O descobridor da doença de Chagas teve quatro indicações ao Prêmio Nobel de Medicina e Fisiologia, em 1921,ano em que Albert Einstein recebeu o Nobel de Física. Ele foi o primeiro brasileiro a obter o título de Doutor Honoris Causa da Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, em 1921.
A descoberta da doença foi o marco inicial de uma vida de expedições e atuações a favor do saneamento básico e da melhoria da saúde pública dos brasileiros.
Em 1905, Oswaldo Cruz requisita Carlos Chagas para a missão de controlar a epidemia de malária que assolava o município de Itatinga(SP). Entusiasmado como o desafio, ele coordena a primeira e mais bem-sucedida grande campanha até então realizada e consegue deter o surto da doença em cinco meses. Seus procedimentos passam a ser seguidos nas campanhas seguintes.
Novas Descobertas
Em 1907, na cidade mineira de Lassance, ele identificaria uma nova doença, a Doença de Chagas. A descoberta marca definitivamente sua trajetória profissional.
Nos horários vagos de sua estada na cidade, ele descobriu uma nova espécie de protozoário, que denominou inicialmente de Trypanosoma Minasense. Chamou sua atenção também a presença de um inseto que vinha se proliferando nas frestas da casas de pau-a-pique, o “barbeiro”.
Chagas identificou no intestino do inseto um protozoário com características semelhantes ao do sagüi, o que o levou a acreditar que poderia ser uma fase evolutiva do Trypanosoma Minasense. Enviou amostras do parasito para Oswaldo Cruz, pedindo que alimentasse com os insetos os sagüis criados no laboratório de Manguinhos. Um mês depois, Oswaldo Cruz comunica que os animais adoeceram e que de fato havia a presença do Trypanosoma no sangue.
Animado, Chagas volta imediatamente para o Rio e com o auxílio de outros pesquisadores desvenda, quase completamente, o ciclo evolutivo do novo protozoário, ao qual dá o nome de Trypanosoma Cruzi – o Cruzi, em homenagem a Oswaldo Cruz.Em 14 de fevereiro de 1909 ele detecta o primeiro caso de moléstia provocada pelo Trypanosoma Cruzi. Era a doença de Chagas. Em 1917, três dias após a morte de Oswaldo Cruz, Carlos Chagas é nomeado diretor de Manguinhos, cargo que ocupou até sua morte, em 1934.
Carlos Ribeiro Justiniano Chagas nasceu numa fazenda a 20 quilômetros da pequena cidade de Oliveira (MG), no dia 9 de julho de 1878. Morreu no dia 8 de novembro de 1934.
Carlos Chagas – História
“Não vai demorar que passemos adiante uma grande e bela ciência, que faz arte em defesa da vida.” (1928)
Carlos Chagas
A 22 de abril de 1909, Oswaldo Cruz anunciou formalmente à Academia Nacional de Medicina a descoberta, por Carlos Chagas, de uma nova doença: a tripanosomíase americana ou moléstia de Chagas.
O processo da descoberta se iniciou em 1907, quando Chagas, pesquisador de Manguinhos, chegou a Lassance, no norte de Minas Gerais, com a missão de combater a malária entre os trabalhadores da Estrada de Ferro Central do Brasil. Lá, teve sua atenção despertada por um inseto que proliferava nas frestas das paredes de pau-a-pique das casas, alimentando-se à noite do sangue de seus moradores. Por atacar preferencialmente o rosto, era chamado de barbeiro pela população local.
Ao examinar estes insetos, Chagas encontrou neles um novo parasito, que chamou de Trypanosoma cruzi, em homenagem a Oswaldo Cruz. Verificou que este era patogênico para animais de laboratório e descobriu sua presença em animais domésticos. Paralelamente, já havia detectado nos habitantes da região alterações patológicas inexplicáveis. Começou então a pesquisar as ligações entre o novo parasito e a condição mórbida daquela população.
A 23 de abril de 1909, Chagas descobriu pela primeira vez o protozoário no sangue de um ser humano: uma menina de três anos, Berenice, em plena fase aguda.
Era um feito único na história da medicina: Chagas descobriu o parasito – o Trypanosoma cruzi – e seu ciclo evolutivo; o vetor – o barbeiro – e seus hábitos; o reservatório doméstico – o gato; e a moléstia – a doença de Chagas.
A repercussão
Trypanosoma cruzi
A repercussão de sua descoberta foi enorme, tanto no Brasil quanto no exterior. A Academia de Medicina, fato singular em sua história, fez de Chagas membro extraordinário, já que, naquele momento, não havia vaga disponível. “0 descobrimento desta moléstia constitui o mais belo exemplo do poder da lógica a serviço da ciência. Nunca até agora, nos domínios das pesquisas biológicas, se tinha feito um descobrimento tão complexo e brilhante e, o que mais, por um só pesquisador,” diz Oswaldo Cruz.
O prêmio Schaudinn, conferido ao autor do melhor trabalho sobre protozoologia realizado até então, foi outorgado ao pesquisador em julho de 1912, como homenagem do Instituto de Doenças Tropicais de Hamburgo, na Alemanha. A consagração internacional possibilitou o prosseguimento das pesquisas sobre a nova doença, contando com a contribuição de vários pesquisadores de Manguinhos, entre os quais se destacam Gaspar Vianna, Arthur Neiva, Eurico Villela, Magarinos Torres, César Guerreiro, Astrogildo Machado, Evandro Chagas e Emmanuel Dias.
Barbeiro após alimentar-se
Chagas e seus colaboradores identificaram as diversas modalidades clínicas da doença, separando-as entre as fases aguda e crônica, descreveram minuciosamente a morfologia e o ciclo evolutivo do T. Cruzi no inseto transmissor e no hospedeiro vertebrado e estudaram a biologia das várias espécies de barbeiros transmissores. Realizaram investigações experimentais, produziram estudos sobre a patogenia (processo de evolução da doença) e a anatomia patológica (estudo das lesões provocadas pela doença por meio de necrópsias), desenvolveram métodos de diagnóstico, analisaram o papel dos reservatórios domiciliares e silvestres do T. cruzi e apontaram a relevância da doença como flagelo que impedia o desenvolvimento físico e social das populações rurais do país.
Entre novembro de 1922 e dezembro de 1923, a Academia Nacional de Medicina foi palco de uma grande controvérsia envolvendo a doença de Chagas. Um grupo de médicos, entre os quais, Afrânio Peixoto, professor de Higiene da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, Henrique Figueiredo de Vasconcellos, pesquisador do Instituto Oswaldo Cruz, e Parreiras Horta, professor de parasitologia da Escola Superior de Agricultura e Medicina Veterinária, contestaram a autoria da descoberta do T.cruzi, qualificaram a tripanossomíase americana de “doença inventada” e questionaram a importância que lhe era conferida pelos poderes públicos, afirmando não haver provas concretas de sua extensão para além dos limites de Lassance. Após examinar a questão, uma comissão da academia reconheceu que o autor da descoberta era efetivamente Chagas, mas manteve a dúvida quanto à distribuição da doença no território nacional.
Fim da controvérsia
Somente na década de 30, esta questão seria definitivamente resolvida. As pesquisas dos médicos argentinos Salvador Mazza e Cecilio Romaña, com a detecção de centenas de casos agudos na Argentina, comprovaram que a tripanossomíase não estava circunscrita ao Brasil, mas atingia também outros países do continente.
Na mesma época, pesquisadores brasileiras empenhavam-se em comprovar a ampla distribuição da doença de Chagas. Em 1935, o filho mais velho de Chagas, Evandro, criou, em Manguinhos, o Serviço de Estudos de Grandes Endemias, estimulando o desenvolvimento de investigações sobre a doença. Em 1940, o pesquisador Amilcar Vianna Martins descreveu 25 casos agudos da doença de Chagas na cidade de Bambuí, em Minas Gerais.
Em 1943, o então Instituto Oswaldo Cruz, instalou um centro de pesquisas em Bambuí, chefiado pelo pesquisador e colaborador de Carlos Chagas, Emmanuel Dias. O centro, transformado em 1980 no Posto Avançado de Pesquisas Emmanuel Dias, constituiu um marco decisivo para a afirmação efetiva da doença de Chagas como problema de saúde pública de grande relevância para o Brasil e para a América Latina.
Em 1959, o I Congresso Internacional de Doença de Chagas, realizado no Rio de Janeiro, tornaram evidente que a moléstia achava-se finalmente reconhecida como assunto de grande importância social e que a trilha científica aberta por Carlos Chagas deveria ser ampliada e aprofundada na busca de novos caminhos e soluções.
Infância e formação
Nascido a 9 de julho de 1879, em Oliveira, no oeste de Minas Gerais, Carlos Justiniano Ribeiro Chagas ficou órfão de pai aos quatro anos. Inicialmente, fez o preparatório para a Escola de Minas em Ouro Preto, atendendo ao desejo de sua mãe, que queria vê-lo formado em Engenharia.
Aos 16 anos, porém, sua verdadeira vocação se manifestou e, em 1897, ingressou na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro.
Concluído o curso, escolheu como tema de sua tese o Estudos hematológicos no impaludismo (1903), o que o colocou pela primeira vez em contato com Oswaldo Cruz. Apesar de sua admiração pelo sanitarista, Chagas recusou um convite para permanecer em Manguinhos, por se sentir atraído pela clínica.
Em 1904, instalou seu consultório particular no centro do Rio e casou-se com Íris Lobo. Dessa união nasceriam Evandro Chagas, em 1905, e Carlos Chagas Filho, em 1910.
Na Fiocruz
Em 1905, realizou, em Itatinga, interior de São Paulo, a primeira campanha bem sucedida contra a malária do país. Decide combater o mosquito no interior das casas, desinfetando-as mediante a queima de piretro. Sua teoria da infecção domiciliar da malária serviu de base para o efetivo combate à moléstia no mundo inteiro.
Voltando de São Paulo ingressou, em 1906, nos quadros do Instituto Oswaldo Cruz, onde trabalharia durante toda a vida. No ano seguinte, foi enviado por Oswaldo Cruz, junto com Arthur Neiva, para combater uma epidemia de malária em Xerém, na Baixada Fluminense.
Em 1912, Chagas realizou uma expedição ao vale do Amazonas, fazendo um completo levantamento médico-sanitário e das condições de vida dos habitantes daquela região. Em relatório ao Ministério da da Agricultura, Indústria e Comércio, Chagas e outros membros da expedições relataram situação de abandono médico e social em que viviam as populações da Amazônia, enfatizando a necessidade de medidas sanitárias como instrumento fundamental para viabilizar o desenvolvimento econômico da região.
Ao morrer Osvaldo Cruz em 1917, Chagas é nomeado, em 14 de fevereiro, diretor de Manguinhos. Durante sua gestão, procurou consolidar o estabelecido por Oswaldo Cruz à semelhança do Instituto Pasteur, cujas características fundamentais eram a autonomia administrativa e financeira e a estreita articulação entre a pesquisa, o ensino e a fabricação de produtos destinados à medicina humana e à veterinária, visando atender aos serviços de saúde pública do país.
No campo da pesquisa, sua administração privilegiou a investigação das causas e dos aspectos epidemiológicos e clínicos das endemias rurais. Foi responsável também pela criação de seções científicas, definidas por áreas de conhecimento e com as quais pretendia estabelecer uma divisão de trabalho mais nítida no Instituto. Na área de ensino, ampliou o programa dos Cursos de Aplicação do Instituto.
Quanto à área de produção, Chagas diversificou a pauta de medicamentos e produtos biológicos fabricados em Manguinhos, entre eles alguns desenvolvidos pelos próprios pesquisadores, e estimulou a comercialização destes produtos, fortalecendo assim a renda própria da instituição. A partir de 1920, o Instituto assumiu também a responsabilidade pelo controle da qualidade dos produtos utilizados na medicina humana no país, nacionais ou importados.
Saúde pública
Em 1918, Carlos Chagas foi chamado pelo governo brasileiro para chefiar a campanha contra a epidemia de gripe espanhola, que assolava o Rio de Janeiro. O sucesso de sua atuação pesaria decisivamente na escolha de seu nome para dirigir a reforma dos serviços de saúde pública do país, a partir de 1919.
Designado chefe do Departamento Nacional de Saúde Pública (DNSP), criado pelo novo regulamento sanitário, Chagas ampliou o poder de intervenção e regulação da União no campo da saúde pública e organizou diversos serviços especializados, como o de higiene infantil, de combate às endemias rurais, à tuberculose, à hanseníase, às doenças venéreas.
Dedica-se ainda à capacitação de quadros profissionais especializados na área da saúde pública, criando a Escola de Enfermagem Anna Nery. Estabeleceu ainda a formação de médicos sanitaristas, através do Curso Especial de Higiene e Saúde Pública, anexo à Faculdade de Medicina e ministrado pelos pesquisadores de Manguinhos, que garantia aos aprovados a nomeação para cargos nos serviços sanitários federais. Cria ainda o Hospital São Francisco de Assis, para servir de modelo à modernização dos serviços hospitalares do país.
Em 1925, foi nomeado professor da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, onde criou a cadeira de Medicina Tropical e estabeleceu as bases do estudo desta área em nosso país. Além disso, Carlos Chagas representou o Brasil em vários comitês internacionais, principalmente como membro permanente do Comitê de Higiene da Liga das Nações.
A 8 de novembro de 1934, morreu subitamente aos 55 anos.
Carlos Chagas – Vida
Infância e formação
Infância no interior de Minas Gerais
Carlos Ribeiro Justiniano Chagas, primeiro dos quatro filhos de José Justiniano Chagas e Mariana Cândida Ribeiro de Castro Chagas, nasce no dia 9 de julho de 1878 na Fazenda Bom Retiro localizada a cerca de 20 km da pequena cidade de Oliveira, no estado de Minas Gerais. Ali haviam se enraizado seus antepassados há quase um século e meio, todos de origem portuguesa.
Órfão de pai aos quatro anos, Chagas passa a viver parte do ano em outra propriedade da família, onde sua mãe assume a administração do cultivo do café. A Fazenda Bela Vista situava-se na estação de Águas Limpas, próximo a Juiz de Fora, Minas Gerais.
