistas e corporativos que permeiam parte da mídia de tendência esquerdista, ou, ainda, certo "que" de "imparcialidade hipócrita" entre a esquerda e a direita , por não terem noção de nenhuma das duas (injustiçando, quase sempre, um ou outro lado) são as vias que levaram o material produzido a se caracterizar: pela falta de isenção; pelos erros de análise; pela, não rara, caracterização de tendência ideológica; e pelo manuseio constante da meia - verdade, afim de preencher lacunas de conhecimento: Entre os modelos internacionais a prática social poderia haver um verdadeiro abismo, desde que o Partido estivesse formalmente ancorado em algo que lhe desse legitimação. para continuar agindo, operando. Coesão, segurança, legitimação. [...] começa-se a perceber que os modelos não induzem a erros, cobrem os mesmos. (REIS Fº. 1990: 97). Em reportagem publicada no jornal Tribuna Operária fica claro que o silêncio vai se rompendo, a partir da ação e da luta dos familiares. Como relata a repórter Conceição Freitas:
“A Caravana desloca-se sob a constante observação de olheiros. A certa altura, um senhor aproxima-se em lágrimas, para segredar que conheceu vários guerrilheiros, mas está sendo perseguido e nada pode falar. É a lei do Exército. [...] Mas pouco a pouco as histórias vão surgindo [...] um rapaz conta que tem um irmão que “o que ele sabe foi dona Cristina que ensinou”: e vai relatando detalhes de como viviam “aqueles moços que vieram de São Paulo”. Mas perde a desenvoltura com a chegada de sua
9 Shelb, Guilherme, Weichert, Marlon. Ministério Público e Araguaia. Folha São Paulo. Opinião. 2001: A-3
16
mãe, que teve o marido preso e torturado pelos militares, apenas por morar ao lado dos guerrilheiros”. 10 Parece-me que se estabeleceu no Araguaia um sentimento de pertencimento nesses acontecimentos vividos seja de forma pessoal, seja pelo grupo, mesmo que não participante. A memória sobre a Guerrilha do Araguaia criou uma espécie de projeção do imaginário estabelecendo uma memória coletiva:
“É perfeitamente possível que, por meio da socialização política, ou da socialização histórica, ocorra um fenômeno de projeção ou de identificação com determinado passado, tão forte que podemos falar numa memória quase herdada [...] podem existir acontecimentos regionais que traumatizaram tanto, marcaram tanto uma região ou um grupo, que sua memória pode ser transmitida ao longo dos séculos com altíssimo grau de identificação.” 11. Esse sentimento de pertencimento, essa memória quase herdada, associado ao trauma, apenas fizeram crescer entre os moradores do Araguaia os sentimentos de admiração pelos guerrilheiros, vistos como boas pessoas que ali chegaram e nunca se foram. Essa memória faz cair a barreira que separa o presente do passado, lançando uma ponte que elimina o esquecimento, fortalecendo a busca dos familiares dos guerrilheiros desaparecidos, já que a memória pertence a todos que sabem discernir para além do presente o que está enterrado no mais profundo passado, sem revanchismos:
“Tenho autoridade para falar: o destino de um parente desaparecido é montado com retalhos de informações colhidas ao longo do tempo. Por vezes, novas informações contradizem as antigas, rasgam a colcha, e a família reavalia, imagina um segundo fim para o parente, e assim vai, até a próxima informação.[...]este vai e vem de informações dá vida à morte: um desaparecido morre de muitos jeitos, e sua família revive o luto, presa a um novo calvário. É difícil visualizar o pai herói, o filho guerrilheiro, intelectuais, estudantes, ex-deputados envolvidos em sonhos românticos de mudar o país, nas mãos de feras imbecilizadas pela guerra suja, macacos esquartejadores de uma direita sem projeto. De uma vez por todas, vencedores, abram estes arquivos e nos dêem a morte sem boatos, deixem o Brasil contar sua história. Deixem-no em paz!”12
10 FREITAS, Conceição. Na Trilha dos Guerrilheiros .São Paulo. Tribuna Operária.. 17/11 a 31/11. . 1980 11 POLLACK, Michael. Memória e Identidade Social. Estudos Históricos, Rio de janeiro, Vol. 5, N.10, 1992, P. 200-212. 12 Paiva. Marcelo R. Abram os Arquivos e Deixem-nos em Paz! Folha de São Paulo. Especial. 1992: 6-²
17
Despertar a atenção de um número cada vez maior de pessoas, a cada dia que passa e a cada informação que surge, não esquecendo que agora os espectros da censura e repressão policial-militar parecem perder as suas cores mais vivas. E como era de se esperar, no recente clima de “abertura e conciliação política” que vivemos hoje no Brasil, aqueles fragmentos de nossa História que foram suprimidos do conhecimento público através das eficientes tesouradas dos alfaiates da segurança nacional tendem a emergir e a alimentar com força o debate público. “Os governos militares fracassaram na tentativa de jogar a Guerrilha do Araguaia no esquecimento. Depoimentos de sobreviventes do conflito e documentos produzidos pelos serviços secretos do governo preservaram por mais de três décadas a memória de um dos mais chocantes episódios da História do Brasil.” (MORAIS; SILVA. 2005: 13-14). Com a análise da atuação do Exército, e dos militantes do PC do B, verificamos os projetos políticos diferentes, de formas de representação social específica, mas ignoradas pelo Estado; ausência ou inadequação de políticas públicas que não têm em consideração a estrutura e a configuração sócio-cultural do povo brasileiro, em especial na região amazônica, que ainda hoje, parece permanecer na mesma condição do período da Guerrilha do Araguaia: “a morte recente da religiosa norte-americana naturalizada brasileira Dorothy Stang, no Sul do Pará, é um exemplo gritante desse quadro de instabilidade social e injustiça”. (MORAIS; SILVA. 2005: 15) Não é colocado o motivo pelo qual é necessária a apuração das circunstâncias das mortes e dos desaparecimentos durante a Guerrilha. Este comportamento termina por esvaziar o discurso dos familiares e por relegar a questão apenas ao interesse dos mesmos. Por isso não existe possibilidade de ampliação da luta.
