por Roberto Navarro
Era uma verdadeira usina da morte, montada pelos nazistas durante a Segunda Guerra para promover a aniquilação em massa de pessoas indesejáveis na Alemanha e nos territórios invadidos. A função básica desses lugares era o assassinato coletivo de judeus e outros grupos considerados "anti-sociais" - ciganos, dissidentes políticos, prisioneiros de guerra, homossexuais, deficientes físicos e mentais, andarilhos e mendigos. Sabe-se que a matança em massa de judeus começou em 1941. "A morte era sempre por gás venenoso. Em Chelmno, o primeiro dos campos de extermínio, havia furgões adaptados, em que o monóxido de carbono do escapamento entrava no interior do veículo e matava seus ocupantes", afirma o historiador Ney Vilela, da Unesp de Bauru. Quase todos os campos de extermínio foram construídos na Polônia. O maior deles, o de Auschwitz (que serviu de inspiração para o infográfico destas páginas), nasceu em 1940 em uma região rural no sul do país. Ocupando uma área de 40 km2, Auschwitz era um misto de campo de concentração - que servia de prisão para inimigos dos nazistas -, campo de trabalho escravo e campo de extermínio. O total de mortos nesses lugares é incerto, mas pode ter chegado a 3,8 milhões de pessoas, 1,1 milhão em Auschwitz. Os assassinatos coletivos só acabaram com a derrocada alemã, em 1945. Calcula-se que 80% das pessoas envolvidas nesses crimes escaparam de qualquer punição.
Arquitetura da destruição
TERMINAL DA MORTE
A estação de trem era a porta de entrada para Auschwitz, misto de campo de concentração, de extermínio e de trabalhos forçados. Os passageiros chegavam em vagões de carga superlotados, sem água, nem comida e em condições precárias de higiene - um balde em cada vagão servia de latrina
MORTOS-VIVOS
Depois de desembarcar, os prisioneiros tinham seus bens confiscados e eram examinados por médicos. Os mais fortes iam para a área de trabalhadores escravos. Mas entre 70% e 75% dos recém-chegados eram mandados direto para a morte nas câmaras de gás
CASA DO DESESPERO
A maioria dos prisioneiros de Auschwitz ficava em um dos 300 prédios de "moradia" do complexo. Infestados de ratos e vermes, esses ambientes abafados e sem água corrente abrigavam até mil presos cada um, que dormiam de lado para caber em camas coletivas de madeira para dez pessoas
DE VOLTA AO PÓ
Depois da asfixia, os corpos dos mortos seguiam para a cremação em fornalhas. A fumaça da queima deixava o complexo com um cheiro de carne queimada, enquanto as cinzas eram pulverizadas ou usadas em plantações. Estima-se que 4 700 pessoas podiam ser cremadas por dia em Auschwitz
GÁS FATAL
A morte acontecia em 4 câmaras de gás subterrâneas - as vítimas eram mandadas prá lá com a desculpa de que iam tomar um banho de desinfecção. De chuveiros falsos no teto saía o gás venenoso zyklon B, usado como inseticida. A asfixia durava de 3 a 20 minutos e podia matar até 2 mil pessoas por câmara
DÁ CÁ O TEU
Numa área junto ao campo principal de Auschwitz ficava um depósito onde se armazenavam os bens confiscados dos prisioneiros - sapatos, roupas, jóias, dinheiro, óculos ou qualquer objeto de valor. A maioria dessas coisas era mandada para os nazistas na Alemanha
MEDICINA MACABRA
Vários tipos de barbaridades médicas rolaram em Auschwitz. Prisioneiros foram infectados com doenças contagiosas, grávidas tiveram o útero destruído, crianças receberam produtos químicos nos olhos (aparentemente para mudar sua cor) e cadáveres foram dissecados para testes genéticos
JÁ PRO PAREDÃO
Nos barracões conhecidos como "quarteirão da morte" ficavam detidas as pessoas que perturbassem a ordem em Auschwitz. Lá dentro, os prisioneiros eram torturados e submetidos a julgamentos sumários. Depois, eram fuzilados no muro de execução, uma parede perto dos barracões
VELÓRIO ROUBADO
Quando todas as vítimas estavam mortas, alguns dos próprios prisioneiros entravam na câmara usando roupas especiais para retirar os mortos. Em seguida, usavam-se maçaricos para derreter o ouro das obturações de dentes dos mortos, produzindo de 5 a 10 quilos do metal por dia
Fonte: http://mundoestranho.abril.com.br/materia/como-era-um-campo-de-exterminio
29.1.15
Como era um campo de extermínio?
Qual o tamanho da fortuna de Hitler?
por Tiago Cordeiro
Cerca de 3,5 bilhões de euros em valores atuais. Pelo menos é essa a quantia que investigações recentes apontam como verdadeira. O salário mensal do Führer era de apenas 1.500 marcos alemães (4.725 euros hoje), mas ele tinha diversas outras fontes de renda, como os direitos autorais de seu livro e cachês por discursos. Horas antes de se matar, o ditador fez um testamento apontando os herdeiros de seu patrimônio, mas sem explicitar quanto dinheiro tinha. Depois de três anos de investigações após o fim da 2ª Guerra, os países aliados concluíram que o Führer havia deixado em torno de 200 mil marcos alemães (630 milhões de euros hoje). Foi só décadas depois que se descobriu que o valor era quase seis vezes isso. Na Europa arrasada pela guerra, provavelmente Hitler era o homem mais rico do continente. Hoje, no entanto, ele ficaria só no 325º lugar na lista das pessoas mais ricas do mundo feita pela revista Forbes.
Dinheiro sangrento
Saiba como Hitler ganhava sua grana
SHOWMAN
O Führer exigia cachê para fazer seus discursos. Na época, ele também cobrava do Partido Nazista (o qual havia fundado) direitos autorais pelo uso de suas fotos. Desde 1923 seu fotógrafo exclusivo, Heinrich Hoffmann, tinha uma agência para gerenciar as imagens de seu cliente. Hitler dizia que saiu da cadeia, em 1924, sem um centavo no bolso - mas a grana estava escondida
BEST-SELLER FORÇADO
Ao chegar ao poder, em 1933, o comandante decidiu doar seu livro Minha Luta a todos os recém-casados. O governo, então, tinha que comprar as obras para distribuí-las. Foi a sacada que deixou o ditador rico. Hitler chegou a ganhar 1 milhão de marcos por ano em direitos - e sem pagar impostos. Até 1945, doaram-se mais de 10 milhões de exemplares
DOAÇÕES A RODO
Admiradores de Hitler deixaram, em seus testamentos, bens e dinheiro ao líder. Outras pessoas doavam por concordar com suas ideias, como a nora do compositor Richard Wagner, Winifred Wagner. Mas, mesmo entre os empresários que não admiravam o ditador, poucos escaparam de dar dinheiro a ele
DECORAÇÃO ROUBADA
Hitler tinha três imóveis bem conhecidos: um apartamento em Munique, uma vila na mesma cidade e uma fortaleza nos Alpes da Áustria, batizada Berghof, que era um palácio de 13 quartos recheados com pinturas, esculturas e tapeçarias retiradas de museus de todo o mundo durante os ataques nazistas
O testamento deveria ser executado por Martin Bormann, que morreu dois dias depois de Hitler, contribuindo com o mistério
Obras de arte foram devolvidas aos museus e proprietários de origem e os imóveis foram divididos entre norte-americanos, ingleses e russos
Onde foi parar?
A saga para achar o dinheiro após o fim da guerra
1. Ainda em 1945, descobriu-se que Hitler tinha dois testamentos. O primeiro, de 1938, previa a distribuição de bens estimados em 1,5 milhão de euros atuais. O segundo, de 29 de abril de 1945 (um dia antes de sua morte), previa o pagamento vitalício de dinheiro à irmã, a dois meios-irmãos, à sua governanta e à mãe de Eva Braun
2. Os aliados passaram três anos rastreando os bens dos principais líderes nazistas. Em 1948, divulgaram que a fortuna estimada de Hitler era de 200 mil marcos alemães (630 milhões de euros atuais). Ambos os testamentos apontavam para a existência de mais grana do que havia sido descoberto - mas onde ela estava?
3. Nos anos pós-guerra, Paula Hitler, única irmã viva de Adolf, brigou para ter acesso aos bens. Ela venceu a causa em 1960 e ganhou o direito de receber dois terços do patrimônio do irmão, mas morreu quatro meses depois sem receber nada, pois ninguém sabia onde estava o dinheiro. Nenhum outro familiar do ditador se manifestou
4. Em 2005, o pesquisador Chris Whetton publicou o livro Hitler¿s Fortune, estimando a fortuna do ditador em 3,5 bilhões de euros (valor de hoje). Historiadores que se dedicam à Alemanha nazista embasaram o estudo. O problema era localizar o dinheiro. Sempre se desconfiou que Hitler tinha contas secretas na Suíça...
