Rasputin, "o Amigo"
A guerra foi o fim da dinastia |
Com a entrada da Rússia na guerra de 1914, sua influência aumentou ainda mais. Especialmente porque ele havia manifestado sua contrariedade em fazer a guerra contra as potências centrais (a coligação do Império Austro-húngaro com o Império Alemão). Quando as derrotas começaram a avolumar-se no fronte, os maus presságios de Rasputin foram lembrados. Entrementes, conforme o país afundava no desastre e no desespero, os cortesãos mais próximos do czar passaram a não poder mais suportar as intromissões de Rasputin na condução dos negócios. Além disso a imagem de um bruxo agindo nos bastidores, aparentemente conduzindo o país numa guerra devastadora, depunha contra a seriedade da monarquia. Alguma coisa tinha que ser feita. Depois de ter assistido na Duma, o parlamento russo, um contundente discurso de um deputado da extrema-direita chamado Purishkevitch, denunciando as forças ocultas que estavam manipulando a monarquia, numa clara alusão a Rasputin, o príncipe Félix Youssoupov o procurou para participar num plano. Além deles, havia ainda um oficial de nome Sukhotin, e um médico, o doutor Lazovert, mas a figura mais impressionante era o grão-duque Dmitri, da própria família real.
Os conspiradores imaginaram então um ardil. O príncipe Félix Youssoupov era casado com a sensual Irene Alexandrovna, uma das maiores beldades da corte e nada menos do que sobrinha de Nicolau II. Rasputin a viu certa vez na ópera e encantou-se. Para atrai-lo ao seu palácio, situado sobre o canal do Mojka, um dos diversos condutos que levava ao Rio Neva, em São Petersburgo, Youssoupov prometeu que a apresentaria ao iluminado. Um pouco antes, no entanto, levando-o ao porão, desejava propiciar-lhe alguns regalos. Nada daquilo pareceu estranho a Rasputin. Foram incontáveis as vezes que homens poderosos ofereceram-lhe as esposas em troca de benesses e cargos. Só que desta vez os seus doces favoritos que Youssoupov lhe ofereceu numa bandeja estavam encharcados de cianureto.
O príncipe Youssoupov no exílio em Paris |
Depois de uma série de brindes com vinho também envenenado o bruxo arriou. Caiu sobre um sofá, resvalando para o chão. Youssoupov acreditando-o morto, comunicou o resultado aos conjurados que o aguardavam no andar de cima do palácio. Repentinamente ecoou um grito terrível. Era o próprio Youssoupov assustado ao deparar-se com Rasputin erguendo-se do chão onde o presumira morto. Havia nos doces veneno suficiente para abater um cavalo. Calculou-se depois que as quantidades colossais de bebida que ele ingeria regularmente neutralizaram em parte a ação da mortífera poção que lhe deram. Atendendo ao chamamento do príncipe, que chegou a disparar por duas vezes em Rasputin, Vladimir Purishkevitch, desceu com o revolver em punho e , de imediato, descarregou-o sobre o corpanzil de Rasputin, que naquela altura ensaiava uma fuga. Não antes, porém, de tentar esganar com suas poderosas mãos o pescoço de Youssoupov.
Amadores, os conjurados quando se desfizeram do cadáver jogando-o num buraco feito na crosta enregelada do rio Neva, esqueceram-se de colocar-lhe uns pesos aos pés. Três dias depois, a polícia o encontrou. A czarina fez questão, na véspera do Natal, dia 24 de dezembro, de prestar-lhe uma homenagem fúnebre em completo segredo. Deram o óbito como morte acidental.
A família Romanov |
Dada a alta linhagem dos envolvidos no assassinato, Nicolau II resolveu apenas puni-los com desterros benignos. O estrago à imagem da monarquia porém foi irrecuperável. No Natal seguinte, o do ano de 1917, o czar e toda a sua família estavam presos e, apenas quinze meses depois da retirada do corpo de Rasputin das margens do Neva, Nicolau II, a czarina e os filhos, foram passados pelas armas no dia 17 de julho de 1918, na cidade de Ekaterinburg por um comando de execução bolchevique, liderado pelo camarada Yurovsky. O fim brutal do bruxo, de certa forma, foi a antecipação, ainda que em dimensão bem menor, do que aguardava os últimos dos Romanovs.
Hoje, na Rússia pós-comunista, esboça-se entre os grupos de extrema-direita nacionalista um movimento de resgate da figura de Rasputin. Acreditam-no um tipo puro, o "bom selvagem" siberiano, místico e supersticioso, não contaminado pelos ideais racionalistas do Ocidente, um "russo puro", ao modo de Dostoievski, que a seu modo tosco tentou preservar a Santa Rússia das desgraças.
Na noite de 16 de dezembro de 1916 o Príncipe Youssoupov ergueu novamente sua taça. Mais um brinde. A figura que começava a cambalear em sua frente empinou o cálice e sorveu tudo de um só vez. Seus cabelos negros desgrenhados esparramavam-se pelos ombros e entre a barba, e a testa brilhavam seus poderosos olhos cinzentos, "olhos de lobos" como diziam, que já estavam um tanto embaçados. O monge Grigori Rasputin privava com os grandes da Rússia. Desde que uma aia da corte o havia apresentado a czarina Alexandra Fedorovna, por volta de 1905, ele se tornara a eminência parda da autocracia.
Alexei, o herdeiro doente da Rússia |
Rasputin no seu apogeu |
A sua consagração frente aos soberanos - como homem santo oficial - fez com que cessassem os seus tempos de peregrinação, fome e vagabundagem. Doravante estaria à disposição dos monarcas a qualquer momento. Não demorou muito para que aquele homem esperto e vivo tirasse todo o proveito possível daquela situação. Na constante troca de bilhetes de Alexandra com o marido, zelosamente coletados pela polícia secreta do próprio czar, ele é referido como "o Amigo". Não havia nomeação, transferência ou decisão importante a ser tomada por Nicolau II sem que ela rogasse que "escutasse o Amigo". Sabe-se que geralmente com sucesso.
Alexandra e Nicolau |
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