Em janeiro de 1979, deu-se um terremoto político no Oriente Médio. O regime do Xarado, amparado pela Grã-Bretanha desde que Winston Churchill chegara ao Cairo em 1921 para redesenhar o mapa da região em favor do império, ruiu por completo. O xá Mohamed Reza Pahlevi, que reinava desde 1953 com mão de ferro, de um dia para o outro se tornou um pária, com bem poucos colegas estadistas dispostos a lhe dar abrigo naqueles dias de exílio e desgraça. Os pilares do Xarado
Por 25 anos o poder dele sustentara-se em alguns pilares básicos: a) o exército iraniano, treinado e comandado até 1941 pelo pai dele, Reza Khan, um ex-oficial dos cossacos persas; b) a Savak, a implacável policia política adestrada desde 1953 pelo general Herbert N. Schwarzkopf na luta contra a oposição; c) o inabalável apoio que os Estados Unidos lhe prestava desde que a Operação Ajax orquestrada pela CIA e pelo MI-5 britânico derrubara o ministro nacionalista Mossadegh, em 19 de agosto de 1953, para colocá-lo de volta no poder e, em troca disto, beber-lhe o petróleo a preços módicos enquanto lhe repassava armas no valor de bilhões de dólares e apoio na construção de usinas nucleares; d) a boa cobertura, para não dizer escandalosa, que a mídia ocidental lhe prestava então - particularmente a dos cronistas sociais pagos pelo xá - idolatrando as esposas que ele escolhia (especialmente a bela princesa Soraya Esfandiari, a ‘de olhos tristes’, que não pode lhe dar filhos e tinha o carinho das mulheres ocidentais que se condoíam com aquela situação).Pasdaran, os Guardiães da revolução
Numa região que entrara em ebulição anti-colonialista, o regime do xá Reza Pahlevi, sentado sobre 1/5 das reservas de petróleo e gás do Oriente Médio, aparecia ao mundo como uma inabalável fortaleza dos interesses ocidentais. Posava como o grão-policial do Golfo Pérsico, corredor de água por onde passa 40 % do petróleo do mundo. Era um anacronismo.
Perseguindo sem descanso qualquer opositor civil ou militar, a Savak mesmo acelerou a sua desgraça. Eliminando fisicamente quem ousasse questionar a Revolução Branca (algo equivalente ao que Kemal Altatürk fizera na Turquia em 1920), desencadeada autoritariamente pelo xá na década de 1960, fez por jogar os clérigos xiitas contra o regime.
O aiatolá como messias salvador
O aiatolá Khomeini |
Todavia não deixou de ser surpreendente que a tirania de Pahlevi tenha vindo abaixo em apenas três meses. Desde outubro de 1978 manifestações que partiram da cidade sagrada de Qom inspiradas no aiatolá exilado espalharam-se pelo país atingindo os campos petrolíferos de Abadan. O clímax ocorreu em Teerã. Em dezembro de 1978: dois milhões marcharam pela capital contra o xá. A ocidentalização imposta por ele à nação foi entendida como um ato de um déspota. O exército negou-se a reprimir e o trono sangrento sediado no Palácio Niavaran afundou (o xá morreu no Egito dezoito meses depois).
O vácuo de poder foi imenso. Ainda que o aiatolá Khomeini, que retornara do exílio para ser erguido pelos braços de milhões de iranianos (que o receberam como se fora o Mahdi, o 12º Imã), exercesse uma autoridade moral imensa sobre a recém instituída República Islâmica, não consegui evitar a dilaceração das forças que se uniram para combater a tirania: a esquerda, os liberais e os fundamentalistas.
A volta ao medievo
Militantes islâmicas (Teerã, 2009) |
A então União Soviética foi mais longe. Temendo um surto religioso nas suas fronteiras da Ásia Central tratou de ocupar o Afeganistão. A partir de dezembro de 1979 enviou seus tanques em apoio aos comunistas locais que temiam as conseqüências da revolta islâmica dos mujahidins. O tirano do Iraque Saddam Hussein, por igual, radicalizou, atacando o regime dos aiatolás de surpresa em 1980, causando a perda de 750 mil vidas de iranianos (o que ajudou a consolidar o frente interno iraniano, fazendo cessar as lutas fratricidas).
Transcorridos os 30 anos da Revolução Islâmica, o Irã continua isolado e ameaçado. Tropas norte-americanas e de seus aliados ocupam o Iraque e o Afeganistão, enquanto o governo colaboracionista do Paquistão empresta suas armas para combater a resistência muçulmana que assola os americanos dos altos do Hindu Kush. A US Navy, por seu lado, mantém seus lança-misseis atômicos no Golfo Pérsico. Até o presidente Sarkozy, da França decidiu pressionar Teerã, criando uma base aeronaval em Abu Dhabi nos Emirados Árabes. A recente reeleição de Mahmoud Ahmadinejad é o resultado disso tudo.