5. Em 2013, o governo suíço aprovou uma lei que lhe permitia ficar com o dinheiro de contas não movimentadas ao longo de 62 anos - para alguns, uma manobra clara para embolsar fortunas de nazistas. Desde então, o contador norte-americano Kenneth Yormark luta para encontrar a fortuna misteriosa e doar às vítimas do nazismo
Consultoria Helen Fry, historiadora britânica e editora do livro Hitler's Will, de Herman Rothman
Fontes Livro Hitler's Fortune, de Chris Whetton, documentário The AAHunt for Hitler's Missing Millions
Fonte: http://mundoestranho.abril.com.br/materia/qual-o-tamanho-da-fortuna-de-hitler
Quem foi Montezuma?
por Gabriela Ingrid
Foi um líder asteca do século 16. Sob seu governo, entre 1502 e 1520, a civilização que ocupava o atual território mexicano alcançou seu auge econômico e militar. Mas o imperador ficou mais conhecido por um erro: ser amistoso com os colonizadores europeus. "Na época, a região onde hoje fica a Cidade do México era uma das mais ricas e populosas do mundo, muito devido ao sistema de dominação e cobrança de tributos, que atraiu os espanhóis", explica Eduardo Natalino dos Santos, historiador da USP. O encontro entre Montezuma e Hernán Cortez, chefe das tropas espanholas, no fim de 1519, foi o princípio do fim dos astecas. A relação começou amigável, mas virou uma batalha sangrenta. Cortez venceu, tomou súditos e ouro dos astecas, soterrou templos e destruiu a cidade de Tenochtitlán. A morte de Montezuma, em 1520, divide historiadores. Na versão mais aceita, ele teria sido apedrejado pelos próprios astecas, por considerarem-no fraco e obediente aos espanhóis.
Fonte: http://mundoestranho.abril.com.br/materia/quem-foi-montezuma
Igreja e ditadura: Como os religiosos se tornaram o maior inimigo dos militares
Saudada pela Igreja, a ditadura tomou o poder no Brasil. Mas bispos e frades ajudaram a sociedade civil a reencontrar o caminho da democracia
TEXTO Igor Natusch | 18/08/2014 16h40
O golpe que lançou o Brasil em 21 anos de regime militar em 1964 encheu de euforia o coração de um presbítero de Petrópolis (RJ). Reconhecendo na “revolução” a chance de um novo país, livre do comunismo ateu que ameaçava a cristandade, o padre deslocou-se até o Rio de Janeiro com um só objetivo: dar a bênção às tropas do general Olímpio Mourão Filho, que tinham vindo desde a mineira Juiz de Fora para ocupar a Guanabara.
Dois anos depois, esse religioso, chamado Paulo Evaristo Arns, foi ordenado bispo; em 1970, assumiu como arcebispo de São Paulo. Desde então, o outrora entusiasta da ascensão dos militares assumiu posição decisiva na contestação e denúncia dos crimes da ditadura. Lutou contra a tortura, liderou o histórico ato na Catedral da Sé em memória do jornalista Vladimir Herzog, criou a Comissão Justiça e Paz e abraçou o projeto Brasil: Nunca Mais, que evitou o sumiço de milhares de documentos fundamentais para contar a história daqueles dias. Hoje é considerado, com justiça, um herói da resistência aos generais – um contraste e tanto com o apoio prestado ao então recém-nascido regime.
As posturas de dom Paulo são representativas da trajetória da Igreja Católica durante a ditadura no Brasil. Um caminho acidentado no qual, após a euforia pela queda de João Goulart, posições conservadoras e atos de reação conviveram durante muito tempo, até que a ilusão de um governo redentor desabasse e a redemocratização se tornasse inevitável. Em um país de forte base católica, os movimentos da Igreja desenham a própria postura da sociedade civil diante do estado de exceção que a muitos pareceu promissor, mas que com o tempo se revelou intolerável.
O apoio
“Em maio de 1964”, diz o historiador Paulo César Gomes Bezerra, “um manifesto assinado por 26 bispos da CNBB agradecia aos militares por ‘salvarem’ o país do perigo iminente do comunismo”. Bezerra é autor de Os Bispos Católicos e a Ditadura Militar Brasileira: a Visão da Espionagem, que será publicado em 2014 pela Editora Record para marcar os 50 anos do evento. A declaração dos bispos manifestava gratidão aos novos governantes por terem “acudido a tempo” e impedido a consumação de um “regime bolchevista” no Brasil. “Ao rendermos graças a Deus”, dizia o documento, “agradecemos aos militares que, com grave risco de suas vidas, se levantaram em nome dos supremos interesses da nação.”
As palavras refletem um sentimento que animou boa parte das ações da Igreja naqueles dias: o temor diante do comunismo, destruidor da família, que vinha para esmagar os preceitos cristãos. Mas demonstra também uma proximidade com o poder, o que, no caso brasileiro, não era novidade. No país, até o final do século 19, a Igreja nem sequer existia como entidade autônoma. No sistema do padroado, eram os governantes que nomeavam bispos e padres, além de financiarem e administrarem grande parte da estrutura eclesiástica. Mesmo com a República e a institucionalização do Estado laico, a ligação estreita se manteve – e os dirigentes entendiam bem a importância do apoio religioso às suas decisões.
A Marcha da Família com Deus pela Liberdade, decisiva como suporte ideológico e popular ao movimento militar, evidenciava tais laços, uma vez que a Igreja atuou fortemente na organização das manifestações. Em São Paulo, Leonor Mendes de Barros, esposa do governador Ademar de Barros, ao fim da marcha, assistiu à missa do padre irlandês Patrick Peyton, que estava no Brasil a convite do cardeal Jaime de Barros Câmara, da Arquidiocese do Rio.
Manifestações semelhantes ocorreram no Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Curitiba. O padre Antônio Abreu, ligado há mais de 40 anos ao Instituto Brasileiro de Desenvolvimento (Ibrades), organismo vinculado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), descreve outros aspectos que influenciaram a posição da instituição. Segundo ele, além de proteger a Igreja e a cristandade, havia entre alguns simpatia por um nacionalismo popular de base militar, a exemplo do que Gamal Abdel Nasser promovia no Egito. “No momento do golpe, a identificação da Igreja era com as elites em geral, em uma postura política antiliberal e antidemocrática”, afirma Abreu. “Entre os que realmente queriam políticas públicas de caráter social, parcela razoável acreditava ser mais provável os militares realizarem aquilo que na democracia não era viável. Julgavam ditaduras esclarecidas mais eficazes para o bem público.”
Fundada em 1952, a CNBB elegeu em 1964 uma direção conservadora. A presidência ficou com dom Agnelo Rossi, que logo em seguida seria nomeado pelo papa Paulo VI arcebispo de São Paulo. O então secretário-geral da entidade, dom Hélder Câmara, opositor de primeira hora do regime, foi deslocado do Rio de Janeiro para a arquidiocese de Olinda e Recife, sendo substituído por dom José Gonçalves, mais simpático aos novos tempos. Com uma elite católica pronta a dar seu aval, os militares estavam legitimados para agir.
Apesar do conservadorismo da cúpula, vivia-se um período de renovação na Igreja Católica. Entre 1962 e 1965, ocorreu o Concílio Vaticano II, uma das mais amplas reformas da história do catolicismo. A partir dele, a Igreja tentou transformar sua relação com a sociedade, colocando em primeiro plano a justiça social, a defesa dos direitos humanos e o auxílio aos necessitados de todos os tipos. Era momento de repensar a relação da fé católica com o ambiente político e social que a cercava – um sopro de mudança que demorou um pouco a arejar o alto comando da Igreja brasileira, ainda que tenha sido percebido em outros lugares.
A contestação
O apoio da Igreja Católica ao golpe pode ter sido majoritário, mas não foi unânime. O bispo de Volta Redonda, dom Waldyr Calheiros, foi quase um pioneiro: já na noite do 31 de março de 1964 leu um sermão cheio de comentários desabonadores à derrubada de Jango. Sem contar a oposição férrea de dom Hélder Câmara – um homem tão combativo que logo passou a ser monitorado de perto pelos militares. Pelo menos desde 1966, o Centro de Informações da Polícia Federal abastecia um dossiê sobre o bispo, e a divisão de segurança e informações do Itamaraty fazia de tudo para impedir suas viagens ao exterior – nas quais ele invariavelmente denunciava a violência da ditadura brasileira. A partir de 1970, a imprensa não podia nem ao menos citar o nome de dom Hélder, para o bem ou para o mal; era como se o religioso, mesmo vivo e atuante, não existisse.
Os mandatários religiosos seguiam alinhados aos militares, mas outras esferas adotavam uma postura crescente de resistência e contestação. “A Igreja, em todos os tempos e lugares, sempre refletiu a luta de classes, como todas as instituições”, afirma Frei Betto, dominicano famoso pela atuação em movimentos pastorais e sociais. Ele tomou parte direta na mais explícita atuação de setores da Igreja junto à guerrilha: o alinhamento com a Aliança Libertadora Nacional, de Carlos Marighella.
Enquanto os dominicanos como Frei Betto auxiliavam pessoas a fugir do Brasil, o arcebispo do Rio de Janeiro, dom Eugênio Sales, oferecia ajuda a indivíduos perseguidos por outras ditaduras da América do Sul. Iniciado em 1976, o processo ganhou tal volume que, a partir de 1979, o bispo chegou a hospedá-los em sua própria residência, na Rua da Glória. Ao todo, com o apoio da Cáritas brasileira e do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur), dom Eugênio teria socorrido, até 1982, mais de 4 mil pessoas. Alguns chegavam por iniciativa do então padre da Companhia de Jesus argentina Jorge Mario Bergoglio, hoje papa Francisco. Tanto dom Eugênio quanto dom Paulo Evaristo Arns teriam recebido pessoas enviadas por Bergoglio ao Brasil – uma das muitas histórias que evidenciam a colaboração entre religiosos no continente.