“O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já tem como julgar ação contra a União, pois a Procuradoria-Geral da República deu parecer favorável ao recurso das famílias dos guerrilheiros desaparecidos. A ação judicial objetiva obrigar o Ministério do Exército a informar o que aconteceu com os militantes do PC do B, se e onde morreram e, neste caso, fornecer atestados de óbito e a localização dos restos mortais.” (MITCHELL. 1992: 18) 13
Quando se fala das implicações para a sociedade adota-se o seguinte raciocínio: pelo menos aparentemente a dificuldade em fazer justiça aos familiares de mortos e desaparecidos está no fato de não causar insatisfação nos quadros militares.
13 Mitchell, José. Exército registrou mortes de guerrilheiros. 1º Caderno. Jornal do Brasil. 1992: p.18
18
“A ex-militante do PC do B Criméia Alice Schmidt Almeida, 57, diz que é “deplorável” a apelação parcial da Advocacia Geral da União sobre o caso Araguaia. “Eu ainda estou sob o impacto da decepção”, disse. “Choca-me ver o governo se desdobrar em elogios às Forças Armadas, sem lembrar os abusos que elas cometeram e que procuram encobrir ainda hoje”. 14
Os militares que participaram da chacina fecharam-se e a campanha do Araguaia sumiu dos documentos oficiais. Não apareceram nem cadáveres para que as famílias pudessem enterrar seus mortos.”15 Por isso, se o Governo preferiu não enfrentar os militares pode ter sido pelo fato de que eles ainda representam algum tipo de ameaça à democracia brasileira. E a partir do momento que o problema passa a envolver questões como a liberdade e a democracia, não diz respeito apenas aos familiares, e sim à sociedade como um todo, pois, o universo desta questão é delicado, por envolver violação dos direitos humanos e a construção de uma memória da nação que continua a negar a repressão política, a tortura e o extermínio de opositores do regime:
“O Araguaia foi uma guerra começada por militantes do PC do B. Militantes são soldados. Eles estavam armados, tentando criar um Estado comunista dentro do Estado brasileiro. Não há nenhuma convenção internacional que me obrigue a enterrar corpos de inimigos, e a lei da selva não permite a nenhum combatente transportar corpos por vários dias”. 16 Entretanto, é preciso entender que quem determina quais revelações são desnecessárias, e quem diz quais itens ameaçam a estrutura sociocultural vigente, são as classes dominantes. Estas classes regulam qualquer tipo de ameaça de acordo com seus próprios interesses. A ação ideológica da classe dominante não nega oculta ou suprime simplesmente os fatos, mas faz desaparecer seu sentido ou capacidade de indicar um fenômeno social. Nesse sentido uma questão nos parece fundamental considerando que buscamos não uma narrativa de sucessões de fatos. Trata-se da mitificação dos guerrilheiros, muito provavelmente, incentivada pelo silêncio em versões oficiais, já que a negação do episódio do Araguaia era a linha política da ditadura.
14 Reportagem Local. Folha de São Paulo. Brasil 2003: A-11 15 Época. Fantasmas do Araguaia. Soldado descoberto por ÉPOCA mostram onde enterraram guerrilheiros e o governo ordena escavações. Reportagem de capa. . Nº 302 2004:.P. 28 16 Cipola, Ari. Araguaia “Não há nenhuma convenção internacional que me obrigue a enterrar inimigos”.Folha de São Paulo. Parahupebas Ag. Folha. 10 Brasil. 1996: 1
19
Sentido histórico da luta contra o esquecimento
A maior parte da sociedade brasileira esteve todo tempo à margem do processo de discussão sobre o conflito do Araguaia, como se não estivesse vinculado ao problema. Os segmentos da sociedade envolvidos foram os militares, agentes do Estado, os familiares e a imprensa (sendo omissa, de acordo com a vontade das classes dominantes). “Em certos momentos históricos, os seus agentes somente são conhecidos muito tempo depois de passada a ação. Há uma disritmia entre a informação dos seus atos, a opinião pública e a compreensão histórica. No entanto em que esse silêncio histórico se rompe, quebra-se o monopólio do discurso oficial sobre determinado acontecimento. E a opinião pública passa a discutir o comportamento de pessoas, grupos e instituições, julgando-as ou simplesmente analisando-as de acordo com os fatos revelados.” (MOURA. 1985: XI) Com base nesse posicionamento as mudanças propostas nestas condições devem realizar-se de acordo com as necessidades e interesses de setores mais amplos da sociedade brasileira. Compreender as possibilidades de darmos significados ao sentido histórico e político na luta pela memória da Esquerda Brasileira e da luta Guerrilheira do Araguaia é fundamental para se compreender o porquê da existência dessa e o padrão invariável do comportamento das classes dominantes no Brasil, marcado pela cooptação, repressão, intolerância e tentativa de extermínio de todos aqueles que ousaram questionar o status quo estabelecido. A História do Brasil – no seu lado heróico – é uma série de movimentos abordados e de líderes condenados pelas estruturas de poder do momento. Somente muito tempo depois é que passam de vilões a heróis. (MOURA. 1985: XII). Há uma construção de uma propaganda ideológica, seja de esquerda ou de direita, destinada para membros que, em tese, possuem uma orientação política. Essa propaganda funciona como elemento de mudança da realidade, inclusive apresentando os caminhos para essa mudança, na possibilidade do confronto entre a memória individual e a memória dos outros: “Isso mostra que a Memória e a identidade são valores disputados em conflitos sociais e intergrupais, e particularmente em conflitos que opõem grupos políticos diversos”. (POLLAK. 1992: 200-212).