Em Oliveira, a convivência com seus três tios maternos, Cícero, Olegário e Carlos, marca profundamente a infância de Chagas. Os dois primeiros eram advogados formados em São Paulo e estimulavam constantemente o sobrinho a dedicar-se aos estudos. Carlos, que se formara em medicina no Rio de Janeiro, era dono de uma clínica em Oliveira para onde acorriam todos os doentes da região. A proximidade com o tio Carlos seria decisiva na opção de Chagas em seguir a profissão médica.
José Justiniano Chagas e Mariana Cândida Ribeiro de Castro Chagas, pais de Carlos Chagas. Rio de Janeiro
Casa onde nasceu Carlos Chagas, na Fazenda Bom Retiro, situada próximo à cidade de Oliveira, Minas Gerais. Oliveira
CARLOS Chagas, quando tinha cerca de quatro anos. Rio de Janeiro
Primeiros estudos
Aos oito anos, já alfabetizado, Carlos Chagas é matriculado no Colégio de São Luís, internato dirigido por jesuítas em Itu, interior do estado de São Paulo. Mas não ficaria ali por muito tempo. Em maio de 1888, ao ter notícias de que os escravos recém-libertados estariam depredando fazendas, foge do colégio para ir ao encontro de sua mãe em Águas Limpas. O ato de indisciplina é punido pelos padres jesuítas com sua expulsão do colégio.
Chagas vai estudar então no Colégio São Francisco, fundado pelo padre João Batista do Sacramento em São João del Rey, Minas Gerais. Sacramento é uma figura muito marcante em sua formação. Os conhecimentos que o mestre tinha de história natural, botânica e zoologia, e o entusiasmo com que ensinava aos alunos os diversos saberes sobre a natureza, estimulam o interesse de Chagas pela ciência.
Concluído o curso no Colégio São Francisco, sua mãe decide que ele deveria seguir a profissão de engenheiro e, em 1895, Chagas ingressa no curso preparatório da Escola de Minas de Ouro Preto, respeitado centro de ensino superior. Ali, em companhia de seus colegas de curso, adere à vida boêmia e negligencia os estudos e a saúde. Em 1896, acaba reprovado nos exames e, adoentado, volta para Oliveira.
O período de recuperação em sua cidade natal é marcado pelo convívio com seu tio Carlos, que fortalece em Chagas o desejo de ser médico. O tio decide ajudá-lo a vencer a resistência da mãe, que acaba finalmente aceitando sua opção pela medicina.
Chagas segue então para São Paulo, onde presta exames para a obtenção dos diplomas básicos exigidos para a matrícula no curso médico. Conseguindo tais certificados em fevereiro de 1897, parte para a capital federal a fim de ingressar na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro.
Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro
As origens da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro (FMRJ) remontam à transferência da Corte Real Portuguesa para o Brasil, em 1808. Entre as providências destinadas a organizar o aparelho administrativo, D. João VI funda os primeiros estabelecimentos de ensino superior da colônia, criando nesse mesmo ano cursos médico-cirúrgicos no Rio de Janeiro e em Salvador.
A Escola Anatômica, Cirúrgica e Médica do Rio de Janeiro é instalada no Hospital Real Militar, no morro do Castelo. O curso, de quatro anos de duração, é regido pela Universidade de Coimbra, Portugal.
Em 1813, as escolas do Rio e de Salvador são reorganizadas e se transformam em Academias Médico-Cirúrgicas. O novo regulamento permite a adoção de normas próprias para o seu funcionamento e garante, pela primeira vez, aos profissionais aqui formados o direito de exercer a medicina, atribuição que até então era monopólio dos médicos formados em Portugal. A partir de 1826, a concessão dos diplomas passa a ser feita pelas próprias Academias e não mais pela Universidade de Coimbra.
Com a independência política do Brasil, novas reformulações do ensino médico se tornam necessárias, tendo em vista adequá-lo ao novo contexto da nação. Em 1832, é aprovada a transformação das Academias Médico-Cirúrgicas em Faculdades de Medicina, seguindo o modelo das instituições francesas de ensino superior. O curso tem sua duração ampliada para seis anos e passa a formar médicos, farmacêuticos e parteiras. A preocupação em elevar o nível da formação acadêmica faz com que passe a ser obrigatória a defesa de tese para a obtenção do título de “doutor em medicina”, exigência que seria abolida em 1911.
A partir de 1884, na gestão do Visconde de Sabóia (1880-1889), o ensino na FMRJ passa por uma ampla reforma. Seu principal aspecto é a introdução do ensino prático de todas as disciplinas médicas, rompendo com o predomínio até então vigente do ensino teórico. Por outro lado, os temas e as disciplinas relacionados às novas tendências da medicina européia, marcadas pelo avanço da medicina experimental e pelo impacto das teorias de Louis Pasteur, começam a se fazer presentes no ambiente da FMRJ, ainda que somente em 1901 seja criada a cadeira de Bacteriologia.
Paralelamente a uma maior abertura para a pesquisa científica nos laboratórios, procura-se estimular o estudo das doenças peculiares ao Brasil, tendo em vista as questões sanitárias consideradas estratégicas para o desenvolvimento nacional.
A reforma realizada por Sabóia introduz também uma série de medidas liberalizantes, tais como a freqüência livre às aulas, a realização de cursos não oficiais nos recintos da faculdade e a permissão à matrícula de mulheres em seus cursos.
Com a proclamação da República em 1889, várias medidas e orientações preconizadas pela reforma de 1884 são revistas ou suprimidas, provocando reações e abrindo crises na direção da FMRJ que se prolongam pelas primeiras décadas do século XX.
Depois de funcionar em vários endereços, a FMRJ instala-se, em 1918, num prédio construído na Praia Vermelha especialmente para sediá-la e no qual permaneceria até 1973, quando é transferida para o campus universitário da Ilha do Fundão.
Com a criação, em 1920, da Universidade do Rio de Janeiro, a Faculdade de Medicina, juntamente com a de Direito e a Escola Politécnica, passa a integrar a instituição. Em 1937, a reforma promovida por Vargas transforma a Universidade do Rio de Janeiro em Universidade do Brasil e a Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro passa a denominar-se Faculdade Nacional de Medicina. Quando, em 1965, a Universidade do Brasil é transformada na Universidade Federal do Rio de Janeiro, a Faculdade de Medicina deixa de ter em sua denominação o termo “nacional”.
O curso de medicina
O Rio de Janeiro nas últimas décadas do século XIX era uma cidade marcada por precárias condições sanitárias. As freqüentes epidemias – sobretudo de febre amarela – que assolavam o porto representavam uma ameaça ao processo de modernização que vinha se intensificando com a expansão da cafeicultura desde meados do século. O saneamento urbano era assim proclamado medida crucial para o progresso do país e, com esse objetivo, preparava-se a reforma da cidade que seria realizada nos primeiros anos do século XX.
É nesse contexto que se dá a difusão no Brasil das idéias de Louis Pasteur, fundador da microbiologia, ciência que estabeleceu uma maneira radicalmente nova de se conceber a natureza das doenças e seus mecanismos de propagação. Sob a influência da “revolução pasteuriana”, a Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro vinha passando, desde a década de 1880, por um processo de renovação. Davam-se os primeiros passos para a incorporação do ensino da medicina experimental, definida pela prática da pesquisa científica no laboratório em busca de novos conhecimentos no campo do saber médico.
Este é o ambiente que Chagas encontra ao matricular-se nesta escola em abril de 1897. Ao longo do curso, dois professores marcam de maneira decisiva sua formação. Miguel Couto, com quem passaria a ter uma estreita amizade, apresenta a Chagas as noções e a prática da clínica moderna, que, acompanhando os avanços científicos da medicina experimental, passava por um processo de especialização e buscava novas formas de explicação para as causas das doenças. Francisco Fajardo, por sua vez, introduz Chagas no estudo experimental das doenças tropicais, especialmente da malária, proporcionando-lhe um treinamento na pesquisa laboratorial que seria de grande importância para sua tese de doutoramento e para sua futura carreira.
Estes mestres representam assim os dois caminhos que se abrem para Chagas no decorrer de seu curso médico: a clínica e a pesquisa científica.
Febre amarela
A febre amarela é uma doença causada por vírus transmitido ao homem por mosquitos, sobretudo o Aedes aegypti. Após período de incubação que oscila entre três e sete dias, manifesta-se por meio de acesso febril, dores de cabeça, da coluna e dor abdominal, fotofobia, icterícia, diarréia e vômitos negros, característicos da doença. Há uma modalidade chamada “febre amarela silvestre”, que se observa nas regiões florestais, onde vários animais, especialmente os macacos, são reservatórios naturais do vírus.
A partir de 1850, vários surtos epidêmicos atingem os portos e os principais centros urbanos do Brasil, especialmente o Rio de Janeiro, com elevados índices de mortalidade. Entre as ações de controle da doença, destaca-se a campanha de erradicação do mosquito transmissor promovida na capital federal por Oswaldo Cruz, diretor-geral da Saúde Pública, a partir de 1903. Na década de 1920, as medidas de combate à doença no país são realizadas sob a orientação da Fundação Rockefeller, mediante acordos de cooperação com o governo brasileiro. Em 1935, essa instituição norte-americana instala, no Instituto Oswaldo Cruz, um laboratório para a produção da vacina, fabricada e comercializada até hoje pela Fundação Oswaldo Cruz
Louis Pasteur
Louis Pasteur nasce no dia 27 de dezembro de 1822 em Dole, na França. Em 1847, apresenta tese de doutoramento em física e química na Escola Normal Superior, em Paris. Depois de realizar, em 1848, estudos na área da cristalografia, Pasteur passa a orientar suas pesquisas para o mundo dos microorganismos, desenvolvendo trabalhos que trazem grandes avanços ao conhecimento e às teorias sobre os corpos “infinitamente pequenos”.
Na Universidade de Lille, onde assume em 1854 a cadeira de Química, dedica-se ao estudo dos processos de fermentação em diversas substâncias, como o leite e o álcool, chegando à conclusão de que cada um desses processos resulta da ação de um microorganismo específico. Tais estudos o levam a rejeitar a tradicional teoria da geração espontânea, provando a impossibilidade do surgimento de organismos vivos em meios completamente esterilizados e protegidos do contato com microrganismos.
No curso de seus trabalhos sobre a fermentação, Pasteur volta-se para a formação do vinagre e as alterações degenerativas dos vinhos e das cervejas. Demonstra que tais processos, assim como as fermentações, são causados pela intervenção de determinados microorganismos. Para evitar as doenças dos vinhos, elabora o processo que ficaria conhecido como pasteurização, que consiste em aquecê-los até a temperatura de 55º, que é letal para os microorganismos mas não interfere nas propriedades da bebida. Tal processo seria posteriormente ampliado para a conservação da cerveja, leite e outras substâncias, tornando-se de grande importância para a indústria de alimentos e de bebidas fermentadas.
Em 1857, Pasteur deixa Lille para administrar a Escola Normal Superior em Paris e assumir a direção dos estudos científicos na instituição. As pesquisas que se seguem o aproximam cada vez mais da medicina e da veterinária.
Em 1865, é chamado a estudar uma doença que atacava os bichos-da-seda e causava sérios prejuízos à sericultura francesa. Suas investigações mostram que tal doença, a pebrina, é contagiosa e hereditária, causada pela ação de um micróbio transmitido às lagartas através do ovo das borboletas.
A partir de sua eleição, em 1873, para membro da Academia de Medicina da França, Pasteur defende, nessa associação, a tese de que grande parte das doenças contagiosas e dos processos infecciosos deve-se à ação de micróbios.
Depois de realizar estudos sobre várias doenças animais causadas por micróbios, Pasteur inicia, em 1880, suas pesquisas sobre a raiva, que marcam a passagem de suas investigações do campo da veterinária para o da medicina humana. Com Roux, Chamberland e Thuillier, desenvolve uma eficaz vacina contra a raiva nos cães e, em 1885, aplica pela primeira vez num ser humano – uma criança atacada por um cão raivoso – uma vacina baseada no princípio, por ele formulado, da inoculação dos micróbios de virulência atenuada. Além de possibilitar o tratamento preventivo da raiva, a experiência abre as perspectivas para a elaboração de profiláticos específicos para outras doenças humanas.
A descoberta da vacina anti-rábica humana é o primeiro resultado de grande repercussão dos trabalhos de microbiologia aplicada à medicina. Ela traz a consagração definitiva dos trabalhos de Pasteur e propicia a criação, em 1888, na cidade de Paris, do Instituto que leva seu nome, por ele dirigido e que logo se transforma num dos mais importantes centros mundiais de pesquisa científica.
Pasteur falece em 28 de setembro de 1895 em Villeneuve l’Etang, na França.
A tese de doutoramento
Com o objetivo de elaborar sua tese de doutoramento, pré-requisito à qualificação para o exercício da medicina, Chagas dirige-se em 1902 ao Instituto Soroterápico Federal, na fazenda de Manguinhos, levando uma carta de apresentação de seu professor, Miguel Couto, a Oswaldo Cruz, diretor técnico do Instituto. Dá-se assim o primeiro contato com aquele que seria seu grande mestre e com a instituição à qual estaria intimamente ligado o percurso de sua vida profissional.
O Instituto de Manguinhos – que a partir de 1908, sob a denominação de Instituto Oswaldo Cruz, se consolidara como respeitado centro de medicina experimental – atraía os estudantes de medicina interessados, como Chagas, no estudo científico das doenças tropicais. Aceito por Oswaldo Cruz, que passa a ser seu orientador, Chagas elege como tema de seu trabalho o ciclo evolutivo do parasito da malária no sangue e passa então a freqüentar o Instituto diariamente.
