As pessoas se aglomeravam em frente à entrada da escola. Gritavam a plenos pulmões expressando o ódio e a repulsa que sentiam em relação aos indivíduos que se encaminhavam à porta de entrada daquela unidade escolar. Carregavam um sentimento alimentado ao longo de toda uma história, marcada pelo segregacionismo, pela discriminação racial e pautada na idéia de superioridade de parte dessa sociedade em relação a certos contingentes populacionais. Faixas e cartazes traziam dizeres ofensivos e a agressividade imperava no ar. Se a polícia não estivesse presente é pouco provável que as pessoas hostilizadas conseguissem sair daquela situação sem que fossem agredidas. “A separação promove harmonia racial. Permite que cada raça siga seu destino, desenvolva sua própria cultura, suas próprias instituições, e sua própria civilização. Segregação não é discriminação. Segregação não é um símbolo de inferioridade racial. A segregação é desejada e apoiada pela vasta maioria dos membros das duas raças no Sul, que vivem lado a lado em condições harmoniosas. É a lei da natureza, é a lei de Deus, que cada raça tem tanto o direito quanto o dever de se perpetuar. Homens livres têm o direito de mandar seus filhos para escolas de sua preferência, livres da interferência do governo.” Esse é um pequeno recorte da questão racial nos Estados Unidos dos anos 1950, quando por determinação da Suprema Corte, os negros passaram a ter o direito de freqüentar as mesmas escolas dos brancos. Poucos foram aqueles que ousaram enfrentar as barricadas e as manifestações contrárias a seu ingresso nas escolas do sul do país naquele momento inicial de confronto, entretanto a história registrou a luta desses verdadeiros mártires e seus passos garantiram a vitória na batalha pela conquista dos Direitos Civis nos Estados Unidos. As pressões da Associação Nacional pelo Avanço das Pessoas de Cor (National Association for the Advancement of Coloured People) visavam justamente obter o necessário apoio legal do governo federal norte-americano para, dessa forma, submeter os estados sulistas a superar a idéia vigente até aquele momento pela qual se dizia que os negros eram tratados de forma igual, só que separados dos brancos (“separate and equal”). Estados americanos como o Texas, Oklahoma, Arkansas, Mississipi, Alabama, Geórgia, Flórida, Missouri, Louisiana, Carolina do Norte e Carolina do Sul se utilizavam desse expediente que lhes assegurava a separação de escolas entre brancos e negros (que se aplicava também ao transporte público, a bebedouros e banheiros públicos, a logradouros municipais e estaduais,...). Teoricamente bastava a esses estados garantir que a qualidade desses serviços fosse equivalente para ambas às clientelas que o problema estaria superado, ao menos era o que definia a Suprema Corte norte-americana até 1954. Não era aquilo que se observava na prática já que havia uma clara superioridade no atendimento e na qualidade dos materiais e recursos destinados a população branca. 1954 foi o ano da virada. O exame das condições providas pelos estados sulistas quanto às escolas de brancos e negros levou a Suprema Corte a alterar seus posicionamentos, declarando a situação inconstitucional e determinando que, em virtude da desigualdade de recursos, as escolas deveriam admitir a freqüência de negros e brancos, sem qualquer tipo de separação. Alguns estados admitiram e promoveram o estabelecimento das diretivas da Suprema Corte. Não porque concordassem com as novas diretrizes, mas motivados pela economia de recursos que a medida lhes proporcionava já que seus contingentes populacionais negros eram pequenos e a manutenção de escolas à parte, destinadas exclusivamente a esse nicho populacional, lhes era custosa. Entretanto alguns dos estados sulistas resistiram e iniciaram campanhas contrárias a aplicação das normas definidas pela Suprema Corte, entre os quais o estado de Arkansas. A resistência à idéia de integração era tão grande que o governador do estado de Arkansas, Orval Faubus, colocou a guarda nacional estabelecida em seu território na porta da Central High School de Little Rock para impedir o acesso de estudantes negros a esse estabelecimento. Além disso, Faubus utilizou-se da imprensa oficial do