“Por causa do absoluto silêncio mantido pelas Forças Armadas, tudo o que se sabe até hoje, 30 anos depois do fim da guerrilha foi contado por militantes do PC do B. O melhor e mais completo relatório ao qual já se teve acesso é o de Ângelo Arroyo, um dos comandantes da guerrilha, capturado e morto. Ali estão escritas, em minúcias, as manobras do
20
Exército, dos revolucionários, as circunstâncias de morte de muitos deles e as participações dos camponeses nas ações. Até hoje, o governo não apresentou nada que se compare em número de informações e detalhamento.” 17 Por isso, chamo a atenção para o quanto é importante, para a manutenção da coerência dos discursos das instituições políticas, a forma como elas lidam com o passado, em que a memória passa a ser responsável pelo reconhecimento dos indivíduos na imagem que a instituição política forja de si mesma. Sem essa identificação, ou mesmo sem esse sentimento de pertencimento, como afirma Michael Pollack:
“Está claro portanto que a memória especificamente política pode ser motivo de disputa entre várias organizações para caracterizar essa memória constituída (...) introduzir o conceito de trabalho de enquadramento da memória”. 18 Nesse sentido, se apresenta a hipótese da reivindicação da tradição e dos símbolos representados na trajetória comunista brasileira desde 1922, no caso em questão da Guerrilha do Araguaia, para legitimar as atuações políticas no presente e, assim, conseguir a coesão necessária para a atuação de seus militantes, que apresentam grande respeito e admiração por esse passado reivindicado. Admitir que não representam a continuidade da tradição comunista brasileira poderia, e talvez hoje ainda possa, acarretar a perda de militantes. No caso do PC do B, isso é ainda mais evidente, e que, a princípio, não parece ter demonstrado grande diferença em relação ao PCB, (nem de caráter teórico nem em sua atuação política), após o rompimento, acabando por utilizar o argumento da autoridade advinda de "seu" passado para justificar tanto o seu nascimento quanto a orientação política seguida a partir de então. Em resumo, o PC do B se apresenta como o “verdadeiro partido do proletariado”, porque teria se mantido dentro da tradição política de 1922, enquanto o outro grupo teria rompido com essa tradição ao abandonar o marxismo-leninismo e se alinhar à corrente revisionista soviética.
De toda a história do PC do B, a guerrilha do Araguaia é destacada por sua direção como o exemplo que demonstra mais claramente as características que teriam norteado a sua trajetória de luta. Nesse caminho, usou todas as suas forças na elaboração de uma história da guerrilha que fosse digna de orgulho para seus militantes, onde não se admitem
17 Garçoni, Inês. Os Documentos do Araguaia; Guerrilha de única Versão. Isto È.. Nº 1830. 2005. 18 Estudos Históricos, Rio de Janeiro, Vol. 5, n.10, 1992, p. 200-212
21
os erros que possam ter sido cometidos, e tenta-se mesmo apagar a memória da participação de certas figuras que hoje não pertencem mais ao partido. No Araguaia de Xambioá, da fronteira do Pará com o antigo Norte Goiano, hoje Estado do Tocantins, dois atores em graus variáveis estranhos à realidade local: guerrilheiros e militares procedentes de áreas e situações bastante distintas daquelas em que o conflito se deu. No caso dos guerrilheiros, a maioria era composta por filhos das camadas médias da sociedade, muitos com curso superior e com vivência da cultura urbana dos grandes centros e sua característica plenamente capitalista.
“A idade média dos guerrilheiros estava abaixo de trinta anos. Cerca de 70% de seu efetivo era composto de estudantes que haviam tomado as ruas em 1968. Mais da metade havia abandonado as universidades. Em pouco mais de três anos, no meio da juventude, saltaram da militância urbana para clandestinidade. Dela, para o grande sonho da guerra popular amazônica. Cinco passaram por faculdades de medicina. Três estudaram física e um deles, astronomia. Duas jovens abandonaram os cursos de letras.” (GASPARI. 2002: 410) 19 Já os moradores da região do Araguaia, em sua maioria camponesa, donas de casa, trabalhadores manuais e gente humilde, assistiram bestializados e praticamente sem compreender o que verdadeiramente acontecia. Ficaram completamente assustados quando viram "moradores da região" fugindo para as matas e sendo perseguidos pelos militares como caça a ser abatida. “A inquietação vai tomando conta dos pacatos moradores do Sul do Pará. Dezenas de lavradores da zona do Caiano procuram Paulo Rodrigues para discutir a situação. Querem resistir à intimação do grilheiro Antoninho. No Gameleira, muitos buscam contato com Osvaldo para pedir-lhes conselhos. Zé Carlos, igualmente, é ouvido. A massa fala em cativeiro, diz que o que está sucedendo se parece com a volta do cativeiro [...] Dona Hilda rezadeira de fama, que andara por ceca e meca, espalha a profecia do Padre Cícero, Araguaia iria pegar fogo e quem não morasse do lado do Pará não mais poderia ali chegar.” (MOURA. 1985: 34). Os guerrilheiros acreditavam que as massas poderiam ser levantadas. A luta armada dos “moradores” do Sul do Pará iria prosseguir, pois os guerrilheiros tentariam visitar o maior número de famílias camponesas, recrutando para a guerrilha:
19 Garçoni, Inês. Os documentos da Araguaia: Guerrilha de única Versão. Isto É. Nº 1830. 2005
22
“Isto aqui, de certa maneira, é um foco, uma chama brilhante que se acendeu na região do Araguaia. Mas não tem nada a ver como o foco fidelista. Neste, os combatentes pretendem por seus feitos arrastar atrás de si as massas passivas. Nós pensamos diferente. Acreditamos no povo, somos povo e achamos que tudo só tem futuro a Luta de sólida base popular.” (MOURA. 1985: 52) “O PC do B, sem assumir a responsabilidade pela organização da guerrilha, aponta para os moradores do Araguaia o caminho aprendido na China. A revolução libertará o Brasil dos obstáculos para o progresso e levará ao poder um governo realmente do povo. Sem luta, não se fará revolução. O povo do interior deve levantar-se para exigir direitos, juntar-se aos trabalhadores das cidades, aos estudantes e a todos que se rebelem contra os poderosos. Unidos, se tornarão invencíveis.” (MORAIS; SILVA. 2005: 172-173) Percebemos a construção de uma identidade que contribui para a formação de uma “saga” dos combatentes da Guerrilha do Araguaia e os seus “heróis”, mas não há a discussão se essas ações foram suficientes para levar a aventura resultados práticos, sobretudo pela falta de efetivo apoio político externo, já que a China, fonte inspiradora inicial, já buscava estabelecer relações diplomáticas com a “ditadura militar brasileira”.
“Passam-se muitos meses, dois anos talvez. Os novos moradores estreitam suas relações com o povo, identificam-se com ele. São estimados e estimam sinceramente os que conhecem. Amizade não se consegue da noite para o dia. Vai se forjando com o tempo. Uma ajuda aqui, outra acolá, o respeito às pessoas, a atenção que se lhes presta na conversa, o interesse pela sua vida, o conselho que se ouve dos que habitam o lugar, o desejo de aprender com a massa - tudo isso vai tecendo os fios invisíveis da amizade.” 20 Essa aproximação ressalta a importância das particularidades serem discutidas, para não permitir que se transforme algo real em mitológico. Tomamos o termo mito como a solução imaginária para tensões, conflitos e contradições que não encontram caminhos para serem resolvidos no nível da realidade.