A ditadura não estava alheia a esses movimentos e começou a agir de forma cada vez mais dura. Em 1966 o padre Henrique Pereira Neto, auxiliar de dom Hélder Câmara, foi assassinado pelo Comando de Caça aos Comunistas (CCC), um grupo paramilitar. A partir daí, o porão do regime perdeu o constrangimento e se voltou contra a Igreja. A reação dos órgãos eclesiásticos, em princípio, foi tímida: apenas em maio de 1970 viria o primeiro documento da CNBB denunciando a prática de tortura no país, ainda assim com o cuidado de criticar também ações atribuídas à esquerda, como assaltos e sequestros. Em outubro daquele ano, porém, a prisão do secretário-geral da CNBB, dom Aloísio Lorscheider, durante uma ação do Departamento de Ordem Pública e Social (Dops) na sede do Ibrades, azedou totalmente o diálogo. Foi a primeira vez que um alto dirigente da CNBB viu-se nas mãos dos militares.
Lorscheider ficou preso durante cerca de quatro horas. Tempo suficiente para o alto clero atacar o regime com ousadia inédita. Os cardeais chegaram a enviar carta diretamente ao então presidente, o general Emílio Garrastazu Médici, lamentando a “deterioração” de seus vínculos. O impacto internacional também foi péssimo: a imprensa do Vaticano noticiou o fato e até o papa Paulo VI manifestou publicamente apoio aos bispos brasileiros. “Foi quando se resolveu criar a Comissão Bipartite, que funcionou entre 1970 e 1974, com o intuito de promover diálogos entre a Igreja e o Estado e evitar a ruptura”, afirma o historiador Paulo César Gomes Bezerra. O efeito da medida, contudo, foi limitado: as relações entre as instituições jamais voltariam a ser as mesmas.
Dominicanos no cárcere
Nenhum setor da Igreja brasileira foi tão fundo na oposição ao regime quanto os dominicanos. Os frades passaram a apoiar perseguidos políticos que precisavam esconder-se ou fugir do país. Foi essa ação que os aproximou de Carlos Marighella e da Aliança Libertadora Nacional. Em 1968, com o advento do AI-5, a repressão chegou ao momento mais duro – e Frei Betto, morando no Rio Grande do Sul, ajudou dezenas de pessoas a atravessar a fronteira do Uruguai.
A ligação dos dominicanos com questões sociais e políticas vem desde os anos 1940, a partir da Ação Católica (AC), movimento que buscava maior inserção da Igreja junto aos movimentos da sociedade civil. Como forma de recrutar estudantes, surgiram dentro da AC grupos como a Juventude Estudantil Católica (JEC) e a Juventude Universitária Católica (JUC). A partir deles, nasceu a Ação Popular (AP), segundo Frei Betto “um movimento de esquerda, laico, independente da Igreja”, com forte presença dos dominicanos e forte inserção no meio universitário. Depois do golpe, a organização passou à clandestinidade.
Com o endurecimento do regime, os serviços de inteligência passaram a prestar especial atenção nos dominicanos, levando a uma série de prisões, como a dos frades Fernando, Ivo e Tito, todos alvo de torturas e expostos como terroristas. O caso de frei Tito tornou-se tristemente célebre: incapaz de conciliar-se com as memórias dos padecimentos, ele se suicidou nos arredores de um convento francês em 1974, aos 28 anos. No exílio ou na cadeia, os dominicanos continuavam incomodando o poder.
“Nós, religiosos presos, éramos a principal fonte de denúncia no exterior dos crimes praticados pela ditadura. E o papa Paulo VI nos deu ouvidos e apoio”, diz Frei Betto. “Na tentativa de nos neutralizar, nos obrigaram a partilhar do mesmo regime carcerário dos presos comuns. Nem assim cessamos as denúncias, pois as informações sempre nos chegavam.” A voz dos dominicanos ecoou em todo o mundo e levou a uma rejeição cada vez maior à ditadura no exterior.
A denúncia
Em 1970, a mudança de comando na Arquidiocese de São Paulo aumentou o fosso entre Igreja e militares. Frei Betto afirma que, mesmo após visitar dominicanos no Dops e ouvir seus relatos, o então arcebispo, dom Agnelo Rossi, seguia negando que houvesse tortura nas prisões. O Vaticano, então, resolveu transferir dom Agnelo a Roma – uma espécie de promoção às avessas, já que abriu espaço para seu auxiliar, dom Paulo Evaristo Arns, assumir a arquidiocese.
A essa altura, a simpatia de dom Paulo pelo golpe já tinha virado fumaça. Ele se tornou firme opositor da ditadura no Brasil, tanto no discurso quanto na prática: fundou a Comissão Justiça e Paz, o grupo Clamor (uma rede de solidariedade a fugitivos das ditaduras sul-americanas) e o projeto Brasil: Nunca Mais, que reunia em segredo documentos relativos aos porões da ditadura militar. Além disso, promoveu a criação de várias pastorais (como a da Moradia, a da Criança e a Operária), de valioso papel na consolidação dos movimentos sociais na reta final do período dos militares no comando do país.
Durante os anos de chumbo, surgiram também as Comunidades Eclesiais de Base (CEBs). Incentivadas por seguidores da Teologia da Libertação, como Leonardo Boff e o próprio Frei Betto, as CEBs tentavam suprir a falta de sacerdotes nas áreas de baixa renda, em especial no Nordeste. “Por serem movimento de Igreja, a repressão não deu muita importância a elas, que se tornaram incubadoras de movimentos populares”, diz Frei Betto.
Em 1975, o caso do jornalista Vladimir Herzog, torturado até a morte no quartel-general do II Exército, em São Paulo (veja ao lado), abalou os alicerces do regime. A partir do episódio, ficou impossível negar o que acontecia nos porões. No ano seguinte, o metalúrgico Manuel Fiel Filho foi outra vítima fatal da tortura nas prisões do Doi-Codi. A repercussão do assassinato – mais um suicídio por enforcamento, na versão dos militares – foi tão expressiva que o general Ednardo d’Ávila Mello, advertido pelo presidente Ernesto Geisel no caso Herzog, foi exonerado do comando do II Exército. Para o jornalista Elio Gaspari, autor da maior obra sobre a ditadura militar brasileira, o enquadramento de Geisel aos militares do porão no episódio marcou o fim da bagunça na tropa.
A essa altura, a Igreja tinha assumido uma postura de clara oposição. No final dos anos 1970, as Forças Armadas tentaram sem sucesso deportar dom Pedro Casaldáliga, bispo de origem catalã que atuava na região de São Félix do Araguaia (MT). Próximo de dom Pedro, o padre João Bosco foi morto em 1976 com um tiro dentro de uma delegacia onde tinha ido denunciar abusos contra camponeses. A sequência da queda de braço com os religiosos incluiu investigação a outros bispos, como dom Fernando Gomes e dom Waldyr Calheiros, e o monitoramento de perto do jornal O São Paulo, da Arquidiocese da cidade – o último veículo brasileiro a livrar-se da censura prévia, já em 1978.
O ato ecumênico por Herzog na Sé
“A morte do Vlado evidenciou muitas ações dos bispos. Antes, o registro do que diziam ficava no canto de página dos jornais. Isso quando saía”, diz o jornalista Audálio Dantas, autor de As Duas Guerras de Vlado Herzog, livro-reportagem que recebeu o Prêmio Jabuti em 2013. A versão de suicídio apresentada pelos militares foi contestada não apenas pelos colegas do jornalista morto, mas também por líderes religiosos. Herzog era judeu. Segundo o rito judaico, os suicidas devem ser enterrados perto dos muros dos cemitérios. Mas ao ver o corpo, o rabino Henri Sobel tomou uma decisão que teve o peso de denúncia: ordenou que Herzog fosse enterrado na área comum do Cemitério Israelita do Butantã, em São Paulo, um claro desmentido à versão dos militares.
Foi o Sindicato dos Jornalistas de São Paulo, do qual Audálio fazia parte, que teve a ideia de um culto ecumênico em memória de Herzog. No dia 28 de outubro, mesma data em que dom Paulo concordou em ceder a Catedral da Sé para o ato, dom Eugênio Salles recusou no Rio de Janeiro pedido da Associação Brasileira de Imprensa (ABI) para uma missa com o mesmo objetivo. A recusa não era inexplicável: o clima era de tensão, com constantes ameaças. Pouco antes do ato na Sé, dom Paulo Evaristo Arns foi visitado por dois secretários do governador de São Paulo, Paulo Egydio Martins. Segundo os emissários, centenas de policiais tinham ordens de atirar ao menor sinal de confusão. Usando uma inauguração como pretexto, o presidente Geisel abalou-se de Brasília para a capital paulista para acompanhar os desdobramentos. “Só foi embora quando o culto terminou”, diz Audálio.
O culto ecumênico aconteceu no dia 31 de outubro de 1975, presidido por dom Paulo e com a presença do rabino Henri Sobel e do pastor protestante James Wright. Mesmo proibida qualquer menção a seu nome em veículos de imprensa, dom Hélder Câmara também compareceu, sem pronunciar palavra. Mais de 300 barreiras policiais impediam o acesso da população à catedral; ainda assim, 8 mil pessoas lotaram o lugar.
A memória
Da segunda metade dos anos 1970 em diante, a Igreja brasileira acertou o passo com a sociedade civil na caminhada de retorno à democracia. Entre 1976 e 1977, a CNBB lançou documentos denunciando de forma explícita casos como o que vitimou o padre João Bosco e o operário Fiel Filho. “A segurança, como bem da Nação, é incompatível com uma permanente insegurança do povo”, dizia uma dessas notas, condenando as “medidas arbitrárias”, os “desaparecimentos inexplicáveis” e “inquéritos aviltantes” promovidos pelos militares. Ainda assim, alguns bispos – entre eles dom Antônio Castro Mayer e dom Geraldo Sigaud – teriam, segundo o historiador Paulo César Bezerra, permanecido fiéis ao regime militar até o fim.