Em março de 1903, defende sua tese de doutoramento, intitulada Estudos hematológicos no impaludismo, e em maio termina o curso na Faculdade de Medicina. Oswaldo Cruz, que na época assumia simultaneamente a direção de Manguinhos e da Diretoria Geral de Saúde Pública (DGSP), nomeia Chagas médico deste órgão, para que pudesse integrar o quadro de pesquisadores do Instituto. Contudo, ele prefere a clínica e vai trabalhar, a partir de março de 1904, no Hospital de Jurujuba, em Niterói, destinado ao isolamento das vítimas da peste. Ainda nesse ano, instala seu consultório particular no centro do Rio e casa-se, em julho, com Íris Lobo, filha do senador mineiro Fernando Lobo Leite Pereira. Dessa união nasceriam Evandro Chagas, em 1905, e Carlos Chagas Filho, em 1910.
Campanhas contra a malária
Tendo em vista o trabalho realizado por Chagas em sua tese de doutoramento, Oswaldo Cruz o requisita, em março de 1905, para a missão de controlar a epidemia de malária que assolava o município de Itatinga, no estado de São Paulo. A doença atacava a maioria dos trabalhadores da Companhia Docas de Santos, que construía uma represa na região, causando a paralisação das obras.
Entusiasmado pelo desafio, Chagas segue para Itatinga e lá realiza a primeira campanha bem-sucedida contra a malária no Brasil, introduzindo procedimentos que passariam a ser corriqueiros nas campanhas subseqüentes. Segundo ele, para se impedir a propagação da doença em regiões em que não havia ações sistemáticas de saneamento, fazia-se necessário concentrar as medidas preventivas nos locais onde viviam os homens e os mosquitos infectados com o parasito da malária. Seguindo tal orientação, em cinco meses Chagas consegue debelar o surto da doença. De volta ao Rio, continua a servir à Diretoria Geral de Saúde Pública e, em 19 de março de 1906, transfere-se para o Instituto de Manguinhos.
No ano seguinte, Oswaldo Cruz é solicitado pela Inspetoria Geral de Obras Públicas a organizar o saneamento da Baixada Fluminense, onde estavam sendo realizadas obras de captação de água para o Rio de Janeiro. Juntamente com Arthur Neiva, também pesquisador de Manguinhos, Chagas parte para Xerém e o êxito das medidas ali adotadas confirma sua teoria da infecção domiciliar da malária.
Diante do sucesso alcançado nestas duas campanhas, ainda em 1907 Chagas é incumbido por Oswaldo Cruz de organizar, com Belisário Penna, médico da Diretoria Geral de Saúde Pública, o controle da malária no norte de Minas Gerais. A doença prejudicava seriamente as obras de prolongamento da Estrada de Ferro Central do Brasil na região do rio das Velhas, entre Corinto e Pirapora, comprometendo o projeto que pretendia unir o norte ao sul do país com a expansão da ferrovia do Rio de Janeiro a Belém do Pará. Na cidade de Lassance, Chagas realiza a profilaxia da malária, mas, no decorrer do ano seguinte, seus trabalhos tomam um rumo inesperado. Ali ele iria identificar uma nova doença humana, descoberta que marcaria decisivamente sua trajetória profissional.
Belisário Penna
Belisário Augusto de Oliveira Penna nasce em 29 de novembro de 1868 na cidade de Barbacena, Minas Gerais. Tendo iniciado o curso na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, diploma-se em 1890 pela Faculdade de Medicina da Bahia.
Vereador pelo município de Juiz de Fora, Minas Gerais, até 1903, retorna em seguida ao Rio de Janeiro, onde assume o cargo de inspetor sanitário da Diretoria Geral de Saúde Pública Em 1905, é designado para trabalhar na Inspetoria de Profilaxia da Febre Amarela, realizando vários estudos sobre o mosquito transmissor da doença e incorporando-se à campanha chefiada por Oswaldo Cruz para a sua erradicação no Rio de Janeiro. A partir de então, dedica-se ao combate das endemias rurais em várias regiões do país.
Entre 1907 e 1910, por designação de Oswaldo Cruz, organiza o controle da malária ao longo da Estrada de Ferro Central do Brasil, acompanhando Carlos Chagas a Lassance na ocasião em que este descobre a tripanossomíase americana. Em 1912, participa, com Arthur Neiva, de uma longa expedição promovida pelo Instituto Oswaldo Cruz para examinar as condições sanitárias de vários estados do Norte e Nordeste do país. O relatório da viagem, publicado em 1916, teria um papel decisivo na deflagração do movimento nacional pelo saneamento dos sertões brasileiros.
Em 1914, reassume o cargo de inspetor sanitário no Rio de Janeiro, instalando, dois anos depois, o primeiro Posto de Profilaxia Rural do país, no subúrbio carioca de Vigário Geral.
Em artigos publicados no jornal Correio da Manhã, inicia em 1916 uma campanha intensiva pelo saneamento rural do país, o que o leva a criar em 1918 a Liga Pró-Saneamento do Brasil, entidade que institucionaliza o movimento que reunia médicos, cientistas, intelectuais e políticos numa ampla mobilização pública em prol da reforma dos serviços de saúde pública brasileiros.
Ainda em 1918, publica o livro O Saneamento dos Sertões e é nomeado diretor do então criado Serviço de Profilaxia Rural, da Diretoria Geral de Saúde Pública. Entre 1920 e 1922, dirige os serviços de saneamento rural do Departamento Nacional de Saúde Pública (DNSP), instalando postos de profilaxia em vários estados brasileiros. Nessa ocasião, entra em conflito com Carlos Chagas acerca da orientação política a ser impressa ao DNSP.
Em 1924, apoia a revolta promovida em São Paulo pelo movimento tenentista com o objetivo de derrubar o governo do presidente Arthur Bernardes. Em virtude disso, é preso e suspenso de suas funções, sendo reintegrado somente em 1927.
Em 1928, ocupa a chefia do Serviço de Propaganda e Educação Sanitária do DNSP, percorrendo os estados de Minas Gerais, Alagoas, Pernambuco, Paraíba e Rio Grande do Norte, até ser requisitado em 1930, pelo governo do Rio Grande do Sul, para reorganizar os serviços de saúde pública daquele estado. Nesse ano, assume a chefia do DNSP, em substituição a Clementino Fraga, que se exonerara devido à vitória da Revolução de 30.
Durante dois breves períodos, em setembro de 1931 e dezembro de 1932, ocupa interinamente o Ministério da Educação e Saúde. Ao final deste ano, exonera-se do DNSP. Nessa época, filia-se à Ação Integralista Brasileira, tornando-se membro da Câmara dos 40, órgão supremo do integralismo.
Carlos Chagas falece no dia 4 de novembro de 1939 no Rio de Janeiro.
Carlos Chagas – Biografia
Carlos Chagas
Carlos Ribeiro Justiniano das Chagas, médico e bacteriologista; brasileiro, nasceu em Oliveira, Minas Gerais no dia 9 de Julho de 1879, e faleceu no Rio de Janeiro no dia 8 de Novembro de 1934.
Ingressou na Faculdade de Medicina no Rio de Janeiro depois de concluir o curso preparatório.
Dedicou-se aos serviços de profilaxia do interior.
O sucesso que obteve no combate à malária tornou-o conhecido e respeitado.
Foi admitido em 1907 no Instituto Osvaldo Cruz em Manguinhos.
Foi constituído uma comissão afim de efetuar estudos sobre uma tripanossomíase endémica, constada no interior brasileiro cuja chefia designou-se Carlos Chagas.
Em 1909, Carlos Chagas conseguiu descobrir o agente causador dessa terrível doença, denominou-a “Tripanosoma Cruzi” em homenagem a Osvaldo Cruz.
Sua descoberta não ficou somente aí, foi mais além, demonstrando que tal doença era transmitida por um inseto chamado “Barbeiro” (Triatoma Megista) hoje conhecida como doença de Chagas, numa justa homenagem ao grande bacteriologista.
Em 1911 foi-lhe concedido o prêmio Schaudim, conferido por um juri internacional ao melhor trabalho sobre Protozoologia e Microbiologia.
Comissionado novamente em 1912 à chefia dos Estudos da Malária no Vale do Amazonas.
Nomeado Diretor do Instituto Osvaldo Cruz.
Por ocasião da gripe espanhola em 1918, Carlos Chagas demoradamente, dirigiu a Campanha de Saneamento.
Diretor Geral do Departamento Nacional de Saúde Pública, foi ainda Professor de Medicina Tropical da Universidade do Rio de Janeiro.
Pesquisador nato e uma dedicação completa quando realizava o seu trabalho altruísta, deu continuidade à obra de Osvaldo Cruz.
Carlos Chagas – Descoberta
Carlos Chagas
Descoberta em Lassance
Ao chegar, em junho de 1907, no norte de Minas com a missão de combater a malária entre os trabalhadores da Estrada de Ferro Central do Brasil, Chagas instala-se na estação da pequena cidade de Lassance, utilizando um vagão de trem como alojamento e ali montando um laboratório. O alpendre de uma casa abandonada é transformado em ambulatório para atendimento aos doentes.
Sua atividade contudo não se limita à campanha contra a malária. Nas horas vagas, captura, classifica e estuda os hábitos dos anofelinos, mosquitos transmissores desta doença, e examina o sangue de animais e insetos em busca de parasitos. É dessa forma que Chagas identifica no sangue de um sagüi, macaco comum na região, uma nova espécie de protozoário, do gênero dos tripanossomos, ao qual dá o nome de Trypanosoma minasense. Na mesma época, o engenheiro Cantarino Mota, responsável pelas obras da ferrovia, chama sua atenção para a presença de um inseto que prolifera nas frestas das paredes de pau-a-pique das casas, alimentando-se à noite do sangue de seus moradores. Por atacar preferencialmente o rosto, era conhecido pela população local como “barbeiro”.
Chagas leva alguns desses insetos a seu laboratório e, examinando-lhes o intestino, identifica a presença de protozoários com certas características que o levam a pensar que poderiam ser uma fase evolutiva do Trypanosoma minasense, recém-identificado por ele.
Por não dispor em Lassance de condições para uma pesquisa mais aprofundada, Chagas envia exemplares de barbeiros infectados com o parasito a Oswaldo Cruz, pedindo que alimente os insetos em sagüis criados nos laboratórios de Manguinhos. Quase um mês depois, Oswaldo Cruz comunica-lhe a presença de tripanossomos no sangue dos animais, que haviam adoecido. Chagas volta imediatamente ao Rio de Janeiro, onde constata não se tratar do Trypanosoma minasense, mas de outro tripanossomo até então desconhecido. Com o apoio de outros pesquisadores do Instituto, desvenda quase por completo o ciclo evolutivo do novo protozoário, ao qual dá o nome de Trypanosoma cruzi, em homenagem a Oswaldo Cruz.
Dados os seus conhecimentos sobre a forma domiciliária de transmissão da malária e o fato de que os barbeiros, portadores do T. cruzi, viviam no interior das habitações humanas, Chagas volta a Lassance convencido de que o parasito descoberto poderia ser causa de doença tanto para animais domésticos quanto para o homem. Após ter encontrado um gato infectado com o novo tripanossomo, no dia 14 de fevereiro de 1909 ele examina o sangue de uma criança febril de dois anos e identifica a presença do parasito. A menina Berenice é o primeiro caso da moléstia à qual se daria o nome de doença de Chagas, provocada pelo Trypanosoma cruzi que o barbeiro transmite ao organismo do homem. Até então, a única doença humana causada por tripanossomos era a chamada doença do sono, ou tripanossomíase africana, transmitida pela picada da mosca tsé-tsé.
Conclui-se assim o ciclo da descoberta, no qual foi identificado primeiro o vetor (barbeiro), em seguida o agente causal (T. cruzi), o reservatório doméstico do parasito (gato) e por fim a doença (o caso de Berenice), tudo por um único pesquisador. A descoberta realizada em Lassance consolidaria a protozoologia, ramo da parasitologia dedicado ao estudo dos protozoários, como uma das mais importantes áreas de pesquisa do Instituto Oswaldo Cruz.
Segundo Chagas, a nova tripanossomíase era uma enfermidade disseminada por todo o Brasil, somando-se a outras doenças endêmicas como a malária e a ancilostomose, que assolavam de forma permanente as populações das zonas rurais do país.
Divulgação da descoberta
A doença descoberta por Chagas é levada ao conhecimento da comunidade científica por meio de uma nota prévia, datada de 15 de abril de 1909 e publicada na revista Brazil-Medico em sua edição de 22 de abril. Nesse mesmo dia, a descoberta é formalmente anunciada por Oswaldo Cruz à Academia Nacional de Medicina, que decide nomear uma comissão para ir a Lassance verificar o trabalho realizado por Chagas. Na cidade mineira, uma vez confirmadas as provas relativas à descoberta, o presidente da comissão, Miguel Couto, propõe que a nova doença passe a se chamar “moléstia de Chagas”. De fato, a doença se popularizaria com seu nome, mas o próprio Chagas, durante toda sua vida, se referiria a ela como tripanossomíase americana.
A divulgação inicial da descoberta se dá também pela publicação de trabalhos em revistas científicas estrangeiras, na Alemanha e na França. A nova doença desperta o interesse imediato dos pesquisadores europeus envolvidos com o tema das doenças tropicais. Na época, a tripanossomíase africana ou doença do sono vinha prejudicando a expansão do colonialismo europeu naquele continente.
Em agosto de 1909, Chagas publica no primeiro volume da revista de Manguinhos, Memórias do Instituto Oswaldo Cruz, um estudo completo sobre a tripanossomíase americana e o ciclo evolutivo do Trypanosoma cruzi. Esse trabalho e o prestígio crescente de Chagas garantem sua ascensão na hierarquia do Instituto, sendo promovido a “chefe de serviço” mediante a primeira colocação no concurso de títulos organizado por Oswaldo Cruz em março de 1910.
Em solenidade realizada em 26 de outubro deste ano, a Academia Nacional de Medicina reconhece formalmente a importância do trabalho de Chagas e o recebe como membro titular. Na ocasião, ele pronuncia sua primeira conferência sobre a tripanossomíase americana, apresentando projeções cinematográficas sobre os doentes em Lassance.
No ano seguinte, Chagas prossegue divulgando os resultados de seus estudos. Em julho, profere conferência na Sociedade de Medicina e Cirurgia de Minas Gerais e, em agosto, realiza uma segunda conferência na Academia Nacional de Medicina. Em 1912, é a vez da classe médica paulista recebê-lo para uma apresentação sobre a doença descoberta em Lassance.