“Por isso os guerrilheiros do Araguaia conquistam a cada dia o respeito e a admiração das grandes massas populares. Filhos queridos do povo, patriotas da melhor estirpe, eles ousam desafiar as dificuldades, os reveses e os sacrifícios com o pensamento voltado para o Brasil livre do despotismo. Viverão no coração de todos os que amam a liberdade e odeiam a opressão.” 21
20 Folheto do PC do B. A Resistência Armada no Araguaia. Coleção Política Revolucionária. Edições Bandeira Vermelha. s/d. 21 Folheto do PC do B. A Resistência Armada no Araguaia. Coleção Política Revolucionária. Edições Bandeira Vermelha. s/d: 103.
23
O uso do mito encontra-se na história que se procura impor, para que se esqueça aqueles tempos e não se construam as narrativas contrárias. O sofrimento pelo qual passamos em nossa existência somente pode ser absorvido e transformado em experiência se pudermos conceder-lhe publicidade. Não se trata, é claro, de desmerecer as ações de grande coragem daqueles jovens que se propuseram, em situação de extrema inferioridade, a enfrentar a repressão movida por ideais. No entanto, tratá-los hoje como parte de um mito somente contribui para nos afastar da possibilidade de compreensão de suas lutas. “Na medida em que se constituem em “esfera autônoma e em posição de superioridade” em relação aos dirigidos, ou às bases, ou às massas, os comunistas incorrem num tipo de alienação que não é “desvio” ou “debilidade”, porque é conseqüência e atributo do tipo mesmo de organização que preconizam. Mas esta alienação não impede os comunistas de agir com eficácia e decisão no sentido da revolução pela qual tanto se empenham.” (REIS Fº. 1990: 184) A memória daqueles que sofreram com a repressão, que procuravam transformar a coisa pública, se vê reduzida à cena privada das lembranças dos sobreviventes, testemunhas e seus familiares.
“Parentes de militantes mortos pelo exército durante a repressão à Guerrilha do Araguaia vão pedir [...}, a abertura dos arquivos das Força Armadas sobre o episódio [...] ela disse que os familiares reinvidicarão ainda a retificação dos atestados de óbito dos guerrilheiros e a localização de seus restos mortais: “Sabemos que todos os presos eram fotografados. Queremos as fotos e as informações.”22
Quando se trata do conhecimento, essencialmente subjetivo, produzido pela memória de passado doloroso, nunca se pode dizer que já se sabe de tudo, nem mesmo se pode resignar a ter um conhecimento parcial, que ao mesmo tempo é inimigo da memória. Portanto, à volta as questões do passado autoritário, não é uma mera ação de reconstrução de memória factual ou de repressão às vítimas, em uma simples presentificação do passado. Tais eventos deixam marcas não somente nas vítimas, mas em toda a sociedade, na medida em que postergam os traumas e abalam nossa confiança nas instituições: “Por causa da tortura tinham perdido a confiança em todas as autoridades, e o INCRA mesmo não parecia oferecer aos mais pequenos uma oportunidade de fato” (DÒRIA, et. al. 1978: 62). A herança autoritária da sociedade brasileira faz com que a democracia seja ameaçada pela
22 Tosta, Wilson. Famílias vão pedir abertura de Arquivos. Folha de São Paulo. Brasil. 1996: 8
24
eliminação da memória e também pela perda de seus valores. “Na maior parte das vezes, lembrar não é reviver, mas refazer, reconstruir, repensar, com imagens e idéias de hoje, as experiências do passado”. (BOSI. 1994: 55). Procuramos demonstrar que a opção de ressignificar os conflitos do passado com as experiências do presente, fornece publicidade àquilo que corrói a sociedade por dentro, abrindo a possibilidade de uma ação política inovadora e criativa, dentro de um agir democrático. Há uma consciência em reforçar os sentimentos de pertencimento enquadrando a memória:
“Todo trabalho de enquadramento de uma memória de grupo tem limites, pois ela não pode ser construída arbitrariamente. Este trabalho deve satisfazer certas exigências de justificação. Recusar levar a sério o imperativo de justificação sobre o qual repousa a possibilidade de coordenação das condutas humanas significa admitir o reino da injustiça e da violência.”23
Dessa forma, as memórias doloridas daqueles tempos acabam por ser reduzidas à dor, apenas emoções, sem expressão pública no novo espaço institucional de retomada democrática, construído justamente sobre o silêncio e a negação delas: “... insinua não apenas a seletividade de toda memória, mas também um processo de “negociação para conciliar memória coletiva e memórias individuais”. 24 O PC do B, a exemplo de toda organização política, forja a imagem que faz de si mesmo, reinvidica as memórias, como no caso da Guerrilha do Araguaia: “Narra-se ao mesmo tempo a ação tenebrosa das Forças aramadas em missão repressiva no Sul do Pará. Duas condutas, dois propósitos. Amor à liberdade e consciência dos direitos do povo, de uma parte; aversão à democracia e ódio as massas populares, de outra. Breve roteiro, retrata de longe o heroísmo e o significado da resistência armada aos desmandos da ditadura – acontecimento destinado a ocupar lugar de destaque entre os feitos gloriosos de que se orgulham os brasileiros”(MOURA. 1985: 17) Todos os princípios da esquerda, independentes de suas “falhas” históricas ou suas inadequações funcionais tornam-se intocáveis acima de qualquer julgamento crítico e mais valioso que a própria vida humana.