Com a consolidação da abertura política, a tensão entre religiosos e militares diminuiu. Entretanto, o lado da fé continuou somando vítimas, como o líder metalúrgico Santo Dias da Silva, militante da Pastoral Operária, morto pela Polícia Militar em outubro de 1979 enquanto participava de uma greve em São Paulo. A violência representou mais um abalo nas já frágeis estruturas do regime: o velório, novamente na Catedral da Sé, reuniu mais de 15 mil pessoas e o cenário forçou uma mudança de postura do governo com relação às entidades sindicais.
A CNBB assumiu no final da década papel ativo na campanha pela anistia e depois contribuiu na articulação do movimento Diretas Já. Além disso, seguiam os esforços para preservar a memória do período. A Editora Vozes, vinculada à Igreja Católica, editou o livro Brasil: Nunca Mais em 1985, meses depois da retomada da democracia. Se tinham sido fundamentais na sustentação do regime militar quando este se iniciou, no apagar das luzes da ditadura os religiosos abriam caminho para que não fossem esquecidos os duros anos de repressão.
O projeto Brasil: Nunca Mais resultou em cerca de 900 mil páginas, referentes a centenas de processos. O material foi microfilmado e enviado ao Conselho Mundial de Igrejas, em Genebra, na Suíça, para evitar que fosse apreendido e destruído pelos militares. Foram necessários 25 anos até que esse pedaço da história brasileira fosse repatriado. Em 2011, os microfilmes voltaram ao país, e em agosto de 2013 foi lançado o BNM Digital, site que disponibiliza a consulta a toda essa documentação.
Hoje, com a Comissão Nacional da Verdade e suas ramificações estaduais, o país busca iluminar os cantos escuros do período gerado pelo golpe e, a partir deles, enxergar melhor a si mesmo. A ditadura talvez não tivesse se consolidado sem a bênção inicial da Igreja Católica ao novo regime, mas as denúncias e a combatividade dos religiosos foram igualmente fundamentais na retomada da democracia.
SAIBA MAIS
Livros
Brasil Nunca Mais, dom Paulo Evaristo Arns, Editora Vozes, 1996
Os Bispos Católicos e a Ditadura Militar Brasileira: A Visão da Espionagem, Paulo César Gomes Bezerra, Editora Multifoco, 2013
A Ditadura Derrotada, Elio Gaspari, Cia. Das Letras, 2003
Sociedades secretas no Brasil e o lado oculto do poder
Como organizações que existiam à margem da vida pública do Brasil ajudaram a moldar os destinos do país desde seu nascimento
TEXTO Paulo Rezzutti
Às vésperas da Independência do Brasil, dom Pedro I enviou de São Paulo uma carta ao seu amigo e ministro José Bonifácio. No final, cravou um pedido misterioso: “Recomende-me aos senhores nossos II e CC (...)”.
Essa simples frase, cheia de pontos em formatos estranhos, revela o contato estreito do então príncipe regente, a pouco tempo de virar o primeiro governante do Brasil independente, com duas sociedades secretas operantes durante o processo histórico que culminou no 7 de Setembro. Os três pontos, cada um no que seria um vértice de uma pirâmide, antecedidos por duas letras “i”, são ainda hoje utilizados por membros da Maçonaria e significam “irmãos”. Se essa primeira sociedade permanece conhecida no mundo inteiro, a seguinte, que se revela nas duas letras “c” seguidas por quatro pontos em forma de cruz, que significavam “camaradas”, foi uma ordem secreta 100% brasileira que teve vida efêmera. Tratava-se do “Apostolado da Nobre Ordem dos Cavaleiros da Santa Cruz, ou, simplesmente, Apostolado.
A Maçonaria e o Apostolado na independência
Dom Pedro foi iniciado na Maçonaria em 2 de agosto de 1822, adotando o nome de Guatimozin, o último imperador asteca que tentou resistir aos invasores espanhóis. Nesse período, a partir de 1821, com a campanha de emancipação política do Brasil, as lojas existentes começaram a ter um papel político mais vigoroso, embora já existissem registros de atividades maçônicas no Brasil desde o século 18. Em 1822, durante o processo da Independência, foi criado o Grande Oriente do Brasil, ou Brasiliano, conforme ata de 17 de junho, com o qual a Maçonaria brasileira libertou-se e tornou-se independente do Grande Oriente Lusitano.
Inspirado pelos ventos da Revolução Francesa, da independência da América do Norte e das Guerras Napoleônicas, que varreram por algum tempo da Europa o absolutismo, a Maçonaria brasileira tentava atrair o então príncipe regente. Se alguns elementos maçônicos sonhavam com a implantação da República no Brasil, a maioria achava que a independência definitiva de Portugal se daria de maneira menos traumática se contasse com a simpatia de dom Pedro, por isso buscou envolvê-lo na causa.
Foram os maçons, capitaneados por Joaquim Gonçalves Ledo e José Clemente Pereira, presidente do Senado da Câmara do Rio de Janeiro, que se movimentaram para dissuadir dom Pedro de cumprir as ordens das Cortes Portuguesas, que solicitaram o retorno dele à Europa em 1821. Inclinado a respeitar as diretrizes das Cortes, o príncipe regente foi convencido pelo movimento de Ledo e Pereira, que conseguiram a adesão de representantes de Rio de Janeiro, Minas Gerais, São Paulo e Bahia ao pedido para que não deixasse o Brasil, levando ao Dia do Fico, em 9 de janeiro de 1822. Em 13 de maio, a Maçonaria concedeu a dom Pedro o título de “Protetor e Defensor Perpétuo do Reino Unido do Brasil”, o qual o príncipe declinou parcialmente, aceitando apenas o de “Defensor Perpétuo”.
O Apostolado da Ordem dos Cavaleiros de Santa Cruz foi fundado por José Bonifácio em 1822, com o objetivo de defender a integridade do Brasil e lutar por sua independência. Porém o propósito primordial era combater o grupo de Gonçalves Ledo, que, se a princípio havia aceitado a monarquia constitucional como caminho rápido para a separação, acalentava o sonho republicano.
Tanto a Maçonaria como o Apostolado acabaram sendo, cada um a seu tempo, fechados por ordem de dom Pedro. Mas a influência das duas sociedades secretas no processo político da Independência é inegável. Das reuniões do Apostolado entre janeiro e março de 1823, como mostram as atas reunidas no Acervo Histórico do Museu Imperial, em Petrópolis, há debates de artigos que seriam apresentados ao projeto da Constituição do Império em setembro pelo deputado Antônio Carlos, irmão de Bonifácio.
O escritor Luiz Gonzaga da Rocha, presidente do Tribunal Distrital de Justiça do Grande Oriente do Distrito Federal e autor de A Bucha e Outras Reminiscências Maçônicas, afirma que as sociedades secretas perderam poder. “A Maçonaria exerce pouca ou quase nenhuma influência na sociedade brasileira”, diz. Segundo Rocha, isso ocorre devido ao baixo índice de inserção social e ao fato de a sociedade estar afastada do cenário político-econômico-social e das discussões das questões de interesse nacional.
A ação da Bucha
“É a polícia, ninguém se mexa!”, disse, triunfante, o subdelegado Armando Pamplona para um bando encapuzado. Eram os anos finais da Primeira Guerra, e Pamplona buscava espiões alemães. Certa noite, passando a altas horas pelo antigo prédio do Liceu de Artes e Ofícios em São Paulo, notou uma estranha movimentação. Diversos senhores com ar misterioso tomavam carros de luxo estacionados nas redondezas do edifício. Decidido, o subdelegado resolveu montar uma campana para descobrir do que se tratava.
A persistência deu resultado. Certa noite, por volta das 9 horas, vultos suspeitos se esgueiravam para dentro do edifício. Já passava das 10 horas quando o movimento terminou. O subdelegado chamou seus homens e invadiu o local. Pamplona deve ter achado esquisito aqueles homens trajando mantos e faixas bordadas. Uns traziam no peito uma âncora verde, símbolo da esperança, outros um coração vermelho, lembrando a caridade, alguns, a cruz azul da fé.
O subdelegado estava radiante com a perspectiva de ter “explodido” um ninho de perigosos espiões. Mas qual não foi sua surpresa quando os membros da assembleia, perplexos diante daquela invasão, começaram a tirar os capuzes. Armando reparou que os rostos eram familiares: ele conhecia pessoalmente alguns daqueles senhores, outros de vista, outros por fotos em jornais. Estavam no salão o governador do estado, Altino Arantes, diversos políticos paulistas, mineiros, cariocas e gaúchos, além de inúmeros professores das Faculdades de Direito, de Medicina e Politécnica, assim como o secretário de Segurança Pública, Elói Chaves, chefe de Pamplona. Invertendo a ação, Chaves deu ordem de prisão ao subdelegado e a seus homens.
Naquela mesma noite os policiais invasores foram juramentados e ameaçados severamente pelas altas personalidades ali reunidas. Assim terminou a grande noite do subdelegado Pamplona; em vez de uma batida e a prisão de espiões, a fama e a glória estampadas nos jornais matutinos, ele acabou se tornando, à força, membro juramentado da Bucha, a sociedade secreta que, para muitos, por quase cem anos ajudou a governar os destinos do Brasil.