Consagração internacional
A descoberta da tripanossomíase americana tem, desde o início, grande repercussão na Europa, notadamente na Alemanha, de onde parte o reconhecimento do trabalho de Chagas no exterior.
Em junho de 1911, realiza-se em Dresden, Alemanha, a Exposição Internacional de Higiene e Demografia. No pavilhão brasileiro, a doença de Chagas desperta grande interesse no público, sendo apresentada inclusive através de imagens cinematográficas tomadas em Lassance.
Um ano depois, em junho de 1912, o Instituto de Moléstias Tropicais de Hamburgo distingue Chagas com o Prêmio Schaudinn, conferido de quatro em quatro anos ao melhor trabalho na área de protozoologia.
A partir de então, e durante toda a sua vida, Chagas iria receber diversas homenagens, títulos e condecorações, concedidos por universidades e instituições médicas e científicas em reconhecimento ao mérito de sua obra. Também viajaria muitas vezes, pelo Brasil e pelo exterior, para falar sobre a tripanossomíase americana em aulas, conferências e apresentações em congressos médicos e científicos.
Entre essas viagens, destaca-se a visita aos Estados Unidos, em 1921, onde faz uma série de conferências e recebe o título de doutor honoris causa da Universidade de Harvard, tornando-se o primeiro brasileiro a obtê-lo. A mesma distinção lhe seria concedida em 1926 pela Universidade de Paris. Chagas conquistaria ainda os títulos de membro honorário da Société de Pathologie Exotique da França, da Royal Society of Tropical Medicine da Inglaterra e das Academias de Medicina de Paris, Bruxelas, Roma e Nova York.
Estudos de Chagas e seus colaboradores sobre a doença
A partir da identificação da nova doença, em 1909, até seu falecimento, em 1934, Chagas se dedica a ampliar os conhecimentos sobre a tripanossomíase americana.
Depois da comunicação da descoberta à Academia Nacional de Medicina, Lassance torna-se um posto permanente para o estudo desta e de outras endemias rurais. Em 1912, quando Chagas recebe o Prêmio Schaudinn, Oswaldo Cruz obtém junto ao governo federal verbas para mapear a distribuição geográfica da doença, equipar um pequeno hospital naquela estação ferroviária e iniciar, em Manguinhos, a construção de um hospital destinado a estudar os casos lá recolhidos.
O prosseguimento das pesquisas em Lassance e as investigações realizadas no Instituto Oswaldo Cruz permitem a Chagas desenvolver um estudo completo sobre os aspectos essenciais da nova tripanossomíase. Para isso, conta com a contribuição de vários pesquisadores de Manguinhos, entre os quais se destacam Gaspar Vianna, Arthur Neiva, Eurico Villela, Magarinos Torres, César Guerreiro, Astrogildo Machado, Evandro Chagas e Emmanuel Dias.
Chagas e seus colaboradores identificam as diversas modalidades clínicas da doença, separando-as entre as fases aguda e crônica, descrevem minuciosamente a morfologia e o ciclo evolutivo do agente causal (T. cruzi) no inseto transmissor e no hospedeiro vertebrado e estudam a biologia das várias espécies de barbeiros transmissores. Realizam investigações experimentais, produzem estudos sobre a patogenia (processo de evolução da doença) e a anatomia patológica (estudo das lesões provocadas pela doença por meio de necrópsias), desenvolvem métodos de diagnóstico, analisam o papel dos reservatórios domiciliares e silvestres do T. cruzi e apontam a relevância da doença como flagelo que impedia o desenvolvimento físico e social das populações rurais do país.
Ao longo de suas investigações sobre a tripanossomíase americana, Chagas propõe algumas concepções que, mais tarde, se revelariam equivocadas. Uma delas é a suposição de que o bócio endêmico ou “papo” era uma das manifestações clínicas da tripanossomíase americana. Não obstante, sua obra científica é internacionalmente reconhecida como um novo capítulo da medicina tropical.
A expedição científica à Amazônia
Na década de 1910, o Instituto Oswaldo Cruz promove várias viagens científicas ao interior do país com o objetivo de investigar os problemas médico-sanitários dos “sertões” brasileiros.
Em agosto de 1912, em função da crise do extrativismo da borracha amazônica, o governo federal firma um contrato com Oswaldo Cruz para o estudo das condições de salubridade dos vales dos grande afluentes do rio Amazonas, tendo em vista a elaboração de um plano que permitisse a exploração racional de seus recursos. Assim, entre outubro de 1912 e março de 1913, Carlos Chagas percorre os rios Solimões, Purus e Negro e seus principais afluentes, acompanhado de Pacheco Leão, da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, João Pedroso, da Diretoria Geral de Saúde Pública, e um fotógrafo.
Visitando seringais e povoados ribeirinhos, a comissão examina as condições de vida da população, analisando fatores como abastecimento de água, esgoto, moradia, alimentação, trabalho e assistência médica. Além disso, realiza observações clínicas sobre as diversas doenças incidentes, sobretudo a malária, que atingia com grande gravidade a maior parte dos habitantes. Levanta também informações sobre as principais epidemias ocorridas na região, registra as práticas medicinais utilizadas, captura insetos suspeitos de transmitirem doenças e colhe plantas com possível valor medicinal. No laboratório improvisado a bordo da pequena embarcação que lhe servia de transporte, Chagas examina peixes e outros animais em busca de parasitos e observa ao microscópio amostras e materiais colhidos junto à população.
Em outubro de 1913, Chagas expõe os resultados da expedição na Conferência Nacional da Borracha, realizada no Senado Federal, no Rio de Janeiro. Sua conferência, bem como o relatório apresentado por Oswaldo Cruz ao Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio, oferecem um amplo inventário da situação de abandono médico e social em que viviam as populações da Amazônia, enfatizando a necessidade de medidas sanitárias como instrumento fundamental para viabilizar o desenvolvimento econômico da região.
A grande repercussão das expedições científicas realizadas pelo Instituto Oswaldo Cruz contribui para fortalecer o movimento que, ao longo dos anos 10, busca alertar o governo para a importância do saneamento rural do país e para a necessidade de uma ampla reforma dos serviços de saúde pública brasileiros.
Ampliando as atividades de Manguinhos
Em 14 de fevereiro de 1917, três dias após a morte de Oswaldo Cruz, Chagas é nomeado, por decreto presidencial, para o cargo de diretor de Manguinhos.
Durante sua gestão, que se estenderia até seu falecimento em 1934, o Instituto passa por reestruturações internas e ganha novas atribuições. Busca-se consolidar o modelo estabelecido por Oswaldo Cruz à semelhança do Instituto Pasteur, cujas características fundamentais eram a autonomia administrativa e financeira e a estreita articulação entre a pesquisa, o ensino e a fabricação de produtos destinados à medicina humana e à veterinária, visando atender aos serviços de saúde pública do país.
No campo da pesquisa, a administração de Chagas privilegia a investigação das causas e dos aspectos epidemiológicos e clínicos das endemias rurais. Com esse objetivo, em 1918 é concluída a construção, em Manguinhos, do Hospital Oswaldo Cruz. Além de prestar assistência médica à população, esse hospital – que em 1942 receberia o nome de seu diretor, Evandro Chagas – constitui um importante centro de estudos para os pesquisadores do Instituto.
Chagas é responsável também pela criação de seções científicas, definidas por áreas de conhecimento e com as quais pretendia estabelecer uma divisão de trabalho mais nítida no Instituto. São assim instaladas as seções de Química Aplicada, Micologia, Bacteriologia e Imunidade, Zoologia Médica, Anatomia Patológica, Protozoologia e Fisiologia. Essa nova organização, contudo, não impediria que os pesquisadores, atuando simultaneamente nas áreas de pesquisa, ensino e produção, desenvolvessem atividades que muitas vezes não correspondiam às atribuições formais das seções a que pertenciam.
No que se refere ao ensino, Chagas amplia o programa dos Cursos de Aplicação do Instituto, oferecidos desde 1908 como especialização nas áreas de microbiologia e zoologia médica, visando à formação de pesquisadores no campo da medicina experimental.
Quanto à área de produção, Chagas diversifica a pauta de medicamentos e produtos biológicos fabricados em Manguinhos, entre eles alguns desenvolvidos pelos próprios pesquisadores, e estimula a comercialização destes produtos, ampliando assim a renda própria do Instituto que, desde o período da direção de Oswaldo Cruz, era fundamental ao seu funcionamento. Dentre tais produtos, destacava-se a vacina da “manqueira”, desenvolvida por Alcides Godoy em 1908 para combater o carbúnculo sintomático, doença que atacava o rebanho bovino no Brasil e em vários países sul-americanos.
Uma medida fundamental para a expansão da área de produção do Instituto é a criação, em 1918, do Serviço de Medicamentos Oficiais, destinado a preparar e distribuir a quinina – principal produto utilizado na profilaxia e tratamento da malária – e outros medicamentos. A partir de 1920, o Instituto assume também a responsabilidade pelo controle da qualidade dos produtos utilizados na medicina humana no país, tanto os fabricados por laboratórios nacionais quanto os importados. Outra iniciativa relevante relacionada a essa área é a incorporação a Manguinhos, em 1920, do Instituto Vacinogênico Municipal, responsável pela fabricação da vacina antivariólica.
Gestão Institucional
Com a reforma dos serviços sanitários promovida com a criação, em 1920, do Departamento Nacional de Saúde Pública – órgão dirigido por Chagas até 1926 -, o Instituto Oswaldo Cruz tem preservada a sua autonomia administrativa, permanecendo diretamente subordinado ao Ministério da Justiça e Negócios Interiores. Financeiramente, tal autonomia é assegurada por Chagas através do regulamento aprovado em 1919, segundo o qual a receita gerada por trabalhos realizados em Manguinhos a pedido de particulares seria dividida igualmente entre a instituição e os funcionários que os executassem. Mantendo disposição polêmica criada por Oswaldo Cruz, o novo estatuto estabelece também que os produtos resultantes de invenções patenteadas dos pesquisadores poderiam ser fabricados e vendidos pelo Instituto, cabendo aos inventores uma participação nos lucros obtidos com a comercialização.
Contudo, a expansão das atividades de pesquisa e produção de Manguinhos passa a ser dificultada, no decorrer dos anos 20, por um acúmulo de problemas financeiros. Ao aumento progressivo das despesas correntes da instituição vêm somar-se as crescentes limitações orçamentárias, agravadas pelos efeitos generalizados da crise econômica de 1929. Prejudicando a manutenção e o aperfeiçoamento das instalações físicas e comprometendo os salários dos pesquisadores, tais problemas passam a afetar a qualidade da produção científica de Manguinhos.
Esse quadro de dificuldades se agrava a partir de 1930, quando, pondo fim à estrutura descentralizada da República Velha, o governo chefiado por Getúlio Vargas intensifica a intervenção do Estado na sociedade. A nova orientação da administração pública brasileira traz conseqüências diretas a estrutura e o funcionamento de Manguinhos, que, sob a denominação de Departamento de Medicina Experimental, passa à jurisdição do recém-criado Ministério da Educação e Saúde. A partir desse momento, e até a sua morte, Chagas enfrentaria em Manguinhos os efeitos da perda da autonomia institucional que caracterizou o modelo criado por Oswaldo Cruz.
Combate à epidemia de gripe espanhola
O despreparo dos poderes públicos para enfrentar os problemas de saúde pública do país – há tempos denunciado por médicos-higienistas – revela-se por completo nos últimos meses de 1918, quando o Brasil é assolado pela mais violenta de todas as epidemias que já conheceu: a gripe espanhola. Tendo chegado ao Brasil a bordo do navio S. S. Demerara, que em 21 de setembro aportou no Recife proveniente do porto de Dacar, na África, a epidemia espalha-se, em poucas semanas, pelas principais cidades do país.
Na capital, o grande contingente humano aliado às precárias condições de saneamento e assistência médica potencializam os efeitos da doença. De acordo com dados oficiais, seiscentas mil pessoas (dois terços da população) são atingidas pela gripe e mais de onze mil óbitos contabilizados.
Para enfrentar a gravidade da situação no Distrito Federal, Carlos Chagas assume, a convite do presidente da República, Venceslau Brás, a organização de um serviço especial de criação de postos de atendimento à população. Ao mesmo tempo em que providencia a imediata instalação de cinco hospitais emergenciais e de vinte e sete postos de consulta em diferentes pontos da cidade, busca a colaboração de seus colegas de profissão. Por meio da publicação de anúncios nos principais jornais da cidade, consegue a adesão da grande maioria dos clínicos cariocas e de vários membros da Academia Nacional de Medicina. Conta também com a contribuição de seus companheiros de Manguinhos, que tentam solucionar o problema realizando pesquisas sobre as possíveis causas da infecção.
Até o desaparecimento da epidemia em meados de novembro, Chagas dedica-se integralmente à tarefa que lhe foi confiada. Sua incansável atuação na luta contra a gripe espanhola, combatendo-a no que fora possível, pesaria decisivamente na escolha de seu nome para dirigir a reforma dos serviços de saúde pública do país a partir de 1919.
Na direção do Departamento Nacional de Saúde Pública
A campanha pelo saneamento do Brasil, promovida por intelectuais e médicos-higienistas na década de 10, confere aos problemas de saúde pública, sobretudo às endemias rurais, um lugar de destaque no debate político nacional. Ao tomar posse na presidência da República, em julho de 1919, Epitácio Pessoa declara que a reorganização dos serviços sanitários do país é uma prioridade nacional. Para comandá-la, em outubro seguinte nomeia Carlos Chagas para a Diretoria Geral de Saúde Pública (DGSP).
Em janeiro do ano seguinte, após intenso debate no Congresso Nacional, é aprovada a criação do Departamento Nacional de Saúde Pública (DNSP), subordinado ao Ministério da Justiça e Negócios Interiores. Chagas assume a direção do novo órgão, acumulando-a com suas funções em Manguinhos.