23 Pollak. Mitchael. Memória, Silêncio e Esquecimento. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, Vol2, n. 3, 1989, p. 3-15 24 Hallbwchs, apud Pollak. Memória, Silêncio e Esquecimento. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, Vol2, n. 3, 1989, p. 3-15
25
“Termina o primeiro semestre de 1975. A ilusão da resistência no Araguaia mantém-se inalterada. Ângelo Arroyo escreve outro texto25, mais elaborado, sobre o movimento armado. A guerrilha no sul do Pará sobrevive há mais de três anos. Nenhuma luta com esse caráter em nosso país sustentou-se durante tanto tempo, afirma.” (MORAIS; SILVA. 2005: 134) O PC do B buscou construir os elementos nacionais como mito de origem, documentos e ancestrais comuns, “heróis” da guerrilha na produção de uma narrativa histórica, onde as violências têm que ser lembradas. Mas, ao enquadrar a memória sobre a Guerrilha do Araguaia a esquerda brasileira, no caso específico o Partido, não pode representar o bem incondicional, da mesma forma que a direita, satanizada nas informações sobre a guerrilha, também possui seus membros condenados a priori, assim, construindo a história sobre o conflito. “Pode-se entender o conflito conceitual entre „esquerda‟ e „direita‟ como um reflexo do contínuo estado de conflito na busca pelo enquadramento da memória. “A defasagem nas informações permitiu o amadurecimento de uma versão fantasiosa sobre a resistência dos guerrilheiros.” (MORAIS; SILVA. 2005: 515), As Forças Armadas utilizando todos os instrumentos que o Estado proporcionava, atuam no sentido de eliminar, colocar no esquecimento, as informações e depoimentos que foram sendo extraídos de testemunhas sobre a atuação do aparelho repressor na região do Araguaia: “Os organismos de informação desencadearam uma operação de extermínio da história do Araguaia ao final das ações contra o PC do B no sudeste do Pará. No início de 1975, dois helicópteros da Aeronáutica, descaracterizados, fizeram vários vôos com equipes de militares envolvidos na morte dos guerrilheiros. Cabeludos e barbudos andavam à paisana e usavam bermuda e tênis.” (MORAIS; SILVA. 2005: 514).
Essa atuação das Forças Armadas aumentou a simpatia e a mitificação dos guerrilheiros. O silêncio não funcionou no sentido de enquadramento da memória sobre o Araguaia, pois os guerrilheiros tinham criado uma identificação que levaria pouco a pouco a população a “compreender” o motivo da luta, por que aqueles militantes estavam ali compartilhando do mesmo modo de vida, nas pessoas que se solidarizam com as vítimas.
25 Arroyo, Ângelo. Análise do Partido Sobre a Guerrilha do Araguaia.. apresentando sete tópicos de argumentos em favor da iniciativa do PC do B no campo, enaltecendo a integração com as massas.
26
Ocorre um sentimento de compaixão tão forte que chega a constranger a pessoa que faz o relato:
“Lauro, outro camponês, hoje com 22 anos, aos 16 trabalhou num pequeno armazém com alguns guerrilheiros. Conta que seu pai foi preso por ser amigo dos combatentes da mata. E relatou também porque hoje possui uma mão mecânica: quando começou a guerra ele e sua família foram expulsos de casa: andando por um local onde as tropas haviam estacionado, junto com um companheiro encontraram uma garrafa de cor verde, que explodiu quando a pegaram. Era uma granada. Seu companheiro morreu e Lauro perdeu a mão. Mas até hoje não foi indenizado, apesar de o Exército ter reconhecido que a granada era sua.”26 O mito do herói guerrilheiro ganhou força no decorrer do aumento da repressão e das tentativas de silenciar os testemunhos de forma violenta: “ o raciocínio, naturalmente maniqueísta, das populações, dizia que Deus estava do lado dos “paulistas”, também chamados de “homens da mata”. Os soldados até bateram nos padres e nas freiras...não foi?” (PORTELA. 1986: 58). O Exército chegou, até mesmo a, supostamente, transferir corpos de guerrilheiros enterrados para evitar peregrinações e mais mitificação pela população local:
“Quebrando um silêncio de 30 anos, o tenente-coronel Lício Ribeiro Maciel, 74, disse à Folha que, por ordem do general Antonio Bandeira, corpos de militantes comunistas da guerrilha do Araguaia, antes enterrados na mata, foram retirados das covas e levados para outros locais para evitar romarias da população.” 27
“Eu soube que o general Bandeira mandou desenterrar uns corpos, mas só para confirmar alguma coisa. Houve romarias. O pessoal ia para a cova do fulano para fazer reza. Ia se transformar em um local de peregrinação. Eu soube que o general mandou mudar o local de algumas covas. Devem ter sido transferidas para o cemitério da cidade. Se mudassem de local na mata, só mudava o local da reza”. 28 Mesmo com toda censura, a guerrilha do Araguaia ficou conhecida por uma parte significativa de setores políticos no país. Não era possível atravessar essa região do Araguaia sem passar por várias barreiras do Exército. “Nunca um governo havia prestado tanta atenção à região do Araguaia”. (MORAIS; SILVA. 2005: 229)
26 Tribuna Operária. Na Trilha dos Guerrilheiros. 1980: 8 27 Michael, Andréa. Regime Militar. Tenente- coronel diz que troca de covas visava evitar peregrinação. Exército transferiu os corpos de guerrilheiros do Araguaia. Folha de São Paulo. Brasil. 2004: A-4 28 Frases da entrevista do tenente-coronel Licio R. Maciel, que combateu na guerrilha do Araguaia. Folha de São Paulo. 2004: A-5
27
Havia barreiras do Exército a partir de uma área ainda distante da Guerrilha. Era muito difícil de se entrar na região periférica do conflito. A população toda acabou convivendo com isso, passando a tomar partido dos guerrilheiros “heróis”. E o fato de surgir uma resistência armada combatendo o governo dos militares demonstrava exatamente o grau de resistência crescente, num processo de radicalização contra eles. Para o entendimento desse processo lembro que havia um lado importante da questão: o testemunho dos camponeses e dos militantes que combateram na Guerrilha do Araguaia. Esses testemunhos tinham que ser silenciados: “Em nome do Estado, homens do setor de informações das três Forças Armadas encerraram uma fase de quase três anos de perseguições, prisões, torturas, mortes em combate e execuções de militantes comunistas e camponeses no sudoeste do Pará. Cumpriam ordens verbais dos superiores. Encerrada a missão fizeram um pacto de silêncio sobre a eliminação da guerrilha comunista do Araguaia”. (MORAIS; SILVA. 2005: 514) A correlação de forças de cada momento histórico é que define as formas de luta. Naquele momento, o país viveu uma realidade excepcional, de exceção política, ou seja, estava sujeito a uma ditadura que praticamente não permitia nenhuma força política legal no país. “As notícias eram esparsas, imprecisas e não havia menção a corpos. Os camponeses e moradores das cidades e dos vilarejos próximos à área de guerrilha tinham medo dos militares e dos informantes remanescentes. O governo federal negava a existência do movimento armado”. (MORAIS ; SILVA. 2005: 537) Mas a memória do Araguaia foi revelada, não silenciada, representando a certeza de que não podemos nunca duvidar de nossa capacidade, de um homem ou mesmo de um grupo de pessoas e de suas memórias. As tentativas de mudanças, ainda que isoladas, constituem uma esperança para a construção de uma sociedade democrática. A Guerrilha do Araguaia é um tema que persiste. A censura que lhe foi imposta durante tanto tempo, o confinamento, a “destruição” dos arquivos oficiais represaram as análises, o interesse e as polêmicas que ela suscita. Mas o tema permanece de certa forma inconcluso.