estado (Arkansas State Press) para divulgar suas idéias e estabelecer uma campanha contra a integração racial nas escolas. “Eu tinha 15 anos em setembro de 1957. Naquele tempo eu pensava que a guarda nacional estava lá para proteger todos os estudantes. Eu pensei que eles estivessem lá para fazer com que a lei fosse cumprida. Eu não imaginava que eles estavam lá para me manter fora da escola. Meus professores pensavam que seríamos ofendidos, mas eu acreditava que eventualmente acabaríamos sendo aceitos”. Em reação a essa postura que contrariava os direitos civis no país, as associações que lutavam pelo estabelecimento da igualdade de direitos, apoiadas pelo prefeito da cidade de Little Rock, Woodrow Mann, apelaram ao presidente da república, o ex-general Dwight Eisenhower, para que tropas federais fossem mandadas para as áreas de conflito no estado de Arkansas. Eisenhower veio a público e, pressionado publicamente por americanos e estrangeiros, declarou seu apoio à luta pelos direitos civis, alertando para o fato de que a situação nos estados do sul do país estava abastecendo os comunistas de informações que serviam para deteriorar a imagem do país na intensa luta pela conquista de aliados travada desde o final da 2ª Guerra Mundial. Referia-se a Guerra Fria. O racismo contradizia as pregações democráticas do capitalismo norte-americano e poderia fomentar o crescimento da influência soviética no mundo. “Num tempo em que nos defrontamos com situações graves no exterior por causa do ódio do comunismo em relação a um sistema de governo baseado nos direitos humanos, seria difícil exagerar o prejuízo que está sendo causado ao prestígio e influência e até mesmo a segurança de nossa nação no mundo. Nossos inimigos estão se aproveitando desse incidente (em Little Rock) e o usando em todos os lugares para abalar o prestígio de toda a nação”. Os habitantes de Little Rock acusaram o governo federal de terem enviado um verdadeiro exército de ocupação para efetivar a integração e continuaram resistindo com agressividade a entrada de negros em suas escolas “brancas”. Oito estudantes mantiveram sua decisão de continuar a luta pela integração em Little Rock. Sofreram agressões físicas, foram vítimas de xingamentos e humilhações, seus pais foram demitidos por insistirem em mandar os filhos a escolas de brancos. A Ku Klux Klan fincou suas cruzes ardendo em chamas no quintal dessas famílias e também do prefeito Woodrow Mann. As tropas federais somente puderam sair de Little Rock em Novembro de 1957. Os primeiros estudantes negros a se formarem na escola receberam seus diplomas em maio de 1958. A luta se prolongou por mais um longo período e teve baixas consideráveis (como a morte do reverendo Martin Luther King Jr., principal líder negro no movimento pelos Direitos Civis), no final a integração racial aconteceu e a tolerância continua sendo objeto de movimentos e discussões até os dias de hoje, tanto nos Estados Unidos quanto em outras partes do planeta... Fonte:Planeta Educaçao Disponível em:http://www.planetaeducacao.com.br/novo/artigo.asp?artigo=251
Quando as portas das escolas foram fechadas aos negros americanos
Tropas federais escoltam estudantes negros permitindo-lhes a entrada na
Little Rock Central High School, em setembro de 1957.
(James Eastland, representante do estado do Mississipi, em discurso no Senado americano em 27 de maio de 1954).
Depois de ouvirem o governador Faubus e outros oradores a favor da segregação racial,
manifestantes racistas encheram a High Street (atualmente Avenida Martin Luther King Jr.),
caminhando em direção a Central High School (de Little Rock), em agosto de 1957)
Negros americanos em protesto contra o não atendimento em uma lanchonete
no sul dos Estados Unidos ficaram durante horas sentados em cadeiras desse estabelecimento.
Várias pessoas brancas desistiram de se alimentar na lanchonete em virtude da presença dos manifestantes.
(Depoimento dado por Elizabeth Eckfort ao repórter Peter Lennon, do jornal The Guardian, em 30 de dezembro de 1998)
(Discurso do presidente Eisenhower, transmitido pela televisão, em 24 de setembro de 1957, de Little Rock).
Martin Luther King Jr. Foi o maior expoente da luta pelos direitos civis nos Estados Unidos.