Em 11 de agosto de 1827, o imperador dom Pedro I assinou a lei que criava os cursos jurídicos no Brasil. Ela previa a instalação de duas faculdades, uma em Recife e outra em São Paulo. A paulista foi a primeira a entrar em funcionamento. Instalada em parte do antigo Convento de São Francisco, as arcadas do velho claustro se tornaram sinônimo da recém-instalada academia. A lei de 11 de agosto também institucionalizou os Cursos Anexos, espécie de preparatório que capacitava os jovens a prestarem os exames de admissão à faculdade.
Júlio Frank
Nos Cursos Anexos, houve, entre tantos outros, dois importantes mestres estrangeiros de índole liberal: o professor de aritmética, o italiano Líbero Badaró, assassinado por suas ideias em 1830, e o alemão Johann Julius Gottfried Ludwig Frank, ou Júlio Frank, como era conhecido no Brasil. Frank, nascido em 1808, havia estudado na Universidade de Göttingen, mas não chegou a se formar. Teve que sair da cidade por causa de dívidas contraídas e veio parar no Brasil. Tentou se estabelecer no Rio de Janeiro, depois no interior de São Paulo, e por fim na capital.
Frank morreu de pneumonia em 1841 e, como não era católico, seu corpo teria de ser sepultado no Cemitério dos Aflitos, local que recolhia indigentes, criminosos mortos na forca e escravos. Um ultraje para o venerado mestre. Os estudantes, em revolta, resolveram enterrar seu professor na própria escola. Seu túmulo, em um dos pátios, é venerado pela tradição acadêmica da faculdade até hoje.
Inspirado nas Burschenschaften, ou Confrarias de Camaradas, instituições acadêmicas alemãs, Frank teria tido, durante uma reunião com o estudante Vicente Pires da Mota e o secretário de Governo da província de São Paulo, Pimenta Bueno, a ideia de criar uma associação similar na Academia de Direito. Segundo o escritor Luiz Gonzaga da Rocha, “a Bucha tinha por objetivo a filantropia e, ainda, ressaltar a função social do advogado no seio da sociedade paulistana e brasileira, por extensão”.
Controle
Os integrantes da Bucha, Bucha Paulista, ou B. P., como passaria a ser chamada a Burschenschaft da Academia de Direito de São Paulo, eram escolhidos pela sua inteligência e lisura de caráter. Na faculdade, a ordem era composta de Catecúmenos, Crentes e Doze Apóstolos; fora, por Chefes Supremos e Conselho dos Divinos. A estrutura da sociedade, com o passar dos anos, transcendeu os velhos muros da academia e passou a permear a política nacional, envolvendo a estrutura burocrática do Estado.
Os antigos alunos da São Francisco que pertenciam à Bucha e ocupavam posições nas diversas esferas do poder nacional acabaram favorecendo outros membros da organização na distribuição de cargos governamentais. O historiador Luis Fernando Messeder dos Santos, autor da dissertação de mestrado A Burschenschaft e a Formação da Classe Dirigente Brasileira na República Velha, afirma a respeito: “Percebe-se o fortalecimento da atuação da organização na década de 1870, quando alguns dos que iriam ocupar a ‘suprema magistratura’ do país durante a Primeira República estudaram na mesma turma”.
Durante o Império, entre os “bucheiros”, havia políticos, artistas e intelectuais destacados, como Castro Alves, Álvares de Azevedo, o Barão do Rio Branco, o Visconde de Ouro Preto, entre outros. Após a queda do Império, em 1889, foi instituída uma comissão, apelidada de Comissão dos Cinco, encarregada do anteprojeto da Constituição Republicana. Dos cinco membros da comissão, três eram conhecidos bucheiros: Saldanha Marinho, Américo Brasiliense e Santos Werneck.
Embora os ideais liberais levados para as Arcadas por Líbero Badaró e Júlio Frank tenham servido de norte para a criação da Bucha, inspirando seus membros a lutarem pelo abolicionismo e pela República, à medida que os ardores juvenis arrefeciam e seus integrantes passavam a pertencer ao establishment, alguns transformaram-se em conservadores, defendendo a monarquia e a escravidão.
Na República Velha, acredita-se, não havia ministro, juiz ou mesmo candidato à presidência da República que tomasse posse, ou fosse indicado, sem prévia deliberação do Conselho dos Divinos. A filantropia inicial, a ideia de ajuda mútua, acabou se corrompendo e desaguou no franco favorecimento para obtenção de cargos públicos. Segundo o professor Miguel Reale, em suas memórias: “Como toda sociedade secreta, [a Bucha] logo se degenerou em cadeia de privilégios, que começava na faculdade pela seleção dos catedráticos e terminava nos acordos ‘café com leite’ entre ex-alunos de São Paulo e Minas Gerais, sob a batuta do Senador [do Rio Grande do Sul] Pinheiro Machado, também diplomado pelas Arcadas, e que, sutilmente, preferia ser a eminência parda dos eventos republicanos”.
Conchavos
Nos primeiros 40 anos da República, do governo dos militares Deodoro da Fonseca e Floriano Peixoto à política do café com leite, bacharéis formados por uma das duas academias de Direito e membros da Bucha destacaram-se como ministros ou chefes do Executivo. Dos 14 presidentes eleitos da República Velha, oito eram da sociedade: Prudente de Morais, Campos Sales, Rodrigues Alves, Afonso Pena, Venceslau Brás, Artur Bernardes, Washington Luís e Júlio Prestes, que não chegou a ser empossado por causa da Revolução de 1930.
Quando a Bucha foi fundada, no início da década de 1830, também surgiu outra instituição, a Sociedade Filantrópica, que prestava ajuda a presos e órfãos. Desde então, a sociedade secreta da Faculdade de Direito sempre esteve ligada a um “braço” público. Na década de 1910, um deles, a Liga Nacionalista, aglutinou em sua direção membros da Faculdade de Medicina e da Escola Politécnica. Estas possuíam também suas próprias organizações estudantis: a Jungenschaft (União da Mocidade), na Medicina, fundada em 1913, e a Landmannschaft (sociedade das pessoas de um mesmo campo), na Politécnica, de 1895. O intercâmbio de alunos de Direito entre São Paulo e Recife acabou por ocasionar a criação de um braço da Bucha em Pernambuco, a sociedade Tugendbund (União e Virtude).
Com a Revolução de 1930, que pôs fim à República Velha, chegou ao poder Getúlio Vargas. Data daí o declínio da Bucha. Adhemar de Barros, interventor do estado de São Paulo, teria colocado as mãos em uma lista parcial de membros da Bucha no final dos anos 30 e se apressou a apresentála a Getúlio. Segundo o político Carlos Lacerda, o presidente leu atentamente a lista e a devolveu para Adhemar, dizendo: “Não se pode governar o Brasil sem essa gente, o senhor que entre para a Burschenschaft”.
“Forças ocultas”
Em 1931, quase cem anos após a criação da Bucha, foi fundada a Associação dos Antigos Alunos da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo pelo diplomata José Carlos de Macedo Soares. Segundo Afonso Arinos de Melo e Franco, Macedo Soares teria sido o último chefe daquela sociedade secreta, e a associação seria a sucessora final da Bucha.
Mas, e nos dias de hoje, a Bucha ainda existe? Segundo o historiador Pedro Brasil Bandecchi, em 1961, “Jânio Quadros teria se referido à Bucha quando falou de forças ocultas para justificar sua renúncia”. O atual presidente da Associação dos Antigos Alunos da Faculdade de Direito da USP, José Carlos Madia de Souza, afirma que, em 13 anos como presidente da entidade, jamais teve conhecimento da continuidade da existência ou da atuação da Bucha.
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Já o jornalista e escritor Fernando Jorge, ex-aluno da São Francisco e antigo vice-presidente da Academia de Letras da faculdade, na década de 1950, é de opinião contrária: “Na minha época achava curioso o costume de alunos mais velhos se encontrarem ao redor do túmulo do Júlio Frank. Alguns diziam que era ritual da Bucha. Anos mais tarde, na década de 80, Bandecchi, numa conversa comigo e com o historiador Leonardo Arroyo, afirmou categoricamente que a Bucha ainda existia”.
Em 2006, a comunidade da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da Universidade de São Paulo foi surpreendida com cartazes nos corredores de suas unidades. Nele, uma certa sociedade E.S.P.A.R.T.A. anunciava a comemoração de seus 50 anos de existência.
A E.S.P.A.R.T.A., segundo rumores, seria um ramo da Burschenschaft e teria surgido em 1956. Diferentemente dos famosos guerreiros que morreram na Batalha das Termópilas defendendo sua terra da invasão persa, essa sociedade secreta era composta de menos que 300 membros. Por ano, supostamente seriam recrutados 20 alunos. Metade deles, indicados por membros antigos e que ficariam “em observação” por um ano. Cinco vagas seriam reservadas para pessoas que solicitassem sua entrada na sociedade. As demais era reservadas para filhos de antigos membros.
Nascida na Guerra Fria, o período histórico de 1945 a 1991 marcado por disputas estratégicas e conflitos indiretos entre Estados Unidos e a extinta União Soviética, a E.S.P.A.R.T.A. – sempre supostamente – contaria com um projeto de poder denominado Jano, nome do deus romano representado por duas ou mais faces, cada qual olhando para uma direção. Preparando-se para dois cenários mundiais distintos, um com o socialismo como vencedor e outro com o capitalismo, a sociedade teria formado duas elites para que seus interesses sobrevivessem em qualquer cenário.