“A derrota da guerrilha parece ter posto em xeque, contrariamente, o vencedor, aprofundando, revelando mais abertamente os limites, os compromissos e os impasses do regime. È provável que a forma assumida pela vitória militar no espaço da guerra seja também, ao mesmo
28
tempo, uma derrota política no espaço do país”. (DÒRIA, et. al. 1978: 12). Em Julho de 2003, o Tribunal Regional Federal da 1.a Região, decidiu quebrar o sigilo dos documentos do Araguaia.
“A Juíza determinou a “quebra do sigilo das informações militares relativas a todas as operações realizadas no combate” e deu prazo de 120 dias para que sejam revelados os locais de sepultamento dos guerrilheiros mortos, além de dados relativos “a totalidade das operações” das Forças Armadas realizadas no Bico do Papagaio”. 29 Cada mãe, cada pai que morre sem ver concretizado o legítimo e humano sonho de enterrar os restos mortais de seus filhos, resulta numa dor, num trauma que se prolonga. O Estado brasileiro, as Forças Armadas que dele fazem parte, o governo federal que é a instituição dirigente do país, têm esta “dívida” para com a memória democrática da Nação. Atender essa exigência poderia contribuir para unir ainda mais o povo brasileiro com suas instituições. Sabemos que numa época histórica tão agressiva e instável como vivemos, é imperativo que haja coesão nacional em torno da democracia, do desenvolvimento e da soberania do nosso país.
“O presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, Luiz Eduardo Greenhalgh (PT-SP), anunciou ontem que vai apelar na justiça contra a decisão do governo de se opor à abertura dos arquivos do Exército sobre a guerrilha do Araguaia. Greenhalgh disse que o recurso à sentença judicial que mandou abrir os arquivos não se justifica e apresenta contradições evidentes, além de ser “insosso, inodoro e incolor”. 30 Mas o governo, ou as instituições diretamente ligadas a ele, não pode suprimir e interferir no avanço dos estudos históricos, do levantamento de testemunhos com a preocupação de que podem se constituir em um perigo para a construção de uma nação ao mostrar os erros e esquecimentos da memória oficial, criando uma história fria, sem um compromisso forte com a sociedade.
“O ministro do Exército, general Carlos Tinoco, disse há duas semanas ao deputado Nilmário Miranda (PT-MG), da comissão da Câmara que investiga os desaparecidos durante o regime militar que não poderia
29 Michael, Andréa. Governo recorre de sentença sobre guerrilha do Araguaia. Folha de São Paulo. 2003: A-11 30 Èboli, Evandro. Araguaia: Greenhalgh vai à Justiça contra o Governo. O Globo. O País. 2003: 13
29
ajudar na localização dos guerrilheiros porque o Araguaia havia sido uma guerra irregular, sem documentos e relatórios oficiais”. 31 Dentro das problemáticas em discussão, o esquecimento de que tratamos é em relação à violação dos direitos humanos durante a Guerrilha do Araguaia. “E escudados na impossibilidade de fiscalização pelos próprios colegas do exército regular, e da imprensa, na época censurada, os “especialistas” agiram, usando a bandeira da Segurança nacional, como se o conceito de segurança nacional não envolvesse, obrigatoriamente, estudos complexos, profundos, de Geopolítica, Economia, Estratégia, ente outros, e pudesse ser confundido com as operações nada intelectuais de aplicar choques elétricos e espancar pessoas”. (PORTELA. 1986: 47). Assim, nos leva a pensar na constituição de uma memória das famílias dos militantes da Araguaia e não do Estado Nacional. Como vimos essa “memória nacional” está relacionada a uma série de elementos que constituem uma Nação. Já a memória das famílias é a soma das características do testemunho tanto dos atores e autores dos feitos humanos, quanto de seus herdeiros no presente, independente de limites geográficos: “Todavia, a memória não é oprimida apenas porque lhe foram roubados suportes materiais [...] mas também porque uma outra ação, mais daninha e sinistra, sufoca a lembrança: a história oficial celebrativa cujo triunfalismo é a vitória do vencedor a pisotear a tradição dos vencidos.” (BOSI. 1994: 19). Por isso, tanto as discussões de meados dos anos setenta, protagonizadas pelos relatos de jornalistas e/ou militantes, quanto às divergências do início dos anos oitenta, quando muitos militantes saíram ou foram expulsos do PC do B, não podem estabelecer um “história oficial” sem discussões, sem ampliação, sem considerar os lados envolvidos no conflito. Nesse sentido é que destacamos a Guerrilha do Araguaia como o exemplo que demonstra mais claramente as características que teriam norteado um momento na trajetória de luta e de certa coerência com os princípios “revolucionários” da esquerda brasileira, em especial da história do PC do B, da luta pela dominação da informação e memória do período do regime militar, bem como a utilização no palco das ações dos camponeses e desprovidos da região do Araguaia.
