Ampliar Mais do que o índio que emocionou, com um discurso, o Papa João Paulo II, quando o sumo pontífice despedia-se do povo no Aeroporto de Manaus, no dia 11 de julho de 1980, Marçal de Souza foi o líder guarani que defendeu, até a morte, os direitos de seu povo na aldeia de Campestre, a 57 quilômetros de Ponta Porã, no Mato Grosso do Sul.
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Ele nasceu na véspera do Natal de 1920, em Rincão do Júlio, na região de Ponta Porã, Mato Grosso do Sul. Foi assassinado com cinco tiros, na noite de 25 de novembro de 1983, dias depois de recusar a proposta de um fazendeiro que lhe oferecera polpuda quantia para que convencesse os kaiowá a sairem da aldeia de Pirakuá, em Bela Vista (MS), para reservas já demarcadas pelo governo. Tupã-Y (Deus pequeno, em guarani), como era chamado pelo seu povo, recusou a oferta e foi ameaçado pelo fazendeiro. O crime teve repercussão internacional. O Governo de Mato Grosso do Sul chegou a divulgar nota na qual acusava um índio de ser o assassino. Mas as investigações apontavam para o fazendeiro como mandante do crime. Acusado, ele foi considerado inocente em dois julgamentos. Logo depois da morte do cacique, houve aumento considerável no número de suicídios de índios guaranis. No ano passado, decorridos 20 anos do assassinato, o crime foi prescrito. E os culpados não podem mais ser julgados. Marçal de Souza tinha 63 anos, quando morreu ao lado de sua mulher, a índia Celina Vilhava, de 27 anos, que estava grávida de nove meses.
Órfão aos oito anos, Tupã-Y foi educado numa missão presbiteriana. Morou com a família de um oficial do Exército em Recife, onde estudou até a segunda série do antigo ginasial. Adulto, voltou para Ponta Porã e, na década de 40, novamente abraçou sua cultura de origem ao se tornar guia e intérprete dos antropólogos Darcy Ribeiro e Egon Shaden. Na aldeia onde morava Marçal era enfermeiro do posto da FUNAI. Sua luta constante pela demarcação das terras indígenasincomodava fazendeiros e madeireiros. Até o encontro com o papa, em 1980, Marçal era um índio desconhecido.
Ganhou projeção internacional quando denunciou ao papa as agressões dos brancos contra os índios e reclamou da perda dos direitos indígenas ao longo da história “Este é o país que nos foi tomado. Dizem que o Brasil foi descoberto. O Brasil não foi descoberto não, Santo Padre. O Brasil foi invadido e tomado dos indígenas. Esta é a verdadeira história de nosso povo, Santo Padre. Eu deixo aqui o meu apelo, apelo de 20 mil índios que habitam, lutam pela sua sobrevivência, nesse País tão grande e tão pequeno para nós”.
Depois que Marçal foi assassinado, Darcy Ribeiro chamou o seu amigo de brilhante intelectual guarani, num discurso que fez em sua homenagem, no Senado.
Livro 100 Brasileiros (2004)