Pautado no princípio da centralização administrativa, o DNSP pretende ampliar o poder de intervenção e regulação da União no campo da saúde pública. Tal orientação rompe com o modelo descentralizado vigente até então, segundo o qual os estados e municípios gozavam de autonomia quanto à organização dos serviços sanitários. Os principais elementos da reforma são expostos por Chagas em conferência pronunciada, em fevereiro de 1921, na Biblioteca Nacional.
A interiorização das políticas de saúde pública visando o combate às endemias rurais – sobretudo à malária, à ancilostomose e à tripanossomíase americana – constitui uma das principais metas do DNSP e, para viabilizá-la, são estabelecidos acordos com estados e municípios. Em paralelo, regulamenta-se um conjunto minucioso de medidas referentes à higiene urbana.
Em sua gestão no DNSP, Carlos Chagas adota medidas destinadas à formação de quadros profissionais especializados na área da saúde pública. Em 1922, com o apoio da Fundação Rockefeller, cria o Serviço de Enfermagem Sanitária, dirigido pela enfermeira norte-americana Ethel Parsons. Como desdobramento desse serviço, funda, em 1923, a Escola de Enfermagem Anna Nery, que, além de introduzir o ensino da enfermagem no Brasil estabelece um sistema profissionalizado de enfermagem hospitalar. Esse sistema é exercido no Hospital São Francisco de Assis, criado pouco antes por Chagas para servir de modelo à modernização dos serviços hospitalares do país.
Ainda em 1925, é criado no Rio de Janeiro o primeiro curso de higiene e saúde pública do Brasil, que garante aos aprovados a nomeação para cargos nos serviços sanitários federais.
Outro aspecto relevante da atuação de Chagas como diretor da saúde pública é a sua participação como representante brasileiro nas reuniões anuais do Comitê de Higiene da Liga das Nações, associação que, sediada em Genebra, daria origem à atual Organização Mundial da Saúde.
Chagas permanece à frente do DNSP até o final do governo de Arthur Bernardes, em novembro de 1926 e, ao longo de sua gestão, as atividades do órgão asseguram a efetiva expansão do papel do Estado na área da saúde pública. A estrutura desse órgão seria, em grande parte, transferida ao Departamento Nacional de Saúde, do Ministério da Educação e Saúde, criado pelo novo regime político instaurado com a Revolução de 1930.
Chagas e o ensino médico
Durante toda sua vida, Carlos Chagas defende uma concepção de ciência médica pautada em dois princípios fundamentais. O primeiro diz respeito à necessidade de uma estreita articulação entre o ensino e a pesquisa científica. Segundo ele, o aprendizado da medicina não deveria se restringir à formação clínica voltada para o atendimento ao doente e sim contemplar também o estudo e a prática dos conhecimentos e métodos da ciência experimental. Isso contribuiria diretamente para a compreensão, o tratamento e a prevenção adequados não só das doenças mais comuns nos consultórios, mas sobretudo daquelas que, de natureza endêmica, se estendiam por todo o território nacional.
Por outro lado, Chagas proclama a importância de se introduzir nos programas dos cursos de medicina o estudo específico das doenças tropicais, declarando-o fundamental para o conhecimento e o combate dos problemas sanitários peculiares ao Brasil, como a malária, a tripanossomíase americana e a ancilostomose.
A orientação expressa nestes princípios, reafirmando as idéias preconizadas por Oswaldo Cruz, propiciaria a formação de profissionais tecnicamente especializados e qualificados para tratar dos problemas de saúde pública brasileiros.
A reforma do ensino promovida em 1925 pelo Ministério da Justiça e Negócios Interiores permite a Chagas pôr em prática tais objetivos, com a criação da especialização em higiene e saúde pública e a introdução da cadeira de Medicina Tropical no ensino médico.
O Curso Especial de Higiene e Saúde Pública, o primeiro do gênero no país, é instituído como curso anexo à Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, embora fosse estreita a vinculação ao Instituto Oswaldo Cruz. Presidido pelo diretor de Manguinhos e ministrado por seus pesquisadores, o curso pretende oferecer aos médicos formados na faculdade um treinamento técnico conforme os conhecimentos científicos da microbiologia. Aos aprovados, estaria garantido o acesso direto, independentemente de concurso, aos cargos da administração federal da saúde pública.
A cadeira de Medicina Tropical, por sua vez, é criada como complemento obrigatório para todos os estudantes que tivessem concluído os estudos na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro. Neste caso, caberia diretamente à direção do Instituto Oswaldo Cruz, na época assumida por Carlos Chagas, as decisões quanto aos conteúdos do curso, à nomeação de professores e às questões regimentais. Para ministrá-lo, o próprio Chagas é nomeado catedrático em maio de 1925, mediante decreto presidencial que, instituindo o critério de “notório saber”, o dispensa da realização de concurso. O início efetivo do curso se dá em setembro de 1926, quando Chagas pronuncia sua aula inaugural. Nesta conferência, ele analisa a influência do clima sobre a ocorrência das doenças, discutindo o conceito de medicina tropical e suas implicações para a saúde pública brasileira.
A introdução tanto do curso de higiene e saúde pública quanto do de medicina tropical torna-se objeto de acirrados protestos por parte de estudantes e professores da Faculdade de Medicina, que acusam os responsáveis pela reforma de estarem ferindo a autonomia da escola com a submissão à ingerência do Instituto Oswaldo Cruz. Dirigidos com especial ênfase à figura de Chagas, tais protestos vêm somar-se às críticas quanto ao grande poder por ele exercido como diretor do Departamento Nacional de Saúde Pública, sobretudo durante a presidência, de forte conteúdo autoritário, de Arthur Bernardes.
Debate na Argentina
Em setembro de 1916, durante o Primeiro Congresso Médico Panamericano realizado na capital argentina, a doença de Chagas é questionada pelo pesquisador alemão Rudolf Kraus, diretor do Instituto de Bacteriologia de Buenos Aires.
Kraus alega que em suas pesquisas na região do Chaco argentino encontrara inúmeros barbeiros infectados com o Trypanosoma cruzi mas, a despeito disso, nenhum caso da doença fora observado. Com base nesse argumento, já havia divulgado em várias ocasiões trabalhos em que punha em dúvida a existência da tripanossomíase americana.
A defesa de Chagas é apresentada em sessão especial do congresso no dia 20 de setembro. Em seu pronunciamento, argumenta que se tratava de uma doença ainda em fase de adaptação ao gênero humano e, por isso, os dados negativos de Kraus poderiam indicar que não se havia completado o ciclo biológico na referida região.
Sua conferência é muito bem recebida pelos participantes do encontro, mas a polêmica sobre a doença de Chagas estava apenas começando. Na verdade, o debate no Congresso de Buenos Aires é o preâmbulo da controvérsia que teria lugar no Rio de Janeiro na Academia Nacional de Medicina em 1923.
Controvérsia na Academia Nacional de Medicina
Entre novembro de 1922 e dezembro de 1923 a Academia Nacional de Medicina é palco de uma grande controvérsia envolvendo a doença de Chagas. A polêmica inaugura-se na sessão de 30 de novembro de 1922, a partir do discurso com que Afrânio Peixoto, professor de Higiene da Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, recebe Henrique Figueiredo de Vasconcellos, pesquisador do Instituto Oswaldo Cruz, como membro honorário da Academia. Na ocasião, o orador refere-se à tripanossomíase americana como “doença inventada” e questiona a importância que lhe era conferida pelos poderes públicos, uma vez que segundo ele não existiam provas concretas de sua extensão para além dos limites de Lassance.
Três anos antes, em conferência na Sociedade de Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro, o próprio Figueiredo de Vasconcellos havia contestado a autoria da descoberta do parasito causador da doença, argumentando que esta não cabia a Carlos Chagas, mas a Oswaldo Cruz, o primeiro a verificar a existência do novo tripanossomo, nos laboratórios de Manguinhos.
Em função do discurso de Peixoto, Chagas solicita através de carta ao presidente da Academia, Miguel Couto, que fosse formada, no âmbito daquela casa, uma comissão destinada a rever seus trabalhos científicos e a manifestar-se formalmente sobre os vários aspectos da tripanossomíase americana que estavam sendo postos em dúvida. Aprovada a proposta, cinco membros da Academia são designados para examinar as questões apontadas por Chagas.
Um ano depois, pouco antes da conclusão deste trabalho, Chagas envia a Alfredo Nascimento Silva, presidente da comissão, uma carta em que protesta contra a alegação feita pelo grupo de que não dispunha de meios para estudar “in loco” a difusão da doença no território nacional e que portanto não poderia avaliar tal questão. A afirmação de Chagas de que tal decisão o impediria de aceitar o parecer a ser apresentado pela comissão faz com que o debate sobre a tripanossomíase americana entre na ordem do dia na Academia.
Por um lado, Figueiredo de Vasconcellos e Parreiras Horta – professor de Parasitologia da Escola Superior de Agricultura e Medicina Veterinária – fazem pronunciamentos em que, representando Afrânio Peixoto, expõem as teses críticas a Chagas. Por outro, Clementino Fraga – amigo pessoal de Chagas e professor da Faculdade de Medicina da Bahia – assume a responsabilidade pela defesa, utilizando, entre outros argumentos, uma carta em que Bento Oswaldo Cruz afirma que seu pai, Oswaldo Cruz, reconhecia explicitamente os méritos de Chagas como descobridor e estudioso da doença que levava seu nome.
Em 23 de novembro de 1923, o parecer final da comissão é apresentado aos membros da Academia e seus termos são, na maior parte, favoráveis a Chagas. A comissão reconhece que a autoria da descoberta pertence efetivamente a Chagas, mas mantém a dúvida quanto à tese por este defendida de que a tripanossomíase americana era uma enfermidade que grassava por vastas regiões do país.
Na sessão de 6 de dezembro de 1923, Chagas profere a conferência em que se pronuncia a respeito das conclusões da comissão. Reafirmando suas concepções, desafia Afrânio Peixoto a percorrer o interior do Brasil em sua companhia para comprovar a gravidade e a extensão da doença por ele questionada.
Peixoto reitera, através de carta lida no plenário da Academia, suas críticas quanto ao que denominava “o mal de Lassance”.
Embora o resultado formal da controvérsia seja favorável a Chagas, as suspeitas lançadas na polêmica permaneceriam até os anos 30, gerando dificuldades ao estudo e à difusão dos conhecimentos sobre a enfermidade no país. Logo após a morte de Chagas, ocorrida em 8 de novembro de 1934, essa situação começa a ser revertida, em conseqüência dos estudos realizados na Argentina, por Salvador Mazza e Cecílio Romaña, e no Brasil, pelos trabalhos desenvolvidos sob a liderança de Evandro Chagas e Emmanuel Dias, pesquisadores do Instituto Oswaldo Cruz.
Estudos na Argentina e no Brasil
Em março de 1929, o médico argentino Salvador Mazza cria, na cidade de Jujuy, a Misión de Estudios de Patología Regional Argentina (MEPRA), ligada à Universidade de Buenos Aires. O grupo de pesquisadores ali reunidos passa a desenvolver uma série de estudos sobre a doença de Chagas nas diferentes regiões daquele país.
Em 1935, a IX Reunião da Sociedade Argentina de Patologia Regional do Norte, realizada na cidade de Mendoza, homenageia Carlos Chagas, falecido no ano anterior. A maioria dos trabalhos apresentados tem como tema a tripanossomíase americana. Dentre estes, destaca-se o de Cecilio Romaña, pesquisador da MEPRA, no qual o inchaço no olho (complexo oftálmico-ganglionar) é descrito como sinal típico da fase aguda da doença. O “sinal de Romaña” – denominação proposta por Evandro Chagas e Emmanuel Dias, presentes ao encontro – seria decisivo para que a incidência e a extensão da enfermidade pudessem ser efetivamente conhecidas, por permitir a fácil e imediata identificação da infecção.
Os trabalhos desenvolvidos nos anos 30 pelo grupo do MEPRA, sobretudo em função da descrição de centenas de casos agudos da tripanossomíase americana, reforçam as evidências de que a doença não estava circunscrita ao Brasil, atingindo também outros países do continente. Desse modo, eles fornecem um relevante impulso às pesquisas que, no Brasil, buscavam dar continuidade à obra de Carlos Chagas.
Evandro Chagas tem papel destacado nesse processo. No hospital Oswaldo Cruz, por ele dirigido, cria em 1935 o Serviço de Estudos de Grandes Endemias (SEGE), com o objetivo de formar profissionais para a investigação, em todo o país, das doenças tropicais, especialmente a malária, a leishmaniose e a doença de Chagas. Além dos trabalhos do SEGE, outros estudos realizados no hospital de Manguinhos são de grande importância para a renovação do interesse sobre a tripanossomíase americana no Brasil, processo que não se interrompe com a morte de Evandro, em 1940.
Tais iniciativas resultam na criação pelo Instituto Oswaldo Cruz, em 1943, do Centro de Estudos e Profilaxia da Moléstia de Chagas na cidade mineira de Bambuí, cuja atuação seria fundamental no esforço pelo reconhecimento da importância social da doença de Chagas e da relevância da pesquisa científica nesse campo.
De volta a Minas Gerais
Em 1940, o pesquisador Amílcar Vianna Martins, do Instituto Ezequiel Dias – criado em 1906 como filial do Instituto Oswaldo Cruz em Belo Horizonte e transferido em 1936 para o governo de Minas Gerais -, publica com alguns colaboradores um trabalho onde são descritos vinte e cinco casos agudos da doença de Chagas na cidade de Bambuí, em Minas Gerais. Desde os estudos realizados em Lassance, é a primeira vez que um número expressivo de portadores da doença é identificado no país.
Com vistas a implementar estudos sistematizados sobre o novo foco, o diretor do Instituto Oswaldo Cruz, Henrique Aragão, instala em novembro de 1943 o Centro de Estudos e Profilaxia da Moléstia de Chagas em Bambuí. A direção do Centro, cujo objetivo é investigar a doença sobretudo do ponto de vista da profilaxia, é entregue a Emmanuel Dias, pesquisador do Instituto Oswaldo Cruz que havia colaborado diretamente com Chagas nos estudos em Lassance. O cargo seria por ele exercido até seu falecimento, em 1962.