31 Jornal do Brasil.. Relatório Mostra como Exército venceu a guerrilha. 1º Caderno. 1992: 19
30
Também é provável, como se difundiu em certos setores democráticos a idéia de que na preparação da Guerrilha do Araguaia não houve trabalho político junto com o povo e por isso quando foi deflagrada a luta, em 1972, as massas apoiaram "apenas sentimentalmente" os guerrilheiros. Hoje, o percurso do Araguaia oferece um cenário marcado pela devastação, atestando que os acontecimentos serviram ao contexto da liquidação de um projeto nacional de desenvolvimento. “A presença de guerrilheiros na Amazônia fez a ditadura olhar para a região abandonada. O governo militar construiu estradas e realizou Ações Cívico Sociais esporádicas e ineficientes. O povo continuou abandonado” (MORAIS; SILVA. 2005: 14) A paisagem atual demonstra que ali aconteceu um confronto entre duas concepções de desenvolvimento num pedaço estratégico da Amazônia, em seu simbólico portal de acesso, na região conhecida como Bico do Papagaio, confluência do Pará, Goiás e Maranhão, delimitada por Marabá, Araguaína, Xambioá - hoje extremo norte de Tocantins - e Imperatriz. Estão ali os sinais de que, efetivamente, a guerrilha não foi combatida tão somente pela oposição que representava ao regime militar, mas pelas riquezas da região, em especial os seus minérios - o chão de uma rica área cobiçada pelo capital investidor. “Madereiras e mineradoras exportam riquezas naturais sem proporcionar benefícios à população. Grande parte atua na ilegalidade, sem proporcionar a legislação ambiental. Narcotraficantes usam a selva como rota de passagem de drogas para os mercados brasileiro, europeu e norte-americano. Grilheiros ocupam terras protegidos por pistoleiros”.(MORAIS; SILVA. 2005: 14). Foi o momento crítico de uma sucessão secular de acontecimentos registrados pela historiografia, sempre voltados para o controle da Amazônia e protagonizados por diversas nações (Inglaterra, França, Holanda), mas, sobretudo pelos EUA. “O governo militar fez todo esforço para apagar a Guerrilha do Araguaia da História. O Brasil, sob uma ditadura militar, vivia o período do “Milagre econômico”, mas mantinha-se dependente de capital externo. Qualquer informação sobre um movimento armado na Amazônia tornaria a economia nacional ainda mais frágil. Em clima de Guerra Fria, duas superpotências disputavam a hegemonia sobre o planeta”. (MORAIS; SILVA. 2005: 13)
No entanto, o fomento dos novos rumos atribuídos a cada momento histórico, foi quase e com relativa naturalidade, atribuído às “vanguardas”, tidas como a frente da grande
31
massa e sempre a conduzi-la em determinadas direções, sejam elas políticas ou culturais. Para tanto é que privilegiamos os embates em torno da apropriação da memória coletiva e conseqüentemente seu drama. A memória individual permanece quase sempre no anonimato, e quando aparece, é para reafirmar-nos a não reificação absoluta de cada homem imerso naquela massa. “A história da guerrilha impressiona pelos números e pelos dramas vividos por esquerdistas, militares, moradores e parentes dos envolvidos”. (MORAIS; SILVA. 2005: 15). Essas características atribuídas ao “mito” dos guerrilheiros fazem com que a experiência do Araguaia apareça como uma luta “heróica” para o PC do B, uma “guerra suja” para os militares e uma “guerra sem fim” para os familiares dos guerrilheiros, sendo fundamental expor essa história contemporânea brasileira no sentido de firmar as bases de uma nação democrática, onde as lutas, os “heróis” de ambos os lados possam construir uma história sem receios ou revanchismos, sem esquecimentos e silêncios impostos à memória da Nação. A Guerrilha ainda está para ser devidamente estudada. O conhecimento que temos dela é ainda muito precário, suas lições são pouco conhecidas. Temos que lutar contra o “enquadramento” da memória do Araguaia.
“O trabalho do enquadramento da memória se alimenta do material fornecido pela história. Esse material pode sem dúvida ser interpretado e combinado a um sem-número de referências [...] esse trabalho reinterpreta incessantemente o passado em função dos combates do presente e do futuro”. 32 Não parece haver dúvidas que na guerrilha houve grandes debilidades, deficiências, erros políticos e militares, erros de avaliação dos guerrilheiros, mas, há, agora, uma luta empreendida, principalmente, pelos familiares dos guerrilheiros do Araguaia em expor essa memória “esquecida”, “silenciada”. Demonstra a luta que se deve empreender, como na viagem ao Araguaia, quando os familiares dos guerrilheiros entraram no povoado de Boa Vista, antigo Caianos, fundado pelo comandante guerrilheiro Paulo Rodrigues, os camponeses gritavam a plenos pulmões: "Esta é a terra da liberdade, nós estamos colhendo a semente que eles plantaram":
32POLACK, Michael. Memória, Silêncio e Esquecimento. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, Vol2, n. 3, 1989, p. 3-15.
32
“A mata continua lá. Não tão virgem quanto a seis, sete, oito anos atrás, mas igual na sua beleza, mistérios e essência de vida e seus habitantes, isolados pela miséria, pelo latifúndio e pela “competente” ação do Exército, ainda têm na memória a história da guerrilha do Araguaia, “a guerra do povo da mata”, como eles costumam falar”. 33 O Araguaia não foi uma ação aventureira, tão pouco motivada por fanatismos. A memória do Araguaia se adentra na cultura brasileira, está presente em poesias, músicas, vídeos e até em museus populares da região onde houve os combates. Na região do Araguaia, são numerosos os relatos, os livros manuscritos de pessoas do povo que retratam tudo que lá ocorreu determinado pela memória coletiva. As pequenas cidades guardam na lembrança de seu povo as marcas da guerrilha do Araguaia, o que precisamos ter em mente é que remexer nesse passado não é tarefa fácil: a área de mata onde se passaram os principais momentos da luta guerrilheira já não existe mais, além da rigorosa censura imposta ao povo do lugar. Apesar de trazer vivos na memória os fatos da época, muitos moradores ainda têm medo de falar sobre o que aconteceu. “Essas memórias subterrâneas que prosseguem seu trabalho de subversão no silêncio e de maneira quase imperceptível afloram em momentos de crise em sobressaltos bruscos e exarcebados”. (G. Hertberich-Marx, F. Raphael. Apud. POLACK. 1989: p. 3-15). Devemos nos aprofundar nas pesquisas sobre a guerrilha do Araguaia, tentando “desvendar” alguns mistérios da guerrilha: “Quanto menos uma história de vida for pré-construída, mais isso funcionará”. (POLACK. 1992: 200-212). Para os familiares dos guerrilheiros o principal mistério da guerrilha, no entanto, se refere ao destino dos corpos dos combatentes. Para o Exército, formalmente, não houve prisioneiros nestas operações. Apesar disso, camponeses e ex-soldados afirmam ter visto guerrilheiros apanhados vivos.
“Depoimento prestado anteontem pelo ex-soldado do Exército Raimundo Pereira serve para confirmar a versão dos familiares de guerrilheiros do Araguaia segundo a qual alguns integrantes do movimento foram assassinados mesmo estando rendidos, por membros das Forças Armadas, e não foram mortos em combate, como sustenta o Exército”.34
Nem estes, nem os que morreram em combate, têm suas mortes reconhecidas. Familiares em busca de notícias organizam viagens ao sul do Pará, mas quase nada se
33 FREITAS, Conceição. Tribuna Operária. Na Trilha dos guerrilheiros. São Paulo. 1980. P. 9. 34 RONDON, José Eduardo. Ex-Militar confirma que guerrilheiros foram executados. Folha de São Paulo. SP. Brasil. 2004. A-6.
