3.7.12

Mistérios Camonianos

Dono de uma obra cantada em prosa e verso nos quatro cantos do mundo, o ícone das Letras Lusitanas tem sua vida pessoal mergulhada nas sombras.





"Amor é fogo que arde sem se ver" Luís de Camões

"Foge-me, pouco a pouco, a curta vida,
Se por acaso é verdade que inda vivo;
(...) Choro pelo passado; e, enquanto falo,
Se me passam os dias passo a passo.
Vai-se-me, enfim, a idade e fica a pena."

Luís de Camões


Ele teria nascido em uma data qualquer do ano 1524, e falecido na capital portuguesa, a 10 de junho de 1580. Há muitas hipóteses sobre a sua terra natal, e outras mais sobre os estudos literários e filosóficos que ele teria realizado no ambiente aristocrático de Coimbra.

É 1579, e a peste infecta o ar das ruas e vielas de Lisboa. Num quarto quase sem luz, o poeta Luís de Camões jaz estirado na cama. Tem 55 anos e pouca vida. Sua febre alta, sinal inequívoco de que é mais uma vítima da doença. A boca amarga o remédio contra a pestilência: um gosto misto de gengibre, canela, cominho e açafrão.

A mãe, Dona Ana de Macedo, providenciou até uma infusão de serpilho, planta medicinal para os casos de tosse e infecção nos brônquios, enriquecido com o leite de mulher. Mas a vida não se esvai apenas de quem compôs (em 1572) Os Lusíadas. Com a sua agonia o que se perde é o raciocínio de alguém que reportou, de forma criativa e elegante, a história do seu tempo.

Referindo-se, por exemplo, ao desastre de Alcácer-Quibir, a derrota de 1578 que pôs fim à presença de Portugal na Índia, provocou a ruína financeira da Coroa portuguesa, e ameaçou a própria independência nacional, Camões, já sentindo as forças lhe escaparem, escreveu: "Enfim acabarei a vida e verão todos que fui tão afeiçoado à minha Pátria que não só me contentei de morrer nela, mas com ela".

Luís de Camões é o maior poeta da língua portuguesa de todos os tempos - e um historiador de reputação ainda não bem dimensionada -, mas da sua trajetória pessoal pouco se sabe. A começar da data e do lugar onde nasceu.

A maior parte de seus dados biográficos têm sido retirados da sua própria obra literária. Nela há pistas dos seus amores, da vida boêmia - e às vezes desregrada - que levava, de suas alegrias e paixões, da pobreza e das inquietações que lhe atormentavam o espírito.

Ele teria nascido em uma data qualquer do ano 1524, e falecido na capital portuguesa, a 10 de junho de 1580. Há muitas hipóteses sobre a sua terra natal, e outras mais sobre os estudos literários e filosóficos que ele teria realizado no ambiente aristocrático de Coimbra.

Em Ceuta, a famosa cidade portuguesa do Norte de África, durante um combate com os mouros, teria perdido o olho direito.









Camões acumulou tantas glórias na Literatura quanto inimigos. Denúncias contra ele, perseguições e intrigas que o tinham como alvo o reduziram, em Moçambique, no ano de 1568, a um genial escritor de 44 anos de idade, que só se alimentava graças à caridade dos amigos

De volta à Lisboa, e tendo se atritado com um funcionário da Corte, foi detido e, em 1552, recolhido à tristemente famosa Cadeia do Tronco. Dessa masmorra só se livrou no ano seguinte, perdoado pelo ofendido e pelo Rei, conforme se lê numa carta enviada da Índia, para onde partiu ainda em 1553. Segundo alguns estudiosos, terá sido nessa quadra da vida, aos 29 anos de idade, que compôs o primeiro canto de Os Lusíadas. No soneto Cá Nesta Babilônia, percebese, contudo, que não foi feliz em Goa, a capital do Império Português no Oriente.

Camões integrou várias expedições militares, e mais tarde transferiuse para Macau, onde exercerá o cargo de Provedor-Mor de defuntos e ausentes - cidade onde avança por mais seis Cantos do famoso poema épico. No regresso a Goa, a embarcação que o transporta naufraga na Foz do Rio Mecom, na costa oriental da África.

Reza o Canto X que Camões se salva nadando com apenas um braço, enquanto o outro mantém erguido acima das ondas o manuscrito da grande epopéia. Mas o episódio o enluta: pois ali acabaria por afogarse sua Dinamene, uma chinesa por quem se tinha afeiçoado. A esta fatídica morte dedicou os famosos sonetos do ciclo Dinamene, entre os quais se destaca Ah! Minha Dinamene! Assim deixaste.

Camões acumulou tantas glórias na Literatura quanto inimigos. Denúncias contra ele, perseguições e intrigas que o tinham como alvo o reduziram, em Moçambique, no ano de 1568, a um genial escritor de 44 anos de idade, que só se alimentava graças à caridade dos amigos e admiradores - um intelectual na miséria.