Os trabalhos realizados em Bambuí fornecem importantes contribuições de ordem clínica, laboratorial e epidemiológica aos estudos da tripanossomíase americana. No que se refere à investigação clínica, destacam-se os estudos da forma cardíaca realizados pelo cardiologista Francisco Laranja, que demonstram de maneira inequívoca a gravidade e a alta freqüência da cardiopatia crônica entre os portadores da doença de Chagas. Utilizando as modernas técnicas da eletrocardiografia, tais estudos confirmam as concepções de Chagas e permitem a caracterização definitiva da cardiopatia como a principal manifestação clínica da doença em sua forma crônica.
Em paralelo, os pesquisadores do Centro de Bambuí aperfeiçoam um método de diagnóstico sorológico, feito em laboratório, que complementa a identificação dos casos clínicos e possibilita assim a comprovação precisa e em larga escala da incidência da doença entre os habitantes de regiões endêmicas.
O estudo da forma cardíaca e a ampliação dos meios de diagnóstico são fundamentais não somente pelo avanço que propiciam ao conhecimento científico sobre a doença, mas sobretudo porque estabelecem instrumentos empíricos capazes de afastar quaisquer dúvidas quanto à extensão geográfica e à relevância da enfermidade, como as que foram lançadas por ocasião da polêmica enfrentada por Chagas na Academia Nacional de Medicina.
Outra contribuição decisiva dos trabalhos desenvolvidos em Bambuí é a verificação de que a doença de Chagas pode ser efetivamente controlada pela elimininação dos barbeiros transmissores, através do uso de inseticidas e da melhoria das condições de habitação. Embora o próprio Chagas tivesse enfatizado ao longo de toda sua vida a importância de medidas profiláticas nesses termos, até então nada havia sido feito de maneira sistemática neste terreno.
Em 1948, Emmanuel Dias e José Pellegrino publicam um estudo em que relatam o sucesso de suas experiências com inseticidas de ação residual no combate ao barbeiro na região de Bambuí. A partir de então, fica demonstrada a viabilidade do controle da transmissão vetorial da tripanossomíase americana. No ano seguinte o governo federal institui o combate à doença no Brasil, mas, a despeito da disponibilidade de meios comprovadamente eficazes para concretizar tal objetivo, até o final da década de 1970 somente campanhas isoladas seriam implementadas no país.
O Centro de Bambuí – transformado em 1980 no Posto Avançado de Pesquisas Emmanuel Dias – constitui um marco decisivo para a afirmação efetiva da doença de Chagas como problema de saúde pública de grande relevância para o Brasil e para a América Latina, cuja solução se faz possível desde que tratada como prioridade por parte dos governos.
Nos anos 40 e 50, paralelamente ao trabalho pioneiro desenvolvido em Bambuí, multiplicam-se os grupos de pesquisa especializados no estudo da tripanossomíase americana. Em 1959, o Primeiro Congresso Internacional de Doença de Chagas, realizado no Rio de Janeiro, torna evidente que a doença descoberta há cinqüenta anos achava-se finalmente reconhecida como assunto de grande importância social e que a trilha científica aberta por Carlos Chagas deveria ser ampliada e aprofundada na busca de novos caminhos e soluções.
Carlos Chagas – Doença de Chagas
NOÇÕES GERAIS
A doença de Chagas ou tripanosomíase americana foi descoberta pelo médico sanitarista Carlos Justiniano Ribeiro das Chagas – Carlos Chagas – em 1909.
Este brasileiro descobriu a doença e descreveu praticamente todos os seus aspectos. Quando Carlos Chagas realizava uma campanha contra a malária que atingia operários na construção de um trecho da Estrada de Ferro Central do Brasil, ao norte de Minas Gerais, ao fazer exames de uma menina doente, encontrou tripanosomos em seu sangue. Ao examinar posteriormente as fezes de insetos existentes na região e o sangue de animais mamíferos, constatou também a presença dos mesmos parasitas. Desta forma, Carlos Chagas pode descrever o agente causador, o transmissor e o modo de transmissão da doença, como também comprovar a existência de vertebrados que são reservatórios silvestres e domésticos do parasita, esclarecendo assim os aspectos básicos da epidemiologia da doença.
Definição da doença: A doença de Chagas é uma infecção transmissível causada por um parasita que circula no sangue e ataca o coração, bem como órgãos do aparelho digestivo (esôfago e intestino). Sua transmissão exige a participação de um vetor, o triatomíneo conhecido pelo nome de barbeiro, fincão, chupança entre outras dependendo da região. É uma doença do continente americano (sul dos Estados Unidos até a Argentina).
Transmissores: São artrópodes da classe Insecta, ordem Hemiptera, família Reduviidae e subfamília Triatominae. Sugam sangue (hematofágos) em todas as fases de seu ciclo evolutivo. Vivem em média entre um a dois anos, com evolução de ovo, ninfa e adulto, com grande capacidade de reprodução e, dependendo da espécie, com intensa resistência ao jejum.
Ecologia e distribuição
Os triatomíneos têm ampla distribuição geográfica no Novo Mundo, desde os Estados Unidos até o sul do Chile e Argentina, existindo espécies que são tipicamente silvestres; e das 118 espécies conhecidas, 105 são do Novo Mundo.
Todas as espécies são vetoras em potencial para o Trypanosoma cruzi, mas seis têm importância epidemiológica na América do Sul: Triatoma infestans, T. brasiliensis, T. dimidiata, T. sordida, P. megistus e Rhodnius prolixus. A espécie vetora mais importante, devido ao seu hábito quase que estritamente doméstico e também com a mais extensa área de distribuição, é o T. infestans, encontrado na Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Paraguai, Peru e Uruguai. Em algumas localidades do sul do Brasil (Rio Grande do Sul), sul do Peru, Bolívia e algumas localidades do noroeste da Argentina, T. infestans também tem hábito peridoméstico, ocupando galinheiros, currais etc. As colônias em ecótopos artificias têm tendência a se concentrarem nas partes mais altas da parede. Neste gênero, Triatoma, um exemplo típico é dado pelo T. arthurneivai que, habita fendas de pedras e está associado a lagartos e roedores. É encontrado no Brasil nos estados da Bahia, Minas Gerais e São Paulo. No estado de São Paulo, Rodrigues et al. (1992) encontraram adultos da referida espécie em ecótopos artificiais e com infecção natural pelo T. cruzi. Ainda no Brasil, no estado do Rio Grande do Sul, no Uruguai e no norte da Argentina encontra-se outra espécie T. rubrovaria, tipicamente silvestre que convive com roedores em ambientes pedregosos. Apresenta alto índice de infecção natural e invade os domicílios principalmente no verão.
Na Argentina temos mais duas espécies deste grupo que são T. eratyrusiformis e T. patagonica: criam-se em lugares pedregosos e alimentam-se de pequenos roedores, mas atacam o homem e os animais domésticos à noite. T. brasiliensis com altas taxas de infecção pelo T. cruzi é o vetor mais importante no nordeste do Brasil, e pode ser encontrado com alguma freqüência em domicílios. Tem hábitos silvestres e peridomiciliares, onde está associado com abrigo de cabras, galinheiros e ecótopos rochosos; no peridomicílio e domicílio tem as aves como principal fonte alimentar, seguidas por humanos.
A segunda espécie vetora é P. megistus, sendo domiciliada em algumas regiões, peridomiciliar e silvestre em outras. Também tem vasta distribuição geográfica, distribui-se desde as Guianas até a Argentina. É a espécie responsável pelos focos mais intensos da endemia chagásica em Minas Gerais e Bahia (Brasil). Tem hábito silvestre no centro do Brasil e leste do Paraguai e está associado a Didelpbideos, motivo pelo qual os índices de infecção para T. cruzi são elevados. Invadem ocasionalmente domicílios e peridomicílios onde se colonizam com facilidade. P. geniculatus, espécie silvestre que também invade ocasionalmente ecótopos artificiais e tem ampla distribuição geográfica, esta associada a animais com hábitos terrestres (buracos), como é o caso dos tatus. Pode-se citar ainda o P. diasi com distribuição na Bolívia e Brasil nos estados de Goiás, Minas Gerais, São Paulo e Bahia, ocorrendo neste último estado na região da caatinga. P lutzi no nordeste brasileiro e P. tupynambai no Rio Grande do Sul e Uruguai são espécies que nos últimos anos têm sido encontradas com freqüência nas habitações humanas.
T. sordida geralmente é encontrada em ecótopos silvestres e no peridomicílio, invade com freqüência o domicílio, mas é considerada espécie secundária. Tem distribuição no Brasil Central (cerrado), partes do Paraguai. noroeste da Argentina, Uruguai e Bolívia. Tem sido encontrada com baixa taxa de infecção natural, a qual está associada a roedores. T. dimidiata freqüenta o domicílio e é encontrada em diversas tocas silvestres, tais como rocas, grutas ocupadas por morcegos e ocos de arvores, sendo um importante vetor da América Central, México, Colômbia, Equador e norte do Peru.
Outro gênero que pertence a este grupo, cujos adultos invadem ecótopos artificiais, são algumas espécies de Rhodnius, principalmente R. domesticus, que é encontrado na região litorânea do Brasil, R. pictipes nas regiões norte e centro-oeste do Brasil e o R. brethesi, com distribuição no norte do Brasil e Venezuela, tem hábitos silvestres e habita palmeiras de piaçaba (Leopoldinia piassaba), ataca o homem com avidez e, nos últimos anos, tem invadido com freqüência ecótopos artificiais.
R. prolixus é a espécie vetora mais importante da Colômbia e Venezuela, onde tem hábito doméstico, sendo responsável pela transmissão natural da Doença de Chagas. Também é importante em algumas partes da América Central, particularmente em El Salvador, Guatemala e Honduras. No ambiente domiciliar, R. prolixus alimenta-se principalmente de sangue humano e de aves, embora utilize também, como fonte alimentar, cães e gatos. No ambiente silvestre, faz uso de marsupiais e roedores como fonte de alimento. R. pallescens é importante vetora no Panamá, invade casas com freqüência formando colônias e é encontrada também no peridomicílio e em ambientes silvestres em palmeiras. As populações domésticas na área central do Panamá têm como fonte alimentar o homem (59%), seguido por marsupiais e aves domésticas.
No Velho Mundo, são 13 as espécies descritas, necessitando de esclarecimentos epidemiológicos. Não se encontrou nenhuma infectada pelo T. cruzi. A espécie mais conhecida dentre estas é Triatoma rubrofasciata, que é cosmopolita e encontrada em regiões portuárias.
Dada a importância dos gêneros e espécies silvestres de ocorrência em toda a América do Sul, e particularmente em um país como o Brasil, onde além de uma vasta área de matas há uma grande expansão de áreas agrícolas, com retorno de populações para áreas rurais, somando-se a isto o desmatamento que ocorre predatoriamente em toda a América do Sul, torna-se extremamente necessária a consideração destas espécies. Entre as tipicamente silvestres temos espécies do gênero Psammolestes, particularmente P. arthuri com distribuição na Venezuela, P. coreodes ocorre na Argentina, Bolívia, Paraguai e oeste do Brasil e P. tertius tem distribuição limitada ao Brasil (Bahia, Ceará, Goiás, Mato Grosso, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Pernambuco e São Paulo).Outro gênero tipicamente silvestre é o Cavernicola com as espécies C. lenti e C. pilosa, que está associado a morcegos e como ciclo silvestre de transmissão do Tripanosoma cruzi entre morcegos. C. pilosa foi encontrada em domicílios na região de Araçatuba, oeste do estado de São Paulo (Rodrigues, comunicação pessoal). Entre o gênero Triatoma, encontra-se na Argentina, T. delpontei e T. garciabecei ambos habitando ninhos de pássaros e no Panamá T. dispar, que tem hábitos arborícolas e está associado a Choloepus hoffmanni (preguiça). Ainda como estritamente silvestres podem ser citados os gêneros Belminus, Dipetalogaster, Microtriatoma, Parabelminus e algumas espécies do gênero Rhodnius.
Outra espécie do gênero é o R. neglectus encontrado no Brasil nos estados da Bahia, Goiás, Mato Grosso e São Paulo. É uma espécie predominantemente silvestre e tem sido encontrada em palmeiras. Com certa frequência invade as habitações humanas e algumas vezes se encontra infectado pelo T. cruzi.
A infância
Carlos Ribeiro Justiniano das Chagas ou, mais simplesmente, Carlos Chagas nasceu aos 9 de julho de 1878, na fazenda Bom Retiro, em Oliveira, Minas Gerais.
Descendente de uma tradicional família mineira que produzia café e gado, criou-se ali, numa grande casa em estilo colonial, saboreando tutu, feijão-tropeiro e pão-de-milho; doce de leite e queijo fresco; goiabada… Oliveira era uma cidade pequena mas com uma forte tradição de cidadania; o ensino público era muito desenvolvido, havia uma pequena mas atuante imprensa, representada pela Gazeta de Minas. A família de Carlos Chagas tinha marcante presença na vida cultural da cidade. Carlos, que cedo perdeu o pai, respeitava muito seus tios, mas foi sobretudo sua mãe, Mariana Cândida, mulher digna e com muita consciência do dever público, quem o influenciou. Mesmo adulto, Chagas não ousava nem sequer fumar em sua presença – seria falta de respeito.
Iniciou seus estudos num internato jesuíta no município paulista de Itu, e completou-os em São João del Rey, no Colégio São Francisco, onde teve um excelente professor. Padre Sacramento ia para o campo junto com os alunos observar e classificar plantas e animais – atividade que logo despertou no garoto Carlos o interesse pelas ciências naturais. Terminado o colégio, a mãe, com sua peculiar determinação, decidiu que ele deveria seguir o curso de engenheiro de minas. Na verdade, Carlos Chagas queria ser médico, como dois de seus tios; mas, para satisfazer Mariana Cândida, cedeu na escolha. Foi reprovado nos exames vestibulares. Na mesma época, adoeceu – alimentando-se mal, teve, ao que parece, carência de vitaminas – e voltou para casa. Tratou-o um dos tios médicos, e decerto as longas conversas que tiveram reforçaram em Carlos a vontade de seguir medicina. O tio e o avô encarregaram-se de convencer a mãe. Mariana levava mais fé na engenharia – coisa objetiva, “concreta” – do que em cuidar de doentes, mas acabou concordando.