Entre seus membros, estariam proeminentes figuras acadêmicas, como Perseu Abramo, Florestan Fernandes e Fernando Henrique Cardoso, os dois primeiros fundadores do PT, e o último, do PSDB. Juntos, esses partidos têm se mantido há 20 anos no poder. Seus políticos, em alguns momentos, uniram-se a uma causa comum, como quando o então líder sindical Lula apoiou a campanha política de FHC para o Senado, em 1978, chegando, até, a representá-lo em alguns comícios.
SAIBA MAIS
Livros
A Bucha e Outras Reminiscências Maçônicas. Londrina, Luiz Gonzaga da Rocha, A Trolha, 1999
A Sombra de Júlio Frank. Afonso Schmidt, Associação dos Antigos Alunos da Faculdade de Direito da USP, 2008
Uta von Naumburg , Conheça a alemã que inspirou a Rainha Má de "Branca de Neve"
Uta viveu nos anos 1000 e se tornou ícone da Alemanha Nazista como paradigma da mulher ariana
Uta era a mulher de Ekkehard II, o margrave do principado alemão de Meissen, perto das atuais Polônia e República Tcheca, no início dos anos 1000. Margrave é o título de nobreza do comandante militar de fronteira do império romano-germânico, ou seja, Ekkehard era um guerreiro. Eles viveram no castelo de Naumburg, às margens do Rio Saale. O casal não teve filhos e doou parte de seus bens para a Igreja, que construiu uma capela nas terras do nobre, um importante entroncamento de rotas comerciais. Em 1028, por ordem do sacro imperador romano-germânico Conrad II e do papa João XIX, o santuário deu lugar à Catedral de São Pedro e São Paulo de Naumburg. Quando a catedral foi consagrada, no século 13, o bispo Dietrich II pediu a seu mestre escultor para que Ekkehard II e Uta, com outros dez nobres, fossem homenageados na forma de um coro de pedra em tamanho natural – portanto, saiba a partir de agora que a escultura não tem nenhuma identidade com o personagem que retrata além da imaginação do artista que a criou.
“Em outras catedrais, era comum a representação de figuras sacras e de personagens bíblicos, mas não de membros da nobreza”, afirma o professor Jan-Simon Hoogschagen, da Universidade de Eindhoven, na Holanda. “Foi por isso que a obra ganhou reconhecimento artístico. Os 12 retratados representavam corpos de aparência naturalista, pintados com cores chamativas e com semblantes expressivos.”
A anunciação
Nenhuma escultura impressiona tanto quanto a enigmática Uta. Sua gola é levantada, como um sinal de defesa. Ao seu lado, usando espada e escudo, está o marido. Com a cabeça inclinada para o alto, ambos simbolizam o espírito alemão. Até o início do século 20, poucos deram importância às estátuas. Hoje são consideradas tesouros culturais da Alemanha. “Alemães famosos como Goethe e os irmãos Grimm visitaram Naumburg, mas não viram Uta”, diz Wolfgang Ullrich, historiador da Faculdade de Belas Artes de Hamburgo e autor de Uta von Naumburg: Eine Deutsche Ikone (Uta de Naumburg: um ícone alemão, sem tradução).
De santa a bruxa
A escultura de Uta viajava por cidades da Alemanha e da Áustria e o personagem aparecia em filmes de propaganda nazista contra judeus. Até que se transformou em vilã improvável em Hollywood. A “vocação” para o cinema teria sido descoberta em 1935. Walt Disney fez uma discreta viagem à Alemanha em busca de referências para o primeiro longa-metragem de animação:Branca de Neve e os Sete Anões, que estrearia dois anos depois. Ao seguir pela Rota Alemã dos Contos de Fadas, percurso que ganhou o apelido por cruzar 600 km de pequenas vilas nascidas na Idade Média, Disney teria passado por Naumburg antes de seguir para Bremen, ao norte. “Disney pode ter conhecido a escultura de Uta no Kansas City Arts Institute, em aulas de história da arte com professores alemães, antes de disparar para Naumburg e compor sua Rainha Má Grimhilde”, diz Patrícia Sant’Anna, do Grupo de Arte da Unicamp. Disney nunca admitiu a referência.
A princesa da história foi desenhada a partir de um amálgama de traços delicados de estrelas de cinema, com destaque para Hedy Lamarr, a austríaca que criou um sistema de radiocomunicação para os Estados Unidos e seus aliados durante a Segunda Guerra. As coisas só foram se acalmar para Uta de Naumburg com o final do conflito. Em 1945, ela virou a heroína de um drama produzido pelo poeta Felix Dhünen, encenado em mais de uma centena de teatros alemães, como uma rainha injustiçada e salva da Inquisição por um príncipe apaixonado. O “felizes para sempre” que encerra a peça se passa na Catedral de Naumburg.
Nos anos 60, a Alemanha Oriental, comunista, lançou um selo com Uta. “O primeiro foi emitido em Berlim, em 1957, para anunciar a reunião anual da Associação Cultural da República Democrática Alemã (Kulturbund der DDR), criada a fim de valorizar a cultura democrática e antifascista”, afirma Wolfgang Ullrich, da Faculdade de Belas Artes de Hamburgo.
O mistério das estátuas
Especialistas em história da arte sacra não sabem o nome nem muito sobre a origem do mestre artesão responsável pelas esculturas e outros adornos da Catedral de Naumburg, apenas que ele viveu 200 anos após a morte dos patronos que retratou. “Cogita-se que ele era europeu e viveu no período romântico”, diz o historiador Wolfgang Ullrich. A expressão “mestre” significa que a obra tem criação coletiva, supervisionada pelo proprietário do ateliê. Além das estátuas expostas no interior e nos jardins de Naumburg, o estilo realista de representar indivíduos pode ser visto nas catedrais francesas de Reims, Amiens e Chartres. “Levou algum tempo para outros artistas alcançá-lo, o mestre de Naumburg foi pioneiro dessa arte”, afirma Glenn S. Sunshine, da Universidade de Connecticut, nos Estados Unidos. Supõe-se também que as notáveis obras da Catedral de Meissen sejam de sua autoria. É nessa cidade da Saxônia que seus últimos trabalhos foram datados, em 1250.
Fonte: http://guiadoestudante.abril.com.br/aventuras-historia/conheca-alema-inspirou-rainha-ma-branca-neve-808275.shtml
A última batalha de Che
Depois do sucesso em Cuba, Guevara tentou estabelecer a revolução no território boliviano.
Depois do sucesso obtido com a Revolução Cubana, o já afamado líder revolucionário Ernesto Che Guevara não se convencera sobre o fim de suas lutas políticas. Depois de participar do feito histórico na ilha centro-americana, decidiu expandir a possibilidade revolucionária para outras partes do mundo. Observando que o continente americano tinha se tornado um grande campo de influência política imperialista, Guevara decidiu se embrenhar em novas lutas.
No ano de 1966, após sofrer uma terrível derrota no Congo, decidiu organizar um movimento que viesse a dar fim ao governo vigente na Bolívia. Nesse período, o país – um dos mais pobres de todo o continente – havia sido tomado por uma ditadura alinhada aos interesses dos norte-americanos. Para tanto, Che contou com o apoio militar de veteranos da Revolução Cubana, que logo se encontraria com seu líder nas densas matas do interior boliviano.
Contando com a fama e experiência acumuladas em Cuba, Che Guevara tinha o apoio de um breve contingente com doze homens designados para participar dessa missão. A falta de outros recrutas e as relações conflituosas com o PCB (Partido Comunista Boliviano) parecia dificultar as coisas, mas, ainda assim, Che apostava no êxito dos focos guerrilheiros a serem formados. Dessa forma, passou dois meses estudando o território e recrutando novos participantes da nova revolução.
Depois dessa etapa, era necessário treinar seus combatentes para que tivessem condições de enfrentar as dificuldades impostas pelas frentes inimigas e seguir orientações militares. As duras condições da região acabaram impondo a perda de Benjamin Coronado Córdoba, combatente que morrera durante a travessia do Rio Grande. Nesse meio tempo, uma pequena parte dos revolucionários ficou no acampamento à espera de Che e dos outros membros em treinamento.
A disciplina e perseverança exigidas para esperar a volta de um grupo embrenhado nas matas bolivianas eram grandes demais para alguns daqueles que se encontravam no acampamento. No dia 11 de março de 1967, Pastor Barrera e Vicente Rocabado desertaram e partiram em direção à vila de Camiri, onde tentaram vender um dos fuzis pertencentes ao grupo revolucionário. O chamariz causado pela estranha oferta foi o bastante para que fossem denunciados para as autoridades locais.
Presos, acabaram denunciando a “ameaçadora” presença de Che Guevara em território boliviano. Em pouco tempo, um destacamento das forças bolivianas foi designado com a missão de encontrar o foco organizado e seu afamado líder. Em duas tentativas, o mal preparado exército boliviano foi facilmente derrotado pelos revolucionários treinados por Guevara. Temerosas, as autoridades bolivianas logo acionaram o apoio logístico e militar dos Estados Unidos e de outras nações latino-americanas.
A presença dos militares na região impunha grandes dificuldades para que Che pudesse rearticular suas estratégias de combate. Aqueles que apoiavam a guerrilha, realizando a transmissão de informações provenientes da capital La Paz, já não conseguiam realizar esse trânsito. Com isso, Guevara decidiu desmembrar seu grupo guerrilheiro em duas parcelas distintas: um primeiro grupo tentaria ocupar o povoado Muyupampa, enquanto os demais esperavam pelos comandos dos que avançariam pelo território.