33
conseguiu. Por isso continuar as tentativas de resgatar a memória, quebrar o “silêncio” imposto sobre a luta na região do Araguaia se apresenta pertinente e desafiador.
Referências bibliográficas:
BOSI, Ecléa. Memória e Sociedade: lembranças de velhos. São Paulo: Companhia das Letras. 1994. P.19 CHIAVENATO, Júlio Jose´. O golpe de 64 e a ditadura militar. São Paulo: Moderna, 1994. P.118 DÓRIA, Palmério; BUARQUE, Sérgio; CARELLI, Vincent; Sautchuk. A Guerrilha do Araguaia: história Imediata. São Paulo: Alfa-Omega. 1978. GASPARI, Elio. A ditadura escancarada. São Paulo: Companhia das Letras, 2002. P.400-414 GINZBURG, Carlo. O Queijo e os Vermes: o Cotidiano e as idéias de um moleiro perseguido pela Inquisição. São Paulo: Companhia das letras, 1987. P.15. HOBSBAWM, Eric. Era dos Extremos: o breve século XX: 1914-1991. São Paulo: Companhia das Letras. 1995. P.13 KUCINSKI, Bernardo. Jornalistas e revolucionários: nos tempos da imprensa alternativa. São Paulo: Editora Página Aberta. 1991. P.IX-XIV, p. 95 MORAIS, Taís; SILVA, Eumano. Operação Araguaia: os arquivos secretos da guerrilha. São Paulo: Geração Editorial. 2005. P. 13-15, 24-28, 44, 134, 172-173, 229, 514-537 MOURA, Clóvis. Diário da Guerrilha do Araguaia. 3ª ed. São Paulo: Editora Alfa-Omega, 1985. P. XI-XV, p.17, 34,52 PARTIDO COMUNISTA do BRASIL. A Resistência Armada do Araguaia. Coleção Política Revolucionária. Edições Bandeira Vermelha. s/d. p. 33 p.113. Portela, Fernando. Guerra de Guerrilhas no Brasil: documentos inéditos e na íntegra. 7ª. ed. São Paulo: Global, 1986. P.21-23- p.47. p 58 REIS FILHO, Daniel Aarão. A revolução faltou ao Encontro: os comunistas no Brasil. 2ª ed. São Paulo: Editora brasiliense, 1990. P.38, 66, 97, 104, 184.
Periódicos:
FREITAS, Conceição. Na trilha dos Guerrilheiros. Tribuna Operária. SP. 17 novembro 1980. 8 COSTA, Raimundo. Guerrilha do Araguaia. Mortos sem sepultura. Isto È. 04 setembro 1985. nº. 454. P.30-34 Relatório mostra como Exército venceu a guerrilha. Jornal do Brasil. RJ. 22 março 1992 Brasil. 1º caderno. Continuação da 1ª página. 19 MITCHEL, José. Exército registrou mortes de guerrilheiros. Jornal do Brasil. RJ. 07 junho 1992. Brasil. 1º caderno. 18 PAIVA, Marcelo Rubens. Abram os Arquivos e deixem-nos em paz! Folha de São Paulo. 23 de novembro 1992. Especial. 6.
34
TOSTA, Wilson. Famílias vão pedir abertura de arquivos: Desaparecidos: parentes de guerrilheiros mortos pelo exército no Araguaia querem acesso aos bancos de dados oficiais. Folha de São Paulo. SP. 02 de maio 1996. Brasil. 8 CIPOLA, Ari. Corpos forma abandonados, diz Curió. Araguaia: “Não há nenhuma convenção internacional que me obrigue a enterrar inimigos”. Folha de São Paulo. SP. 16 maio 1996. Brasil. 10 GONÇALVES, Marcos Augusto. Esquerda, volver. Folha de São Paulo. SP. 11 maio 1997. Brasil. Domingueira. 14 SCHELB, Ghilherme Zanina. Ministério Público e Araguaia. Folha de São Paulo. SP. 02 Novembro 2001. Opinião. A-3 MICHAEL, Andréa. Governo recorre de sentença sobre guerrilha do Araguaia. Regime Militar: Recurso, porém reconhece direito de familiares de localizar ossadas. Folha de São Paulo. SP. 28 agosto. 2003. Brasil. A-11 ÉBOLI, Evandro. Araguaia: Greenhalgh vai à Justiça contra o governo: para o deputado petista, decisão do Planalto de se opor à abertura dos arquivos do Exército não se justifica. O Globo. RJ. 29 agosto. 2003. O País. 13 LOYOLA, Leandro. Os segredos do Araguaia: fantasmas do Araguaia. Época. SP. 1 março 2004. nº. 302. P. 28-35 MICHAEL, Andréa. Exército transferiu os corpos de guerrilheiros do Araguaia. Regime Militar: tenente-coronel diz que troca de covas visava evitar peregrinação. Folha de São Paulo. SP. 07 março 2004. Brasil. A-4 RONDON, José Eduardo. Ex-militar confirma que guerrilheiros foram executados. Folha de São Paulo. SP. 07 março 2004. Brasil. A-6 STUDART, Hugo. Os Documentos do Araguaia. Exclusivo-Araguaia: os documentos que os militares escondem. Isto È. SP. 03 novembro 2004 nº. 1830. P. 28 -36
Internet:
POLLACK Michael. Memória e Identidade Social. Estudos Históricos, Rio de janeiro, vol. 5, n.10, 1992, 200-212.
Disponível em: http://www.cpdoc.fgv.org.br Acesso em: 24/02/2006 POLLACK, Michael. Memória, Esquecimento, Silêncio. Estudos Históricos, Rio de janeiro, vol. 2, n.3, 1989, p. 3-15.
Disponível em: http://www.cpdoc.fgv.org.br Acesso em: 24/02/2006
SCHIMIDT, Benito Bisso. Construindo Biografias... Historiadores e Jornalistas: aproximações e afastamentos. Estudos Históricos, Rio de Janeiro, n. 19, 1997.
Fonte: http://www.webartigos.com/articles/55771/1/Guerrilha-do-Araguaiamemorias-de-uma-luta-contra-o-silencio-e-o-esquecimento/pagina1.html#ixzz1A7BkEMH1