Carlos Chagas foi aprovado para a então Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, que começou a cursar em 1897. Não conhecia o Rio, mas vários amigos, mineiros como ele, viviam na cidade. Um primo, Augusto das Chagas, era inclusive deputado federal.
Foi morar em uma pensão para estudantes na Tijuca, bairro aristocrático, muito bonito e arborizado.
Descobriu logo, porém, que no Rio de Janeiro daquela época a Tijuca era uma exceção: no Catumbi, no Rio Comprido, na Lapa, as casas eram miseráveis, as condições de higiene, péssimas – as doenças ali campeavam. Mas, embora fosse uma época de grande agitação política, Carlos Chagas não se engajou em nenhum partido, tampouco aderiu, como era moda entre os jovens de sua idade, ao pacitivismo que, como vímos na história de Oswaldo Cruz, transformou-se no, Brasil, em uma forma de articulação política. Que a Carlos Chagas não interessava. Pretendia dedicar-se apenas à medicina.
Na Faculdade
O estudo da medicina era uma coisa solene. Os alunos iam às aulas de terno, colete, colarinho duro e gravata – o que, no tórrido clima do Rio, era um suplício.
Os professores vestiam com mais apuro ainda: sobrecasaca ou fraque cinza, chapéu coco.
Ou seja: imitavam os europeus, coisa que Oswaldo Cruz também fez ao votar de Paris. Chegavam à faculdade em elegantes caleches (carruagem de quatro rodas e dois assentos, puxada por uma parelha de cavalos), entravam no auditório – onde já estavam os alunos – por uma porta especial. As aulas eram verdadeiras conferências proferidas em tom doutoral.
Muitos dos catedráticos eram famosos: Chapôt-Prevost , professor de Histologia (a ciência que estuda os tecidos) e conhecido cirurgião, celebrizou-se com a dificílima operação em que separou gemêas xipófogas, unidas pelo esterno (o osso no centro do peito). Também famoso era Miguel Couto (1865-1934), grande clínico e também mais tarde político, de quem Chagas se tornou discípulo; Couto mostrava-lhes casos de doentes e orientava-o nas leituras médicas.
Um conselho foi particularmente útil: as recomendações para conhecer as obras de Claude Bernard e Louis Pasteur. Esses dois cientistas franceses marcaram a história da medicina.
A propósito, Chagas era um grande leitor. Devorava as obras de José de Alencar, Bernardo Guimarães, Artur de Azevedo, Machado de Assis, e também de Alexandre de Herculano, Eça de Queiroz, Anatole France. Lia inclusive em francês, que dominava, e que era, o idioma da cultura universal, o equivalente ao inglês nos dias de hoje. E este vasto conhecimento, sem dúvida, ajudou muito em sua carreira. Um bom cientista é aquele que não apenas conhece o campo em que trabalha, a sua especialidade, mas tem também uma visão abrangente do mundo e da sociedade, coisa que bons escritores, como Machado de Assis, proporcionam.
Além de Miguel Couto, um outro médico influenciou o jovem Carlos Chagas: Francisco Fajardo, especialista em malária, professor da Faculdade. Fajardo tomou a iniciativa de dar um curso sobre a doença; para isso, precisava de um auxiliar, alguém que soubesse preparar uma lâmina com sangue de pacientes, identificando, ao microscópio, o agente causador da malária. Descobriu, para a sua surpresa, que Carlos Chagas, entao no quarto ano de Medicina, cumpria perfeitamente tais tarefas. Aliás, Carlos era um estudante exemplar; não apenas no laboratório se saía bem, seguia com maestria também nas disciplinas clínicas. Trabalhou com dedicação assombrosa nas enfermarias da Santa Cruz. Fazia contínuos plantões, chegando, certa vez, a passar uma semana sem ir para a casa; acompanhava um colega enfermo de febre amarela, seu parente, que veio a morrer da doença. Entre os colegas, era conhecido como “estudante de duas velas”. Naquela ocasião, estudava-se à luz de velas – duas, no caso de Carlos Chagas, o que significava um longo tempo de estudo. Só saía para passeios ao zoológico.
Carlos Chagas “o duas velas”. Desenho de Sérgio Kon
Contudo, foi uma festa que lhe mudou a vida. A convite de Miguel Couto, participou numa reunião em casa do senador (por Minas Gerais, naturalmente), Fernando Lobo. Ali conheceu Íris, a filha mais velha do anfitrião, por quem se apaixonou. Numa época muito recatada como aquela, namorar não era fácil.
Mas Carlos foi ajudado por Fajardo, que lhe trouxe um bilhete da moça: ela queria vê-lo, no domingo, no bonde que passava as quatro da tarde em frente a casa do senador.
E foi o que Carlos fez: tomou o bonde para que Íris o visse, mesmo de longe. Esse namoro a distância durou algum tempo, muito prejudicado pela irregularidade do horário dos veículos, que eram puxados por inconfiáveis muares ou se atrasavam por causa das chuvas. A mãe de Íris também não se mostrava muito favorável ao romance. Carlos Chagas era ainda estudante, sem meios de ganhar a vida. Além disso, a racista Maria Lobo suspeitava de que ele, apesar de loiro e de olhos azuis, tivesse sangue negro. Íris, contrariada em seu amor, trancou-se no quarto, onde fez greve de fome. Os pais por fim consentiram no namoro, que por fim se transformaria, em 1904, em casamento.
Em 1902, prestes a terminar o curso, Carlos Chagas encontrou um médico que encaminharia sua carreira. Naquela época, para receber o diploma, era necessário elaborar uma tese de doutoramento – uma exigência depois abolida, sobretudo pela má qualidade dos trabalhos apresentados. A conselho de Francisco Fajardo, procurou Oswaldo Cruz no Instituto de Manguinhos, por ele dirigido. Impressionado com o conhecimento e com a seriedade do jovem doutorando, Oswaldo sugeriu-lhe que estudasse a malária que era então, como ainda hoje, uma doença muito frequente e que causava numerosas mortes.
Carlos Chagas começou a frequentar o Instituto. Hoje, o trajeto do centro do Rio até a sede do Instituto pode ser feito de ônibus ou carro, em pouco tempo.
Naquela época, porém, o “único meio de transporte era uma lancha que saía do cais Pharoux (o Cais Pharoux ficava aproximadamente onde hoje são as adjacências da região da Praça XV; nas proximidades de onde está o Museu Histórico Nacional) às sete da manhã, regressando às dezoito horas. E Oswaldo Cruz fazia questão que o horário fosse cumprido rigorosamente.
Começando a carreira
A tese foi defendida em 1903, e logo depois Oswaldo Cruz convidou-o para trabalhar no Instituto. Carlos, entretanto, achava que sua verdadeira vocação era cuidar de doentes; assim, pediu tranferência para o Hospital de Jurujuba, também do governo, onde internavam-se doentes portadores de peste bubônica – à época, uma doença muito comum. A o mesmo tempo, abriu consultório no centro do Rio. Recebia doentes que lhe eram enviados por Miguel Couto e por Salles Guerra, amigo de Oswaldo Cruz. Era um bom médico, mas não sabia cobrar; ao contrário, às vezes dava dinheiro aos pacientes para que comprassem os remédios por ele prescritos. Em consequência, a clínica não lhe cobria as despesas, mesmo porqque àquela altura já estava casado e tinha um filho.
Foi então que ocorreu uma nova, e decisiva, virada em sua vida. A Companhia Docas de Santos estava realizando, em Itatinga, no litoral paulista, uma importante obra portuária – que se viu paralisada devido a malária que grassava entre os operários. Solicitaram a Oswaldo Cruz que indicasse um médico capaz de enfrentar a situação. Carlos Chagas – por causa, evidentemente, de sua tese sobre malária – era a pessoa talhada para isso.
Àquela altura, já se conhecia bem o mecanismo de transmissão, e o plano de Carlos Chagas consistia basicamente em combater o mosquito transmissor da doença, o que foi feito com grande êxito: em três meses a epidemia estava praticamente controlada.
Voltando ao Rio, Chagas foi convidado para trabalhar na equipe de Manguinhos, capitaneada por Oswaldo Cruz. Com notáveis cientistas – Rocha Lima, Arthur Neiva, Beaurepaire Aragão, Ezequiel Dias – e com a regular participação de pesquisadores europeus especialmente convidados, Manguinhos era a própria imagem da medicina científica no Brasil. Chagas colaborou especialmente com Max Hartmann, renomado especialista em protozoários, categoria na qual se enquadra o plasmódio, agente causador da malária. Também continuou com seu trabalho de campo, participando do combate à malária no vale de Xerém, de onde era captada a água para abastecimento do Rio de Janeiro.
A grande descoberta
Em 1909, Chagas foi convidado para um trabalho que, em aparência semelhante aos que já havia executado, seria, na verdade, uma nova e grande oportunidade em sua vida dedicada à ciência.
A Estrada de Ferro Central do Brasil participava de um grande projeto: unir, por ferrovia, o norte e o sudeste do Brasil, de Belém do Pará ao Rio de Janeiro. As obras, contudo, estavam paralisadas – por causa da habitual malária – na altura do vilarejo chamado Lassance, no sertão mineiro. De novo Oswaldo Cruz foi consultado; de novo indicou Carlos Chagas, que partiu para o local acompanhado de Belisário Penna, levando inclusive equipamento laboratorial.
Em Lassance, Chagas encontrou numerosos casos de uma doença que nada tinha a ver com a malária.
Muitas pessoas queixavam-se daquilo que chamavam de “baticum”:palpitações, sensação de que o coração não batia normalmente. E não era imaginação.
Havia mesmo muitos casos de insuficiência cardíaca, isto é, situações em que o coração falhava. E havia também casos de morte súbita, provavelmente pela mesma causa.
Naquela época o diagnóstico que se fazia para casos assim era o de sífilis. Esta doença é causada por um germe chamado treponema, que se transmite pelo contato sexual. Nos estágios avançados, a doença ataca o aparelho cardio-vascular. Era muito freqüente, principalmente porque não havia tratamento – a penicilina, que é muito eficaz contra o treponema, ainda não fora descoberta. O número de casos era muito grande; “no Brasil é preciso pensar sifiliticamente”, diziam os médicos.
Em Lassance havia uma fonte evidente de contágio: as prostitutas que acorriam ao lugar para “atender” aos trabalhadores da estrada de ferro.
Já a gente do lugarejo, desnutrida, enfraquecida pela malária, não parecia muito chegada ao sexo. E, entre essas pessoas, o número de doentes era muito grande.
Esse fato chamou a atenção de Chagas e mostrou sua vocação – o verdadeiro cientista é aquele que não se deixa enganar pelas aparências, vai além e procura explorar todos os aspectos do fenômeno que está observando, inclusive, e principalmente, os mais intrigantes. Isso lembra, aliás, um famoso diálogo entre Sherlock Holmes e seu companheiro, doutor Watson. Sherlock Holmes é um personagem criado pelo inglês Arthur Conan Doyle, que além de escritor era médico, e exerceu a medicina numa época em que se valorizava bastante o raciocínio na prática clínica. O doutor muitas vezes agia como um verdadeiro detetive, buscando o vilão causador da doença. No referido diálogo, Holmes está conversando com Watson acerca de um crime e refere-se ao “curioso incidente” ocorrido à noite com o cão de guarda da casa que fora cenário do delito. “Mas o cão não fez nada”, protesta Watson. “Isto é que é curioso”, replica Holmes. De fato, o cão deveria ter latido à aproximação de alguém estranho. Por que não o fez?
Essa mesma curiosidade assaltou Chagas. O senso comum apontava para a sífilis; mas, e se não fosse sífilis? Se fosse uma outra enfermidade? Uma outra doença? O que estaria causando? Como seria transmitida?
Chagas estava às voltas com essa dúvidas, quando um engenheiro da estrada de ferro, Cantarino Motta, fez um comentário sobre a enorme quantidade de “barbeiros” no local.
Barbeiro é a denominação para insetos semelhantes a percevejos; são bichos noturnos: de dia escondem-se nas frinchas e frestas das casas de taipa ou pau-a pique, à noite saem para picar os moradores, de cujo sangue se alimentam. Como as pessoas em geral estão cobertas, eles escolhem a face – daí o nome.
Examinando ao microscópio o conteúdo do tubo digestivo desses insetos, Chagas fez uma grande descoberta: havia ali tripanossomos, um parasita composto de uma célula só. Na África, um certo tipo desse parasita causa a doença do sono, assim chamada pela sonolência decorrente do comprometimento do sistema nervoso central. Naquela época, essa moléstia estava em evidência; muitas regiões atingidas eram colônias de países europeus, que para lá mandavam seus pesquisadores.
Ora, a doença de Lassance poderia ser causada por um tripanossomo. Chagas decidiu verificar experimentalmente, em macacos, a possível capacidade de esse parasita infectar mamíferos. Mas os sagüis da região, freqüentemente infectados, não serviam para isso. Enviou, então, a Oswaldo Cruz alguns barbeiros, pedindo que tentasse infectar os macacos do laboratório – o que Oswaldo fez. Vários dias se passaram, dias de espera ansiosa.
E então chegou a mensagem de Manguinhos: um dos macacos adoecera. Chagas deveria ir a Manguinhos identificar o tripanossomo. Partiu imediatamente.
“Quantas esperanças e quantas angústias lhe terão assaltado o espírito na longa viagem que empreendeu?”, pergunta Carlos Chagas Filho no livro que escreveu sobre o pai. E era, de fato, uma longa viagem, com muitas baldeações e atrasos. Finalmente chegou. Oswaldo Cruz, tão ansioso como Chagas, mandara um automóvel buscá-lo na estação ferroviária, de onde imediatamente seguiu para o Instituto. Ali estava o macaco infectado, bastante debilitado.