Os tempos consolidaram a versão de que Camões só não morreu de fome devido à dedicação de um escravo Jaú [natural da Ilha de Java]

Após 16 anos de desterro, Camões regressa a Lisboa, em 1569. Os amigos lhe pagaram as dívidas, e ainda compraram a documentação que lhe viabilizaria a viagem de volta.

Três anos mais tarde surge, finalmente, a epopeia baseada na 1.ª viagem de Vasco da Gama à Índia (descoberta do caminho marítimo para a Índia), intitulada de Os Lusíadas. Camões, seguindo a estrutura narrativa da Odisseia de Homero, assim como versos da Eneida de Virgílio, utiliza a estrofação em Oitava Rima, que consiste em estrofes de oito versos, rimadas sempre da mesma forma: "abababcc".

A epopeia se compõe de 1102 dessas estrofes, ou 8816 versos, todos decassílabos, divididos em dez cantos. Em reconhecimento à sua genialidade, o Rei D. Sebastião autorizou uma tença anual de 15000 réis pelo prazo de três anos. Foi o prêmio de Luís de Camões. Dona Ana de Macedo pode renovar essa pensão, pela última vez, em 1582. Foi ela quem assistiu os últimos anos do poeta.

Os tempos consolidaram a versão de que Camões só não morreu de fome devido à dedicação de um escravo Jaú [natural da Ilha de Java], que ia de noite, sem o poeta saber, mendigar de porta em porta o pão que o alimentaria no dia seguinte.

Morto em junho de 1580, seu enterro correu às expensas da Companhia dos Cortesãos, uma associação de beneméritos da época. Um desses fidalgos, D. Gonçalves Coutinho, mandou inscrever-lhe na campa rasa o seguinte epitáfio: "Aqui jaz Luís de Camões, príncipe dos poetas do seu tempo. Viveu pobre e miseravelmente, e assim morreu".


Sete controvérsias

1. A DATA DO NASCIMENTO. No princípio do século 17 ainda predominava a convencimento de que o pequeno Luís viu a luz em 1517, versão que o pesquisador Manuel de Faria e Sousa a princípio adotou, vindo depois a optar por outras datas: 1524 ou 1525. Teófilo Braga sugeriu que Camões tenha nascido em 4 ou 5 de fevereiro de 1524, mas também essas hipóteses parecem erradas;

2. A terra natal. Camões terá nascido em Lisboa, de uma família da Região de Chaves, Norte de Portugal. Mas as localidades de Alenquer e Santarém também são alvo dos estudos de seus biógrafos;

3. A FORMAÇÃO EM COIMBRA. Uma linha de investigação sugere que Camões seja descendente de uma família da nobreza, concretamente de uma ligada aos vice-reis da Índia. O fato explicaria seus aupostos - e decantados - estudos superiores em Coimbra, ainda que essa formação não seja comprovada por qualquer documento...

4. A JUVENTUDE. É da tradição portuguesa considerar que, no período de 1547 a 1550, Luís de Camões tenha vivido em Constância, então Punhete, vila portuguesa do Médio-Tejo - exilado da Corte por mau comportamento com uma dama. Mas também essa informação sofre contestações. A antiga Punhete conferiu seu nome a logradouros públicos, estabelecimentos comerciais, chegou mesmo a criar uma Casa Memória de Camões - mas nem essas são provas incontestáveis de sua passagem pelo lugar. Uma pista são as espécies vegetais do chamado Jardim-Horto de Constância: a árvore da canela, da segurelha, a árvore da pimenta, a planta da cânfora, tamareiras. Ao todo estão ali representadas as 52 espécies botânicas a que o poeta faz referência, tanto nos cânticos d'Os Lusíadas, quanto em outros textos da sua lírica.



5. SUMIÇO DAS ANOTAÇÕES SOBRE SUA VIDA. A lista dos portugueses mais notáveis que foram servir à Índia, organizada no século 16, encontra-se hoje na Biblioteca Nacional de Lisboa. Mas nesses registros, curiosamente, faltam as páginas em que figuraria o nome de Luis de Camões.

6. A PUBLICAÇÃO DOS LUSÍADAS. Até esse episódio está envolto num pequeno mistério, pois há duas edições do mesmo ano e não há confirmação sobre qual foi a primeira.

7. A TÚMULO. O corpo de Camões teria sido enterrado junto à cerca do Convento de Sant'Ana, em Lisboa, mas esse lugar perdeu-se com o terremoto de 1755. A verdade é que se ignora o paradeiro dos restos mortais do poeta. Mas isso não impediu que tenham sido construídos para ele dois túmulos oficiais: um no Mosteiro dos Jerônimos e outro no Panteão Nacional.

Fonte:  portal Ciência & Vida