Georgy Lukács, Arnold Hauser, Eric Auerbach, e o ainda vivo George Steiner, são nomes de fácil circulação entre intelectuais e pessoas ilustradas do Brasil. Todavia o do argentino Juan José Sebreli, que navega nas mesmas profundezas da historia da cultura, é por nós brasileiros quase desconhecido. Uma estranha ausência
Um escritor como Sebreli especializado em se posicionar ao contrário, na oposição à moda, a fustigar, a perturbar, ser incômodo e desagradar, se parece mais do que ninguém ao moderno intelectual crítico, independente e livre. ’Juan José Sebreli (B.Aires, 1930)
Boas Matamoros –
Possivelmente a ausência dele no panorama cultural brasileiro se deva ao fato dele não ter sido suficientemente divulgado no meio europeu, portão de entrada para que alguém das letras seja bem recebido no Brasil ( Jorge Luís Borges, conterrâneo dele, antes de chegar e se consagrar no eixo Rio-São Paulo, teve que fazer sucesso em Paris). Mas ainda assim não deixa de ser um estranho espanto que alguém do porte universal de Sebreli, vivendo praticamente ao nosso lado, nunca tivesse um só livro editado no Brasil.
Nascido em Buenos Aires em 1930, leitor voraz e autodidata, ele tornou-se um dos maiores fenômenos do ensaio sociológico das letras hispânicas dos últimos anos. Filiado a tradição ocidental que vem da Geistesgeschichte, a ‘história do espírito’ de Hegel, de Schlegel e de Burckhardt, é um digníssimo sucessor de Ortega y Gasset e de Octávio Paz, impressionantes homens de letras hispânicos, quando se trata da arte de relacionar a história com a cultura e as idéias em geral.
Os dois grandes braços da obra sebrelista
O segundo concentrou o interesse dele nos temas universais e que, portanto, podem estar mais próximos ao gosto dos brasileiros cultos em geral. Neste aspecto, destaca-se como sua obra maior e impactante: a erudita trilogia formada por El asedio a la modernidad (1991), , Las aventuras dela vanguardia (2000), El olvido de la razón. Un recorrido crítico por la filosofía contemporánea (2006). Trrabalho, diga-se, largamente inspirada no famoso ensaio de G.Lukcás ‘O assalto à Razão”( de 1954)
A tese central e paradoxal dele é que a Modernidade tem sido sistematicamente atacada no campo das idéias, da estética e da filosofia por teóricos, artistas e pensadores das mais diversas correntes e filhações que se apresentam como os maiores expoentes do Modernismo. São como que aprendizes de feiticeiros revoltados contra o seu criador, detratando-o de todos os jeitos.
Colocando-se como escudeiro dos tempos contemporâneos, Sebreli a todo o momento expõe as aberrantes contradições deles, irritando-se particularmente com o charlatanismo de certos artistas e com o desfaçatez de muitos intelectuais em posarem como ‘rebeldes’ a fim de cultivar falsas legendas de ‘contestação’ quando pretendem nada além do que alcançar a boa vida burguesa.
Sebreli se disse muito influenciado pela sociologia de Gilberto Freyre, de perfil ‘proustiano’, capaz de trazer para o redil da boa análise interpretativa, aspectos que a ‘sociologia clássica’ desconsiderava ou não dava importância. Por igual, sempre manteve admiração por José Guilherme Merquior, outro brasileiro a quem seguia à distância e a quem devotou apreço. Depois de ao longo de sua longa vida ter passado por todos os ‘ismos’ possíveis ( existencialismo, maoísmo, marxismo, etc.), saciada a sua sede por ‘utopias milenaristas’, afastou-se dos compromissos ideológicos e tratou de vergastar as falácias do nosso tempo. Em suas memórias El tiempo de uma vida(B.Aires, 2005), confessou que nunca se sentiu tão só como durante a Guerra das Malvinas, em 1983, quando ficou atônito com a reação popular à aventura dos generais argentinos, manifestando especial repugnância ao comportamento da esquerda argentina naquela ocasião que alardeava por tudo um jargão militarista e chauvinista não condizente com os princípios humanitários e cosmopolitas que até então dizia defender.
Destruindo os mitos
(*) Os principais títulos de Sebreli são:
1960:Martínez Estrada, una rebelión inútil ;
1964: Buenos Aires, vida cotidiana y ; alienación;
1970: Mar de Plata, el ocio represivo;
1983: Los deseos maginarios del peronismo;
1985: La saga de los Anchorena ;
1987: Las señales de la memoria ;
1991: El asedio a la modernidad ;
1994: El vacilar de las cosas
1997: Escritos sobre escritos, ciudades bajo ciudades;
1998: La era del fútbol
2000: Las aventuras de la vanguardia ;
2002: Crítica de las ideas políticas argentinas ;
2005: El tiempo de una vida autobiografía ;
2006: El olvido de la razón. Un recorrido crítico por la filosofía contemporánea ;
2008: Comediantes y mártires. Ensayo contra los mitos.