O cientista colheu o sangue e examinou ao micrscópio: encontrou o mesmo tripanossomo a que verificara nos barbeiros e nos macacos de Lassance, posteriormente denominado Tripanossomo cruzi, em homenagem a Oswaldo.
A infecção de mamíferos pelo T. cruzi estava comprovada. E quanto à infecção de seres humanos?
No dia 14 de fevereiro de 1909, foi trazida ao caramanchão onde Chagas às vezes atendia pacientes – consultório ali não havia – uma menina de nove meses, Berenice, que ele já conhecia e por quem nutria sincera afeição. A menina apresentava febre alta e inchume no rosto e no corpo. O caso não era parecido aos de outros doentes de Lassance; mesmo assim Chagas resolveu colher o sangue da doentinha. Examinou-o ao microscópio e ali estava o Tripanossomo cruzi.
Era o primeiro caso em que comprovava a associação do parasito com a doença – e com isso Chagas completava um trabalho extraordinário, jamais realizado na medicina: ele descobrira uma nova doença, identificara o agente causador e o mecanismo de transmissão.
Carlos Chagas
A repercussão
O passo seguinte era divulgar a descoberta, o que Chagas fez em revistas nacionais e estrangeiras. A Academia Nacional de Medicina constituiu uma comissão de renomados médicos para ir a Lassance avaliar de perto o trabalho.
Concluída a auditoria, reuniram-se num modesto jantar, à luz de lampiões, e foi ali que Miguel Couto propôs: a doença deveria receber o nome de Chagas, seu descobridor. Uma proposta que foi aceita por todos os membros da comissão.
Sem demora a doença começou a ser identificada em outros países das Américas. Sucederam-se as homenagens, que culminaram, em 1912, com o Prêmio Schaudinn, uma espécie de Nobel da microbiologia, de cujo júri participaram os nomes mais famosos da área.
Outro talvez ficasse curtindo a glória. Não Chagas. Ele era um cientista, a ciência era a razão de ser de sua vida. Naquele mesmo ano seguiu para a Amazônia acompanhado de uma equipe, a fim de realizar um levantamento dos problemas de saúde da região – trabalho iniciado pelo próprio Oswaldo Cruz. Um ano durou essa difícil missão, realizada em condições as mais precárias; muitas vezes dormia ao relento, em redes ou em camas improvisadas.
Voltando ao Rio, foi convidado a ir à Argentina, onde sua descoberta era colocada em dúvida por ninguém menos que Rudolph Kraus, diretor do Instituto de Bacteriologia de Buenos Aires. Kraus alegava ter encontrado em regiões da Argentina barbeiros com tripanossomos – sem a paralela ocorrência de casos. Chagas ponderou que o parasito talvez ainda não tivesse se adaptado aos seres humanos, ou – hipótese mais provável – que os médicos não estivessem familiarizados com o diagnóstico da doença.
Durante esta visita à Argentina ocorreu um incidente pitoresco.
Chagas foi visitar o laboratório de Kraus e saiu de lá com um enorme sobretudo, que lhe chegava aos pés: era o sobretudo do próprio Kraus, que levara por engano. Chagas era o protótipo do cientista distraído, desses que até se transformam em personagens de anedotas. Uma vez, em sua própria casa, a empregada serviu-lhe um café. Ele tirou dinheiro do bolso e depositou-o na bandeja, “pagando” pelo café. Numa outra vez, recebeu a visita de um jovem médico que vinha, com a esposa, agradecer-lhe um favor e demorou mais que o habitual nessas visitas.
Lá pelas tantas, Chagas, esquecendo que estava em sua própria casa, olhou as horas e disse à mulher: “Íris, está na hora de voltar para a casa”. Mas sua distraçao chegou ao auge quando, numa cerimônia internacional em Bruxelas, recebeu do rei Alberto, da Bélgica, uma importante condecoração – esqueceu-a na mesa do banquete. Um ajudante-de-ordens do rei levou-a depois para o hotel.
Neste episódios ele poderia estar sendo vítima de seu próprio inconsciente, como diz Freud. Afinas, raras coisas são piores do que uma visita chata – e talvez ele não valorizasse tanto assim a condecoração real (ou não valorizasse como devia o próprio trabalho).
Chagas, o administrador de saúde
Voltando da Argentina, recebeu uma triste notícia: Oswaldo Cruz, que há tempos estava doente, piorara muito e falecera a 11 de fevereiro de 1917. Para Chagas, quemal conhecera o seu próprio pai, Oswaldo Cruz havia sido, mais que um mestre, uma verdadeira figura paterna. Ficou muito abalado. Mas, sendo o sucessor natural do grande sanitarista, naquele mesmo fevereiro foi nomeado para a direção do Instituto. Isso o obrigou a se afastar da pesquisa laboratorial; daí em diante seria, antes de mais nada, um administrador. E um administrador muito solicitado pelo governo.
Já no ano seguinte eclodiu no país uma epidemia da tristemente famosa gripe espanhola (não se sabe bem por que assim foi denominada; parece que começou na Espanha, mas isso não é certo). Da Europa devastada pela Primeira Guerra, a doença alastrou-se pelo mundo, levada inclusive pelas tripulações de navios. No Rio de Janeiro, a doença fez logo numerosas vítimas.
Numa tese do ano posterior, conta o doutorando Eduardo Imbassahy: “A população quase inteira tombou ao sopro terrível e fulminante que nos vinha das plagas ocidentais e, de um momento para outro, uma das mais alegres cidades do mundo surgiu silenciosa, erma e triste, com as ruas abandonadas, as casas fechadas, o comércio parado, os veículos imóveis”. Não havia sequer condições para enterrar o grande número de mortos; presos da penitenciária faziam o serviço. Faltavam caixões, de modo que os corpos eram atirados em valas comuns, ou recolhidos por caminhões particulares que passavam pelas ruas, os motoristas gritando” “Tem cadáver aí?”.
Não havia vacina contra a doença, nem antibióticos para tratar suas complicações. Tudo o que podia ser feito era providenciar locais de atendimento e leitos hospitalares para os enfermos, tarefa da qual Chagas, designado pelo Presidente da República, Venceslau Brás, se encarregou.
Era um trabalho essencialmente administrativo, mas muito difícil: Chagas, ele próprio doente, tinha também de cuidar de sua família, a esposa, gravemente enferma, e os dois filhos. Mas ele se saiu tão bem, que foi convidado por líderes políticos a candidatar-se ao senado. Recusou.
Ainda nessa época, encarregou-se de organizar, na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, a cadeira de Medicina Tropical. “Medicina Tropical” é uma expressão que já não se usa mais (em Manaus existe o Hospital de Medicina Tropical), mas no século XIX e princípios do século XX gozava de prestígio, por uma razão mais política do que geográfica: “trópicos eram os lugares onde se desenvolviam arrojados empreendimentos colonialistas ou empresariais – mineração, exploração de produtos vegetais, construção de ferrovias e de grandes obras, como o Canal do Panamá. Doenças chamadas “tropicais”, como febre amarela, malária, doença do sono, leishmaniose e outras, representavam um problema, tanto pelas vidas humanas que ceifavam, como pelos prejuízos econômicos que produziam. Com o fim dos impérios coloniais e com a constatação de que os micróbios não tinham preferência só pelos subdesenvolvidos, surgiu a expressão, cientificamente mais exata, doenças transmissíveis.
A glória – e a polêmica
O prestígio de Chagas era enorme. Viajava pelo mundo todo, participando de congressos e reuniões científicas. Recebeu comendas e títulos, conferidos por vários governos, e foi convidado para o Comitê de Higiene (outro termo em desuso) da Sociedade das Nações, precursora da Organização das Nações Unidas, ONU, que tem como um de seus ramos a Organização Mundial da Saúde. Nessas viagens, ficou conhecendo expoentes da medicina mundial.
Foi em Toronto que encontrou os médicos e fisiologistas canadenses Frederick Banting (1891-1941) e Charles Best (1899-1978) que, alguns meses antes de sua visita, haviam descoberto a insulina – uma revolução no tratamento do diabete. Coincidência:pouco depois, a própria esposa de Chagas revelou-se diabética e tratou-se, com sucesso, com a insulina de Banting e Best.
Apesar desse prestígio, ou justamente por causa dele, Carlos Chagas se viu envolvido em polêmicas e incidentes desagradáveis. A primeira delas ocorreu na Academia Nacional de Medicina em 1922. Alguns membros da instituição – que congregava médicos famosos, mas tinha escasso papel no cenário científico – colocaram em dúvida o trabalho de Chagas. A doença por ele descrita não existiria, ou então seria um problema de saúde restrito à região de Lassance, atingindo no máximo algumas dezenas de pessoas. Essa polêmica estava associada, na verdade, a uma briga de poder e prestígio, mas Chagas saiu vitorioso, mesmo porque o tempo encarregou-se de mostrar que ele tinha razão.
Outro incidente ocorreu quando voltava de uma viagem à Europa, em 1930. Mal o navio atracara, um oficial subiu a bordo e deu-lhe voz de prisão. Naquele ano ocorrera a famosa Revolução que conduziu Getúlio Vargas ao poder. Mineiro, Chagas dera apoio à Aliança Liberal, formada por políticos de seu estado e de São Paulo, que se haviam oposto ao movimento. Entretanto, o motivo de sua prisão (que durou poucas horas) não foi exatamente esse, mas a denúncia de um médico, um urologista que tinha como sócio um charlatão capaz, segundo afirmava, de curar a lepra, doença para a qual não havia tratamento eficaz naquele tempo. Chagas, na qualidade de Diretor de Saúde Pública, cargo também exercido por Oswaldo Cruz, mandar fechar o consultório do homem – que aproveitou a primeira oportunidade para se vingar.
Chagas era criticado por vários motivos. Por exemplo, pelos três cargos que detinha.
Austragésilo de Athayde, mais tarde presidente da Academia Brasileira de Letras e, à época, jovem jornalista, escreveu: “O dr. Chagas quer figurar em todas as folhas de pagamento do Tesouro Nacional: Diretor do Instituto de Manguinhos, Diretor do Departamento Nacional de Saúde Pública, professor de Doenças Tropicais da Faculdade de Medicina.” O que não deixava de ser verdade, embora Chagas não recebesse como diretor do Instituto.
Além disso, até há pouco tempo era comum que médicos trabalhassem em vários lugares mesmo no serviço público: a Constituição permitia.
Da era Oswaldo Cruz, Chagas também herdou polêmicas.
Uma: a vacinação anti-variólica obrigatória que ele, como seu mestre, defendia. A varíola era uma doença epidêmica da qual o mundo veio a se livrar no final da década de 1960 graças, exatamente, às campanhas de vacinação; naquele tempo, porém, ainda havia discussões a respeito. Dois tipos de argumento eram usados.
Na Alemanha, onde a vacinação era obrigatória, dizia-se que a varíola tinha causado 140 mil mortos, uma meia verdade: a vacina era obrigatória, sim, mas só para militares, e os mortos eram civis. Quando a vacinação estendeu-se a toda população, a doença praticamente desapareceu.
O outro argumento, já mencionado, era de ordem filosófica e política: a obrigatoriedade violentava a liberdade individual. Mas, observava Chagas, “os que aconselham o povo a rebelar-se contra a vacinação compulsória vacinam-se e fazem com que seus filhos sejam vacinados”.
Ou seja: faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço. De qualquer maneira, havia um certo ranço autoritário nessas medidas obrigatórias, e esta foi a causa da disputa em torno do Código Sanitário que Chagas, na linha de Oswaldo, estava propondo.
É preciso dizar que, nesse meio tempo, a Diretoria Nacional de Saúde Pública se tinha transformado, em 1920, por decreto do presidente Epitácio Pessoa, em Departamento Nacional de Saúde Pública, o que representava mais autonomia e mais recursos. Na direção do Departamento, Chagas tomou dois tipos de medidas.
Uma de caráter interno, criando Diretorias que deveriam se encarregar dos vários problemas de saúde pública: fiscalização dos alimentos, tuberculose, lepra, doenças venéreas. Eram atividades verticais; do Rio de Janeiro, o orgão encarregado controlava as ações executadas em todo o país. A vantagem disso era a ação unificada; a desvantagem, o fato de marginalizar estados e municípios, que se viam no papel de meros executores.
A outra medida foi o Código Sanitário. Com 1194 artigos, o Código regulamentava – do ângulo da saúde pública – praticamente todas as atividades do ser humano. Dizia como as pessoas devem morar, como devem lavar a roupa, como devem construir as casas.
De novo: do ponto de vista técnico e científico, o código tinha fundamento, mas a maneira como foi implementado acabou gerando protestos, inclusive e principalmente da imprensa, que o atacava quase com a mesma veemência despejada contra Oswaldo Cruz. Um dos artigos, por exemplo, proibia estábulos em áreas residenciais.
Dizia-se que Chagas estava agindo em causa própria: queria eliminar um estábulo que existia perto de sua própria casa, na Rua Paissandu. Proprietários de estábulos, indignados, quase invadiram a residência dele.
Problemas ainda maiores surgiram no final de sua gestão, em 1926. O primeiro deles foi um surto de febre amarela, resultado, segundo os opositores de Chagas, de um desleixo no combate à doença que, contudo, não havia sido erradicada. A erradicação de uma doença significa a não existência de casos. É diferente de controle da doença, situação na qual os casos existem, mas a saúde pública tem conhecimento deles e pode impedir a disseminação da doença. A febre amarela chegou, em alguns momentos, a estar próxima do controle, mas nunca foi erradicada. Portanto, poderia voltar – como aconteceu, e como tem acontecido recentemente.
O segundo problema foi igualmente grave: um surto de varíola eclodiu quando Chagas estava em viagem. Regressando, ele investigou o problema e descobriu, para sua desagradável surpresa, que a vacina não funcionava por deficiências técnicas em sua preparação.
Não hesitou: foi à imprensa e contou o que estava acontecendo. Mais uma prova de seu inabalável caráter.
Morreu relativamente cedo, aos 54 anos, já transformado em uma figura lendária da Medicina e da Ciência no Brasil.
Fonte: ctjovem.mct.gov.br/br.geosities.com/www.museudavida.fiocruz.br