Durante tal ação, os informantes a serem enviados para La Paz foram presos e denunciaram a localização dos guerrilheiros. Com isso, os exércitos bolivianos, agora contando com treinamento norte-americano e armas mais avançadas, conseguiram realizar um novo ataque contra o grupo de Che Guevara. Depois disso, sem ter o retorno de Che, o grupo que ficou em espera decidiu ir ao encontro de seu líder nas proximidades de Vado del Yeso.
Nessa empreitada, os guerrilheiros liderado por Juan Vitalio, mais conhecido como Joaquín, foram denunciados por uma família camponesa que anteriormente havia cooperado com os participantes da ação revolucionária. Em 31 de agosto de 1967, um ataque das forças oficiais conseguiu aniquilar o grupo liderado por Joaquín e obrigar o grupo restante a modificar toda sua estratégia de ação. Depois disso, Guevara e seus comandados partiram para as regiões de Pucará e La Higuera.
A essa altura, a falta de homens e a fome assolavam a todos aqueles que insistiam em prosseguir com a ação revolucionária na Bolívia. Em 26 de setembro, uma nova emboscada do Exército conseguiu reduzir as tropas revolucionárias para apenas dezesseis membros. Chegando em La Higuera, o grupo foi avistado por uma camponesa idosa. Temendo a delação, os combatentes ofereceram dinheiro para que não fossem denunciados por ela.
A ação tomada não surtiu o efeito esperado, a camponesa tomou o dinheiro e denunciou os combatentes. No dia seguinte, na madrugada de 8 de outubro, o Exército boliviano conseguiu emboscar Che Guevara e seus demais seguidores. Nas imediações da Quebrada del Yuro os exércitos conseguiram desbaratar toda a guerrilha e prender Guevara. Após um breve interrogatório, Che Guevara foi fuzilado pelo tenente Mario Terán, na tarde do dia 9 de outubro de 1967.
Por Rainer Sousa
Fonte: http://guerras.brasilescola.com/seculo-xx/a-ultima-batalha-che.htm
Parnasianismo no Brasil
Os poetas Teófilo Dias, Alberto de Oliveira, Olavo Bilac e Raimundo Correia auxiliaram a implantação do Parnasianismo no Brasil.
Alberto de Oliveira, Raimundo Correia e Olavo Bilac – a tríade brasileira do Parnasianismo
O Parnasianismo tem seu marco inicial com a publicação de “Fanfarras” de Teófilo Dias, em 1882. Contudo, Alberto de Oliveira, Olavo Bilac e Raimundo Correia também auxiliaram a implantação do Parnasianismo no Brasil.
A estética parnasiana, originada na França, valorizava a perfeição formal, o rigor das regras clássicas na criação dos poemas, a preferência pelas formas fixas (sonetos), a apreciação da rima e métrica, a descrição minuciosa, a sensualidade, a mitologia greco-romana. Além disso, a doutrina da “arte pela arte” esteve presente nos poemas parnasianos: alienação e descompromisso quanto à realidade.
Contudo, os parnasianos brasileiros não seguiram todos os acordos propostos pelos franceses, pois muitos poemas apresentam subjetividade e preferência por temas voltados à realidade brasileira, contrariando outra característica do parnasianismo francês: o universalismo.
Os temas universais, vangloriados pelos franceses, se opunham ao individualismo romântico, que revelava aspectos pessoais, desejos, aflições e sentimentos do autor.
Outra característica que o Parnasianismo brasileiro não seguiu à risca foi a visão mais carnal do amor em relação à espiritual. Olavo Bilac, principalmente, enfatizou o amor sensual, entretanto, sem vulgarizá-lo.
No Brasil, os principais autores parnasianos são: Olavo Bilac e Raimundo Correia.
O poema “Profissão de fé” de Olavo Bilac é uma representação da estética parnasiana no Brasil:
Veja um trecho:
(...)
E horas sem conta passo, mudo,
O olhar atento,
A trabalhar, longe de tudo
O pensamento.
Porque o escrever – tanta perícia
Tanta requer,
Que ofício tal... nem há notícia
De outro qualquer.
Assim procedo. Minha pena
Segue esta norma,
Por servir-te, Deusa serena,
Serena Forma!
Vemos nas estrofes acima aspectos parnasianos, como “a arte pela arte”: o poeta deixa claro que a arte poética exige do autor o afastamento quanto ao que acontece no mundo.
Ainda vemos a exaltação e procura por um rigor técnico, purismo na forma: o poeta diz que escrever requer muita perícia, cuidado e engrandece a estética formal “Serena Forma”.
Além disso, observamos no poema a forma fixa dos sonetos, a rima rica e a perfeita ou rara em contraposição aos versos livres e brancos dos poetas românticos.
Por Sabrina Vilarinho
Fonte:http://www.brasilescola.com/literatura/parnasianismo-no-brasil.htm
INTERCEPTOR G5
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1914 e a Primeira Guerra Mundial: o suicídio da Europa
Voltaire Schilling
"Ofensiva de soldados com máscara contra gás", do pintor Otto Dix: retrato do horror da Primeira Grande GuerraFoto: Wikimedia / Reprodução
Repentinamente, uma crise na região dos Bálcãs, envolvendo a pequena Sérvia e o Império Austro-húngaro, jogou a Europa e depois os demais continentes nos braços da morte. A guerra que aparecia inicialmente limitar-se ao Bálcãs espalhou-se como um campo em fogo pelo restante do globo. Declarada a guerra, que não tardou a ser denominada como a Grande Guerra, milhões de jovens da Europa, da América, da África e da Ásia e até da Austrália e Nova Zelândia entraram em combate (ao todo 50 milhões foram convocados).
Cegos pelo patriotismo e obedientes à Máquina de Extermínio dos seus respectivos impérios ou países a quem serviam, marcharam para o desastre, como se fizessem parte de um mortífero ritual de suicídio coletivo, sem que ninguém pudesse mais detê-los.
O historiador Christopher Clark chamou os responsáveis pela catástrofe de ‘Os sonâmbulos’, e o romancista vienense Hermann Bloch, na trilogia do mesmo título, registrou os filhos daquela época como ‘seres que vivem em estado letárgico, entre a agonia e a emergência de sistemas éticos’.
A contabilidade funesta
"Será razoável supormos que toda a civilização elevada desenvolve tensões implosivas e movimentos de autodestruição?", escreveu George Steiner no livro "No castelo do barba azul" (1971). "Será a fenomenologia do tédio e do anseio pela dissolução violenta uma constante na história das formas sociais e intelectuais a partir do momento em que ultrapassam um certo limiar de complexidade?”
“Armistício! Armistício!” A notícia varou o mundo. Os telégrafos enlouqueceram. O marechal Ludendorff, o supremo comandante da Reichwehr, o exército da Alemanha Imperial, encaminhara a solicitação de um armistício aos aliados. O II Reich tinha exaurido todas as suas forças.
Em novembro de 1918, a Grande Guerra chegara finalmente ao término. Em instantes as ruas e praças de Nova Iorque, Paris, Londres, Roma e tantas outras mais, encheram-se com as multidões exultantes com o fim da matança. Quatros anos antes, em 1914, as mesmas multidões inconscientes do vinha pela gente atiçaram com clarins marciais, gritos patrióticos e ramadas de flores, os soldados a partir para o fronte.
Naquele momento, em novembro de 1918, quando se anunciou que o mundo voltava à paz - contabilizando 8.5 milhões de mortos e um incalculável número de mutilados e feridos -, as ruas celebravam a sobrevivência.
Perplexidade
Para os historiadores do futuro certamente causará assombro a arrogante cegueira demonstrada pelas elites europeias: seus estadistas, seus generais e diplomatas, seus políticos, seus jornais, seus professores que enfatizaram "como era doce morrer pela pátria" no empenho que tiveram para alcançar a sua autodestruição.
Até o malfadado ano de 1914, era inquestionável o domínio europeu sobre o restante do mundo. Na Ásia, na África, na América Latina, na Austrália ou na Polinésia, tudo girava em função das necessidades e lucros dos interesses financeiros e estratégicos sediados no Velho Continente. Nenhuma ponte era erguida, nem um poste era instalado, nem estrada-de-ferro era estendida, nem fábrica inaugurada, que não tivesse nelas a presença de capitais europeus. E, em apenas quatro anos de morticínio, os estadistas europeus conseguiram desbarataram quase tudo.
A favor do Império Romano pode-se ainda dizer que a sua dissolução pelo menos foi consequência involuntária da chegada da maré bárbara que, inexorável, transbordou o Danúbio e o Reno, levou tudo de roldão. Mas qual a justificativa dos chefes de estado europeus para lançar sua juventude numa guerra de extermínio?
Previsões sombrias
É certo que Marx e, depois dele, Nietzsche, por motivações ideológicas diversas, previam catástrofes para os anos vindouros. Épocas onde o “proletariado” ou a “besta-loura” agiriam como o dissolvente “bárbaro interno”. E, tal como os dois pensadores, inúmeros outros artistas e poetas espelharam sentimentos incrivelmente destrutivos e ruinosos sobre as possibilidades futuras do Velho Mundo mergulhar no sangue. Ninguém, porém, imaginou que atingissem as dimensões trágicas das batalhas de Verdum (714 mil baixas), de Chemin des Dames, do Somme, de Ypres, de Tannenberg, de Caporetto ou de Galípoli.
Somente nas duas primeiras, o exército francês perdeu mais gente do que Napoleão em vinte anos de campanhas! Quase toda a riqueza acumulada em séculos de exploração do globo esvaiu-se num piscar de olhos. E, com ela vieram abaixo dinastias centenárias (Hohenzoller, Habsburgo, Romanov, e outras menores).
Freud, em Viena, chocado com o entusiasmo que a guerra provocara nos austríacos, forçou-se a rever suas teorias da civilização. Percebeu, estarrecido, que por de trás do mais sisudo e empertigado europeu batia o tantã de um selvagem. A cultura deles pareceu-lhe um falso verniz, bastando arranhá-lo para que a selvageria viesse fosse exposta à vista. Na guerra, Eros o deus do Amor foi destronado por Thanatos, o da destruição e morte visto ter ‘o coração de ferro e as entranha de bronze’.
Fronte de batalha durante a Primeira Guerra MundialFoto: Lieutenant W. I. Castle, Canadian Official photographer / Wikimedia / Reprodução
O horror nas trincheiras
O pior ainda estava para surgir. Passada a febre inicial da euforia patrioteira, os soldados foram convencidos a continuar lutando no fronte por quatro anos seguidos, enfiados em labirintos de lama, nauseabundos e tifosos, em razão dos generais e dos políticos lhes dizerem que aquela seria a “última das guerras”.
No entanto, mal as noticias da capitulação alemã, assinada em Compiège em 11 de novembro de 1918, se espalharam, um surdo furor vingativo instalou-se no espirito de muitos dos sobreviventes, do lado dos vitoriosos ou dos derrotados.
Entre eles, no estafeta do regimento List, Adolf Hitler que maldizia estar acamado, semicego, no hospital militar de Pasewal recuperando-se de um envenenamento por gás: no futuro, disse ele, “seremos desumanos, se for preciso!”
O enigma continua
A quem, afinal, pode-se responsabilizar pelo suicídio daquela civilização? Lenin e outros socialistas apontaram os imperialistas, os capitalistas, os oligopolistas, ou os militaristas, e até mesmo, como fizeram os antissemitas, os judeus.
George Steiner, o grande crítico, percebeu a grande tragédia resultar de uma sensação denunciada anteriormente por Baudelaire: o tédio! Desde a derrota de Napoleão em 1815, os europeus teriam mergulhado numa perigosa mistura de tédio - a “grosse Langeweile” de Shopenhauer; “l’ennui atroce” de Flaubert; o “spleen” de Baudelaire - com uma paixão nostálgica pela heroicidade, de volúpia pelo desastre e pelas ruínas, que os conduziu à morte na paisagem lunar provocada pelas explosões em Verdum e de tantos outros campos de guerra.
Na verdade, nunca se encontrou uma causa única comum aos que se envolveram na matança, todas as respostas são parciais com marcado compromisso ideológico que pouco satisfaço. A responsabilidade sobre a deflagração da Grande Guerra continuará sendo um dos enigmas a desafiar os séculos vindouros: por que os Europeus, continente mais civilizado do planeta, entraram em guerra em 1914 e não souberam mais pará-la?
‘Ler o ocidente’ é como entrar em uma galeria do pensamento
Voltaire Schilling
Obra faz passagens pelas origens das culturas ocidentaisFoto: Reprodução
De certo modo folhar e ler esta estupenda obra são como adentrar numa galeria, não as de artes plásticas ou congêneres, mas numa exclusivamente voltada às origens mais remotas do Pensamento Ocidental. O visitante irá deparar-se com repletos salões dedicados, cada um deles, aos elementos filosóficos, teológicos, religiosos, históricos e literários que, entrelaçados, terminaram por germinar a maneira de ser e pensar no Ocidente.
O alentado livro do professor José Hildebrando Dacanal, um dos poucos maître à penser da sabedoria clássica ainda em atividade entre nós, tem por título ‘Para Ler o Ocidente, as origens da nossa cultura’(Besouro Box, 2013). Com pouco mais de 600 páginas, assemelha-se a um super catálogo, a algo majestoso no qual praticamente ninguém relevante das três culturas que antecederam a nossa - a helênica, a judaica e a romana - está ausente.
O método por ele adotado é simples. Passadas as primeiras páginas de introdução – na verdade uma síntese do que iremos nos deparar a seguir – percorrendo a primeira sala, passo a passo, vemos os autores e temas que foram definitivos na velha Hélade, subdivididos entre o período arcaico, o clássico e o helenístico. Ali estão todos os que encantaram gerações e gerações de estudiosos e leitores ocidentais (Homero, Hesíodo, Sólon, Píndaro e as escolas pré-socráticas).
Na Era Clássica somos brindados com um rol de famosos dramaturgos e comediógrafos gregos, e a dupla eminente de filósofosPlatão e Aristóteles, encerrando-a com a importância da oratória de Demóstenes, o derradeiro defensor da independência da polis: a Eleutéria.
Do período Helenístico, Dacanal destaca Polibio como o mais digno discípulo de Tucidides (o fundador da história política), vindo a seguir a nominata dos pós-socráticos (Epicuro, Epitecto, M. Aurélio e Plotino), fechando a série com os autores mais discretos da literatura helenística tardia.
Na segunda espaçosa sala desta exposição das ideias alinham-se os temas ligados ao judaísmo - os mitos fundadores – do Gênesis ao Messias. Em seguida, destaca-se a pérola da exposição: uma relação dos profetas.
Dos 14 citados na Bíblia, o autor selecionou seis: Amós, Oséias, Isaías, Miquéias, Jeremias e Isaías II. Muitos deles contemporâneos dos filósofos gregos, eles eram os porta-vozes do descontentamento popular, os pilares da moralidade, o látego dos depravados.
Numa época sem imprensa, a oratória tonitruante dos profetas abalava os poderosos, os opressores, os corruptos, os desdenhosos, sempre embalada pela indignação e ausência de justiça. A infelicidade coletiva arengavam os profetas, resultava do pecado dos grandes e da perdição do povo miúdo. Daí, por sua contundência, a vida nômade que tais homens-de-Deus eram obrigados a levar para escapar dos suplícios e vergastas que os ameaçavam por todos os lados.
Cada página dedicada a eles é acompanhada por uma citação no qual facilmente se observa a qualidade literária e estilística deles. Observe-se, por exemplo, a fúria de Amós contra os vilões e perversos na passagem a seguir: “Acontecerá naquele dia – o oráculo do Senhor – Que farei o sol se por ao meio-dia / E cobrirei de trevas a terra em pleno dia / Converterei vossas festas em luto / E vossos cantos em elegias fúnebres(...)”.
Dacanal tem toda a razão em repreender os que até hoje não sentem na poesia ou prosa deles o esplendor de uma literatura cuja qualidade perdura e inspira os homens de letras por séculos, incluindo nisto os ‘livros sapienciais’(salmos, cântico dos cânticos, provérbios, etc).
Então se segue a parte dedicada ao Cristianismo primitivo. Paulo é sua figura chave. Mesmo não tendo privado com Cristo, o apóstolo tomou a si a bandeira da cruz e do peixe e, em incansáveis viagens, difundiu a Boa Nova onde pôs os pés. Para Dacanal, constantemente polêmico, ele é o verdadeiro herói do cristianismo nascente.
Continuando a visita à Galeria, o setor em que nos deparamos com Roma é o terceiro. Inaugura-a os comediógrafos Plauto e Terêncio e, em seguida, Cícero centraliza a nossa atenção. A maioria das reflexões principais do filósofo-orador (Amizade, Velhice, República, Ofícios e correspondência) merece uma síntese elucidativa muito apropriada para que a geração atual, desligada quase que totalmente dos clássicos da Antiguidade, retome o gosto por lê-los, ou pelo menos deles se informe.
Entre a lírica dos romanos destaca a de Catulo, Horácio, Virgilio, e Ovídio, e suas respectivas obras-maiores que imortalizaram as letras latinas. Tal como a ‘Eneida’. Na História, habilidade em que os romanos se equiparam aos gregos, aparecem Júlio César, Tito Lívio, Salústio, Tácito e Suetônio, encerrando-se a sala romana com Sêneca, o infeliz filósofo e autor dramático, preceptor de Nero, que por igual mereceu ter seus títulos principais comentados.
No espaço derradeiro desta hipotética galeria das Ideias que contém o sumo do que mais tarde gerou a cultura ocidental, o autor retorna à questão cristã, na qual expõe os nomes dos principais padres da igreja, encerrando-o com Agostinho de Hipona.
Este nobre púnico-romano, possivelmente, foi o maior escritor da cristandade. Graças à excelente instrução, o talento para as letras somadas ao ardor do recém-converso, fez com que “As confissões” se tornassem um dos títulos mais lidos da literatura cristã, obra que certamente foi uma das mais copiadas ou editadas desde seu apareceu no século IV (397 A.D).
Ao alcançar-se a saída desta exposição, a qual bem se pode denominar de Da Magna Trindade (heleno-judaico-romana), o visitante-leitor certamente se sentirá mais do que gratificado. Para ler o Ocidente, além de um manual erudito, é o trabalho de uma vida inteira de um mestre de ensino cuja façanha é fazer-se compreender pela transparência da narrativa adotada.
A formação do professor JH Dacanal deu-se num seminário numa época em que os jovens se preparavam para o sacerdócio desconheciam as ingerências da Teologia da Libertação.
Assim sendo, manteve-se apegado ao universo pré-conciliar (pré-Vaticano II, 1961-65), permanecendo ligado à influência tridentina. Isto nos faz entender as diversas menções negativas ao iluminismo e ao marxismo que surgem aqui e ali ao largo da obra. Certamente é uma das melhores exposições da história das ideias editadas no Rio Grande do Sul nestas derradeiras décadas.